Em Aty Guasu índios “batizam” profissionais que vão fazer demarcações
Com a presença do Ministério Público Federal (MPF) e da Polícia Federal, mais de 100 lideranças políticas e religiosas, e mais de 300 membros de comunidades de praticamente todas as aldeias, acampamentos e comunidades Kaiowá Guarani do Mato Grosso do Sul, foi realizado, na comunidade Sassoró, município de Tacuru, o Aty Guassu (reunião grande) do povo Guarani para “batizar” os integrantes dos grupos técnicos de identificação de terras indígenas (GTs).
A atividade marca o início dos trabalhos de demarcação de terras indígenas reclamadas pelos guarani do Estado, cumprindo um termo de ajustamento de conduta da Funai e do Ministério Público Federal, ajustado no marco da Constituição Federal. Os indígenas realizaram seus ritos ancestrais para convocarem todas as forças espirituais e transmitir energia e proteção sobre os profissionais que vão realizar a tarefa de identificação das terras tradicionais.
A administradora da Funai/MS, Margarida Nicoletti, o procurador de Dourados, Marco Antonio Delfino de Almeida, o deputado estadual Pedro Kemp, Aloísio Azanha, da diretoria de Assuntos Fundiários da Funai, de Brasília, dois representantes do Governo Federal e procuradores da Funai também participaram do encontro. Margarida afirmou que “com grande alegria” veio participar do histórico encontro e que considera como uma oportunidade para rezar, conversar e ouvir às reclamações dos indígenas.
Não violência
Entre os temas que mais chamaram a atenção dos participantes foram às ameaças das organizações dos grandes grupos vinculados ao agronegócio e dos interesses políticos e econômicos que os apóiam, desde as instâncias locais, nos municípios, até as esferas estadual e federal. Igualmente foi denunciada a grande campanha de desinformação plantada através da mídia, que “tem como objetivo confundir a opinião pública e voltar á população não indígena contra ás reivindicações das comunidades”. Perante as intimidações dos que estão contra dos trabalhados de demarcação, em todo momento pediu-se calma ante as provocações. O principal desafio é terminar os estudos antropológicos e garantir um resultado justo para todas as partes que vão estar envolvidas no processo de demarcação de terras, assinalaram os profissionais que vão estar envolvidos nas tarefas.
Os indígenas cobraram rapidez e máxima proteção ao Governo Federal porque segundo disseram, com as constantes ameaças dos fazendeiros, nas aldeias “a morte é para hoje ou para amanha”. Igualmente mostraram toda a desconfiança em relação ao que podia acontecer nas aldeias durante os estudos que vão realizar o grupo de trabalho e que qualquer conflito ou ameaça à integridade física e psicológica contra a população indígena e os Grupos de Trabalho (GTs) serão responsabilidade das organizações vinculadas ao latifúndio e ao agronegócio e do governo estadual. Os Indígenas disseram estar defendendo não só um direito consuetudinário (do próprio povo), mas também a Constituição Federal. Foram muito firmes ao afirmar que os que estão contra os índios podem ter muito dinheiro, mas que não podem ser donos de terras indígenas e que elas foram tiradas de forma violenta nas últimas décadas. “Nossa luta é pela vida, estamos contra a violência; se os fazendeiros dizem que tem documentos nós temos nossa memória e nossa dignidade; o que é do índio é do índio e vamos morrer pela terra que é nossa”, foram entre outras as frases ouvidas durante o Aty Guasu.
Na avaliação dos participantes, esse foi um momento histórico, marcado pela expressiva presença dos Nhanderu e Nhandesi (lideranças religiosas), que permitiu não apenas a harmonia, profundidade e alegria do encontro, mas a certeza da vitória expressa no documento da Aty Guasu: ”Sabemos que não estamos sozinhos. Temos muitos amigos e aliados, pessoas que sabem a verdade de todo o sofrimento que estamos passando, aqui mesmo no Mato Grosso do Sul, mas também em todo o Brasil e mundo afora. Saímos mais unidos, fortalecidos e dispostos nessa grande celebração. Juntamente com nossos Nhanderu temos a certeza de que vamos vencer”.
Dourados (MS), 02 de agosto de 2008.
Cimi Regional Mato Grosso do Sul