29/02/2008

Documento de lideranças Kaingang e Guarani sobre os Projetos de Decreto Legislativo

Chapecó, SC, 23 de outubro de 2007.


 


Ao Senhor Presidente da Câmara dos Deputados


Senhor Arlindo Chinaglia


 


Senhor Presidente.


 


Nós, lideranças das Terras Indígenas Guarani do Araça´í, Toldo Pinhal, Xapecó e Toldo Imbu, juntamente com as demais lideranças de nossa região, nos dirigimos ao Senhor Presidente para expressar nossa preocupação quanto aos Projetos de Decreto Legislativo (PDL) apresentados por um deputado de Santa Catarina. Esta proposta é uma afronta aos nossos direitos e a histórica luta que travamos pela reconquista de pequena parte de nosso território.


            No Oeste Catarinense, a partir do momento em que o Ministro da Justiça assinou, em abril de 2007, as portarias declaratórias das terras indígenas acima mencionadas, setores contrários às demarcações pressionam os poderes públicos com o objetivo de revogar a decisão administrativa. Vale ressaltar, que o ato de declarar as referidas terras como sendo de nossa ocupação tradicional atende aos preceitos constitucionais (Art. 231 e ao Dec. 1775/96) e nos assegura a possibilidade e o direito, depois de décadas de sofrimento e luta, de vivermos em paz dentro de nossos territórios.


            Os setores antiindígenas de nosso Estado, articulado, em sua maioria por políticos, grandes cooperativas, dentre outros, ignoram a existência e a luta histórica de nossas comunidades, em especial pela demarcação das terras tradicionais. Quando nós, depois de uma longa trajetória de enfrentamentos políticos, de resistência às violências físicas, a discriminação e a intolerância, conquistamos uma parcela de nosso direito a terra, acabamos sendo tratados, pelo poder político e pelo judiciário, como sendo invasores de nossa própria terra. Perguntamos: Quem são mesmo os invasores? Amontoaram-se, nos últimos tempos, ações judiciais contra as demarcações de terras indígenas. As quatro terras acima citadas sofreram decisões liminares que obriga a Funai a paralisar os procedimentos demarcatórios e como conseqüência protela-se indefinidamente o cumprimento das normas constitucionais estabelecidas no Art. 231, bem como alimentam o ódio de parte dos agricultores contra os índios, muitos deles ocupantes de boa fé das terras indígenas. 


            Os setores anti-indígenas, carregados de ódio e intolerância, tentam, através dos meios de comunicação, jogar a opinião publica contra os povos indígenas. Um exemplo das atrocidades patrocinadas por estes setores foi o ato realizado em Chapecó, no dia 01 de junho de 2007, onde na oportunidade os agricultores, incitados pelos discursos inflamados de políticos de carreira, enforcaram um boneco de pano, simbolizando o bispo diocesano Dom Manoel João Francisco, bem como proferiam palavras e gritos de difamação contra as lideranças indígenas e nossos aliados. É lamentável que em pleno ano de 2007 existam ainda setores com tanto ódio, preconceito, intolerância e maldade.


            Prezado Deputado, sabemos e temos conhecimento, do teor dos 04 Projetos de Decreto Legislativo que tramita nesta casa (PDL 47, 48, 49 e 50/07), todos de autoria do deputado Valdir Colatto (PMDB-SC).  Estes projetos visam, via poder legislativo, cancelar os efeitos das Portarias Declaratórias das Terras Indígenas acima citadas.  As Portarias Declaratórias são um ato administrativo realizado pelo poder executivo, através do Ministério da Justiça e da Funai. Sabemos que não cabe ao poder legislativo suspender, através de tais projetos, atos administrativo do poder executivo. Cabe sim, a esta casa, suspender atos normativos do pode executivo. Portanto, estes Projetos de Decretos Legislativos são ilegais.


            Temos consciência também, que estas propostas fazem parte dos artifícios usados por estes setores, agora representados pelo Deputado Collato, a fim de protelarem a garantia de um direito legitimo de nossos povos; a terra. Estas tentativas, além de iludirem os agricultores e ganhar o voto, não levam a lugar algum, apenas protelam a efetiva garantia deste direito.


Tendo consciência de nossos direitos, pedimos ao Senhor que está casa não aprove estes projetos.


            Por fim, gostaríamos de informá-lo que nossas comunidades têm plena consciência de nossos direitos e não admitimos que a vida de nossas crianças seja colocadas, por políticos carreiristas e mal intencionados, em mesas de negociações. Estamos atentos!


            Sendo o que tínhamos para o momento desejamos êxito em seu trabalho frente a esta casa.


            Atenciosamente

            Lideranças Indígenas de Santa Catarina

Fonte: Cimi - Assessoria de Imprensa
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