07/02/2008

Povo Miguelem perde último falante de sua língua

 


 


No dia 19 de janeiro, faleceu, o ancião Antônio Marcirilo Maciel Miguelem, 82 anos – o último falante da língua miguelem, que pertence à  família isolada txapakura. O povo miguelem se auto-denomina “wanyam”. Ele estava internado em Guajará-Mirim, Rondônia.


 


Nos dois últimos anos, Marcirilo sofreu diversas fraturas e infecções, sendo internado diversas vezes. Ele já não podia andar e seu estado de saúde piorou em agosto de 2007, quando perdeu o filho João, vítima de um acidente.


 


O físico muito alterado contrastava com a lucidez e a garra de um guerreiro que não se entregava. Até o fim sonhou com a volta à sua terra e incentivava seus parentes a lutarem por ela. 


 


Marcirilo incomodava os fazendeiros que grilaram a margem direita do rio São Miguel. Desde 2000, ele afirmava que as malocas ficavam nas duas margens do rio e que ele nasceu na maloca ocupada hoje pela fazenda “Soberana” , ao lado do povoado de Porto Murtinho.


 


Fazendeiros do rio São Miguel por duas vezes procuraram Marcirilo para convencê-lo a negar a presença ancestral dos miguelem na margem direita do rio. Em troca, prometiam apoio na retomada da área na margem esquerda, dentro da Reserva Biológica do Guaporé, de onde os miguelem foram expulsos em 1984, quando o Instituto do Meio Ambiente (IBAMA) criou a Reserva. Marcirilo ficava indignado com os fazendeiros.


 


Em dezembro de 2000, Marcirilo percorreu mais de 1000 km com a equipe do CIMI-RO para ir ao encontro de seu irmão Sebastião em Porto Murtinho. Esse encontro abriu o caminho para o povo miguelem que daí em diante não parou mais de lutar para conquistar os seus direitos negados. Conseguiram vitórias na saúde e na educação. Hoje são atendidos pela Fundação Nacional de Saúde (Funsa) e têm dois professores indígenas contratados pelo Estado. Entretanto, por conta da demora no processo de demarcação, Marcirilo e Sebastião partiram antes de realizar o sonho de ter a terra homologada.


 


Na véspera de sua internação, Marcirilo não dormiu tentando lembrar a palavra “periquito” na sua lingua materna. No dia seguinte, perguntou, falando com dificuldade, ao Gil (da equipe do Cimi): “Lembrou do periquito?”. Gil repondeu: “towin!”. O rosto do Marcirilo por uns instantes se iluminou e ele repetiu sorrindo: ” towin, towin, é isso mesmo!”. Em seguida, foi levado para o hospital.


 


Equipe Cimi-Guajará-Mirim


Guajará-Mirim, 23 de janeiro de 2008

Fonte: Equipe Cimi-Guajará-Mirim
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