Que cada povo trame os fios da sua história – Rita Segato
“Que Estado é esse que hoje pretende legislar sobre como os povos indígenas devem preservar suas crianças? Que estado é esse que hoje pretende ensinar-lhes a cuidá-las? Que autoridade esse Estado tem? Que legitimidade e que prerrogativa? Que credibilidade esse Estado tem ao tentar, mediante nova lei, criminalizar os povos que aqui teciam os fios da sua história quando foram interrompidos pela violência e a cobiça dos cristãos? Em face das evidencias que cada dia se avultam e multiplicam sobre o absoluto fracasso desse Estado no cumprimento das suas obrigações e até na realização do seu próprio projeto de Nação, vejo-me obrigada a concluir que a única prerrogativa com que esse Estado conta é a de ser o depositário do espólio da conquista, o herdeiro direto do conquistador.”
Texto completo da antropóloga Rita Segato, da Universidade de Brasília, lido na Audiência Pública, realizada em 5 de setembro de 2007, pela Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados sobre o Projeto de Lei nº 1057 de 2007 do Deputado Henrique Afonso sobre a prática do infanticídio em áreas indígenas.