Transposição pode ter impasse junto a indígenas; ministério crê em ‘diálogo’
TRANSPOSIÇÃO DO RIO SÃO FRANCISCO
Obra pode ter impasse junto a indígenas; ministério crê em ‘diálogo’
Ciente de que as obras da transposição do rio São Francisco podem enfrentar problemas em função de parte delas interferir direta ou indiretamente na situação de povos indígenas, ministério da Integração Nacional aposta que impasses futuros poderão ser resolvidos pelo diálogo.
Antonio Biondi – Carta Maior
SÃO PAULO – O ministério da Integração Nacional está ciente que as obras da transposição das águas do rio São Francisco podem enfrentar problemas em função de parte delas interferir direta ou indiretamente na situação de povos indígenas do Nordeste. A pasta, responsável pelo projeto, afirma não crer em impasse nesse sentido e diz não vislumbrar outra perspectiva para superar os conflitos senão a do diálogo.
Na região de Cabrobó (PE), os índios Truká afirmam que a área destinada ao início das obras deveria integrar o território delimitado como sua reserva, cuja demarcação final depende de estudos por parte da Funai (Fundação Nacional do Índio). A área reivindicada pelos índios, onde foram iniciadas as obras pelo Exército em junho, foi palco de ocupação por parte dos movimentos sociais logo depois. Os movimentos deixaram a área após decisão da Justiça nesse sentido, mas os Truká reiteraram que não desistirão de lutar para que o local seja integrado ao seu território.
A assessoria de comunicação do ministério explicou que o ministro Geddel Vieira Lima não poderia conceder entrevista por estar viajando, mas que a determinação do governo é de que o ministério continue a obra. Segundo a assessoria, “se surgir algum problema dessa natureza, e pode surgir, o ministro quer conversar com as comunidades, e espera achar alguma solução que eles acatem”.
A assessoria explicou que, em caso de impasse, o ministério buscará convencer as comunidades “conversando até esgotar a conversação” e que “o ministro acredita que possui argumentos suficientes para convencer os indígenas”. Com isso, o ministério entende que as reivindicações dos índios “não vão impedir a obra”.
Após a ocupação realizada em Cabrobó, os Tumbalalá apresentaram reivindicação semelhante à dosTruká, ocupando terras em Curaçá (BA) próximas ao rio São Francisco e que, caso permaneçam ocupadas, podem gerar entraves ao projeto. O povo indígena reivindica a conclusão dos estudos de identificação de suas terras por parte da Funai.
As entidades ligadas à causa indígena, como o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) alegam que o projeto não poderia ser realizado sem prévia autorização do Congresso Nacional, por tratar do aproveitamento de recursos hídricos existentes em terras indígenas – tal análise embasa ações contrárias à obra que tramitam no Supremo Tribunal Federal (STF).
A reportagem perguntou à assessoria do ministério o que poderia ocorrer com o projeto em termos de licenciamento ambiental, elaboração do projeto executivo e licitação da obra, caso as análises da Funai concluam futuramente que áreas destinadas à obra pertencem a territórios indígenas. De acordo com a assessoria “mudar o projeto é inviável”, de modo que “a intenção é seguir o que ele pede. A intenção não é mudar nada do projeto, isso não chegou a ser cogitado”.
Carta Maior buscou entrevistar representantes dos Truká quanto à perspectiva de eventuais impasses serem resolvidos pelo diálogo, mas até o fechamento da matéria não obteve resposta.
Trâmites jurídicos
De acordo com a assessoria de imprensa da Funai, a posse permanente da Terra Indígena Truká foi declarada em 2002. A partir de solicitação dos Truká, o território encontra-se em revisão de limites e, de acordo com a Funai, “não é possível dizer se as áreas destinadas às obras de transposição poderão receber outra destinação”. Já a Terra Indígena Tumbalalá “encontra-se em fase de estudos”.
Segundo a Funai, uma antropóloga indicada pelos indígenas será enviada à região, para “fazer o levantamento da regularização fundiária e a situação de ocupação dos Truká e Tumbalalá”. O órgão prevê que, em 25 de julho “ela estará na aldeia Tumbalalá e, no início de agosto, segue para as aldeias Truká”.
Além das ações junto à Funai, no início de julho os Truká entraram em contato com o procurador Sérgio Rodrigo de Castro Pinto, do Ministério Público Federal (MPF) de Serra Talhada (PE) a fim de obter auxílio quanto às suas reivindicações. O procurador, que responde pelas ações do MPF na região de Cabrobó, explicou à Carta Maior que ainda analisa o tema e aguarda documentos do Cimi e da Funai para definir como atuará em relação à pauta.
Simultaneamente às questões envolvendo os povos indígenas, a licitação das obras da transposição vem avançando. A assessoria do ministério da Integração diz que o resultado da licitação do primeiro lote das obras, que envolve sete empreiteiras, “deve ser divulgado nos próximos dias” e que o Exército voltou a trabalhar normalmente na obra após a área em Cabrobó ser desocupada.
No STF, onde diversas ações relativas à transposição aguardam julgamento definitivo, o procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza apresentou em 5 de julho petição solicitando a imediata suspensão das obras. Mas, assim como as demais ações, a petição somente terá oportunidade de ser analisada pelo STF em agosto, após o fim do recesso.
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