26/06/2007

Cerca de 1200 pessoas ocupam área onde o exército iniciou projeto de transposição

 


Mais de mil pessoas ocupam área onde o exército iniciou projeto de transposição


 


Cerca de 1200 pessoas ocuparam e estão acampadas, desde o início da madrugada de hoje (26), em Cabrobó (PE), na área em que os batalhões de engenharia do exército deram início à construção dos canais de aproximação do eixo norte, do projeto do governo federal de transposição das águas do rio São Francisco. A ação deve servir para impedir o avanço das obras e para a retomada do território pelo povo indígena Truká, que reivindica a posse da terra.


 


O acampamento não tem prazo para encerrar e o número de participantes deve aumentar, até o final do dia. Participam da ação organizações sociais e movimentos populares, além de comunidades tradicionais de Minas Gerais, Pernambuco, Sergipe, Alagoas, Bahia e Ceará. Eles exigem o arquivamento do projeto, além da implementação de alternativas e tecnologias apropriadas de convivência com o semi-árido.


 



Manifesto do Acampamento:


 


O Nordeste é Viável sem Transposição e com Ética na Política.


 


De São João a São Pedro, o Nordeste todo se une em sua maior festa. Coincidente com as colheitas no sertão, é a festa da fartura, da solidariedade e da alegria. Do Nordeste viável, auto-sustentável e soberano. Nós, os movimentos populares e entidades civis da Bacia do Rio São Francisco e de todo o Nordeste, vimos festejar em Cabrobó-PE para mostrar que o Nordeste não precisa deste projeto traiçoeiro chamado “integração de bacias”, a mesma antiga transposição. Acampados em cerca de 2000 pessoas junto ao canteiro de obras, no km 29 da BR 428, vimos exigir a imediata suspensão das ações que dão início às obras da transposição. Em sinal de outro desenvolvimento, voltado para a população e não para o capital, nos irmanamos ao Povo Truká e aos indígenas de todo o Nordeste na retomada desta terra, da Fazenda Mãe Rosa, desapropriada para a transposição, território Truká desde tempos imemoriais.


 


Água nos açudes e cisternas, caatinga verdejante, comidas de milho, requeijão e paçoca, licores e muito forró ao redor da fogueira… Sinais do Nordeste bonito e viável, evidências do que pode o período chuvoso do semi-árido, se para ele deslocarmos o foco, concentrarmos os esforços, investirmos. Ao optar por obra contra a seca e não a favor do semi-árido e sua dinâmica sócio-ambiental, o governo erra mais uma vez, como tem acontecido historicamente. A proposta de conviver com o semi-árido – esperava-se desse governo – sepultaria a política e a indústria do combate à seca e consolidaria a política do aproveitamento do chuvoso, pois é neste e não na seca que se decide a vida do sertão e do sertanejo. A transposição, barganhada e em nome de uma falsa revitalização das bacias do Nordeste, significa uma “travessia para o passado”. A questão não é doar água ou não, mas qual desenvolvimento, a que preço e para quem. E como enfrentar os limites impostos pelas mudanças climáticas globais, que tendem a diminuir os mananciais do Rio São Francisco e desertificar o semi-árido.


 


Este é o terceiro acampamento que fazemos, o último em Brasília por uma semana no mês de março, com 740 pessoas. Já se somam quase uma centena de manifestações públicas. Sequer fomos recebidos, muito menos ouvidos ou considerados. Será por que significamos a incômoda verdade sobre esse projeto e o que ele vai trazer de falso desenvolvimento para o Nordeste? Ou é porque vivemos num blefe de democracia? Ditadura de novo, com desenvolvimentismo e até ação do Exército?


 


O processo transcorrido até aqui não foi democrático nem republicano e desabona o projeto, seus promotores e lobistas: estudos de impacto ambiental formais e incompletos; críticas fundamentadas dos principais especialistas; desrespeito às decisões do Comitê de Bacia; descumprimento do acordo feito com D. Luiz Cappio, ao encerrar a greve de fome, em novembro de 2005, para que houvesse um amplo e sério debate nacional sobre o assunto; incertezas e inverdades quanto as reais motivações do projeto, quanto a seus custos e a quem vai pagar a conta; propaganda enganosa sobre seu alcance, ao manipular a opinião pública e inventar um público beneficiário de 12 milhões de sedentos, na verdade, os que vão pagar a conta dos grandes usos econômicos intensivos em água; irregularidades flagrantes detectadas pelo Tribunal de Contas da União; indícios de corrupção (caso da Gautama, empreiteira candidata ao segundo trecho mais caro da obra); ocultação ao debate público dos projetos de transposição do Rio Tocantins para os Rios São Francisco e Parnaíba; compra descarada de apoio dos políticos do São Francisco, com verbas da revitalização; chantagens de um pseudo-desenvolvimento transmutado em crescimento econômico a qualquer custo e sem futuro… São motivos mais que suficientes para que esse projeto seja arquivado. E que a sociedade cobre essa única atitude digna de um Estado de Direito democrático e republicano.


 


Transposição não é solução – esta a verdade que não quer calar!
Queremos um programa verdadeiro de convivência com o semi-árido;
Queremos um projeto de desenvolvimento regional que atenda às reais necessidades da população do semi-árido e do São Francisco e não de uma minoria de empresários nacionais e estrangeiros;


Queremos a democratização do acesso à água, com acesso livre da população aos açudes e às adutoras;
Queremos controle social sobre os usos das águas dos açudes e reservatórios geridos com competência;
Queremos destinação prioritária das águas para a agricultura familiar e camponesa;
Queremos a implementação imediata das 530 obras do Atlas Nordeste da ANA – Agência Nacional de Águas para levar água a 34 milhões de habitantes do Polígono das Seca;


Queremos programas que ampliem, divulguem e implantem as mais de 140 tecnologias hídricas, agrícolas e ambientais de convivência com o bioma caatinga e o clima semi-árido;


Queremos reforma agrária ampla e efetiva e regularização dos territórios tradicionais, a começar pelas áreas dos Povos Truká, Tumbalalá, Pipipã e Cambiwá, atingidos pela transposição;


Queremos a suspensão das barragens de Pedra Branca, Riacho Seco e Pão de Açúcar e de Centrais Nucleares na região;


Queremos uma revitalização do Rio São Francisco que seja para valer!


Queremos que o Supremo Tribunal Federal tome finalmente a decisão e que essa seja contrária ao projeto;


Queremos o arquivamento definitivo do projeto de transposição!


CONVIVER COM O SEMI-ÁRIDO É A SOLUÇÃO! SÃO FRANCISCO VIVO – TERRA E ÁGUA, RIO E POVO!


 


Cabrobó, 26 de junho de 2007.


 


 


MST – MPA – MMC – MAB – APOINME – MONAPE – CETA – SINDAE – CÁRITAS – CIMI – CPP – CPT – ASA – AATR – PJMP – CREA/BA – SINDIPETRO AL/SE – CONLUTAS – Federação Sindical e Democrática de Metalúrgicos do Estado de MG – Terra de Direitos – Fórum Nacional da Reforma Agrária – Rede Brasileira de Justiça Ambiental – Fórum Permanente em Defesa do Rio São Francisco / BA – Fórum de Desenvolvimento Sustentável do Norte de MG – Fóruns de Organizações Populares do Alto, Médio, Submédio e Baixo São Francisco – Frente Cearense Por uma Nova Cultura da Água Contra a Transposição – Projeto Manuelzão/MG – STRs, Colônias de Pescadores, Comunidades Ribeirinhas, Indígenas, Quilombolas, Vazanteiras, Brejeiras, Catingueiras e Geraiseiras da Bacia do Rio São Francisco

Fonte: Não à Transposição
Share this: