A impronúncia do fazendeiro “Delsão” e a construção da impunidade
Os Movimentos Sociais e Entidades de Direitos Humanos abaixo mencionadas vêm a público, manifestar seu protesto e indignação, referente à decisão do Juiz da Comarca de Rondon do Pará que IMPRONUNCIOU o fazendeiro Décio José Barroso Nunes, o Delsão, acusado de ser mandante do assassinato do sindicalista JOSÉ DUTRA DA COSTA, o Dezinho. Crime ocorrido no dia 21 de novembro de 2000, no município de Rondon do Pará.
A decisão do Magistrado, acompanhando um pedido do Ministério Público de Rondon, coloca o caso no curso de centenas de outros assassinatos ocorridos na região, cujo fim a sociedade já conhece: a IMPUNIDADE! É também, mais um lamentável exemplo, do descaso da polícia, do Ministério Público e do Poder Judiciário paraense em punir aqueles que detêm o poder econômico e comandam o crime organizado no campo. De acordo com dados da Comissão Pastoral da Terra, nos últimos 30 (trinta) anos, foram mais de 700 (setecentos) assassinatos no campo no Estado do Pará, destes, apenas 4 (quatro) fazendeiros, mandantes de crimes, foram condenados pela justiça, no entanto, nenhum deles cumpre pena atrás das grades. Uma Justiça Inoperante!
O processo que apura o assassinato do sindicalista Dezinho, como tantos outros, é um exemplo claro de como se constrói a impunidade. São 6 (seis) anos e 4 (quatro) meses de tramitação, 5(cinco) promotores e igual número de juízes passaram pelo caso, mais de 2 (dois) anos totalmente parado aguardando apenas transcrições de 5 (cinco) fitas K7, aditamento da denúncia quase 6 (seis) anos após o crime, nenhum esforço da polícia para prender os intermediários foragidos, houve o assassinato de uma testemunha e o crime não foi apurado, enfim, o único condenado foi o pistoleiro, preso pelo próprio Dezinho antes de morrer.
Assim, os que comandam os crimes não têm com o que se preocuparem, é só comemorar e financiar outras mortes!
Tanto a atual promotora quanto o Juiz, alegaram que não há provas suficientes nos autos para a pronúncia do fazendeiro acusado, para isso, buscaram desqualificar o depoimento das principais testemunhas. Argumentos contestados, com apresentação de provas, pelos advogados que atuam na assistência da acusação. No mesmo dia do crime, um telefonema anônimo feito para a Delegada que apurava o crime, apontou o intermediário Ygoismar e indicou Delsão como sendo um dos envolvidos no episódio; um funcionário de Delsão prestou depoimento à polícia e afirmou que Dezinho, antes de morrer, lhe confessou que Delsão o ameaçou de morte; Dezinho denunciou o fazendeiro por trabalho escravo em suas fazendas e pelo assassinato de um funcionário seu conhecido por “Piauí”; a testemunha Francisco Martins relatou que um irmão seu de nome Pedro trabalhava como pistoleiro para Delsão e que o fazendeiro o contratou para assassinar Dezinho, no entanto, o pistoleiro foi morto 15 dias antes da morte de Dezinho, etc. Tudo isso está no processo, no entanto, para a promotora e o juiz nada disso é prova e nem sequer indício de prova.
A promotora Lucinery Helena, em suas alegações finais e nas declarações que tem dado à imprensa, tem ido mais longe, afirma que o acusado “continua, ao longo desses anos, investindo no crescimento do município”; A promotora chegou até a fazer uma espécie de defesa de Delsão, afirmando que “as fazendas de Delsão são todas produtivas, ele investe na região e emprega mais de cinco mil pessoas” (Jornal Opinião, edição dos dias 5.12.2006/6.12.2006, página 4).
Pura inverdade! Só quem pode dizer se uma propriedade é produtiva ou não é o INCRA, e não temos conhecimento de uma única propriedade do acusado com laudo atestando que ela seja produtiva. Pelo contrário, INCRA e ITERPA procederam levantamento nas propriedades do fazendeiro e atestaram que, dos 130.000 (cento e trinta mil) hectares de terra que ele ocupa em Rondon do Pará, mais de 100.000 (cem mil) é fruto de apropriação ilegal de terra pública ou grilagem, onde ele usa para extrair madeira e criar gado. O problema é que até agora nem o INCRA nem o ITERPA tiveram interesse político para retomar essas terras e destiná-las para a Reforma Agrária. Daria para assentar cerca de 2.000 (duas mil) famílias sem qualquer custo com desapropriação ou pagamento de benfeitorias.
Quanto aos mais de 5.000 (cinco mil) empregos, só a promotora tem esse dado, pois, o próprio Delsão, em depoimento dado em juízo afirmou que emprega cerca de 800 (oitocentos) pessoas em suas serrarias. Na Justiça do Trabalho de Marabá, nos últimos anos, foram instaurados mais de 500 (quinhentos) processos trabalhistas contra este fazendeiro e suas empresas. É quase um processo por trabalhador empregado. Sem contar o grande número de trabalhadores que não procuram a justiça por medo de ameaças. Responde ainda, inúmeros outros processos que tramitam na Justiça Federal por crimes ambientais e previdenciários.
Depoimentos colhidos após a morte de Dezinho apontam Delsão como envolvido no assassinato de 5 (cinco) funcionários de suas serrarias. Três dos inquéritos que apuravam esses crimes simplesmente desapareceram da Comarca de Rondon do Pará. É dessa forma que ele contribui para o desenvolvimento de Rondon como afirma a promotora! A sociedade quer saber é o que está fazendo o Ministério Público de Rondon para apurar esse rosário de crimes!
A forma como a promotora vem atuando neste processo, deixa sérias dúvidas quanto à sua imparcialidade, de modo que a continuidade de sua atuação neste processo preocupa o conjunto das entidades que representam os trabalhadores e que defende os direitos humanos, e, além disso, não dá qualquer segurança de que no final chegará a se fazer justiça, uma vez que parece estar ausente na promotora a isenção de ânimo necessária para fazer um trabalho que tem por finalidade o esclarecimento da verdade.
Frente à situação exposta queremos deixar claro:
1. Nossos advogados que atuam na assistência de acusação vão recorrer da decisão do Juiz de Rondon, junto ao Tribunal de Justiça do Estado;
2. Solicitamos aos nossos advogados que ingressem com ação de suspeição da promotora Lucinery Rezende para que ela deixe de atuar no caso;
3. Se o braço da justiça não alcançar o acusados de serem os mandantes do crime de Dezinho, a organização dos trabalhadores os alcançará através da ocupação de suas fazendas. Se não houver punição pela Lei haverá punição econômica pela ocupação;
4. Não daremos um passo atrás na luta pela condenação de todos os envolvidos no assassinato do companheiro Dezinho.
Marabá, 29 de março de 2007.
Federação dos Trabalhadores na Agricultora do Estado do Pará – FETAGRI
Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Rondon do Pará
Comissão Pastoral da Terra – Diocese de Marabá
Pastorais Sociais da Diocese de Marabá
Sociedade Paraense de Defesa de Direitos Humanos – SDDH
Conselho Indigenista Missionário – CIMI
Movimento Sem Terra – MST
Movimento dos Pequenos Agricultores – MPA
Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB
Centro de Pesquisa e Assessoria Sindical – CEPASP
FASE – Programa Amazônia
Escola Família Agrícola – EFA
Cooperativa de Prestação de Serviços – COOPSERVIÇOS