15/03/2007

Nota dos Guarani de Morro dos Cavalos (SC) sobre a matéria “Made in Paraguai”

 


Indignados com a forma como foram tratados pela revista Veja na matéria  Made in Paraguai” (publicada na edição de 11/3/2007 da revista), os Guarani solicitaram ao Ministério Público Federal em Florianópolis que o órgão formalize o pedido de direito de resposta e entre com uma Ação Civil Pública contra a revista.


 


Veja abaixo também nota do Cimi enviada à redação da Veja.


 


Se você também se sente indignado com esta matéria, sugerimos que envie uma carta à redação da revista.


 


 


Terra Indígena Guarani de Morro dos Cavalos


 


13 de Março de 2007, Palhoça, Santa Catarina.


 


 


A: Revista VEJA, Editora Abril


 


 


Viemos por meio deste informar aos editores e responsáveis da Revista VEJA que toda a comunidade Guarani de Morro dos Cavalos está indignada e transtornada com a reportagem intitulada “Made in Paraguai”, publicada na Edição 1999, de 14 de março de 2007, páginas 56, 57 e 58, de autoria do jornalista José Edward Lima, em que é tratado o processo de Demarcação da Terra Indígena Morro dos Cavalos, Palhoça, Santa Catarina.


 


Estamos nos sentindo gravemente insultados e desrespeitados pelas calúnias e distorções escritas na matéria que contém racismo e imoralidade, difamando a autenticidade da História Indígena Guarani no Brasil. Nos sentimos também agredidos pela manipulação das informações cedidas em entrevista.


 


Além de destorcer nosso depoimento e o depoimento de nossos parentes, usaram de inverdades para justificar a reportagem. O reporte não teve o cuidado de conhecer um pouco mais a nossa história, o nosso território e a nossa luta pela terra. Bastaria ler o relatório circunstanciado de identificação e delimitação, que muita coisa iria ficar esclarecida, ele preferiu confiar em fontes pouco confiáveis, essa mesma fonte que há muito tempo vem ameaçando nossa comunidade. O repórter afirma que a TCU declarou inconsistente a “tese” da antropóloga: bastaria o repórter ter lido o Acórdão do TCU pra saber que o referido tribunal informa que não teve acesso a “tese”.


 


Por isso, exigimos o direito de resposta, nos termos do Art. 29 da Lei 5.250, de 9.2.1967, na mesma quantidade de espaço da citada reportagem, para podermos esclarecer à população brasileira a verdade sobre a História Indígena de Morro dos Cavalos.


 


Caso o pedido não seja atendido, seremos obrigados a recorrer a via judicial para defender nossa honra e esclarecer as verdades dos fatos.


 




Atenciosamente,


 


Artur Benite


Cacique



 


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NOTA DO CIMI


Ao Diretor de Redação da VEJA


 


O Conselho Indigenista Missionário (Cimi) ficou indignado ao ver a matéria “Made in Paraguai”, publicada na edição de 11/3 da revista Veja, com autoria do jornalista José Edward. A reportagem tratou de forma extremamente desrespeitosa o povo Guarani Mbyá (grafado embiá na matéria) e traz informações erradas sobre demarcação de terras indígenas e sobre este povo.


O título da matéria insinua que os Guarani Mbyá são falsificados ou de procedência duvidosa (idéia que o senso comum atribui ao que é fabricado – “made” – no Paraguai). Durante todo o texto, os Guarani são tratados de forma jocosa como “hermanos”. O autor da matéria, pelo que mostra o texto, desconsiderou o que a antropóloga Maria Inês Ladeira explicou a ele sobre a dinâmica da circulação Guarani, que atravessa as fronteiras criadas sobre o território deste povo.


Além de desqualificar os Guarani Mbyá, a reportagem trata de forma leviana a situação fundiária de outros povos indígenas que vivem no Brasil. O jornalista apresenta como fonte uma “consultoria social” e não menciona como estão estes processos na Fundação Nacional do Índio. A Funai não é uma “indústria de reservas”. Como determina a Constituição Federal, ela é o órgão responsável, em nome da União, pela demarcação das terras indígenas.


Quem definiu o que é terra indígena foi a Constituição. O relatório necessário num processo de demarcação prevê pesquisas etnográficas, com levantamentos genealógicos, ambientais, de organização social, entre outros, para mostrar a relação que um povo tem com a terra em questão. Portanto, o fato de uma terra ser produtiva, por exemplo, não é um critério considerado pela lei para definir se uma terra é ou não é indígena.


O jornalista também publicou no texto afirmações falsas. O Tribunal de Contas da União não declarou a tese da antropóloga inconsistente, até por que não analisou este relatório.


Os leitores de Veja merecem reportagens feitas com mais profundidade, cuidado e responsabilidade. E, claro, veracidade.


Os povos indígenas deste país merecem, pelo menos, seriedade e respeito ao serem objeto de uma reportagem.


Atenciosamente,


 


Éden Magalhães


Secretário-Executivo do Conselho Indigenista Missionário (Cimi)

Fonte: Cimi Sul
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