Guarani-Kaiowá e Terena: Conquistando amigos e aliados da luta
Uma delegação de 50 pessoas dos povos Guarani-Kaiowá e Terena, do Mato Grosso do Sul, tiveram uma intensa maratona de visitas, contatos e manifestações
Estiveram na Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP), no Tribunal Regional Federal, no Ministério Público, nas ruas de São Paulo. Contaram sua realidade para a imprensa, convocaram acadêmicos e intelectuais para sua luta, sensibilizaram outros setores excluídos e contestadores para sua causa – moradores de rua, sem terra, punks. Foi um importante momento de dar visibilidade a uma das situações mais dramáticas vividas por povos indígenas no Brasil. Conquistaram muitos aliados e fizeram uma legião de amigos. De uma das janelas da PUC algumas lideranças acenaram com os maracás nas mãos: “adeus São Paulo”. Afinal de contas a cidade de muitas novidades que os impressionaram, tinha também uma alma e um coração que se colocou em sintonia com eles. Foram visitar seus irmãos Guarani no Pico do Jaraguá. Ali fizeram ritual e ficaram impressionados como mais de 70 famílias vivem em um pouco mais de três hectares.
Uma das mais importantes conversas que tiveram foi a com a presidente do Tribunal Regional Federal, 3ª. Turma, Desembargadora Diva Malerbi. Ela não apenas acolheu as dezenas de lideranças indígenas, mas se emocionou ao ouvir os depoimentos: o desfile de sofrimento, ameaças, e toda sorte de violências e tormenta da fome a que estão submetidas – a terra mãe que lhes foi tirada e destruída. Querem suas terras de volta. Por isso estavam ali, altivos, apesar de machucados e marcados pela discriminação, descaso, violência e ódio manifesto por setores e elites locais. Falaram com muita dignidade e respeito. Sensibilizaram muita gente para sua causa. No final de quase duas horas e meia de encontro, a Dra. Diva pediu que acreditassem na justiça, pois estamos num movimento de paz: “os recebo com muita atenção e carinho, mas não posso prometer que resolvo os sérios problemas de vocês com a caneta, pois isso não depende só de mim. Mas se todos nós lutarmos a mesma luta, combater o mesmo combate, poderemos conseguir a solução”. No final assumiu três compromissos com eles: acelerar os processos que tramitam hoje no TRF-3ª Região e impedem a continuidade dos processos de demarcação, investigar, juntamente com o Ministério Público, as denúncias de descaso e omissão da Funai e pressionar para que sejam apuradas as evidências de crime de pistolagem contra as lideranças. Além disso, se comprometeu a falar com os juízes no Mato Grosso do Sul, no sentido de buscar uma compreensão da realidade e dos direitos indígenas nesta região. Finalizou dizendo: ”A justiça, acreditem, ela depende também de vocês, ela virá”.
Conseguimos nossos objetivos
Ao avaliar a viagem, o velho líder e cacique Lico assim resumiu o resultado: “volto cheio de alegria”. Alegria e paz são as principais características do bem viver Guarani, da Terra Sem Males.
Anastácio Peralta, um dos coordenadores da delegação, mostrou-se esperançoso, mas também realista ao dizer: “as conversas foram boas. Mas as coisas só funcionam com pressão. Falei duro dizendo que hoje não se mata só com balas, pois tentam também nos matar tirando nossos direitos da Constituição”.
A antropóloga e lutadora da causa indígena há décadas, Carmem Junqueira, também foi prestar seu apoio e solidariedade à delegação Guarani-Kaiowá e Terena. Falou que o governo tem se apressado em pagar a dívida externa, porém, “seria importante que o governo antes de pagar a dívida externa saldasse a dívida histórica com os povos indígenas”. Lembrou ainda que a sociedade tem se insurgido contra a invasão do Afeganistão e Iraque, porém parece que não nos comovemos com a invasão das terras indígenas.
Plínio de Arruda Sampaio também manifestou seu apoio e solidariedade com a luta dos povos indígenas do Mato Grosso do Sul, falou do muito que aprendeu com a causa indígena, especialmente com relação a terra. Contou sua experiência pessoal de ter que desconstruir tudo que aprendeu nos livros de escola sobre os índios, e ter uma visão realista da importância e contribuição dos povos indígenas com o país.
Frei José, um dos anfitriões da delegação, na Igreja São Francisco, onde foram servidos os almoços, incentivou os guerreiros e guerreiras a continuarem firmes na luta “e podem contar com a gente”. Viabilizou a vinda do diretor da Faculdade de Direito da USP, que se comprometeu em criar um grupo permanente de acompanhamento dos processos relacionados aos índios do MS que tramitam no TRF.
Também receberam a solidariedade do Movimento dos Sem Terra, presentes na manifestação no MASP, simbolizada pela entrega aos índios de uma bandeira do movimento.
Muitos foram os que contribuíram com a realização desse importante momento de luta política dos Guarani-Kaiowá e Terena nesta sua viagem a São Paulo. A todos agradecem de coração esse momento de luta e conquista de amigos e aliados de sua causa.
Ainda no Mato Grosso do Sul, receberam uma delegação de representantes dos povos do Tocantins, outra solidariedade importante porque possibilita troca de experiência e reforço das alianças na luta indígena da atualidade. Eles também participaram da Grande Assembléia Aty Guasu, realizada
São Paulo, 30 de novembro de 2006.
Egon Heck
Cimi MS
Lucia Rangel
PUC/NEAP