25/11/2006

Grande Assembléia Indígena em Dourados

“Marçal foi morto, mas nasceram milhares de outros guerreiros Guarani para continuar sua luta” (Isaías –  Nhanderu Marangatu)


 


No dia em que é lembrada a morte do líder Guarani, Marçal Tupã’y, assassinado no dia 25 de novembro de 1983, na aldeia Campestre, município de Antonio João, fronteira com o Paraguai, uma Grande Assembléia  Indígena, com mais de 700 participantes está se realizando na cidade de Dourados, no Mato Grosso do Sul. É a Aty Guasu dos Professores Kaiowá Guarani que neste ano está tendo um caráter muito especial. Não apenas pela amplitude da participação, mas também pela presença de povos indígenas de outras regiões do país. Além disso é um primeiro encontro depois da reeleição de Lula e de um novo governador para este Estado.


 


Em Dourados, na Câmara Municipal será realizado um importante debate sobre a realidade de vida e violência que sofrem hoje os povos Guarani-Kaiowá. Será uma maneira de lembrar a memória de Marçal de Souza e de dezenas de lideranças que foram assassinadas nestes últimos anos, na luta pela recuperação de seus tekoha, terras tradicionais.


 


Em Campo Grande, na aldeia urbana Água Bonita, também estará sendo realizado um ato em memória de Marçal, promovido pelo Centro de Defesa de Direitos Humanos Marçal de Souza e representantes Guarani que ali vivem.


 


“Esta Aty Guasu está se destacando pela união entre as lideranças, os caciques e os professores. Além disso, está sendo muito importante a expressiva participação de lideranças de outros Estados e povos. A preocupação principal é com a terra, que vem ligada com as lutas e preocupações com a educação, saúde e economia indígena”. Desta forma a professora Teodora de Souza, uma das articuladoras do Encontro, expressou sua opinião com relação ao andamento da Aty Guasu.


 


Terra e violências


 


Na noite de abertura da Aty Guasu, enquanto os Nhanderu presentes puxavam os rituais de vida e resistência, há pouca distância dali algumas famílias Kaiowá Guarani se movimentavam para seguir para próximo de sua terra tradicional, na região do Carumbé e Rio Santa Maria. Nessa região há uns trinta e poucos anos existiam algumas aldeias Kaiowá Guarani. Agora retornam à região e estão acampados à beira da estrada. É uma das iniciativas para diminuir o sofrimento dos mais de doze mil índios que vivem nos três mil e quinhentos hectares na Terra Indígena Dourados, onde está se realizando esta Assembléia.


 


Já há vinte quilômetros daqui, no Passo Piraju, mais um movimento de violência e intimidação contra um grupo indígena que tem mais de 10% de sua população presa, desde o início de abril, quando de um conflito na área em que morreram dois policiais.


 


Quando do levantamento da realidade vivenciada nas diversas aldeias e pelos povos aqui presentes foi denunciada a falta de agilidade do governo em resolver os graves problemas das terras do povo Kaiowá Guarani. A Funai diz que esse povo é prioridade para a demarcação das terras. Então perguntam por que não estão sendo enviados grupos de trabalho que realmente comecem a resolver os problemas com a identificação e garantia das dezenas de tekoha que precisam ser reconhecidos.


 


Documentos


 


Violência no Passo Piraju – Os participantes da Assembléia pediram, através de documento assinados por todos, providências pelas violências que estão sendo cometidas contra a comunidade como foi na noite do início da Aty Guasu, no dia 23 de novembro.


 


Outro documento foi feito pedindo solução de problemas da terra, já que não se destinam recursos para indenizar as benfeitorias, como no caso do Nhanderu Marangatu, Potrero Guassu e outros. O documento denuncia um jogo em que se procura jogar uns contra os outros, quando a solução é o governo destinar realmente mais recursos para resolver os problemas, especialmente a demarcação das terras e retirada dos invasores.


 


Educação e Saúde – é preciso avançar


 


Muito se debateu a realidade da educação escolar nas aldeias. Em geral, se constatou que teve alguns avanços, onde os professores e as comunidades têm se unido para exigir dos governos políticas públicas diferenciadas e de qualidade. Porém, também foram denunciadas várias situações de precariedade e mesmo de desassistência em várias comunidades.


 


O Procurador da República, Dr. Charles Pessoa, foi enfático ao denunciar a negativa de algumas prefeituras e órgãos, de negar assistência aos índios em áreas “em litígio”. Ele considerou isso uma desculpa improcedente e que os índios têm o direito a exigir atendimento esteja onde estiverem e os órgãos públicos são obrigados a atender pois se trata de um direito constitucional dos povos indígenas.


 


Intercâmbio e solidariedade entre povos do Estado de Tocantins e Mato Grosso do Sul


 


Estão presentes nesta Aty Guasu mais de 30 indígenas dos povos, Apinajé, Krahô, Apinajé, Karajá/Javaé e Krahô-Kanela. Eles vieram conhecer a realidade dos povos daqui e trazer a eles a solidariedade. Após visitarem várias aldeias Kaiowá Guarani, estão muito impressionados pelo sofrimento e luta desses seus parentes, e estão se propondo a apoiar a luta de todas as formas possíveis. Ao mesmo tempo vão sair daqui convencidos da importância de valorizar e zelar mais pelo que tem, especialmente a terra e os recursos naturais. “Aqui está tudo arrasado. Cadê a floresta, as árvores, os passarinhos, a água limpa dos rios, a terra boa para viver feliz?” Perguntaram as lideranças nas avaliações feitas. Ao mesmo tempo, ficaram indignados com a situação de fome, dependência e exploração a que estão submetidos os índios daqui.


 


Também ficaram impressionados pela situação de violências e ameaças a que os indígenas daqui estão submetidos. Foram narrados vários casos de lideranças ameaçadas de morte e a forte presença de jagunços em algumas áreas.


 


Retornam às suas terras muito enriquecidos pelo que viram e conheceram, fazem o convite aos Kaiowá Guarani para que os visitem também, e estão solidários com seus irmãos, denunciando a violência, fome, falta de terra e prometem apoiá-los nestas lutas.


 


Dourados (MS), 25 de novembro de 2006.


 


Egon Dionício Heck


Cimi Regional Mato Grosso do Sul


 

Fonte: Cimi - Regional Mato Grosso do Sul
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