Caso Vicente Cañas: Indígenas que ajudaram a identificar réu são ouvidos
No julgamento sobre o assassinato de Vicente Cañas, seguem sendo realizados os depoimentos das testemunhas de defesa. Na manhã desta sexta-feira, 27, foi ouvido Paulo Tompeba, do povo Rikbaktsa e, após o almoço, foi interrogado outro Rikbaktsa, Adalberto Pito. Ambos são testemunhas centrais no processo, porque foram eles que ouviram relatos de não-índios que disseram ter participado do crime.
Os depoimentos têm durado mais de quatro horas. O julgamento tornou-se mais tenso desde a tarde de ontem (quinta-feira), quando foi ouvida a testemunha Sebastião Carlos Moreira, missionário do Cimi. Sebastião estava visivelmente nervoso, não conseguiu lembrar-se de alguns detalhes e, ao ser questionado por uma jurada sobre sua tensão, admitiu estar temeroso por causa de ameaças, ligadas não apenas a este caso, mas à atuação do Cimi em relação à luta pelos direitos indígenas.
A defesa do acusado Ronaldo Antônio Osmar tem feito um trabalho minucioso de checar datas de documentos, locais de assinaturas e pessoas presentes em cada circunstância. Eles têm a seu favor o longo tempo passado desde o assassinato e desde os depoimentos iniciais.
A defesa tem conseguido apontar diferenças nas lembranças das testemunhas. Entre elas está, por exemplo, o local de gravação da fita com depoimento dos indígenas, que é uma das provas principais da acusação. Todas as testemunhas concordaram que se tratava de uma reunião feita na Aldeia Primavera, do povo Rikbatsa. Mas houve versões distintas sobre se a reunião foi feita sob uma mangueira ou dentro de uma casa, por exemplo.
As diferenças culturais e lingüísticas foram questões sensíveis nos últimos dois depoimentos. Perguntas sobre tempo geraram respostas confusas dos indígenas, que na região têm pouco tempo de contato com a sociedade ocidental. Os contatos com os povos Rikbakta e Enawenê-Nawê datam das décadas de 1960 e finais de 1970, respectivamente.
A inquirição da defesa a Adalberto Pito, do povo Rikbaktsa, começou com o advogado Dr. Waldir Caldas apresentando-se e dizendo o seu nome e o de seus pais. Depois de diversas outras perguntas, ele passou a palavra a seu colega, Dr. Zoroastro Teixeira. O segundo advogado perguntou, então, à testemunha, qual era o nome do outro advogado e qual era o nome dos pais deles, “já que, como disse o antropólogo ontem, a testemunha faz parte de uma cultura oral”. O juiz indeferiu a pergunta, argumentando que não se tratava de um teste de memória e que as perguntas teriam que estar relacionadas ao processo. A defesa justificou que as perguntas eram importantes porque, no documento assinado pelos indígenas, havia o nome do pai e da mãe de Martinez Abadio da Silva, acusado que não irá a júri por ter mais de 70 anos. Eles tentavam provar a veracidade da participação do indígena na elaboração do documento. O juiz determinou, então, que a pergunta a ser feita a Adalberto Rikbaktsa teria que ser sobre o nome dos pais do acusado. Na mesma hora, Adalberto Rikbaktsa respondeu. E acertou os nomes.
O depoimento de Adalberto Rikbaktsa terminará nesta sexta-feira. O julgamento segue amanhã, sábado, 28. Dependerá de decisão do juiz se começarão a ser ouvidas hoje as testemunhas de acusação.
Cuiabá (MT), 27 de outubro de 2006.
Priscila D. de Carvalho
Cimi – Assessoria de Comunicação
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