Vicente que vi e Visita Derradeira
Vicente, Kiwi
Tua morte não foi em vão
Tua memória nos acompanha,
Na vida dos Enawenê-Nawê,
No Centro de formação
E luta do Cimi,
Na mobilização dos povos,
Na construção
De um mundo mais justo!
Chega de impunidade,
Basta de duas medidas,
Depois de 19 anos,
É chegada a hora
Da justiça e punição
Pela barbárie cometida,
Tiraram tua vida,
Tentando calar tua voz,
Teus sonhos e utopia,
De ver clarear novo dia
Solidário e plural,
Onde todos possam viver
Na igualdade e dignidade!
O Vicente que vi,
Estirado ao lado do seu barraco,
Com belo colar Enawenê
No pescoço
E um buraco no peito,
Preservado pela natureza,
Depois do brutal assassinato,
Há mais de 40 dias,
Foi uma imagem chocante,
Que levou Tomás ao pranto,
E uma revolta incontida,
Convertido em luta por justiça!
Por tantos anos
Os assassinos e os mandantes
Apostaram na impunidade,
Tua cabeça rolou por esse país,
Nas mãos de estranhos e peritos
Sem conseguir sensibilizar
Os responsáveis pela justiça!
Enquanto isso, em Dourados,
Nove Kaiowá Guarani,
Presos há mais de meio ano,
Acusados da morte
De dois policiais,
Vêem o processo acusatório
Correndo com tanta presteza
Que já se começa prever
Julgamento ainda esse ano!
Os assassinos de Marçal
Continuam impunes,
Depois de depois de 28 anos.
Igualmente os matadores
De Dorival e Dorvalino,
Contam a seu favor,
A lentidão da justiça,
Enquanto gozam de liberdade!
Kiwi, nos acompanhe
Na luta de cada dia,
Enquanto atentos acompanhamos,
O julgamento dos teus assassinos,
Clamando por justiça,
Que embora tardia,
Será muito importante,
No combate à impunidade!
Campo Grande (MS), 19 de outubro de 2006.
Visita Derradeira
(escrito em junho de 1987, um mês após o assassinato de Vicente Canãs)
Sol nascente,
Cortando as águas do rio Papagaio.
Manhã de ansiedade.
Ao encontro do companheiro Vicente,
íamos seus amigos.
Jarika, o novo, kiwuxi, Myky,
Tião e Egon, do Cimi regional e nacional.
Vencendo as águas contrárias
do Yuruena,
pensamento e esperança
já indo além.
Finalmente,
a chegada ao porto.
A estranheza.
A grito.
Respondido pelo silêncio!
O encontro,
a estupefação.
o pranto,
ante o cadáver mumificado ao lado do barraco.
Era dia 16 de maio.
A vida matada do companheiro
calou fundo.
Ganhou as matas,
os rios, as estradas,
O mundo.
Semente!