14/07/2006

Romaria homenageia mártires da causa indígena

 


A Romaria dos Mártires da Caminhada reunirá centenas de pessoas de todo o país e de outras partes do mundo entre os dias 15 e 16 de julho em Ribeirão Cascalheira, Mato Grosso, junto ao Santuário dos Mártires da Caminhada, localizado na Prelazia de São Félix do Araguaia. Em 2006, a Romaria, que ocorre a cada cinco anos, lembra os 30 anos do assassinato do Pe. João Bosco Penido Burnier.


 


Ponto central da Romaria, o Santuário é a memória daqueles que viveram e que deram sua vida lutando pelo direito à Vida, à Justiça e à Liberdade. Entre os mártires, estão dezenas de indígenas e de missionários, assassinados na luta. (Apresentamos abaixo uma pequena lista dos mártires ligados à causa indígena).


 


 “A Romaria tem grande significado por trazer a memória dos mártires para alimentar as lutas e as esperanças. São pessoas que deram a vida pela causa do Reino”, avalia o secretário-executivo do Cimi, Éden Magalhães. O Conselho Indigenista Missionário estará presente na Romaria, junto aos familiares de mártires indígenas como Xicão Xikuru e Galdino Pataxó Hã-Hã-Hãe.


 


A Prelazia de São Félix do Araguaia, onde atuou por três décadas Dom Pedro Casaldáliga, tem significado especial na construção da visão missionária do Cimi, baseada na inculturação do missionário aos povos indígenas, no apoio à luta pelo direito dos povos à sua terra e pelo direito de terem seu modo de vida respeitado. Na Prelazia de São Félix, a atuação de Dom Pedro ajudou a criar uma Igreja comprometida com a luta do povo indígena, caboclo e ribeirinho, na época em que o Mato Grosso começava a ser invadido pelo latifúndio incentivado pela ideologia desenvolvimentista e integracionista.


 


A Romaria


Santuário e Romaria dos Mártires são únicos no mundo, tanto por seu caráter ecumênico quanto pela proposta que apresentam. Em nenhum outro lugar do mundo existe tal tipo de santuário em que se cultue a memória daqueles que tombaram defendendo a vida. Mais do que cultuar pessoas, o Santuário e a Romaria lembram e celebram a causa. A grande causa da Justiça e da Liberdade, independentemente de religião. São lembrados bispos, padres, religiosos e religiosas, leigos e leigas católicos, mas também pessoas de outras igrejas cristãs, e das religiões judaica, indígenas e africanas.


 


Romarias onde fé e vida se mesclam


 As romarias da terra que acontecem também neste final de semana em Bom Jesus da Lapa (BA) e em Zé Doca, (MA) e a Romaria dos Mártires têm um cunho profético de denúncia da realidade de opressão vivida pelos trabalhadores e trabalhadoras do campo e das injustiças que contra eles se cometem. Elas buscam através da fé e do elemento religioso a transformação da sociedade.


 


 


MÁRTIRES DA CAUSA INDÍGENA


 


INDÍGENAS


Ângelo Pankararé. Ângelo Pereira Xavier foi assassinado em 26 de dezembro de 1979, em Brejo dos Burgos, Bahia. Lutava contra a tutela ilegal das terras indígenas, através dos órgãos do estado da Bahia (Interba), contra a invasão dos latifundiários e contra a repressão policial às manifestações culturais do povo Pankararé.


 


Ângelo Kretã – Kaingang. Morreu em 29 de janeiro de 1980 num acidente de carro mal esclarecido, com fortes suspeitas de emboscada, em Mangueirinha, Paraná. Foi o primeiro vereador índio do sul do Brasil, eleito pelo extinto MDB na Câmara Municipal de Mangueirinha. A defesa da terra levou Kretã e seu povo a uma guerra permanente contra os invasores. A meta mais importante era a expulsão do grupo econômico Slaviero, que ocupava 8.975 hectares da área indígena.


 


Marçal Tupã-iGuarani. Nasceu em 1924 e foi assassinado na aldeia de Campestre, município de Antonio João, Mato Grosso do Sul, em 25 de novembro de 1983, aos 59 anos. Marçal, cinco dias antes de ser morto, havia recusado uma oferta de dinheiro para facilitar a retirada dos índios Kaiowá da área Pirakuá. Em julho de 1980 leu uma mensagem para o Papa João Paulo II, em sua primeira visita ao Brasil, no Amazonas. Na carta falava da tristeza “…pela morte de líderes assassinados friamente por aqueles que tomam o nosso chão.”


 


Simão Bororo. Foi assassinado no dia 15 de julho de 1976. Entrou na frente de um tiro que se dirigia ao Pe. Rodolfo Lunkenbein. Defendiam a comunidade indígena Bororo no processo de demarcação de seu território.


  


Arnaldo Apurinã. Foi assassinado junto com a Irmã Cleusa, em 28 de abril de 1985.  Foi morta também Maria Apurinã mulher do tuxaua Agostinho, da aldeia do Japiim.  O assassino, o índio apurinã Raimundo Podivem, tinha ligações com os interesses econômicos de Lábrea/AM, serviu na Polícia Militar do Amazonas e fez treinamento antiguerrilha em Manaus.


 


Galdino Jesus dos Santos. Liderança do povo Pataxó  Hã-Hã-Hãe, nasceu em 1952, na Bahia. Foi assassinado por jovens de classe média em abril de 1997, enquanto dormia num banco de uma parada de ônibus em Brasília, onde se encontrava juntamente com outros representantes de seu povo para tratar de assuntos relacionados à demarcação de suas terras.


 


Xicão Xukuru. Cacique do povo Xukuru e coordenador da Articulação dos Povos Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (Apoinme), foi assassinado em maio de 1998 em um crime encomendado por fazendeiros do município de Pesqueira, Pernambuco. Nasceu em Cana Brava, Pernambuco, em 1949.


 


Marcos Veron. Líder do povo Guarani-Kaiowá, foi assassinado em janeiro de 2003 por jagunços e policiais, durante a madrugada, em um ataque covarde contra a aldeia Taquara, no município de Jutí, Mato Grosso do Sul.


 


Aldo da Silva Mota – Macuxi. Teve seu corpo encontrado em uma cova rasa, sete dias depois de haver desaparecido, em janeiro de 2003. O crime ocorreu em razão da luta pela demarcação da terra indígena Raposa Serra do Sol, Roraima. O acusado é um fazendeiro invasor da terra.


 


Josenilson José dos Santos – Atikum e José Ademilson Barbosa da Silva – Xukuru. Foram assassinados em 7 de fevereiro de 2003, numa emboscada na rodovia estadual que liga a cidade de Pesqueira à vila de Cimbres, Pernambuco.


 


João Araújo Guajajara. Cacique da aldeia Kamihaw assassinado em maio de 2005 em conseqüência da disputa pela posse da terra indígena Bacurizinho, no município de Grajaú, Maranhão.


 


 Dorival Benitez – Guarani-Kaiowá. Foi morto a tiros em conflito com fazendeiros invasores da terra indígena Sombrerito, município de Sete Quedas, Mato Grosso do Sul.


 


Adenilson dos Santos Truká, o Dena, e seu filho Jorge dos Santos. Foram mortos a tiros por policiais militares que, à paisana e sem se identificar, entraram em uma festa onde estavam reunidos cerca de 400 indígenas, na Ilha de Assunção, território Truká, em Pernambuco. As duas vítimas morreram sem que a polícia permitisse que os indígenas presentes na festa lhes prestassem socorro. Jorge tinha 17 anos na ocasião.


 


Dorvalino Rocha – Guarani-Kaiowá. Foi assassinado a tiros no dia 24 de dezembro de 2005 por seguranças da fazenda Fronteira, no município de Antonio João, Mato Grosso do Sul. Dorvalino encontrava-se acampado às margens da rodovia MS-384, juntamente com todos os outros indígenas que haviam sido expulsos, por decisão judicial, da terra indígena Ñande Ru Marangatu 15 dias antes do assassinato.


 


 


MISSIONÁRIOS


 


Pe. Rodolfo Lunkenbein, SDB – tinha 37 anos, diretor da Missão Salesiana de Meruri, Mato Grosso. Nasceu no dia 1º de abril de 1939, em Döringsadt, Alemanha. Veio para o Brasil em 1958. Foi assassinado no dia 15 de julho de 1976, por defender a comunidade indígena Bororo no processo de demarcação de seu território.


 


Pe. João Bosco Penido Burnier, jesuíta – tinha 60 anos, Missionário da Prelazia de Diamantino-MT. Nasceu no dia 11 de junho de 1916, em Juiz de Fora, Minas Gerais. Foi assassinado no dia 12 de outubro de 1976, em Ribeirão Bonito, Mato Grosso, ao tentar defender duas mulheres presas na delegacia local.


 


Pe.Vicente Cañas – Kiwxi para os Enawenê-Nawê – tinha 48 anos. Nasceu em Albacete, Espanha, no dia 22 de outubro de 1939 e veio para o Brasil em 1965. Foi assassinado em abril de 1987, num barraco à beira no rio Juruena, Mato Grosso, por defender os direitos dos índios à sua terra, constantemente invadida por madeireiros e latifundiários. Trabalhou inicialmente com os índios “beiço de pau” após uma terrível epidemia que assolou esse grupo. Depois com os Paresi, Miky e desde 1977 assistia os  Enawenê-Nawê, vivendo como eles.


 


Irmã Cleusa Rody Coelho – tinha 52 anos. Nasceu em Cachoeiro do Itapemirim, Espírito Santo, a 12 de novembro de 1933. Assassinada em 28 de abril de 1985, no rio Paciá, Prelazia de Lábrea, Amazonas, pelo índio Apurinã, Raimundo Podivem. Integrava a Congregação das Missionárias Agostinianas Recoletas e era membro do Cimi. Trabalhava entre os Apurinã e sua morte está ligada à história do extrativismo da castanha no Purus e aos interesses econômicos de Lábrea/AM


 


Pe. Ezequiel Ramin – tinha 32 anos. Nasceu na Itália, em 1953. Missionário da diocese de Ji-Paraná, Rondônia. Assassinado em 24 de julho de 1985, na fazenda Catuva, município de Aripuanã, por jagunços dos fazendeiros da região.

Membro da Congregação dos Combonianos, veio ao Brasil em meados de 1983. Assumiu a causa dos trabalhadores sem-terra e dos índios. Ganhou a confiança dos Suruí que iam procurá-lo para expor os problemas da aldeia. 

Fonte: Cimi
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