30/06/2006

Criança Guarani morre em Santa Catarina

Na manhã desta sexta-feira, 30, saímos de casa com a intenção de visitar os índios Guarani que residem provisoriamente na Terra Indígena Toldo Chimbangue, no interior do município de Chapecó. Pouco antes de chegarmos, encontramos o Guarani Maximino Moraes. Ele nos informou que uma criança havia morrido e estava sendo velada na aldeia. Ficamos tristes. Seguimos viagem.


 


Ao chegarmos, nos deparamos com um ambiente triste, angustiante, dramático. Com a temperatura beirando os zero graus centígrados, crianças maltrapilhas e descalças, jovens, adultos e idosos tremiam encolhidos em meio à densa neblina. Todos em volta de um pequeno caixão que guardava uma meiga criancinha de um ano e cinco meses, Fernando Siqueira. Morto.


 


Clementino Barbosa, com a sabedoria proporcionada por seus 94 anos, fez a “reza” Guarani em homenagem ao pequeno Fernando. Pôs as mãos sobre a sua cabeça e, após um instante de silêncio, disse aos demais guarani: “ele se foi porque não quis ficar neste lugar”. Concluída a oração, Clementino chorou com o desespero que a situação exigia. Todos choramos com ele.


 


Clinicamente, a morte de Fernando foi causada por “parada cárdio-respiratória advinda de broncopneumonia”. A causa de sua morte, no entanto, vai muito além disso. 


 


Os Guarani reivindicam a regularização de sua terra tradicional há oito anos. No ano 2000, a Funai criou um Grupo de Trabalho que identificou e delimitou a Terra Indígena Guarani do Araça’í, localizada no interior dos municípios de Saudades e Cunha Porã, no oeste catarinense. O relatório antropológico somente foi publicado em outubro de 2005, mais de cinco anos após a constituição do Grupo.


 


Atualmente, o processo encontra-se na Diretoria de Assuntos Fundiários da Funai para “análise das contestações” apresentadas ao relatório. Está nesta situação desde meados de janeiro de 2006. A lei que regulamenta o processo administrativo em curso determina prazo máximo de sessenta dias para emissão de parecer sobre as contestações. A Funai tem se negado a responder aos constantes pedidos que os Guarani têm feito para que o processo seja agilizado.


 


A tristeza mistura-se com a indignação e a revolta. Mais uma criança morta. Vida ceifada prematura e injustamente. Mais um guarani morto no exílio, distante de sua terra. Necessidade de fazer alguma coisa. O quê? Vontade de gritar “basta de negligência” com a vida e o direito das pessoas. Limitados que somos, ao menos relatamos o sentimento e a realidade. Acima de tudo, proclamamos a verdadeira esperança. Não pode ter sido por nada, a morte de Fernando.


 


Chapecó, SC, 30 de junho de 2006


Cleber César Buzatto, Ivan César Cima e Marline Dassoler Buzatto


Conselho Indigenista Missionário – Regional Sul – Equipe Chapecó.


 

Fonte: Cimi Regional Sul
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