Dom Cappio, CPT e Comitê da Bacia cobram do Planalto agenda de debates sobre São Francisco
Foi protocolado no Palácio do Planalto na tarde de hoje, 23 de fevereiro, ofício endereçado ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, solicitando uma proposta de agenda para o debate público sobre o projeto de transposição do rio São Francisco. Em 15 de dezembro de 2005, o presidente da República recebeu em audiência Dom Luiz Flavio Cappio (bispo de Barra, BA), Dom Tomás Balduíno (presidente da CPT) e Dra. Luciana Khoury (coordenadora das Promotorias de Justiça do São Francisco, MP/BA). De acordo com os participantes da reunião, encaminhou-se que o Governo Federal indicaria, logo após o encontro, uma agenda que contemplasse a discussão sobre o tema nos âmbitos técnico, jurídico e político.
“Até a presente data, não foi recebida qualquer proposta quanto à agenda a ser pactuada, razão pela qual dirigimo-nos a Vossa Excelência para reiterar o propósito desse coletivo de que seja efetivamente realizado amplo e verdadeiro debate”, afirmam, no ofício, D. Cappio, a representante do Ministério Público, Rubens Siqueira, da CPT, e os representantes do Fórum Permanente de Defesa do Rio São Francisco e do Comitê da Bacia do Rio. “Aguardamos posicionamento do Governo Federal quanto à proposta de agenda”, escreveram.
Dom Luiz Cappio reafirma a disponibilidade para o diálogo. “Queremos construir com o governo a metodologia. É necessário que haja discussões envolvendo a comunidade cientifica, para fortalecer o debate sobre quais são as alternativas para garantir água para a população do semi-árido. As populações tradicionais, representantes da bacia do São Francisco e dos locais que, supostamente, serão beneficiários da transposição, e organizações que atuam no sem-árido precisam estar presentes”, afirma o bispo, que realizou uma greve de fome questionando o projeto de transposição e defendendo a revitalização do São Francisco, em setembro de 2005.
Na carta que foi entregue hoje, o grupo ressalta que “o debate precisa acontecer com o enfoque da garantia à água e ao desenvolvimento às populações do semi-árido e, nesse contexto, o Projeto de Transposição deve ser discutido, sem que seja apenas enfrentado este último tema em detrimento do primeiro”.
Para a promotora Dra. Luciana Khoury não houve mudanças no quadro jurídico desde dezembro, quando houve a reunião. As liminares judiciais concedidas na Bahia, em ações civis públicas, continuam válidas, o que impede o início da obra, suspende os efeitos da licença prévia concedida pelo Ibama e impede a realização de licitações. A decisão em primeira instância foi mantida pelo presidente do TRF e não houve decisão contrária do Supremo Tribunal Federal.
Veja aqui a íntegra do documento encaminhado ao presidente da República:
Salvador, 10 de fevereiro de 2006.
Exmo. Sr.
LUIS INÁCIO LULA DA SILVA
MD. Presidente da República
Cumprimentando-o cordialmente, servimo-nos do presente para expor e requerer a Vossa Excelência o que se segue:
No último dia 15 de dezembro de 2006, às 17:30 horas, houve Audiência com presença de Vossa Excelência, do Ministro Jaques Wagner e do Ministro Ciro Gomes, representando o Governo Federal recepcionando o Dom Frei Luiz Flavio Cappio, que se fez acompanhar pelo Presidente Nacional da CPT Dom Tomás Balduíno, pelo Bispo de Propriá Dom Mario Sivieri, pelo Coordenador do Projeto São Francisco da CPT Rubens Siqueira, pela Promotora de Justiça da Bahia e Coordenadora das Promotorias de Justiça do São Francisco Luciana Khoury, pela representante da Coordenação Nacional da ASA Leninha, pelo Jornalista Henrique Cortez e pelo membro do Fórum Permanente de Defesa do São Francisco Adriano Martins
Naquela oportunidade, foram apresentados três documentos: o primeiro contendo as razões pelas quais somos contrários ao Projeto de Transposição, o segundo demonstrando a atual situação da bacia do São Francisco e a revitalização que se faz necessária, e um terceiro documento compilando as propostas de debate nacional para uma verdadeira convivência com o semi-árido. Na ocasião restou demonstrado que o que se pretende alcançar é um debate amplo, verdadeiro e participativo, que pretenda buscar alternativas reais de acesso à água e desenvolvimento para toda a população do semi-árido, tanto a dos estados do chamado Nordeste Setentrional quanto os da Bacia, e que o Projeto de Transposição não atenderá aos fins propagandeados pela grande mídia.
Desse modo, ficou demonstrado que nem o Projeto de Transposição foi devidamente discutido com as populações da Bacia, bem como não foi debatido um projeto de alternativas de convivência com o semi-árido que garanta acesso à água e desenvolvimento para as populações que vivem no semi-árido, para que nesse contexto se avalie a necessidade e adequação do referido Projeto de Transposição.
Assim, na oportunidade daquele encontro foi garantido por Vossa Excelência que será viabilizado uma série de debates, como exige inclusive a complexidade do tema, com os diversos enfoques, com discussões técnicas, jurídicas, políticas e sociais, contemplando as populações diretamente afetadas. Ressalte-se que o debate necessariamente precisa acontecer com o enfoque da garantia à água e ao desenvolvimento às populações do semi-árido e, nesse contexto, o Projeto de Transposição deve ser discutido, sem que seja apenas enfrentado este último tema em detrimento do primeiro.
Ocorre que, até a presente data, não foi recebida qualquer proposta quanto à agenda a ser pactuada, razão pela qual dirigimo-nos a Vossa Excelência para reiterar o propósito desse coletivo de que seja efetivamente realizado amplo e verdadeiro debate sobre os temas acima referidos. Aguardamos posicionamento do Governo Federal quanto à proposta de agenda.
No ensejo, renovamos protestos de consideração e apreço.
Atenciosamente,
DOM FREI LUIZ FLAVIO CAPPIO
Bispo Diocesano de Barra – Bahia
RUBENS SIQUEIRA
Representante da CPT
LUCIANA ESPINHEIRA DA COSTA KHOURY
Ministério Público
YVONILDES MEDEIROS
Representante do Comitê da Bacia do São Francisco
LUCIDALVA BARBOSA
Representante do Fórum Permanente de Defesa do São Francisco