Informe nº 702: Mobilizações pela saúde repetem-se em todo o país
MOBILIZAÇÕES PELA SAÚDE REPETEM-SE EM TODO O PAÍS
Na manhã de 14 de fevereiro, cerca de 500 indígenas bloquearam, pela segunda vez em 15 dias, a Ferrovia Carajás, pertencente à Companhia Vale do Rio Doce, no Maranhão. O protesto teve o objetivo de pressionar pela melhoria no atendimento à saúde dos povos e por mudanças políticas na administração da saúde. As reivindicações dos indígenas foram atendidas e, na tarde do dia 15, a Fundação Nacional de Saúde (Funasa) anunciou a liberação de R$ 52 milhões para uso emergencial em saúde indígena, em 21 dos 34 Distritos Sanitários Especiais de Saúde Indígena (DSEIs). Deste total, 620 mil são destinados ao Maranhão para compra de medicamentos, capacitação de pessoal e equipamentos médicos.
As mobilizações pela melhoria do atendimento à saúde seguem acontecendo em todo o país. Na última semana, os Tupinambá de Serra do Padeiro, na Bahia, ocuparam a Prefeitura da cidade de Una para conseguir atendimento constante, medicamentos e o pagamento dos agentes de saúde e da equipe do Programa de Saúde da Família Indígenas (PSFI). Um dia após a ocupação, foi liberado o pagamento de R$ 19,2 mil, para cinco agentes. O dinheiro estava nos cofres da prefeitura e, neste caso, as dificuldades de atendimento são ligadas a questões políticas municipais. “Já tivemos no mínimo três contatos com o prefeito Zé Pretinho, de Una. A última foi dia 1º de fevereiro. O prefeito alega que não tem interesse em prestar assistência aos índios, e a Prefeitura [do município de] Buerarema também se nega a prestar assistência”, afirmou a liderança Magno Tupinambá durante a ocupação. Havia um impasse pelo desinteresse das prefeituras em ficar com a responsabilidade do atendimento aos indígenas. Enquanto isso, o dinheiro fica preso nos cofres do município de Una e os indígenas seguem sem atendimento médico. A mobilização conseguiu obter o compromisso da Funasa de realizar uma reunião com as prefeituras de municípios que atuam na saúde indígena para debater o atendimento em todo o sul da Bahia.
O tema continua em pauta também no centro do país, no estado do Tocantins, onde já houve 17 mortes de crianças que apresentaram sintomas banais, como diarréia, febre, gripe e tosse e outras 19 crianças continuam internadas. Da verba anunciada pela Funasa, R$ 410 mil serão destinados a este estado.
Com os protestos no Maranhão, os indígenas do estado conseguiram que fossem atendidas as reivindicações de autonomia política e financeira do distrito de saúde em relação à Funasa. Esta será a primeira experiência de atuação administrativa e financeira descentralizada no país. Eles conseguiram também a mudança do coordenador regional da Funasa no Estado. O coordenador era acusado de desrespeitar as definições do Conselho Distrital de Saúde Indígena que, em teoria, define as prioridades da política de atendimento à saúde. O descontentamento dos indígenas também é causado pelos desencontros entre as solicitações dos povos e as decisões sobre a execução do atendimento. A falta de técnicos, medicamentos e o não deslocamento dos doentes mais graves para hospitais têm caracterizado o atendimento oferecido pela Funasa no Maranhão.
MINISTRO ATENDE AOS INTERESSES DO GOVERNO DE SANTA CATARINA E NÃO DECLARA TERRA INDÍGENA GUARANI DO MORRO DOS CAVALOS
Segue carta divulgada pela Comunidade Guarani do Morro dos Cavalos na manhã de hoje, dia 16:
Passados 27 meses do prazo legal para a publicação da portaria do Ministério da Justiça que declara os limites de nossa terra, denominada Morro dos Cavalos, em Santa Catarina, o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, devolveu o processo à Funai para esfriar a pressão que vinha sofrendo pela demarcação e continuar atendendo ao governo deste estado e aos ruralistas catarinenses.
Agora, por causa dessa decisão, a Funai terá que nomear outro antropólogo para responder as demandas do ministro. Esse trabalho poderá demorar até um ano. Enquanto a terra não está demarcada, nossa comunidade ocupa cerca de 3 hectares num morro íngrime ao lado da BR-101, uma das rodovias mais perigosas do país. Sem condições de produzir alimentos, vivemos de cestas básicas doadas por voluntários e do artesanato.
Segundo informações do diretor de assuntos fundiários da Funai, Artur Nobre Mendes, a atitude de Thomaz Bastos foi baseada em uma decisão anterior do Tribunal de Contas da União, que solicitava ao Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transporte (DNIT) novos estudos ambientais e sociais para o projeto de duplicação da BR-101, que corta a terra indígena. No entanto, a decisão do Tribunal, publicada no Diário Oficial da União em 12 de maio de 2005, refere-se somente à questão dos custos da duplicação, e não à terra Guarani. Entendemos que a devolução do relatório foi apenas uma desculpa para se livrar da pressão e ganhar mais tempo, já que se trata de ano eleitoral e uma assinatura poderia desagradar possíveis aliados nas eleições.
Desde que o Governo Federal criou uma Comissão Especial em âmbito estadual, que avalia as demarcações de terras indígenas em Santa Catarina, em setembro de 2004, nenhuma terra foi demarcada no estado. A comissão é composta pelos setores contrários à demarcação da terra indígena, como o governo do estado e representantes do agronegócio.
Devido a acordos feitos com o Governo do Estado, amplamente divulgados em jornais de circulação estadual, o Ministro comprometeu-se a não assinar as portarias que declaram os limites das terras indígenas no estado e criou a Comissão Especial para decidir sobre as demarcações, atitude totalmente inconstitucional e ilegítima, porque a demarcação de uma terra indígena é de competência Federal.
Em agosto de 2005, 22 meses após o vencimento do prazo legal, nossa Comunidade iniciou uma campanha de pressão pela demarcação da terra. Mais de 10 mil cartas, entre cartões postais e e-mails foram enviados ao Ministério da Justiça. Em Dezembro nosso cacique Arthur Benite esteve em Brasília no Ministério da Justiça conversando com o secretário especial do Ministro, que se comprometeu a agilizar o processo. No entanto, para surpresa de todos, o processo foi devolvido a Funai. Nossa comunidade decidiu continuar a campanha de pressão ao ministro.
Mais informações sobre a Campanha pela Demarcação: www.terraguarani.org.br.
Brasília, 16 de fevereiro de 2006.
Cimi – Conselho Indigenista Missionário