Sepé Tiaraju reivindica antes de tudo e sobretudo, a terra
Próximo às celebrações dos 250 anos da morte de Sepé Tiaraju e dos 1.500 guerreiros Guarani que resistiram em suas Missões contra os exércitos de Espanha e Portugal, Dom Pedro Casaldáliga, ex-bispo da Prelazia de São Félix do Araguaia, militante das causas populares, um dos fundadores do Conselho Indigenista Missionário e autor da “Missa da Terra Sem Males” — inspirada na epopéia Guarani –, fala em entrevista exclusiva sobre o significado de Sepé para os movimentos sociais e a necessidade de pensar formas de luta continental contra o império.
O que significa Sepé Tiaraju para a luta dos movimentos sociais no Brasil?
Em primeiro lugar Sepé Tiaraju é um dos patriarcas, líder máximo da causa indígena do Brasil e de toda a Ameríndia. Segundo lugar, Sepé Tiaraju reivindica, antes de tudo e sobretudo, a terra… Mártir da terra indígena, mártir da terra do povo: “esta terra tem dono” e o dono desta terra é o povo. Uma terra partilhada e respeitada ecologicamente, inclusive. Em terceiro lugar, Sepé Tiaraju evocado o direito da terra como dom de Deus. Foi Deus quem nos a deu. Em quarto lugar, a luta de Sepé Tiaraju é uma luta contra o império. Contra os impérios de Portugal e Espanha, evidentemente contra todos os impérios. Causa e motivações sumamente e totalmente atuais: a continentalidade das causas. Essa integração verdadeira da Ameríndia, da Abya Yala, da Pátria Grande da Nossa América.
Então a luta de Sepé Tiaraju é a mesma dos movimentos sociais hoje?
A luta pela terra contra o latifúndio, contra o agronegócio exclusivista e predador, é a luta contra o neo-imperialismo, que hoje é neoliberalismo, que é império econômico, cultural, militar, social e político. Assim, o aniversário de um jubileu é de suma atualidade; que São Sepé Tiaraju ponha na testa de cada um de nós a sua estrela de consciência luminosa e em nossos corações o seu fogo a sua esperança a sua militância.
Paralela às celebrações de Sepé Tiaraju temos o encontro Continental Guarani, com representantes da Bolívia, Argentina, Paraguai, Uruguai e Brasil, um momento histórico para este povo que encontra as mesmas dificuldades em países diferentes. O que podemos esperar deste encontro?
Logo depois de um ano com tanta violência contra os povos indígenas, o martírio de Sepé. O que podemos aprender com estas mortes e com o martírio?
Nós entendemos o martírio em seu aspecto mais positivo. As últimas consígnias da Romaria dos Mártires, que realizamos em nossa Prelazia, tem sido: vida pela vida; vida pelo reino; vidas pelo reino da vida. Por que são vidas doadas não são mortes simplesmente morridas ou matadas. São mortes vividas. São aqueles gestos extremos como o de Jesus: de doar a vida pela vida; pelas pessoas que amamos. Eu insisto também que esquecer o martírio é se entregar ao futuro. Somos herdeiros do sangue mártir. Herdeiros de testemunhos ricos que devemos fazer frutificar com nossa luta. Com nossa união. Com a nossa esperança.
Por Cristiano Navarro (Cimi)