Funasa abandona a saúde indígena no Tocantins
Em menos de 15 dias, por desassistência à saúde indígena, seis crianças do povo Apinajé, morreram por falta de atendimento médico. Todas elas apresentaram os mesmos sintomas: vômito, diarréia, gripe, febre. Há ainda nas aldeias outras crianças que estão apresentando quadro de desnutrição. Uma liderança do povo Apinajé, morador da aldeia São José, denuncia que ali tem uma pequena farmácia, mas que não há remédios suficientes para atender a demanda da comunidade. Falta dinheiro para pagar as passagens dos indígenas e seus acompanhantes, que necessitam fazer tratamento em outros municípios ou até mesmo em outro estado. Reclama ainda que não há orientação sobre educação em saúde, falta saneamento básico e que estão há mais de sete meses sem receber o atendimento médico nas aldeias.
Em documento denúncia, protocolado no Ministério Público Federal, lideranças Apinajé repreendem a Funasa pelo absurdo da devolução de mais de um milhão de reais destinados à saúde indígena, no Tocantins que foram devolvidos aos cofres públicos em Brasília.
Quanto à “doença misteriosa”, como foi chamada, e que matou em pouco mais de uma semana, seis crianças Apinajé, já afirmávamos antes de qualquer análise de água ou qualquer outro exame, que de “misteriosa” ela não tinha nada. Havia e há sim, o completo abandono da saúde dos povos indígenas no Tocantins e no Brasil. Há incompetência no gerenciamento e destinação dos recursos e na implementação das ações de saúde. Como divulgar melhoria nos indicadores de saúde de uma determinada população e, logo em seguida, crianças desse grupo morrerem por doenças que tem como fator pré-determinante a desnutrição?
Os três veículos destinados para o transporte de doentes das 15 aldeias do povo Apinajé, para o Pólo Base de Atenção à Saúde Indígena ou para unidades de saúde, em busca de atendimento, estão sucateados, impossibilitando um atendimento rápido e eficiente.
As estradas no interior da terra indígena estão em péssimas condições de conservação. A prefeitura de Tocantinópolis e o Dertins se negam em fazer a manutenção das mesmas, assumindo um discurso contra os indígenas e seus aliados. O objetivo claro dos detentores do poder político local, é a implementação dos grandes projetos e asfaltamento de estradas que cortam a área indígena, ou que fazem o entorno da mesma, para outras finalidades e não para atender as necessidades da comunidade.
As indígenas criticam as péssimas condições no atendimento recebido nos hospitais, e das precárias condições dispensadas as mães das crianças internadas. Nas unidades de saúde elas não recebem lençóis para forrar os colchões para deitar os seus filhos, ou mesmo para cobri-los. No Pronto Socorro Infantil, do Hospital Maternidade Dom Orione, em Araguaína, uma das mães, cujo filho se encontrava internado ali, reclamava de muito cansaço, pois havia nove dias que estava acompanhando seu bebê, de apenas 20 dias de nascido. E segundo ela, durante todo este tempo só tinha uma cadeira de fibra para repousar, com seu bebê ao colo, fosse de dia ou de noite, pois aquela unidade de saúde não tinha lençóis para forrar o berço e ela não ia colocar seu filho diretamente sobre o plástico do colchão.
O coordenador Regional da Funasa no Tocantins, Sr. Carlos Patrocínio, durante a 2ª Conferencia Distrital de Saúde Indígena, apresentou dados das ações implementadas na saúde indígena no Estado. Ele afirmou que a saúde indígena no Tocantins é modelo para os outros estados da federação, pois aqui existe um profissional da saúde para cada 26 índios.
A violência praticada na saúde indígena no Estado, é extremamente grave e o que reina é o silêncio e a omissão dos responsáveis pela implementação e pelo controle desta política pública.
Até quando iremos brincar com vidas humanas? A Funasa tem o dever moral e ético de responder pelas mortes destas crianças. Se ela é incapaz de gerenciar a saúde indígena, que assuma publicamente, pois as evidências estão aí para provar isto. Tais acontecimentos só confirmam aquilo que o Cimi já alertava desde 1999, quando a Funasa assumiu a saúde indígena, ou seja, o Governo Federal tem que assumir a gestão e execução das ações de saúde dos povos indígenas.
Palmas (TO), 25 de janeiro de 2006.
Conselho Indigenista Missionário
Regional Goiás/Tocantins