12/01/2006

Informe nº 697: Presidente da Funai assume discurso dos fazendeiros e diz que índios têm “terra demais”

Em matéria da agência de notícias Reuters, o presidente da Funai, Mércio Pereira Gomes, deu declarações questionando o direito dos indígenas às terras que tradicionalmente ocupam. “É terra demais. Até agora, não há limites para suas reivindicações fundiárias, mas estamos chegando a um ponto em que o Supremo Tribunal Federal terá de definir um limite”, disse Gomes.


 


Para o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), causa estranheza que um presidente da Funai reproduza o discurso da imposição de limites para as terras indígenas no país, pois esta é uma das reivindicações antigas dos setores antiindígenas. “Isso revela o atrelamento de Mércio Gomes e do governo Lula ao agronegócio e às antigas oligarquias rurais do país”, afirma Saulo Feitosa, vice-presidente do Cimi. Feitosa lembra que existe no Senado Federal uma proposta de emenda constitucional que propõe limitar a extensão de terras indígenas por estado brasileiro, de autoria do Senador Mozarildo Cavalcanti, que tem histórica atuação contra a demarcação de terras indígenas.


 


Ao defender a atuação da Funai, Gomes afirmou também que “o Brasil deveria ser citado como exemplo para outros países. Retiramos de terras indígenas fazendeiros que estavam ali havia duas gerações. Quem mais faz isso?”, ignorando os direitos originários dos indígenas às terras que tradicionamente ocupam, garantidos pela Constituição Federal de 1988.


 


As declarações de Gomes foram dadas no contexto da repercussão dos dados divulgados pelo Cimi na última quinta-feira, que revelam que 2005 foi o ano com maior número de assassinatos de indígenas na última década, com 38 mortes.


 


“O Cimi sustenta que a lentidão do Estado brasileiro nos processos de reconhecimento e proteção das terras indígenas é causa primeira da violência com a qual os indígenas são obrigados a conviver. Um dos exemplos mais marcantes desta ligação é a situação de confinamento do povo Guarani. Para eles, assim como para muitos outros povos, o discurso de “excesso de terras” não faz sentido”, afirma Saulo Feitosa.


 


Dez mil indígenas do povo Guarani vivem confinados em 3.475 hectares, próximos à cidade de Dourados, Mato Grosso do Sul, nas aldeias Jaguapiru e Bororo. Grande parte dessas pessoas não tem onde plantar e não tem trabalho nas lavouras de soja ou nas fazendas de gado que circundam a área. Fazendas que, em muitos casos, foram criadas sobre terras onde os indígenas viviam. Nesta situação, muitos homens são obrigados a trabalhar em usinas de cana de açúcar, em condições análogas à escravidão, em contato com álcool e prostituição. A falta de perspectivas de vida e o confinamento levam a uma situação de tensão, alcoolismo, alto nível de suicídio e a um ambiente sem dúvida violento. “Não é possível separar esta situação da situação de falta de terras”, afirma Feitosa. 


 


POVO GUARANI REALIZA MANIFESTAÇÃO EM DOURADOS


 


Cerca de 700 Guarani, vindos de 10 aldeias do Mato Grosso do Sul, realizaram ontem, 12, uma manifestação em Dourados, a 221 km de Campo Grande, pelo fim da violência, pela punição dos assassinos de Dorival Benitez, morto durante uma retomada da terra Sombrerito, em 26 de junho de 2005, e de Dorvalino Rocha, de 39 anos, assassinado na véspera de Natal, no local onde os Guarani da terra Nhande Ru Marangatu estão acampados depois de terem sido despejados de sua terra homologada. A outra reivindicação estava ligada à demarcação de terras deste povo no Mato Grosso do Sul.


 


A manifestação começou no início da manhã em uma praça de Dourados. Ali,  encontraram-se indígenas de aldeias distantes que vieram de ônibus e cerca de três centenas de indígenas que vivem nas aldeias Jaguapiru e Bororo, que ficam próximas a Dourados. Depois, a caminhada passou pelo Ministério Público Federal, onde entregou carta ao procurador da República, Dr. Charles Motta Pessoa, agradecendo por sua atuação na defesa dos direitos indígenas. Parte do grupo seguiu até o prédio da Justiça Federal, onde tiveram audiência com o juiz Roberto Pollini, que decidiu sobre o despejo do grupo de Nhande Ru Marangatu. De acordo com a equipe do Cimi no MS, o juiz comprometeu-se a dar encaminhamentos necessários para que sejam feitas perícias nas terras Sucuri´y em Nhande Ru Marangatu para levantar o custo de indenização das benfeitorias.


 


Brasília, 12 de janeiro de 2006.


 


Cimi – Conselho Indigenista Missionário


 

Fonte: Cimi - Assessoria de Imprensa
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