Informe no. 694: Policia expulsa povo Guarani Kaiowá. Fazendeiros queimam casas
– Policia expulsa povo Guarani Kaiowá. Fazendeiros queimam casas
– Funai compromete-se a criar reserva indígena para povo Krahô-Kanela
– Brasil permite a comunidades indígenas cadastro como pessoas jurídicas
– Povo Miqueleno faz assembléia sob ameaça
POLICIA EXPULSA POVO GUARANI KAIOWÁ. FAZENDEIROS QUEIMAM CASAS
Logo nas primeiras horas da manhã da quinta-feira, 15, a Polícia Federal, com 200 homens armados com bombas de gás lacrimogêneo e escopetas de bala de borracha e contando com um helicóptero, três ônibus e oito viaturas, estava pronta para expulsar o povo Guarani Kaiowá de sua terra, Ñande Ru Marangatu, localizada no município João Antônio, Mato Grosso do Sul. A terra foi homologada pelo presidente Luis Inácio Lula da Silva em março deste ano, mas a homologação foi suspensa por uma decisão liminar do Supremo Tribunal Federal e isto abriu espaço para outra decisão judicial que determinou a reintegração de posse. Mais de 500 indígenas vivem nesta terra.
“É inacreditável que isso tenha acontecido. Não pensávamos que o país onde vivemos pudesse fazer isso com a gente”, declarou a liderança indígena Eugênio Morales, cinco filhos, em tom de voz que deixou transparecer tristeza e incredulidade.
Durante a tarde, após a saída das entidades de direitos humanos e da imprensa que acompanharam o despejo, fazendeiros atearam fogo às casas dos indígenas. “Agora ficamos perdidos. Acreditávamos na justiça, mas o que vimos foi os fazendeiros queimarem as nossas casas, deixando as pessoas sem alimentos, documentos… só ficaram com a roupa do corpo. Agora estamos jogados na beira da estrada”, disse Léia Aquino, professora Guarani, por telefone.
As famílias despejadas serão obrigadas a viver na beira da estrada ou em um espaço de 26 hectares, onde está construída uma aldeia. Na terra onde os Guarani haviam voltado a viver depois de retomadas e depois da mobilização que levou à homologação do território, eles voltaram a produzir alimentos para subsistência, como mandioca, feijão, milho, batata, arroz e banana. Com o despejo, a fome e a miséria voltam a ameaçar esta comunidade.
Os Guarani Kaiowá foram expulsos por volta das dez e meia da manhã. Na retirada, um helicóptero fez uma série de vôos rasantes para assustar as pessoas que permaneciam no local. Ninguém foi ferido fisicamente durante a operação. Os adultos discursavam por Justiça para os policiais. À frente deles, dezenas de crianças sustentavam cartazes. Os dizeres de um deles eram: “Enquanto os senhores ministros, juízes e policiais estão preparando o melhor Natal para os seus filhos, nós estamos sendo colocados nas ruas”.
Em um clima que misturava tristeza, revolta e apreensão, lideranças Guarani Kaiowá fizeram rituais durante toda a noite do dia 15, com o propósito de resistir através da não-violência.
Para o Cimi, a expulsão dos indígenas de uma terra homologada é absurda. Quando as forças policiais precisam proteger os indígenas e as terras indígenas, que são patrimônio da União, o argumento é que não há verbas e contingente. Foi o que aconteceu após os ataque a um centro de formação em Raposa Serra do Sol, para usar exemplo recente. Quando, ao contrário, a força policial precisa proteger fazendeiros que invadiram terras indígenas, o Estado brasileiro prontifica-se a agir.
FUNAI COMPROMETE-SE A CRIAR RESERVA INDÍGENA PARA POVO KRAHÔ-KANELA
O presidente da FUNAI, Mércio Pereira Gomes, decidiu não considerar a terra reivindicada pelos Krahô-Kanela como território tradicional deste povo. A resolução foi apresentada na tarde desta terça-feira, 13. Com isto, a criação de uma reserva indígena no mesmo local onde fica a terra reivindicada pelos Krahô-Kanela foi a solução encontrada para garantir terra para a vida deste povo, que há mais de 30 anos luta por seu território tradicional. Atualmente, os indígenas vivem de forma desumana, confinados em uma casa construída sobre o lixão da cidade de Gurupi, Tocantins.
A criação de uma reserva indígena é uma vitória dos Krahô-Kanela em um cenário em que a direção da Fundação Nacional do Índio (Funai) já havia negado sua responsabilidade sobre o destino deste povo. Ao longo dos anos, os Krahô-Kanela conseguiram gerar solidariedade da população do estado onde vivem, o Tocantins, e se aproximaram de outros povos e movimentos sociais de todo o país. Conquistaram o apoio de setores do poder legislativo e a atenção do Ministério Público Federal e, fortalecidos, conseguiram finalmente serem ouvidos pela Funai.
Pelo acordo firmado esta semana, a constituição da reserva indígena deverá ser feita em duas etapas. Até no máximo 31 de janeiro de 2006, a Funai deverá adquirir, em caráter emergencial, duas fazendas que serão vistoriadas pelo Incra, com superfície de cerca de sete hectares. O Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) dispôs-se a repassar à Funai recursos orçamentários para a aquisição das terras desta primeira fase. “O restante da área (…) deverá ser implementado mediante dotação orçamentária extraordinária à Funai,. Para tanto, esse pleito será encaminhado ao Ministério da Justiça”, diz trecho do documento firmado pelos indígenas e pela Funai. O senador Paulo Paim, vive-presidente da Comissão de Direitos Humanos do Senado, comprometeu-se a apresentar emendas no Orçamento da União em 2006 para que sejam disponibilizados os recursos necessários para a constituição da reserva. A ação tem como objetivo garantir que os Krahô-Kanela tenham acesso a toda a sua terra até o final de 2006.
BRASIL PERMITE A COMUNIDADES INDÍGENAS CADASTRO COMO PESSOAS JURÍDICAS
Atendendo a uma solicitação do Cimi, a Comissão Nacional de Classificação (Concla), do Ministério do Planejamento, aprovou a inclusão das comunidades indígenas como um tipo específico de pessoa jurídica na Tabela de Natureza Jurídica, classificando as comunidades como entidades sem fins lucrativos.
Com a decisão tomada nesta quarta-feira, 14, os órgãos públicos serão orientados a considerar as comunidades indígenas como pessoas jurídicas. Uma das conseqüências imediatas da decisão é que a Receita Federal poderá inscrever as comunidades no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ) sem exigir que delas o registro de associações. Serão determinadas exigências específicas, que respeitem as características das comunidades indígenas. Com isto, elas não mais precisam registrar associações para estarem representadas juridicamente e manter atividades tributárias, financeiras e contratuais.
A nova regra não valerá, por exemplo, para organizações indígenas que representam vários povos, já que ela se refere a cada povo indígena individualmente.
Este é mais um passo do Estado brasileiro na aplicação do direito dos indígenas a serem respeitados em suas instituições sociais, econômicas e políticas específicas, distintas daquelas utilizadas pela sociedade não indígena.
POVO MIQUELENO FAZ ASSEMBLÉIA SOB AMEAÇA
A 4a. Assembléia anual do povo indígena Miqueleno, realizada entre os dias 29 de novembro e 1o. de dezembro no município de São Francisco de Guaporé, Rondônia, somente pode ser iniciada sob proteção policial requerida pelo Ministério Público Federal, depois que um numeroso grupo de fazendeiros e colonos invadiram a casa do líder indígena Tanadi Miqueleno.
Fazendeiros da região tentaram dividir as lideranças Miqueleno espalhando boatos de que dois grupos do povo reivindicavam terras distintas. A perspectiva do reconhecimento oficial do território tradicional Miqueleno provocou reação dos atuais ocupantes do território indígena, que temem perder as terras. O povo Miqueleno tem cerca de 170 sobreviventes, vivendo em diversas localidades do estado de Rondônia.
Em sua Assembléia, os indígenas reforçaram o pedido pela demarcação de seu território tradicional, além de educação e saúde específicas e diferenciadas. Os Miqueleno lutam pelo direito de voltar a Limoeiro, de onde foram expulsos pelo Ibama em 1986 para a criação da Reserva Biológica do Guaporé. Outra parte de seu território foi loteada, vendida ou grilada por fazendeiros.
Cimi – Conselho Indigenista Missionário
Brasília, 15 de dezembro de 2005