20/10/2005

Informe no. 686: Racismo contra indígenas no Brasil é denunciado à ONU. Funai reage

– Racismo contra indígenas no Brasil é denunciado à ONU. Funai reage


– Falta de atendimento à saúde leva a ocupação de prédio da Funasa no Amazonas


– Presos oito acusados de envolvimento na morte de Dorival Benitez no MS



– Indígenas participam da Assembléia Popular, em Brasília


 


Racismo contra indígenas no Brasil é denunciado à ONU. Funai reage


 


O relator da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre Formas Contemporâneas de Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia, Doudou Diène, iniciou a sua viagem pelo Brasil na Capital Federal no dia 17 ouvindo denúncias feitas por representantes e entidades da sociedade civil que acusaram o governo e o Estado brasileiros de serem os maiores promotores de discriminação.


            Denúncia contundente foi feita pelo cacique do povo Krahô-Kanela, Mariano Ribeiro. Ele relatou o sofrimento de 96 pessoas Krahô-Kanela que há dois anos vivem confinadas em uma casa de 100 metros quadrados, no município de Gurupi, Tocantins, onde antes funcionava o depósito de lixo público da cidade. Mais de 80% vivem com uma verminose que pode levar a morte. Sem espaço para plantar ou ter com que sobreviver, os Krahô-Kanela reivindicam a mais de 20 anos 29,3 mil hectares de sua terra tradicional, chamada de Mata Alagada.


            Após ouvir Mariano Ribeiro, Diène afirmou que, assim como no Brasil, em outros países por onde já passou os índios são as principais vítimas do preconceito. “A discriminação contra os povos indígenas é o começo de tudo. No princípio, a discussão racista era se os índios tinham ou não uma alma humana. E é a partir da discriminação contra o índio que veio a discriminação contra o negro, por isso as duas estão intimamente ligadas”, lembrou o relator da ONU. A visita passa ainda por Recife e Pesqueira, onde ele conhecerá a terra do povo Xukuru. Os primeiros resultados da viagem devem ser apresentados no dia 7 de novembro à ONU.


 


Funai reage às críticas


Em resposta às denúncias feitas pelo Cimi ao relator da ONU, a Funai citou ontem, dia 19, dados que apresentam queda nos números de mortalidade infantil entre o povo Guarani-Kaiowá, no estado do Mato Grosso do Sul. “Neste ano, o índice é de 35,9 mortes para cada mil crianças nascidas. O que representa uma redução de 51,4% da mortalidade no 1º ano de vida se comparada a 2004, quando era de 69,7 para cada mil”, afirma o órgão.


            A queda da mortalidade infantil é um fato importante. Mas o Cimi sente-se no dever de trazer ao debate público questionamentos sobre o tipo de políticas públicas que têm sido aplicadas no Mato Grosso do Sul e as conseqüências que elas podem trazer.


            A distribuição de alimentos e de vitaminas é uma medida para resolver os problemas emergenciais das crianças e adultos do povo Guarani. No entanto, a Funai não encaminhou ou articulou ações estruturantes que permitissem aos índios a possibilidade de voltar a produzir seus alimentos, pois isso requer o reconhecimento de suas terras tradicionais e um árduo trabalho de recuperação ambiental de grande parte dessas terras, que foram degradadas pela exploração para pecuária e, recentemente, para a soja. 


            Em sua última Aty Guasu (grande reunião tradicional deste povo), os Guarani listaram cerca de 200 Tekohá (territórios tradicionais) no Mato Grosso do Sul e ficaram indignados ao ouvirem que a Funai não mais designaria grupos de trabalho para identificação e regularização das terras até julho de 2006.


            Só a regularização de terras garante que este povo sobreviva sem depender de fornecimento de alimentos pelo poder público. Ainda que sejam necessárias em um momento inicial, políticas públicas não podem ser restritas a ações que diminuam a fome sem tocar em suas causas primeiras, sob pena de, havendo mudanças nas políticas públicas, os indígenas voltarem a enfrentar altos índices de desnutrição e morte.


 


Funai mente sobre situação do povo Krahô-Kanela


A Funai reagiu também às denúncias dos Krahô-Kanela, através da imprensa, alegando que as terras reivindicadas pelos Krahô-Kanela não foram consideradas tradicionalmente indígenas pelos estudos antropológicos e que cabe ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) a responsabilidade de providenciar um assentamento para a comunidade.


            O Cimi reafirma a crítica dos indígenas. Ainda que a Funai concluísse que a terra não é tradicionalmente ocupada, a lei (Estatuto do Índio) diz que a Funai deveria encontrar uma área onde este povo possa viver. Áreas criadas nestas circunstâncias são as chamadas Reservas Indígenas. Ou seja, ainda que aquela terra não fosse dos Krahô, a Funai teria obrigação de resolver a questão porque se trata de uma população indígena.


            Mas a pior das inverdades divulgadas pela Funai é a de que os estudos antropológicos não consideraram a terra Krahô-Kanela, chamada por esse povo de “Mata Alagada”, como terra tradicional.


            Não é isso o que dizem os estudos antropológicos e fundiários solicitados pelo órgão. Foram realizados dois estudos sobre esta área: um levantamento prévio e um estudo antropológico completo, feito por um Grupo Técnico. Ambos os estudos concluem que a área reivindicada pelo grupo étnico possui as características de uma terra tradicionalmente ocupada. A coordenadora do GT, Graziela Rodrigues de Almeida, propõe a delimitação da Terra Indígena Krahô-Kanela com uma superfície de 31.925 hectares.


            Segundo determina o Decreto nº 1.775/96 que dispõe sobre o procedimento administrativo de demarcação de terras indígenas, a fase seguinte é a decisão do presidente do órgão, em 15 dias, sobre se aprova ou não o relatório do GT que ele próprio constituiu. Assim, ao contrário do que afirma a Funai, o processo de demarcação da Terra Indígena Krahô-Kanela está sim parado há mais de um ano nos “escaninhos da burocracia” da Funai, sem qualquer decisão jurídico-administrativa de sua direção.


            Ora, se o procedimento está em andamento, porque então caberia ao Incra fazer o assentamento dos Krahô-Kanela? Isso só poderia ocorrer após a conclusão do processo administrativo. Neste caso, por que a União gastaria recursos do erário público para estabelecer um assentamento da reforma agrária para índios? Provavelmente essas perguntas ficarão sem resposta.


 


 


atendimento PRECÁRIO leva a ocupação de prédio da Funasa no Amazonas


 


Em protesto contra a atual situação da saúde indígena no Vale do Javari, considerada de total caos pelas lideranças da região, mais de cem indígenas dos povos Marubo, Mayoruna, Matis, Kanamari e Kulina, ocupam desde sábado, 15, a sede administrativa da Fundação Nacional de Saúde (Funasa) de Atalaia do Norte, Amazonas. A ocupação também é uma medida de protesto contra a indicação de um parente do prefeito local para a coordenação do Distrito de Saúde Indígena. O novo coordenador, coronel Cláudio Gomes, também é visto com desconfiança pelos indígenas por ter dado declarações preconceituosas e sempre se posicionar politicamente contra a causa indígena.


            O Conselho Indígena do Vale do Javari (Civaja) apresenta documentos que comprovam que a prefeitura do município aplicou de forma irregular recursos públicos do Programa Incentivo de Atenção Básica dos Povos Indígenas e Ações Básicas de Vigilância Sanitária, ambos do Fundo Nacional de Saúde, estimados no valor de R$   221. 957, 78, nos últimos seis meses.


            Segundo o coordenador do Civaja, Jorge Duarte Marubo, apenas um médico atende mais de três mil indígenas na calha de quatro rios, em 37 comunidades espalhadas por uma área de mais de oito milhões de hectares. Jorge Marubo diz que os profissionais da saúde deveriam permanecer por 45 dias visitando as comunidades. “Devido à vazante, hoje está mais difícil chegar às comunidades. Os profissionais da saúde passam cerca de 25 dias viajando e têm menos tempo para cuidar dos doentes”. Marubo avalia que mais da metade da população indígena do Vale do Javari, que é de 3. 215 habitantes, está contaminada com malária ou com hepatites virais (Com informações da Coiab).


 


CURTAS:


 


– Foram presos oito fazendeiros acusados de envolvimento na morte do cacique Guarani Nhandeva Dorival Benites, de 36 anos, durante confronto na retomada da terra Sombrerito. De acordo com o site Dourados Agora, a prisão preventiva ocorre por causa de depoimentos contraditórios prestados pelos fzenderios.


 


– Indígenas de todo o país se mobilizam para participar da Assembléia Popular: Mutirão por um novo Brasil, que acontecerá em Brasília de 25 a 28 de outubro. Já estão confirmados dois ônibus que virão do interior de Pernambuco, 9 pessoas nos ônibus de Manaus, e.representantes Guarani vindos de São Paulo. Para mais informações, visite www.assembleiapopular.com.br


 


Brasília, 20 de outubro de 2005


Cimi – Conselho Indigenista Missionário


www.cimi.org.br

Fonte: Cimi
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