Indígenas protestam contra exploração de petróleo Petrobrás
Indígenas Huaorani denunciam que acordos com a petroleira brasileira Petrobrás haviam sido feitos sem consulta às populações afetadas e temem os impactos que a construção da estrada e as atividades de extração da empresa terão sobre seu território. A manifestação contará com uma roda de imprensa. No Brasil, a Rede Brasileira de Justiça Ambiental prepara um estudo denunciando a adoção de um duplo padrão pela Petrobrás ao ameaçar a integridade do Parque Nacional Yasuni e do povo indígena Huaorani.
Nos dias 11 e 12 de julho, em Quito, uma delegação de representantes do povo Huaorani protestará contra a presença da Petrobrás em seu território. Está prevista a participação de 120 indígenas, com uma forte presença das mulheres Huaorani. O grupo inclui populações afetadas pela REPSOL YPF, que também opera na Amazônia equatoriana e tem causado inúmeros impactos socioambientais, relatados por uma missão internacional que esteve na área em agosto de 2004.
Para o primeiro dia de ação (segunda-feira) está confirmada a realização de uma roda de imprensa com a participação de correspondentes internacionais na sede da CONAIE (Confederação das Nacionalidades Indígenas do Equador). A marcha até o Palácio do Governo será no dia 12, terça, quando será entregue uma carta ao Presidente da República pelos Huaorani. A carta afirma que o governo do Equador deve cuidar dos indígenas e não só pelo petróleo, e fazer com que “mudem as leis para que hajam propostas para todos os equatorianos. O governo deve buscar outro projeto, não só o petróleo; para que dos recursos não afetem o futuro. Pois isto afeta não só aos huaoranis mas todo o país”.
A Petrobrás tem autorização para explorar petróleo no Bloco 31, em Orellana, na região amazônica do país. Mês passado, porém, o governo do Equador solicitou uma auditoria à Controladoria Geral do Estado sobre a licença ambiental concedida à empresa, devido as inúmeras pressões da sociedade civil contra o projeto.
O Bloco 31 compreende a maior parte do Parque Nacional Yasuni e o território dos povos indígenas Huaorani, incluindo os grupos Tagaeri e Taromenane, que escolheram viver isolados e dependem inteiramente da floresta.
Um relatório da ONG Acción Ecológica mostra que, com as primeiras atividades da Petrobrás, iniciadas em janeiro deste ano, iniciou-se a contaminação. Um porto, em construção em terras do povo Quíchuas do Bloco 31, não só tem poluído a água, como gerado problemas trabalhistas.
Em notícia recém-publicada pelo jornal equatoriano El Comercio, o coordenador da ONHAE (Organização da Nacionalidade Huaorani da Amazônia Equatoriana), Ramón Huani, afirmou que não vai manter os acordos firmados pela gestão anterior da organização com a Petrobras, já que, além de terem sido feitos sem consulta às comunidades de base da nacionalidade Huaorani, eles sequer foram cumpridos pela empresa. A nova direção da ONHAE afirma estar decidida a não aceitar mais a exploração petroleira em seu território, em função dos inúmeros impactos que a população tem sofrido nos últimos anos por ação das companhias petrolíferas.
A ruptura responde à pressão exercida principalmente pelas mulheres indígenas. Elas querem manter livre de contaminação o território de onde extraem seu alimento. Na mesma reportagem, Alicia Cahuiya, presidente da Associação de Mulheres Huaorani, disse que com a presença das indústrias petroleiras na região, os rios que abastecem as populações ficam contaminados. “Isto só traz desmatamento, extinção dos animais selvagens e introdução de maus costumes ocidentais como o alcoolismo e a prostituição”, afirmou.
Os Huaorani tiveram o apoio do povo Quíchua nessa decisão. Entre os planos polêmicos da Petrobrás está a construção de uma estrada que corta, em quase 30km, o parque. Ela deve atravessar uma comunidade quíchua antes de chegar à terra Huaorani. Alvo de protestos ambientais, a abertura da estrada foi motivo da saída da ONG Wildlife Conservation Society Equador do grupo de acompanhamento para o monitoramento das atividades da Petrobrás no Parque Nacional Yasuni, em maio deste ano. No esquema atual, as comunidades locais e o grupo de monitoramento têm direito apenas de voz, e não de voto, sobre as decisões que concernem às atividades realizadas pela empresa no parque.
Desde 2004, um movimento internacional visa impedir a exploração de petróleo no Parque Nacional Yasuni. A ação inclui a produção, por cientistas e militantes do Equador e de diversos países, de relatórios técnicos que projetam o impacto da presença da petroleira na reserva da biosfera, como o que resultou da missão internacional de verificação de agosto do ano passado. Os temas discutidos com a Petrobrás pela Rede Brasileira de Justiça Ambiental são também resultado desses relatórios. A rede coordena no Brasil uma campanha que denuncia a aplicação de um duplo padrão pela empresa. O estudo “Extraterritorialidade e direitos humanos: o duplo padrão da Petrobrás” em Yasuni, a ser lançado em breve, expõe o problema com mais detalhes.
Ao iniciar suas atividades em uma área de grande biodiversidade e território indígena no Equador, a Petrobrás aplica um duplo padrão. O argumento se baseia no fato de que no Brasil não é permitida a exploração petrolífera em parques nacionais ou em terras indígenas.
Mês passado, por exemplo, o Ibama negou à empresa canadense Newfield a licença ambiental para explorar petróleo no Bloco BMES-20, próximo ao arquipélago de Abrolhos, na Bahia. Os motivos foram justamente os riscos potenciais que uma exploração petrolífera representa a uma área que é considerada parte da Zona de Amortecimento do Parque Nacional de Abrolhos. Nenhuma empresa tem conseguido explorar petróleo nos parques nacionais do Brasil, mas a estatal brasileira tem autorização para fazer o mesmo no país vizinho. Embora a Legislação Ambiental Unificada do Equador proíba a exploração petroleira em áreas protegidas, uma série de resoluções ministeriais foi emitida ao longo da história dessa exploração no Equador a fim de garantir que a atividade pudesse ser desenvolvida nessas áreas.
Para os representantes da Rede Brasileira de Justiça Ambiental, a sociedade civil brasileira deve estar atenta à possibilidade de uma empresa estatal reproduzir o que inúmeras empresas transnacionais têm historicamente feito no Brasil: transferir, para locais onde há fragilidade na regulação ambiental, impactos e riscos que não são permitidos em seus países de origem.