29/06/2005

Sombrerito: morte e vida Guarani

Na madrugada de domingo, dia 26, em torno de 200 índios Kaiowá Guarani retornaram ao seu Tekoha Sombrerito, no município de Sete Quedas, a 470 km de Campo Grande. Iam com grande expectativa de recomeçarem sua vida, com dignidade e em paz. Também iam com certo temor, pois ainda estava vivo na memória o covarde ataque que ali sofreram em 1999, quando mais de 100 pistoleiros os expulsaram a bala, destruindo suas casas e matando todos os animais. Agora, esperavam que seu sagrado direito à terra tradicional finalmente fosse reconhecido, pois isso já havia sido comprovado no estudo antropológico.


 


Mal haviam descarregado seus poucos pertences para começar a pensar na construção dos barracos, quando subitamente chegam duas camionetes cheias de pistoleiros. Não deu tempo nem para pensar. Eles chegaram atirando contra o grupo de índios que ali estavam. Do covarde ataque ficou estendido no chão o corpo do Kaiowá Guarani Dorival Benitez. Foram atingidos pelas balas seu irmão Ari e mais Eugênio e Jaime. Os pistoleiros também arrancaram de um caminhão Silvio Iturve e sua esposa Rosana – grávida de quatro meses – submetendo ambos a uma sessão de socos e pontapés. Não contentes em sua sede de violência e morte, atearam fogo no caminhão que havia trazido parte dos índios.


 


Pânico, terror, indignação e revolta foram os sentimentos que tomaram conta dos índios ali presentes. Passaram logo a cuidar do corpo estendido ao chão e dos feridos. E tomaram a firme decisão de não deixar que o sangue ali derramado ficasse impune. Decidiram que iriam continuar ali, lutando por sua terra.


 


Esse é mais um capitulo da tragédia e humilhação a que esse povo está sendo submetido. Confinados em mínimos pedaços de terra, ali estão sofrendo toda sorte de violência, com inúmeras e constantes mortes por subnutrição, suicídios, assassinatos. Alguns estão submetidos a trabalhos semiescravos nas fazendas de cana de açúcar e quase todos acabam vítimas da fome e da humilhante dependência das cestas básicas e de outras políticas assistenciais do governo.


 


Infelizmente a regularização de suas terras continua emperrada na burocracia oficial, pela justiça, que tem se mostrado ágil apenas a favor dos fazendeiros, da pressão dos políticos e do poder econômico. E assim a morte vai interrompendo vidas Guarani, sem, contudo conseguir dobrar a resistência e a persistência desse povo que continua confiando firmemente nos espíritos que os protegem e em Tupã, que os acompanha em sua peregrinação. Ao clamor dos anjos juntam-se as vozes heróicas dos seus mártires, a revolta de seus guerreiros e teimosia inquebrantável de suas aguerridas mulheres.


 


Campo Grande (MS), 28 de junho de 2005.


 


Egon Heck – Cimi Regional Mato Grosso do Sul


 

Fonte: Cimi - Regional Mato Grosso do Sul
Share this: