Povos buscam participação na definição de políticas públicas
A política de cotas para estudantes indígenas nas universidades particulares, através do Pro-Uni, foi um dos temas do debate sobre educação escolar que aconteceu durante a tarde desta terça-feira (dia 7) na VI Assembléia da Articulação dos Povos Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo. Como a entrada dos estudantes nas universidades não veio acompanhada de uma política de financiamento para a manutenção dos indígenas no ensino superior, muitos deles não conseguem permanecer no curso ou, antes, nem chegam a inscrever-se no programa.
Kleber Gesteira, Coordenador de Educação Escolar Indígena do MEC que esteve na Assembléia, concorda com a avaliação dos indígenas. “Não adianta apenas o acesso à universidade. E não existe, fora da Funai, política de assistência e manutenção dos estudantes do Pro-Uni. É importante cobrar isto”, afirmou.
Os indígenas questionam também os critérios estabelecidos para as cotas, por não envolverem as comunidades ou as organizações indígenas no processo de seleção dos estudantes.
Grande parte destes problemas poderia não existir se os povos, conhecedores de suas especificidades, fossem ouvidos durante a criação e planejamento das políticas públicas. A participação dos indígenas na formulação destas políticas é garantida pela Convenção 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), que tem peso de lei no Brasil.
Inadequação atinge quase todos os programas
A falta de políticas de apoio também torna difícil que muitos indígenas cursem o ensino médio. Os jovens precisam sair de suas aldeias para estudar, pois a grande maioria das aldeias que têm escolas oferecem apenas salas de 1ª. a 4ª. séries. O estado de Pernambuco, com 11 povos indígenas, conta apenas com uma escola de ensino médio, inaugurada em 2004. Em Alagoas, onde vivem 11 povos, não há nenhuma escola indígena de ensino médio. A Assembléia tirou como decisão solicitar que se desenvolva uma política de apoio aos estudantes indígenas fora das aldeias. Atualmente, o setor de educação da Funai concentra a questão, mas não tem verbas suficientes para atender a esta demanda.
A inadequação à realidade dos povos não acontece apenas nas políticas públicas de educação. Nos programas de segurança alimentar ou de incentivo à produção, são raras as vezes em que as políticas são planejadas de acordo com os costumes e necessidades indígenas, o que leva inclusive a disputas e conflitos internos.
O projeto de transposição do Rio São Francisco, uma das maiores preocupações levantadas pelos indígenas dentre os temas ambientais, também não respeitou a legislação ao não consultar os indígenas sobre a obra. “O São Francisco hoje é a vida de 25 povos indígenas, além de todos os povos ribeirinhos das suas margens. Nós que vivemos no rio sabemos que ele está morrendo. Por isso somos a favor da revitalização”, afirma Neguinho Truká. Segundo ele, 90% da mata ciliar do rio já foi retirada e mais de 90 municípios jogam dejetos diretamente no rio, o que compromete ainda mais sua “saúde”.
Indígenas cobram estruturação da educação escolar
“Precisamos de uma escola autônoma, com materiais didáticos próprios, currículos específicos e com a gestão das comunidades. Precisamos formar professores para atuar dentro desta escola”, afirma a educadora Iolanda Potiguara.
Na construção de uma educação escolar diferenciada, os indígenas identificam a necessidade de garantir a formação de seus professores através de processos diferenciados que lhes permitam pensar materiais didáticos e currículos que atendam às especificidades de cada povo.
É necessário também criar mecanismos para efetivação dos professores indígenas nas escolas, através, por exemplo, de formas diferenciadas de a participação nos concursos públicos. Outra decisão da Assembléia é lutar pela criação de Conselhos Estaduais de Educação Escolar Indígena, onde sejam definidas linhas políticas para a educação e onde possa haver controle social dos programas.
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