02/06/2005

Informe nº 666

NO MT, ACORDOS POLÍTICOS DIFICULTAM A DEMARCAÇÃO DE TERRAS INDÍGENAS E ABREM ESPAÇO PARA O DESMATAMENTO



 


Lideranças dos povos indígenas Enawenê-Nawê, Irantxe (Manuke) e Kayabi, que vivem no estado do Mato Grosso, estão em Brasília para reivindicar suas terras tradicionais e, com isso, impedir o processo acelerado de desmatamento ilegal para venda de madeiras, criação de gado e plantação de soja que as atinge. A destruição afeta também as cabeceiras dos rios dos quais os indígenas tiram seu alimento.


 


O desmatamento denunciado pelas lideranças – que trazem consigo mapas que demonstram o crescimento das atividades ilegais – é comprovado pelos números de derrubada da floresta Amazônica divulgados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). A Amazônia perdeu 26.130 quilômetros quadrados entre 2003 e 2004, e o Mato Grosso foi responsável por 48,1% do total de desmatamentos.


 


A dificuldade para o reconhecimento das terras indígenas passa por questões políticas nacionais. O Governador do Mato Grosso, Blairo Maggi (PPS), faz parte da base aliada do governo federal e é do mesmo partido do presidente da Funai, Mércio Pereira Gomes. Em 2003, o governador solicitou ao governo federal a suspensão da demarcação de terras indígenas no estado por dois anos. O poder de pressão que os fazendeiros do MT exercem sobre as instâncias federais é algo bastante conhecido no Brasil. Ademais, Maggi é um dos maiores produtores de soja do mundo, e o agronegócio continua sendo defendido pelo Governo Lula, interessado em manter o saldo de exportações positivo a qualquer custo.


 


Os Enawenê-Nawê reivindicam o início da revisão dos limites de suas terras. Um grupo de trabalho estava sendo formado para realizar os estudos antropológicos, mas o processo foi interrompido pela Fundação Nacional do Índio (Funai), que segue uma determinação de não encaminhar processos de revisão de limites.


 


As terras Irantxe e Kayabi estão na lista daquelas que já foram identificadas pela Fundação, chegaram ao Ministério da Justiça e voltaram para a Funai sem maiores explicações. “Se o processo fica parado, cada vez mais avança o impacto ambiental, a retirada de madeira, os grileiros. As pastagens estão até onde há cerâmica e onde estão nossos cemitérios, o flechal”, afirma Raimundo Jywy, do povo Kayabi.


 


O Ministério Público Federal solicitou ao Ministério da Justiça justificativa para o retorno dos laudos antropológicos dos povos Irantxe (autodenominados Manuke) e Kayabi e pediu providências urgentes sobre o desmatamento nas três áreas. A Funai também se comprometeu a articular-se com os órgãos ambientais para coibir o desmatamento.


 


A Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados aprovou ontem (dia 1) a realização de uma  audiência pública para cobrar do Ministério da Justiça, da Funai e de órgãos como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), responsável pela conservação do meio-ambiente. A audiência deverá ocorrer em agosto. A solicitação foi feita pelos deputados Eduardo Valverde (PT-RO) e Iriny Lopes (PT-ES), após reunião com os indígenas.


 


Enawenê-Nawê


 


Os Enawenê-Nawê são um povo de contato recente. Sua população era de 97 pessoas quando foram contatados, em 1974. Atualmente, são 430. Este povo reivindica a inclusão, em seu território, da região do Rio Preto, que ficou fora da terra homologada em 1996. No ano passado, a Funai publicou um edital no qual informava sobre a contratação de técnicos para o estudo. No entanto, o processo foi suspenso. Em 31 de maio, a ONG Survival International enviou ao governo brasileiro uma carta solicitando medidas em relação a este povo. Afirmam na carta que “a Survival tem recebido relatórios muito preocupantes que descrevem como os rios [da região] de Rio Preto, que são cruciais para a subsistência deste povo pescador, estão sendo poluídos, envenenando a água para beber e as reservas de peixes. Tradicionalmente, os Enawenê-Nawê têm vivido da pesca, da plantação de milho, da coleta de castanhas e construído as suas malocas na área do Rio Preto. Além disso, esta região tem um enorme significado espiritual para eles. Os índios também estão sendo intimidados pelos fazendeiros que em diversas ocasiões chegaram a queimar as suas malocas”.


 


TUPINIKIM E GUARANI RETOMAM SUAS TERRAS NO ESPÍRITO SANTO


 


Cerca de 200 indígenas das sete aldeias do Espírito Santo iniciaram a reocupação das áreas que auto-demarcaram nas últimas semanas. O grupo está cortando o eucalipto plantado na área de 11.009 hectares de terras indígenas que atualmente está nas mãos da empresa Aracruz Celulose. Estes 11.009 hectares já foram identificados pela Funai e reconhecidos como terras indígenas pelo ex-ministro da Justiça Íris Rezende, mas ficaram fora das portarias de demarcação através de um acordo inconstitucional assinado pelos indígenas após violento constrangimento das lideranças.


 


A liminar que determinava a retirada dos indígenas de seu território, em favor da Aracruz Celulose, foi derrubada pela segunda instância da Justiça Federal, com o argumento de que a Funai e o Ministério Público Federal deveriam ter sido ouvidos antes de a Justiça Federal haver tomado aquela decisão.


 


Hoje (dia 2), acontecerá em Vitória, capital do Espírito Santo, uma marcha em favor da demarcação das terras Tupinikim e Guarani. Indígenas, trabalhadores Sem Terra, pequenos agricultores e a população capixaba realizarão uma caminhada até o centro da cidade. Este momento será também a abertura do IV Encontro Nacional da Rede Alerta contra o Deserto Verde, rede que congrega comunidades impactadas pelas monoculturas de eucalipto e pinus de Minas Gerais, Espírito Santo, Bahia, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul.


 


Até meados de junho, o atual ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos terá que se pronunciar sobre uma recomendação feita pelo Ministério Público Federal para editar uma nova portaria de demarcação que inclua os 11.009 hectares não demarcados em 1998. O presidente da Funai, Mércio Pereira Gomes, que recebeu os caciques indígenas na semana passada, comprometeu-se a conversar esta semana com o ministro da Justiça, solicitando a ele que edite uma nova portaria que reconheça o direito dos Tupinikim e Guarani sobre a área.


 


A reocupação das terras acontece nove dias depois de concluída a auto-demarcação da área, ação da qual participaram 500 indígenas. Hoje, continuam os trabalhos de corte do eucalipto e de construção de duas cabanas para o alojamento das famílias que permanecerão no local. No lugar dos eucaliptos cortados, serão plantados alimentos e árvores nativas (Com informações da Fase).


 


Brasília, 2 de junho de 2005.


 


Cimi – Conselho Indigenista Missionário


 

Fonte: Cimi - Assessoria de Imprensa
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