22/03/2005

Carta MAB – Violência contra os atingidos por barragens

 


 


 À sociedade brasileira


 


Nós, bispos acompanhantes da Comissão Pastoral da Terra, em diversos estados do Brasil, junto com outros bispos solidários com a causa dos atingidos pelas barragens, queremos nos dirigir à Sociedade brasileira, para denunciarmos a violência com que são tratadas as famílias, vítimas da implantação de hidrelétricas que buscam defender os direitos espezinhados por aqueles que se arvoram em promotores do progresso.


 


O Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB, organizado em quase todo o Brasil, vem realizando manifestações e protestos para chamar a atenção das autoridades e sensibilizar a opinião pública para a dura realidade que enfrenta.


 


No dia 8 de março, Dia Internacional da Mulher, em Rio Casca, MG, uma manifestação que tentava provocar o adiamento de audiência pública sobre a construção de barragem da PCH Jurumirim foi violentamente reprimida pela Polícia Militar, deixando o  saldo  de 35 pessoas agredidas, inclusive seis mulheres, duas delas grávidas, e seis presos. Um dos presos foi o Pe. Antônio Claret Fernandes, que se solidarizava com os manifestantes e que a ocorrência policial o qualificou como liderança.


 


Em Tucuruí, diante da possibilidade dos atingidos por barragens ocuparem a Usina Hidrelétrica, 200 soldados do Exército Brasileiro foram deslocados para “proteger suas instalações”. Esta usina construída à época da Ditadura Militar, sobre o rio Tocantins, expulsou 32 mil pessoas. Poucas famílias atingidas receberam indenização. E até hoje as famílias que vivem nas imediações do lago não desfrutam da energia ali gerada.


 


Em Campos Novos, SC, cinco agricultores atingidos pela barragem Campos Novos S/C foram presos na madrugada do dia 12. Estas lideranças foram retiradas violentamente de suas casas e levadas ao presídio da cidade, deixando as famílias em estado de choque. Os lavradores continuam presos até este momento. Uma prisão preventiva por descumprimento de Interdito Proibitório, uma anomalia jurídica de fazer inveja aos tempos da ditadura.


 


O que mais nos enche de indignação é que quando se decide pela construção de uma barragem, o Governo Federal desapropria as áreas a serem alagadas por “Interesse Público” que, porém, são entregues para exploração de empresas privadas, a maioria delas transnacionais. Estas pouco se interessam pelos impactos sociais sobre as populações atingidas. Elas reconhecem o direito de quem tem documentos de propriedade, mas os direitos das famílias de posseiros, meeiros, arrendatários, pequenos comerciantes e artesãos, pescadores e ribeirinhos que sempre viveram na área, simplesmente são esquecidos. O MAB calcula que para cada três famílias que recebem indenização, outras sete acabam simplesmente sem nada.


 


Para aprovação das obras são usados muitos subterfúgios e burladas normas legais, como o Estudo de Impacto Ambiental (EIA). Isto aconteceu na construção da Usina de Barra Grande, RS, que não fez constar a existência de uma mata nativa de pinheiros, Araucária Angustifólia, espécie em extinção, e que é protegida por lei.  E a cada dia se tem conhecimento de novas estratégias utilizadas para se burlar a lei.


 


As barragens alagam não apenas as terras, mas também acabam destruindo e desestruturando comunidades inteiras. O trabalho, a cultura, a vida de muita gente são submersos.


 


Quando os atingidos pelas barragens se manifestam, eles estão gritando por vida, por respeito aos direitos não só de cada pessoa, de cada família, mas pelos direitos de toda uma comunidade. E suas manifestações são tratadas como caso de polícia.


 


Como bispos, pastores de nossas Igrejas, preocupados com a situação, denunciamos a violência e as arbitrariedades que se cometem contra as famílias dos atingidos por barragens. Conclamamos a todos e todas em nosso país, que têm compromisso com a causa da justiça, a apoiarem esta luta desigual dos pequenos contra os interesses dos que só vêem em sua frente o lucro a qualquer custo. Apelamos também ao Governo Federal para que tenha a mesma determinação, expressa na desapropriação das áreas para a construção de barragens, para buscar soluções eficazes para as famílias e as comunidades atingidas e para que busque formas alternativas de geração de energia elétrica, de reconhecida eficácia e não agressivas ao meio-ambiente, como o próprio MAB vem propondo com insistência.


 


 


Goiânia, 21 de março de 2005


 


Dom Tomás Balduino


 


Presidente da CPT


 


D. Xavier Gilles – Bispo de Viana – MA, Vice presidente da CPT


 


Dom Luiz Carlos Eccel – Bispo de Caçador – SC


 


Dom Pedro Casaldáliga – Bispo emérito de São Félix do Araguaia – MT


 


Dom Antônio Possamai – Bispo de Ji- Paraná – RO


 


Dom José Maria Libório Camino Saracho – Bispo de Presidente Prudente – SP


 


Dom Orlando Dotti – Bispo emérito de Vacaria – RS


 


Dom Ladislau Biernaski – Bispo Auxiliar de Curitiba – PR


 


Dom Heriberto Hermes – Bispo de Cristalândia – TO


 


Pe. Edson Damian – Administrador de Roraima – RR


 


Dom Maurício Grotto de Camargo – Bispo de Assis – SP


 


Dom Guilherme Werlang – Bispo de Ipameri – GOeHHer


 


Dom José Alberto Moura – Bispo de Uberlândia – MG


 


Dom Marcelo Pinto Carvalheira – Bispo emérito da Paraíba – PB


 

Dom André de Witte –Bispo de Ruy Barbosa BA

Fonte: MAB
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