15/02/2005

Manifesto: Agro-banditismo faz mais uma vítima

Claramente expresso em documentos como a Carta da Terra, as organizações que compõem o Fórum Nacional pela Reforma Agrária e pela Justiça no Campo “defendem a realização de uma ampla e massiva reforma agrária e a ampliação e o fortalecimento da agricultura familiar”. Assumem essa luta e compromisso porque entendem que “estas políticas garantem o direito ao trabalho para a população rural, historicamente excluída, através de uma mudança no atual modelo de desenvolvimento agropecuário, excludente, predatório e concentrador de terra, renda e poder”.


 


As entidades do Fórum reafirmaram, também na Carta da Terra elaborada em 2003, a necessidade de ações governamentais para garantir “o respeito aos direitos humanos no campo, combatendo todas as formas de violência e o fim da impunidade”. Infelizmente, antes de qualquer medida governamental efetiva, aconteceu mais uma tragédia com o assassinato de Irmã Dorothy em 12 de fevereiro de 2005, no município de Anapú, Pará.


 


Esse assassinato explicita a violência com que representantes e beneficiários da exploração predatória da Amazônia reagem ante a existência de projetos como o Projeto de Desenvolvimento Sustentável, que propõe a inclusão social cidadã com sustentabilidade ambiental. O assassinato de Irmã Dorothy encontra-se no mesmo raio de ação das forças responsáveis pela grilagem das terras públicas, pela destruição ambiental, especialmente através da retirada ilegal de madeira, e pela reiterada violência contra camponeses, indígenas, defensores de direitos humanos e todos os que se opõe à ocupação predatória da Amazônia.


 


Protegidos sob o discurso de “setor produtivo” e “responsável” pelo equilíbrio da balança comercial, estas forças não somente bloqueiam estradas para chantagear o Governo Federal, mas são verdadeiros agrobandidos que corporeificam as injustiças e violência do modelo de “desenvolvimento” que se alimenta da prática do trabalho escravo, da exploração ilegal e predatória dos recursos ambientais, e da grilagem de terras públicas, se articulando nacionalmente através da União Democrática Ruralista, da Confederação Nacional da Agricultura , CNA e da bancada ruralista no Congresso.


 


 A ausência de ações de Estado é patente no Pará. Em que pesem os anúncios de medidas do Governo Federal, suas ações locais no Pará têm sempre sido tópicas, retóricas e sem a firmeza próprias de uma ação de Estado, cedendo a reações de grupos de interesses, que agem de forma articulada, com  omissão ou apoio  do Governo Estadual do Pará. Do massacre de Eldorado dos Carajás ao assassinato de Irmã Dorothy, a política do Governo do Estado do Pará tem sido a defesa dos interesses de grileiros, madeireiros e latifundiários.


 


Neste cenário, não há espaços para vacilações e omissões do Governo Federal, que resultarão em mais tragédias. A punição dos responsáveis por esse assassinato é uma obrigação imperativa do Estado, mas as causas da violência e da desigualdade social só serão enfrentadas efetivamente através de uma ação articulada, interministerial e permanente que demonstre a opção do Governo Federal pela democratização da terra, respeito ao meio ambiente, diálogo com as populações locais marginalizadas e efetiva proteção aos defensores de direitos humanos.


 


Demandas das entidades do Fórum Nacional pela Reforma Agrária:


 


– A punição dos responsáveis diretos e indiretos pelo assassinato de Irmã Dorothy Stang, inclusive das autoridades que se omitiram de tomar providências contra as ameaças que ela vinha sofrendo.


 


– Classificar, segundo EMC 45, de 2004 (parágrafo 5 do art. 109 da CF), esse assassinato como uma grave violação dos direitos humanos, transferindo todo os procedimentos investigatórios e processuais para a competência da Justiça Federal;


 


– Ação interministerial (Ministério do Desenvolvimento Agrário, Meio Ambiente, Justiça, Integração Nacional, Secretaria Especial de Direitos Humanos e Defesa) para atuar nas diversas faces do problema agrário e ambiental no Estado do Pará, ampliando recursos e efetivo policial para aumentar a fiscalização ambiental e de violação de direitos humanos;


 


– Proceder a classificação dos imóveis (geo-referenciamento) da região, garantindo a discriminação e arrecadação de terras griladas e de todas as terras públicas, destinando-as ao programa federal de reforma agrária;


 


– Retomada das terras públicas tomadas ilegalmente por grileiros, para sua transformação em Projetos de Assentamento que beneficiem os agricultores de Anapú;


 


– Ampliar os recursos – e repassar imediatamente para os órgãos responsáveis – para o combate ao trabalho escravo no Pará e em todo o País;


 


– Intervenção federal no Estado do Pará, justificada pelas graves omissões do Governo Estado do Pará frente às reiteradas violações de direitos humanos, ferindo o pacto federativo.


 


– Adoção de medidas urgentes para proteger todos os defensores e defensoras de direitos humanos com risco de morte no Estado do Pará e a imediata efetivação da Coordenação para Defensores de Direitos Humanos no Pará e a proteção a Luis Morais de Brito, do PDS Esperança e outros ameaçados;


 


– Rompimento imediato do acordo do Governo Federal com os madeireiros da região, suspendendo todos os Planos de Manejo Irregulares;


 


– Colocar em pauta e aprovar imediatamente a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 438, de 2001, que altera o artigo 243 da CF e pune a prática do trabalho escravo.


 


Além da apuração rápida e punição dos mandantes e executores desse crime bárbaro, as entidades do Fórum Nacional pela Reforma Agrária e Justiça no Campo reafirmam que a solução definitiva dos conflitos no Estado do Pará e em todo o território nacional é a realização de uma reforma agrária ampla e massiva capaz de democratizar a propriedade fundiária e criar os fundamentos para a construção de um desenvolvimento sustentável e solidário para o nosso País.


 


Brasília/DF, 14 de fevereiro de 2004.


 


RELAÇÃO DAS ENTIDADES DO FÓRUM NACIONAL PELA REFORMA AGRÁRIA E JUSTIÇA NO CAMPO


 


1. ABRA – Associação Brasileira de Reforma Agrária


 


2. ABONG – Associação Brasileira das ONGs


 


3. APR – Animação Pastoral Rural


 


4. ASPTA – Assessoria e Serviços em Projetos de Tecnologia Alternativa


 


5. ANDES – Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Superior


 


6. COIAB – Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira


 


7. Cáritas Brasileira


 


8. Centro de justiça Global


 


9. CESE – Coordenadoria Ecumênica de Serviço


 


10. CIMI – Conselho Indigenista Missionário


 


11. CMP – Central dos Movimentos Populares


 


12. CNASI – Confederação Nacional das Associações dos Servidores do Incra


 


13. CONDSEF – Confederação Nacional dos Servidores Públicos Federais


 


14. CONIC – Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil


 


15. CONTAG – Confederação dos Trabalhadores na Agricultura


 


16. CPT – Comissão Pastoral da Terra


 


17. CUT – Central Única dos Trabalhadores


 


18. DESER – Departamento de Estudos Sindicais Rurais


 


19. ESPLAR – Escritório de Planejamento Rural


 


20. FASE – Federação de Órgãos de Assistência Social e Educacional


 


21. FASER – Federação das Associações e Sindicatos dos Trabalhadores da Extensão Rural e do Setor Público Agrícola do Brasil


 


22. FEAB – Federação dos Estudantes de Engenharia Agronômica


 


23. FETRAF Brasil – Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar


 


24. FIAN-Brasil – Rede de Informação e Ação pelo Direito a se Alimentar


 


25. FISENGE – Federação Interestadual de Sindicatos de Engenheiros


 


26. IBASE – Instituto de Estudos Sociais e Econômicos


 


27. IBRADES – Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Social


 


28. IDACO – Instituto de Desenvolvimento e Ação comunitária


 


29. IECLB – Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil


 


30. IFAS – Instituto de Formação e Assessoria Sindical


 


31. INESC – Instituto de Estudos Sócio-Econômicos


 


32. MAB – Movimento dos Atingidos pelas Barragens


 


33. MLST – Movimento de Libertação dos Sem-Terra


 


34. MMC – Movimento de Mulheres Camponesas


 


35. MNDH – Movimento Nacional de Direitos Humanos


 


36. MPA – Movimento de Pequenos Agricultores


 


37. MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra


 


38. MTL – Movimento Terra, Trabalho e Liberdade


 


39. Pastorais Sociais da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil)


 


40. PJR – Pastoral da Juventude Rural


 


41. Rede Brasil sobre Instituições Financeiras Multilaterais


 


42. Rede Social de Justiça e Direitos Humanos


 


43. RENAP – Rede Nacional dos Advogados Populares


 


44. SINPAF – Sindicato Nacional dos Trabalhadores de Instituição de Pesquisa e Desenvolvimento Agropecuário


 


45.  TERRA DE DIREITOS


 

Fonte: Cimi
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