21/10/2004

Informe nº 636

EXPANSÃO DA MONOCULTURA DE EUCALIPTOS EM TERRA INDÍGENA GERA PROTESTOS


 


No período em que o Brasil era uma colônia de Portugal, a monocultura para exportação foi um dos vetores de desenvolvimento da economia nacional. 504 anos depois, o projeto de desenvolvimento do País continua baseado na produção para exportação. A cana-de-açúcar foi substituída principalmente pela soja, grande mercadoria do agronegócio que tem sido celebrado pelo governo como solução para a economia nacional, e pelo eucalipto, matéria prima para a produção industrial de papel e celulose.


 


O avanço da monocultura sobre terras indígenas continua sendo tema de disputa entre estes povos e os invasores de suas terras. Ainda hoje, são raros os casos em que a expansão de monoculturas acontece sem afetar profundamente os indígenas, suas terras tradicionais e o meio ambiente.


 


No extremo sul da Bahia, muito perto de onde os primeiros colonizadores portugueses chegaram, cerca de 300 indígenas que participaram de um seminário sobre os impactos de monoculturas em suas comunidades bloquearam um trecho da rodovia BR-101. O protesto tinha como objetivo pressionar a empresa Veracel Celulose a deixar de plantar eucalipto em terras tradicionalmente ocupadas pelos Pataxó.


 


A estrada foi liberada na manhã de ontem (dia 20) para o trânsito de carros, mas os caminhões de eucalipto permaneceram retidos. Uma comissão de indígenas chega hoje a Brasília para reuniões já agendadas com o Ministério do Meio Ambiente, Ministério Público e com a Advocacia Geral da União. A comissão tinha informações de que havia uma reunião agendada com o presidente do órgão indigenista oficial, a Funai, mas o encontro não foi confirmado pela assessoria de Gomes. “Enquanto perdurar essa situação, a Funai não receberá os índios. A Funai não aceita mais esse tipo de pressão”, afirma a assessoria, referindo-se ao bloqueio da estrada.


 


Parte da terra reivindicada pelo povo Pataxó do extremo sul da Bahia está sendo usada pela empresa Veracel Celulose para o plantio de eucalipto. A Veracel Celulose é uma das empresas da Aracruz Celulose, líder mundial na produção de celulose branqueada de eucalipto. A terceira fábrica da Aracruz no Brasil está sendo construída em Eunápolis, no sul da Bahia. A empresa tem plantações nos estados do Espírito Santo, Bahia, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, com aproximadamente 247 mil hectares de plantios de eucalipto, e exporta a maior parte do que produz no Brasil.


 


De acordo com denúncias feitas pelos índios, as empresas ferem a legislação ambiental plantando eucaliptos nos limites das unidades de conservação, destruindo plantas nativas, coqueirais, mudando o relevo da terra e atingindo as fontes de água.


 


É justamente a demora no processo de demarcação das terras indígenas que possibilita a existência de plantações de eucalipto em terras tradicionais e leva a retomadas e a situações de tensão e violência.


 


Por isso, a comissão indígena que vem a Brasília solicita das autoridades a suspensão do plantio de eucalipto em terras tradicionalmente ocupadas e reivindicadas pelos Pataxó, o andamento do processo de demarcação desta terra e a suspensão das quase 30 liminares para a retirada de Pataxó e Pataxó Hã-Hã-Hãe de fazendas retomadas no sul da Bahia. 


 


JUSTIÇA FEDERAL CONDENA CIR A MULTA DIÁRIA DE R$  10 MIL. COMUNIDADES DECLARARAM QUE NÃO VÃO SAIR DA TERRA ANCESTRAL


 


Expira hoje (dia 21) o prazo dado pela Justiça Federal para a retirada espontânea das comunidades indígenas Homologação, Jawarizinho e São Francisco da terra indígena Raposa/Serra do Sol.  Caso a sentença não seja cumprida, o Conselho Indígena de Roraima (CIR) deverá pagar multa diária de R$  10 mil e os indígenas poderão ser retirados compulsoriamente, inclusive com uso de força policial.


 


Preocupado com possibilidade iminente de conflito na região, Noberto Cruz da Silva, vice-coordenador do CIR, encaminhou, no dia 19 de outubro, carta orientando os tuxauas (denominação dada aos chefes dos povos no norte do país) sobre a decisão do Juiz Helder Girão Barreto. Ele pede que os índios aceitem a sentença, concedida em caráter liminar.


 


“O CIR entende que a referida decisão, mesmo contrariando os direitos originários dos povos indígenas e seus interesses, precisa ser respeitada”, cita a carta assinada pelo vice-coordenador. O documento diz, também, que o CIR não substitui e nem tem responsabilidade  pelas decisões e ações das comunidades.


 


“Não viemos de fora e daqui não vamos sair”, disse o líder Nelino Galé, ao receber a carta das mãos da liderança do CIR, Júlio José de Souza.  Galé explicou que a comunidade Homologação está a quatro quilômetros da sede e a mais de 100 metros da cerca da fazenda Recife, para qual a Justiça concedeu reintegração de posse.


 


“O problema é que o Juiz nunca veio aqui, ele não conhece a nossa realidade e acredita em tudo que dizem os arrozeiros”, protestou Nelino Galé.  Ao receberem o documento, os tuxauas das três comunidades declararam unânimes que não vão sair da terra habitada desde tempos ancestrais.


 


Júlio Macuxi insistiu que o Conselho Indígena de Roraima já recorreu da decisão, mas enquanto o agravo não for julgado deverá ser cumprida a liminar.  “A organização está preocupada também com a segurança das comunidades, já que a Polícia Federal poderá receber ordens para retira-las à força”, avisou.


 


Mais uma vez, o Conselho Indígena de Roraima alerta as autoridades para iminência de conflito na terra indígena Raposa/Serra do Sol decorrente da demora na homologação pelo presidente Lula da Silva. A organização responsabiliza o Governo Federal por qualquer ato violento contra os indígenas ameaçados de serem expulsos da própria terra.


 


Índios Macuxi, Wapichana, Ingarikó, Taurepang e Patamona de Raposa/Serra do Sol foram convocados pelas comunidades Homologação, Jawarizinho e São Francisco para resistirem à reintegração de posse. A partir de hoje, os tuxauas esperam a chegada de dois mil indígenas.


 


Brasília, 21 de outubro de 2004.


 

Fonte: Cimi – Assessoria de Imprensa
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