Informe nº 633
TERRA, SAÚDE, EDUCAÇÃO E PRODUÇÃO AGRÍCOLA DISCUTIDOS PELOS
“Nosso Seminário foi marcado pela presença maciça da comunidade e uma enorme vontade de encontrar soluções para os problemas que enfrentamos no nosso dia-a-dia, tendo como objetivo maior discutir as várias políticas públicas e governamentais que atingem o nosso povo e os parentes presentes no Seminário. Queremos construir ações e atividades que tragam melhorias concretas para toda a comunidade”, diz o documento final do seminário Pataxó Hã-Hã-Hãe: discutindo o presente para proteger o nosso futuro, que reuniu cerca de 400 pessoas na aldeia Caramuru, na Bahia, de 22 a 24 de setembro.
As discussões foram realizadas em oficinas divididas entre os temas terra, saúde, educação e produção, e reuniram os três caciques do povo.
Os indígenas mantêm como sua principal bandeira a reconquista de seu território e reafirmaram no Seminário a responsabilidade e o compromisso das comunidades em participar da luta pela terra. Decidiram pela “articulação com os parentes do sul, extremo sul e baixo sul da Bahia para o desenvolvimento de ações que visem a conquista e a garantia de nossos territórios” e pela criação de “um meio de comunicação entre as aldeias para melhor relacionamento entre as comunidades”.
A terra indígena deste povo está demarcada, mas os fazendeiros que vivem ali ainda não foram retirados. Para a homologação da terra indígena, o povo aguarda a conclusão de um processo sobre a validade de títulos de posse das terras que foram concedidos pelo estado da Bahia aos fazendeiros que hoje estão na área. O processo tramita no Supremo Tribunal Federal há 22 anos.
A discussão sobre a produção de alimentos é mais recente. “Os Pataxó Hã-Hã-Hãe conseguiram, com as retomadas, reaver 16.000 hectares de suas terras. Agora pensam em como elas devem ser melhor utilizadas para a sustentação do grupo”, conta Eduardo de Oliveira, da equipe do Cimi em Itabuna, sul da Bahia.
O grupo que debateu educação buscou ampliar a relação da comunidade com a vida da escola. Margarida Pataxó Hã-Hã-Hãe, da organização do Seminário, conta que eles tentaram “mostrar que a escola é uma extensão da vida. A comunidade precisa participar da vida na escola. E os pais precisam participar diretamente da educação dos filhos”. Na terra indígena Caramuru/ Catarina Paraguassú, há uma escola com seis salas de aula e mais seis salas espalhadas. Todos os professores são indígenas.
Decidiu-se também “potencializar a utilização dos meios de comunicação existentes nas aldeias, tais como internet, rádio comunitária e outros” e por “uma maior participação do colégio na luta pela terra”.
Na oficina sobre saúde, o tema principal foi a valorização da medicina tradicional dos Pataxó Hã-Hã-Hãe. “Aqui, a Fundação Nacional de Saúde (Funasa) tem feito um trabalho contra o que deseja o povo indígena . Os membros estão usando muito remédio de farmácia. Queríamos tentar trazer a Funasa para apoiar esse nosso trabalho, mas eles só estiveram presentes em um dos dias”, conta Margarida, que acredita que a ausência dos representantes do poder público convidados foi “um desfalque para o Seminário”.
Além dos Pataxó Hã-Hã-Hãe, estiveram no Seminário o Cimi, outras organizações indigenistas e representantes do povo Tupinambá de Serra do Padeiro.
MINISTROS APRESENTAM PROJETO DE INTEGRAÇÃO DO RIO SÃO FRANCISCO
A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, e o ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes, apresentaram na noite de ontem (29) o plano de integração de bacias do Rio São Francisco à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).
O governo federal prevê cerca de R$1 bilhão para o projeto no orçamento de 2005. A verba deve ainda ser aprovada pelo Congresso Nacional. Para que seja executado, o projeto depende também do licenciamento ambiental, que precisa ser aprovado pelo Ministério do Meio Ambiente. Em outubro, acontecerão nove audiências públicas, convocadas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) nos estados afetados pelo projeto.
Os ministros afirmaram que o projeto não é apenas de transposição do rio São Francisco, como nos planos apresentados em governos anteriores, mas um esforço amplo pela segurança hídrica da região do semi-árido, que incluiria planos de revitalização do rio, combate à desertificação, suprimento de água para a população e um programa de integração das bacias hidrográficas.
Em um breve período de perguntas, os bispos colocaram questões sobre o quanto grandes obras realmente atendem às necessidades das populações nordestinas e contestaram a necessidade de repetição de um modelo de grandes projetos que, no Brasil, tem historicamente atendido aos interesses do latifúndio e não das populações carentes. A CNBB tem trabalhado no apoio a soluções para a falta de água como projetos de retenção da água das chuvas, apontadas como saídas baratas e viáveis, em uma lógica de convivência adequada das populações com o ambiente em que vivem, o semi-árido.
Em relação aos povos indígenas, o Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) do “Projeto de Integração do Rio São Francisco com Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional” prevê interferências sobre as terras dos povos indígenas Truká, Pipipã e Kambiwá, todos no estado de Pernambuco.
Estudos do Cimi demonstram, entretanto, que poderão ser afetados pelas obras pelo menos 18 povos que vivem nas margens do rio São Francisco nos estados da Bahia, Alagoas, Sergipe e Pernambuco.
Ao longo do rio, há duas grandes ilhas – a de Assunção, em Cabrobó, Pernambuco, e a de São Pedro, no Sergipe – e cerca de 65 pequenas ilhas habitadas ou ocupadas por povos indígenas, além de populações quilombolas.
Brasília, 30 de setembro de 2004