10/08/2004

Rigoberta Menchú escreve à ONU no Dia Internacional dos Povos Indígenas

Da cidade da Guatemala, no Dia Internacional dos Povos Indígenas e a poucos meses da conclusão do Decênio Internacional dos Povos Indígenas, a Prêmio Nobel da Paz, Rigoberta Menchú Tum, fez um pronunciamento dirigido ao secretário general da ONU, Kofi Annan. “As condições às quais se enfrentam os povos indígenas não admitem postergações, pois, do contrário, continuarão engrossando as fileiras dos mais desprotegidos, dos mais excluídos e dos mais esquecidos”, enfatizou. Abaixo a íntegra da carta:


“Senhor Secretário Geral da Organização das Nações Unidas, Kofi Annan


Dirijo-me ao Senhor, pela passagem do Dia Internacional dos Povos Indígenas, ocasião que também aproveito para saudar e estender um reconhecimento, por seu intermédio, a minhas irmãs e irmãos indígenas de todo o mundo.


A poucos meses de que seja concluído oficialmente o Decênio Internacional dos Povos Indígenas, iniciado em 1994, celebramos um novo Dia Internacional dos Povos Indígenas. A data chega em momentos em que estes Povos do mundo enfrentam-se a uma grave situação de marginalização, discriminação e desigualdade, que ainda com os avanços recentes não se tem conseguido superar.


O Decênio deu à comunidade internacional a oportunidade de reconhecer, não só formalmente, os direitos dos Povos Indígenas, mas também de atuar. Ao estabelecer a Década, os Estados membros da ONU assumiram um compromisso que não se constata na atuação particular de cada um desses Estados em relação aos Povos Indígenas. Por isso, lamento a falta de vontade política de cumprir com os propósitos do Decênio.


Essa ausência de vontade política toma uma forma muito mais concreta na incapacidade de lograr um consenso no seio das Nações Unidas para aprovar a Declaração Universal dos Direitos dos Povos Indígenas, atitude que não é coerente com a postura adotada frente à criação do Decênio.


Apesar dos importantes esforços que temos testemunhado, as comunidades indígenas continuam entre as mais pobres e as mais marginalizadas do mundo. Este fenômeno evidencia que os objetivos desejados no início do Decênio não serão alcançados.


Ante isto, a ONU está na posição de levar a cabo uma avaliação exaustiva do que realmente tem significado o Decênio para os Povos Indígenas enquanto que a marginalização, a exclusão da vida política, social, econômica e cultural e o desprezo às mulheres e aos homens indígenas continuam em muitas regiões do mundo. Com uma ação desta natureza, a ONU dar-se-ia uma nova oportunidade e, com isso, contribuiria a redefinir a agenda relativa aos Povos Indígenas tanto no plano internacional como no dos estados nacionais. O desenvolvimento deste repasse tem um caráter urgente, posto que o Decênio não teve uma incidência clara e direta na vida dos Povos Indígenas.


Para o efeito, Senhor Secretário, proponho-me a apoiar-lhe nos esforços de diálogo e convocatória aos mais prestigiosos dirigentes e personalidades indígenas e suas organizações, incluindo à Iniciativa Indígena pela Paz. As condições às quais se enfrentam os povos indígenas não admitem postergações, pois, do contrário, continuarão engrossando as fileiras dos mais desprotegidos, dos mais excluídos e dos mais esquecidos.


Respeitosamente,


Rigoberta Menchú Tum


Prêmio Nobel da Paz”

Fonte: ALAI
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