20/07/2004

Ministro da Justiça e Presidente da Funai comemoram redução da T.I. Baú

 


Como não bastasse ter no ano passado determinado a redução dos limites da T.I. Baú (PA), cedendo às pressões dos invasores, o Ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos participou, no Pará, das comemorações pela redução da Terra Indígena. O evento, divulgado na noite de 15 de julho, em reportagem do Jornal Nacional, da Rede Globo, contou também com a participação do antropólogo Mércio Gomes, presidente da Fundação Nacional do Índio – Funai.


Em outubro do ano passado o Ministro já havia causado surpresa e indignação ao ceder às intimidações dos invasores da área, que durante dias haviam submetido a comunidade Kayapó e os técnicos da Funai que realizavam os trabalhos de demarcação da terra indígena,  a um clima de terror, onde não faltaram ameaças e até mesmo supressão de seus direitos constitucionais de ir e vir, fatos esses amplamente divulgados pela imprensa: “Fazendeiros tentam barrar demarcação no Pará” (O Estado de São Paulo – SP, 08.09.03, p. A-7);  Demarcação de terra gera tensão. Rodovia Santarém-Cuiabá foi fechada, comércio da cidade de Novo Progresso parou e homens armados ameaçaram retirar à bala técnicos da Funai.” (Jornal do Commércio, Recife/PE, 18.09.03, pág. Brasil – 06); “Protesto armado contra índios” (Estado de Minas, BH/MG, pág. Brasil – 11); “Tensão no Pará – Confronto Iminente em terra Indígena” (Correio Braziliense, Brasília – DF, 18.09.03).


A chamada “Terra do Meio”, região onde se localiza a T.I. Baú, vem sendo objeto de várias denúncias como pólo de exploração madeireira e pecuária, inclusive para exportação, sustentado às custas de trabalho escravo. Segundo a Folha On Line de ontem, 19 de julho, na última quinta-feira 15, cerca de 70 trabalhadores haviam sido resgatados de uma fazenda na região, que estava sendo desmatada para fins de formação de pastagem e criação de gado.


Relatório do Greenpeace intitulado “Pará, Estado de Conflito” informa com relação a “Terra do Meio” que “madeireiros e fazendeiros ilegais se tornaram a única força econômica significativa na região e muitos habitantes locais se tornaram dependentes dessas indústrias, lutando junto com eles contra o governo”. As pressões pela redução da T.I. Baú vieram, exatamente, neste contexto de violação de direitos humanos, de ilegalidade e de depredação ambiental.


Sucumbindo às pressões o Ministro revogou a Portaria Declaratória n.° 645/91, substituindo-a pela de n.° 1.487, de 8.10.2003, na qual exclui dos limites da terra a ser demarcada 306 mil e 540 ha, cuja ocupação é comprovadamente tradicional indígena.


O precedente negativo representado pela medida logo gerou, nos jornais, manchetes do tipo: “Ficou mais fácil: Ministério da Justiça reduz área indígena no Pará” (Rondôniaagora.com – Porto Velho, 14.10.03)  Terra indígena é reduzida no Pará e decisão é exemplo para Roraima” (Folha de Boa Vista – RR, 24.11.03, p. 3); ”Outra área pode ser reduzida no PA” (Folha de São Paulo, SP – 17.10.03: “Depois de reduzir a Terra Indígena Baú, o Governo Federal vai receber pedido de fazendeiros e parlamentares petistas para  rever os limites de outra área indígena, a Cachoeira Seca, em Uruará – PA…”).


A situação levou o Ministério Público Federal a ajuizar, perante a Seção Judiciária Federal em Brasília – DF, a Ação Civil Pública n.° 2004.34.00.011776-6 contra a União e a Funai, apontando a ilegalidade da redução da terra indígena e a obrigação de que seja demarcada conforme os limites tradicionalmente ocupados, como manda a Constituição Federal.


Agora, o Ministro da Justiça e o presidente do órgão indigenista oficial viajaram ao local e participaram, pessoalmente, dos festejos pela redução da T.I.  Neste mesmo dia o “site” da Funai na Internet anunciou: “Brasil mostra ao mundo sua política indigenista”.


Conforme o “site” o presidente da Funai deverá estar participando, nestes dias 18 a 23, em Genebra, Suíça, da 22ª Sessão do Grupo de Trabalho sobre Populações Indígenas, que tem como temática “Povos indígenas e a resolução de conflitos”.
Segue a matéria dizendo que “a política indigenista brasileira está chamando a atenção de outros países”, e que, segundo Mércio Gomes, “é o momento de inserirmos com mais ênfase a política indigenista brasileira no cenário internacional”.


A julgar pela disposição do Ministro e do Presidente da Funai em festejar, na aldeia Kayapó, a redução da T.I. Baú, não é difícil concluir que a política indigenista brasileira à qual o presidente do órgão tenha se referido, e que certamente está levando como modelo para “o cenário internacional” seja uma pretensa “solução de conflitos” via redução de direitos indígenas, via redução de terras indígenas, através da legitimação de ameaças e chantagens, através da violação da Constituição Federal.


O Conselho Indigenista Missionário vem externar sua indignação com mais este episódio deplorável, que exemplifica a triste opção do governo Lula por uma política indigenista calcada no progressivo esmagamento dos direitos dos povos indígenas em benefício de uma relação utilitária com interesses políticos e econômicos, que além do mais sempre se locupletaram imoral e ilicitamente das terras indígenas e de seus recursos naturais. Um mau exemplo a ser mostrado ao mundo.


Brasília – DF,  20 de julho de 2004.


Cimi  – Conselho Indigenista Missionário

Fonte: Cimi
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