Resolução CEB n.º 3, de 10 de novembro de 1999
Fixa Diretrizes Nacionais para o funcionamento das escolas indígenas e dá outras providências.
O PRESIDENTE DA CÂMARA DE EDUCAÇÃO BÁSICA DO CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO, no uso de suas atribuições regimentais e com base nos artigos 210, § 2º, e 231, caput, da Constituição Federal, nos arts. 78 e 79 da Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996, na Lei 9.131, de 25 de novembro de 1995, e ainda no Parecer CEB 14/99, homologado pelo Senhor Ministro de Estado da Educação, em 18 de outubro de 1999,
RESOLVE:
Art. 1.º. Estabelecer, no âmbito da educação básica, a estrutura e o funcionamento das Escolas Indígenas, reconhecendo-lhes a condição de escolas com normas e ordenamento jurídico próprios, e fixando as diretrizes curriculares do ensino intercultural e bilíngüe, visando à valorização plena das culturas dos povos indígenas e à afirmação e manutenção de sua diversidade étnica.
Art. 2.º. Constituirão elementos básicos para a organização, a estrutura e o funcionamento da escola indígena:
I – sua localização em terras habitadas por comunidades indígenas, ainda que se estendam por territórios de diversos Estados ou Municípios contíguos;
II – exclusividade de atendimento a comunidades indígenas;
III – o ensino ministrado nas línguas maternas das comunidades atendidas, como uma das formas de preservação da realidade sociolingüística de cada povo;
IV – a organização escolar própria.
Parágrafo Único. A escola indígena será criada em atendimento à reivindicação ou por iniciativa de comunidade interessada, ou com a anuência da mesma, respeitadas suas formas de representação.
Art. 3.º. Na organização de escola indígena deverá ser considerada a participação da comunidade, na definição do modelo de organização e gestão, bem como:
suas estruturas sociais;
suas práticas sócio-culturais e religiosas;
suas formas de produção de conhecimento, processos próprios e métodos de ensino-aprendizagem;
suas atividades econômicas;
a necessidade de edificação de escolas que atendam aos interesses das comunidades indígenas;
o uso de materiais didático-pedagógicos produzidos de acordo com o contexto sócio-cultural de cada povo indígena.
Art. 4.º As escolas indígenas, respeitados os preceitos constitucionais e legais que fundamentam a sua instituição e normas específicas de funcionamento, editadas pela União e pelos Estados, desenvolverão suas atividades de acordo com o proposto nos respectivos projetos pedagógicos e regimentos escolares com as seguintes prerrogativas:
I – organização das atividades escolares, independentes do ano civil, respeitado o fluxo das atividades econômicas, sociais, culturais e religiosas;
II – duração diversificada dos períodos escolares, ajustando-a às condições e especificidades próprias de cada comunidade.
Art. 5.º A formulação do projeto pedagógico próprio, por escola ou por povo indígena, terá por base:
I – as Diretrizes Curriculares Nacionais referentes a cada etapa da educação básica;
II – as características próprias das escolas indígenas, em respeito à especificidade étnico-cultural de cada povo ou comunidade;
III – as realidades sociolíngüística, em cada situação;
IV – os conteúdos curriculares especificamente indígenas e os modos próprios de constituição do saber e da cultura indígena;
V – a participação da respectiva comunidade ou povo indígena.
Art. 6.º. A formação dos professores das escolas indígena será específica, orientar-se-á pelas Diretrizes Curriculares Nacionais e será desenvolvida no âmbito das instituições formadoras de professores.
Parágrafo único. Será garantida aos professores indígenas a sua formação em serviço e, quando for o caso, concomitantemente com a sua própria escolarização.
Art. 7.º Os cursos de formação de professores indígenas darão ênfase à constituição de competências referenciadas em conhecimentos, valores, habilidades, e atitudes, na elaboração, no desenvolvimento e na avaliação de currículos e programas próprios, na produção de material didático e na utilização de metodologias adequadas de ensino e pesquisa.
Art. 8.º A atividade docente na escola indígena será exercida prioritariamente por professores indígenas oriundos da respectiva etnia.
Art. 9.º São definidas, no plano institucional, administrativo e organizacional, as seguintes esferas de competência, em regime de colaboração:
I – à União caberá legislar, em âmbito nacional, sobre as diretrizes e bases da educação nacional e, em especial:
a) legislar privativamente sobre a educação escolar indígena;
b) definir diretrizes e políticas nacionais para a educação escolar indígena;
c) apoiar técnica e financeiramente os sistemas de ensino no provimento dos programas de educação intercultural das comunidades indígenas, no desenvolvimento de programas integrados de ensino e pesquisa, com a participação dessas comunidades para o acompanhamento e a avaliação dos respectivos programas;
d) apoiar técnica e financeiramente os sistemas de ensino na formação de professores indígenas e do pessoal técnico especializado;
e) criar ou redefinir programas de auxílio ao desenvolvimento da educação, de modo a atender às necessidades escolares indígenas;
f) orientar, acompanhar e avaliar o desenvolvimento de ações na área da formação inicial e continuada de professores indígenas;
g) elaborar e publicar, sistematicamente, material didático específico e diferenciado, destinado às escolas indígenas.
II – aos Estados competirá:
-
responsabilizar-se pela oferta e execução da educação escolar indígena, diretamente ou por meio de regime de colaboração com seus municípios;
-
regulamentar administrativamente as escolas indígenas, nos respectivos Estados, integrando-as como unidades próprias, autônomas e específicas no sistema estadual;
-
prover as escolas indígenas de recursos humanos, materiais e financeiros, para o seu pleno funcionamento;
-
instituir e regulamentar a profissionalização e o reconhecimento público do magistério indígena, a ser admitido mediante concurso público específico;
-
promover a formação inicial e continuada de professores indígenas.
-
elaborar e publicar sistematicamente material didático, específico e diferenciado, para uso nas escolas indígenas.
III – aos Conselhos Estaduais de Educação competirá:
-
estabelecer critérios específicos para criação e regularização das escolas indígenas e dos cursos de formação de professores indígenas;
-
autorizar o funcionamento das escolas indígenas, bem como reconhecê-las;
-
regularizar a vida escolar dos alunos indígenas, quando for o caso.
§ 1.º Os Municípios poderão oferecer educação escolar indígena, em regime de colaboração com os respectivos Estados, desde que se tenham constituído em sistemas de educação próprios, disponham de condições técnicas e financeiras adequadas e contem com a anuência das comunidades indígenas interessadas.
§ 2.º As escolas indígenas, atualmente mantidas por municípios que não satisfaçam as exigências do parágrafo anterior passarão, no prazo máximo de três anos, à responsabilidade dos Estados, ouvidas as comunidades interessadas.
Art. 10. O planejamento da educação escolar indígena, em cada sistema de ensino, deve contar com a participação de representantes de professores indígenas, de organizações indígenas e de apoio aos índios, de universidades e órgãos governamentais.
Art. 11. Aplicam-se às escolas indígenas os recursos destinados ao financiamento público da educação.
Parágrafo Único. As necessidades específicas das escolas indígenas serão contempladas por custeios diferenciados na alocação de recursos a que se referem os artigos 2º e 13º da Lei 9424/96.
Art. 12. Professor de escola indígena que não satisfaça as exigências desta Resolução terá garantida a continuidade do exercício do magistério pelo prazo de três anos, exceção feita ao professor indígena, até que possua a formação requerida.
Art. 13. A educação infantil será ofertada quando houver demanda da comunidade indígena interessada.
Art. 14. Os casos omissos serão resolvidos:
I – pelo Conselho Nacional de Educação, quando a matéria estiver vinculada à competência da União;
II – pelos Conselhos Estaduais de Educação.
Art. 15. Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 16. Ficam revogadas as disposições em contrário.
ULYSSES DE OLIVEIRA PANISSET
Presidente da Câmara de Educação Básica
(Publicação: DOU, 13 de abril de 1999. Seção 1, p. 18.)