Mensagem da XVI Assembléia Geral do Cimi, realizada em julho 2005
Reunidos na XVI Assembléia Geral do Conselho Indigenista Missionário, analisamos a conjuntura brasileira atual vemos com indignação a violência contra os povos indígenas que cresce de forma generalizada e assustadora em todo o país, num nível somente comparável ao período da ditadura militar (1964-1985). Junto com esta violência cresce também a impunidade dos invasores, em sua maioria latifundiários ligados ao agronegócio, responsáveis por muitos assassinatos e agressões aos povos, comunidades e lideranças indígenas, ameaçando inclusive, de extinção vários povos na Amazônia sem contato com sociedade regional. O fato absurdo é que as vítimas da violência são criminalizadas e perseguidas, inclusive pelo aparato policial. Nos últimos dois meses foram assassinados Adenilson dos Santos e seu filho, Jorge dos Santos, do povo Truká (PE); Aurivan dos Santos, o cacique Truká, ao depor como testemunha do assassinato daquele seu irmão e de seu sobrinho, foi preso pela polícia pernambucana. Foram também assassinados os caciques João Araújo Guajajara (MA) e Dorival Benitez Guarani (MS). Nestes primeiros seis meses já foram assassinados 23 indígenas. A política indigenista atualmente em curso se caracteriza pelo retorno à antiga tutela, ao confinamento, à segregação e submissão das comunidades indígenas. Os descalabros da atual política indigenista se manifestam também na paralisação das demarcações de terra e no desrespeito generalizado aos direitos constitucionais dos povos indígenas. O povo Krahô-Kanela expropriado de suas terras e jogado na Casa do Índio de Gurupi/TO é um dos muitos exemplos desse descaso. Ao descalabro do executivo junta-se o Judiciário quando se trata de proteger supostos direitos dos agressores dos povos indígenas, como acabamos de testemunhar no caso da suspensão temporária, através de liminar, da homologação da demarcação da Terra Indígena Nhaderu Marangatu, no MS. Os entraves verificados nos processos administrativos para a demarcação das terras indígenas coincidem, na maioria dos casos, com a pressão da base parlamentar e política de sustentação do poder executivo federal no Congresso Nacional. Os fatos revelam as pressões de articulação de forças políticas e econômicas antiindígenas, notadamente nos estados de SC, MS, MT, RO, AC, AM, RR, PA, TO, com fortes pressões sobre o Poder Judiciário e com intensa atuação no Congresso Nacional, onde atualmente circulam mais de 50 proposições de projetos de lei com o objetivo claro de anular direitos indígenas reconhecidos na Constituição de 1988. A partir da nossa compreensão da atual conjuntura, concluímos que violência, impunidade, corrupção e autoritarismo fazem parte de um mesmo processo, intrinsecamente vinculado ao sistema capitalista neoliberal que penaliza a sociedade brasileira como um todo e, particularmente, os setores populares e os povos indígenas. Os desafios da conjuntura brasileira se manifestam de forma similar em diversos países do continente latino-americano: o povo organizado e mobilizado, com forte participação indígena, cansado de décadas de abuso governamental, vem ocupando ruas e praças, estradas e instituições públicas, protestando, exigindo direitos, depondo presidentes da República coniventes ou cúmplices da desagregação ética, moral, social e política. Identificamos no momento atual, sinais de esperança que revigoram e intensificam nosso trabalho junto aos povos indígenas: a ampliação e o aprofundamento das alianças das Comunidades Eclesiais de Base (CEB’s) com os povos indígenas; a conquista da homologação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol pelos povos indígenas de Roraima; o inequívoco ascenso das lutas populares e indígenas, em todo o Brasil e em toda a América Latina. Os povos indígenas no Brasil, em sua trajetória milenar, e seus aliados, os movimentos sociais do campo e da cidade, sabem hoje que o projeto histórico popular é muito maior do que aqueles que o traem e deturpam, deslumbrados com o poder das elites que sempre, com base na força e na cooptação, governaram este país. Os povos indígenas têm muito a contribuir, a partir de suas formas de sociedade e concepções de poder, com a construção deste projeto de transformação e superação do modelo capitalista. Fortalecidos na nossa Fé e na nossa Esperança; renovados em nosso compromisso com os povos indígenas; dispostos a construir e confirmar nossas alianças com todos os setores populares que lutam por uma sociedade justa, plural e fraterna, no Brasil e na América Latina, enviamos ao povo brasileiro esta nossa Mensagem, convidando a todos para retomarmos com vigor a grande tarefa coletiva da transformação social, guiados pelo lema da nossa XVI Assembléia Geral: “A força dos pequenos é luz para o mundo”. Luziânia (GO), 29 de julho de 2005.