• 31/03/2011

    Manifesto da bancada indígena e indigenista

    16ª. Reunião Ordinária da Comissão Nacional de Política Indigenista – CNPI

     

    Manifesto da bancada indígena e indigenista

     

    À Excelentíssima

    Senhora Dilma Roussef

    Presidente da República Federativa do Brasil

     

    Ao Excelentíssimo

    Senhor José Eduardo Cardozo

    Ministro de Estado da Justiça

     

    Nós lideranças indígenas membros da bancada indígena e indigenista reunidos em Brasília, por ocasião da 16ª. Reunião Ordinária da Comissão Nacional de Política Indigenista – CNPI, considerando a continuidade desta Comissão sob responsabilidade do Governo da Presidente Dilma Roussef, depois de mais de 4 anos de funcionamento, preocupados com a manutenção de um quadro de desrespeito e violação aos direitos dos povos indígenas, e cientes da nossa responsabilidade de zelar por esses direitos nesta instância de diálogo e negociação com o Estado brasileiro, viemos por meio desta apresentar à vossas excelências as seguintes manifestações.

     

    Mesmo reconhecendo os avanços que implicaram na criação da CNPI e alguns feitos como as consultas que possibilitaram discutir propostas para o novo Estatuto, a elaboração do Projeto de Lei do Conselho de Política Indigenista e a construção de uma proposta de Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental das Terras Indígenas (PNGATI), o Estado Brasileiro durante o mandato do Governo Lula não atendeu a contento as demandas e perspectivas do movimento indígena, permitindo que as políticas voltadas aos povos indígenas continuem precárias ou nulas, ameaçando a continuidade física e cultural desses povos, tal como nos casos dos Guarani Kaiowá em Mato Grosso do Sul e dos povos do Vale do Javari no Amazonas, expressões do descaso e da omissão do Estado.

     

    Diante deste quadro, reivindicamos do Governo da Presidente Dilma Roussef comprometimento no atendimento das seguintes demandas:

     

    1. Criação, na Câmara dos Deputados, da Comissão Especial para analisar o PL 2057/91, considerando as propostas encaminhadas pela CNPI, após discussões nas distintas regiões do país, visando a tramitação e aprovação do novo Estatuto dos Povos Indígenas. Dessa forma, todas questões de interesse dos nossos povos serão tratadas dentro desta proposta, evitando ser retalhadas por meio de distintas iniciativas legislativas que buscam reverter os avanços assegurados pela Constituição Federal de 1988.

     

    2. Que o Governo redobre esforços na tramitação e aprovação do Projeto de Lei 3.571/2008 que cria o Conselho Nacional de Política Indigenista, instância deliberativa, normativa e articuladora de todas as políticas e ações atualmente dispersas nos distintos órgãos de Governo.

     

    3. Que a CNPI apóie a mobilização de nossos representantes junto ao Congresso Nacional para assegurar o andamento destas iniciativas e outras matérias de interesse dos nossos povos, conforme discutido na 15ª. Reunião Ordinária desta Comissão.

    4. Que Governo da Presidente Dilma agilize a assinatura do Decreto de criação da Política Nacional de Gestão Ambiental e Territorial de Terras Indígenas, e a sua devida implementação, para assegurar as condições de sustentabilidade dos nossos povos e territórios.

    5. Que o Executivo, por meio do órgão responsável, a Funai, cumpra com máxima celeridade a sua obrigação de demarcar, proteger e desintrusar todas terras indígenas priorizando com urgência os casos críticos dos povos indígenas de Mato Grosso do Sul, principalmente os Guarani Kaiowá, e do Povo Tupinambá de Olivença, no sul da Bahia, não descartando a fragilidade em que se encontram tantos outros povos e terras em todo o país.

     

    A agilidade na conclusão das distintas fases do procedimento de demarcação é necessária para diminuir a crescente judicialização que vem retardando a efetividade das demarcações concluídas pelo Executivo, vulnerabilizando as comunidades frente à violência de grupos contrários ao reconhecimento das terras indígenas e à sua proteção pela União.

     

    6. Que as lutas dos nossos povos pelos seus direitos territoriais não sejam criminalizadas, a exemplo do que vem ocorrendo com nossos líderes na Bahia, Pernambuco e Mato Grosso do Sul, que são perseguidos e criminalizados na maioria das vezes por agentes do poder público que deveriam exercer a função de proteger e zelar pelos direitos indígenas. Reivindicamos ainda que sejam punidos os mandantes e executores de crimes cometidos contra os nossos povos e comunidades.

     

    7. Reivindicamos do excelentíssimo Senhor Ministro da Justiça uma reunião de trabalho com as nossas lideranças que compõem a CNPI e os dirigentes das nossas organizações regionais, que fazem parte da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), para tratar destas e de outras demandas dos nossos povos e organizações.

     

    8. – Que o Governo garanta os recursos financeiros suficientes para a implementação da Secretaria Especial de Saúde Indígena e efetivação da autonomia política, financeira e administrativa dos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI`s), com a participação plena e controle social efetivo dos nossos povos e organizações nos distintos âmbitos, local e nacional, evitando a reprodução de práticas de corrupção, apadrinhamentos políticos, e o agravamento da situação de abandono e desassistência em que estão muitos povos e comunidades indígenas.

     

    9. Demandamos da presidência da CNPI a convocação do Ministro da Saúde, Senhor Alexandre Padilha, para que compareça ao plenário desta Comissão, a fim de informar e fazer esclarecimentos a respeito da situação e das perspectivas da implementação da Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI), conforme o Termo de Pactuação acordado entre o Ministério da Saúde, a Funasa, trabalhadores da saúde e representantes dos nossos povos no final do ano de 2010.

     

    10. Que a Funai conclua o processo de reestruturação, garantidos os recursos financeiros e humanos, para superar a situação de falta de direção e descontentamento que está generalizando-se nas distintas regiões do país, assegurando de fato a participação das organizações e lideranças indígenas no processo de discussão dos ajustes ao Decreto, na formulação do regimento interno da Funai, na composição e localização das coordenações regionais e coordenações técnicas locais, e em todo o processo de implementação e controle social da reestruturação.

    Que os Seminários sobre a reestruturação não sejam simples repasses de informações ou de esclarecimentos, muito menos de anuência dos nossos povos às propostas da Funai,  mas que possibilitem o levantamento das reais demandas para ajustar a reestruturação às realidades de cada povo ou região.

     

    11. Que o Governo da Presidente Dilma normatize a institucionalização do direito dos nossos povos à consulta livre, prévia e informada, sobre os distintos assuntos que os afetam, tal como a implantação de grandes empreendimentos em suas terras (exemplo: hidrelétrica de Belo Monte, Hidrelétricas do Santo Antônio e Jirau, transposição do Rio São Francisco, Pequenas Centrais Hidrelétricas-PCHs) conforme estabelece a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) que em 2004 foi incorporada à legislação nacional através do Decreto 5051.

     

    12. Que o Ministério da Educação assegure a participação dos povos e organizações indígenas na implementação dos territórios etnoeducacionais e que cumpra as resoluções aprovadas pela I Conferência Nacional de Educação Indígena de 2009.

     

    Brasília, 31 de março de 2011.sinam os membros da bancada indígena e indigenista.         

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  • 31/03/2011

    Informe nº957: Bancada indígena e indigenista entrega reivindicações ao ministro da Justiça

    Entre as manifestações estão maior empenho e celeridade na demarcação das terras indígenas e garantia de recursos para implantação da Sesai

     

    A bancada indígena e indigenista entregou hoje pela manhã, 31, carta ao ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, com reivindicações relacionadas à política indigenista do país. A entrega aconteceu durante a 16ª Reunião Ordinária da Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI). Entre as manifestações apresentadas pelas lideranças indígenas que compõem a bancada estão: criação de comissão especial na Câmara para analisar o PLN 2057/91, visando à aprovação do novo Estatuto dos Povos Indígenas; cumprimento, por meio do órgão indigenista, Funai, da obrigação de demarcar, proteger e desintrusar todas as terras indígenas; e garantia de recursos financeiros suficientes para a implementação da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), entre outras.

     

    Ao ouvir as demandas apresentadas, o ministro Cardozo, prometeu celeridade e envolvimento do governo na formulação de uma política pública que garanta os direitos das populações indígenas. De acordo com ele, o governo fará o que for necessário para acelerar a aprovação do Estatuto dos Povos Indígenas no Congresso Nacional. “É urgente ver a questão do Estatuto e as estratégias de ação para fazer caminhar isso. Agora, é importantíssimo estar unido e agir em conjunto e organizados para convencer os parlamentares da importância e necessidade desse projeto”, disse.

     

    “É importante a fala do governo quando o ministro fala que precisamos agir juntos e nos organizar. Mas, também cabe à Dilma e ao governo fazer um trabalho de convencimento junto à sua base aliada para levar à frente essa questão. É preciso que o Estado tome conhecimento da importância da questão indígena”, declarou Marcos Xukuru, liderança de Pernambuco.

     

    Durante o encontro, as lideranças puderam colocar, pessoalmente, suas reivindicações, bem como apresentar a realidade em que vivem os povos indígenas hoje no país. Sandro Tuxá, liderança da comunidade Tuxá de Rodelas, na Bahia, pediu ao ministro que leve as demandas ora apresentadas à presidente Dilma Rousseff para que ela tome conhecimento da situação de descaso e desassistência que envolve os indígenas. “A saúde está um caos, temos situação assim em todas as comunidades. A desassistência é total e o governo sabe disso”, afirmou.

     

    No documento, a bancada faz uma avaliação dos oito anos do governo Lula, que de acordo com as lideranças não atendeu satisfatoriamente as reivindicações do movimento indígena. “O governo Lula não atendeu a contento as demandas e perspectivas do movimento indígena, permitindo que as políticas voltadas aos povos indígenas continuem precárias ou nulas, ameaçando a continuidade física e cultural desses povos, tal como nos casos dos Guarani Kaiowá, em Mato Grosso do Sul, e dos povos do Vale do Javari, no Amazonas, expressões do descaso e da omissão do Estado”.

     

    Por isso, Akiaboro, liderança do povo Kayapó no Pará, cobra do atual governo a responsabilidade em atender à população indígena, garantindo acesso à saúde, educação e, principalmente, terra demarcada. “O senhor está vendo e ouvindo tudo aqui, é preciso fazer algo. Nós estamos pedindo socorro e por isso estamos colocando todos esses problemas para o senhor, que também tem o nosso sangue”. Akiaboro afirmou ainda que estão depositando toda confiança no governo Dilma, a quem as comunidades indígenas tanto apoiaram. “Apoiamos a presidente e agora esperamos que ela olhe para nós”, declarou.

     

    Leia manifesto na íntegra

     

    “É preciso construir uma política pública indigenista para que a questão indígena não fique solta e com atendimentos esporádicos em políticas isoladas. Se continuar assim, diversas políticas espalhadas, soltas por aí, toda vez que um governo sair e outro entrar, elas serão trocadas”, disse Anastácio Peralta. Essa fala está embasada nos itens manifestados na carta, quando a bancada pede que o governo redobre esforços na tramitação e aprovação do Projeto de Lei nº 3.571, que cria o Conselho Nacional de Política Indigenista, instancia deliberativa, normativa e articuladora de todas as políticas e ações atualmente dispersas nos distintos órgãos de governo.

     

    Demarcação X Judicialização

     

    Os processos de demarcação de terras indígenas têm sido retardados constantemente pelos processos de judicialização, que de acordo com as lideranças, vulnerabilizam as comunidades frente à violência de grupos contrários ao reconhecimento de seus territórios tradicionais. Por isso, uma das principais reivindicações apresentadas pela bancada é um maior compromisso e celeridade por parte do Executivo na conclusão das distintas fases do procedimento demarcatório.

     

    Sobre essa questão, o ministro Cardozo disse receber reclamações, toda semana em seu gabinete, de deputados e lideranças dos estados. De acordo com ele, é preciso, então, discutir esse procedimento para demarcar as terras com segurança e não deixar que os processos demarcatórios caiam na Justiça. “É preciso fazer tudo logo formalmente, em ordem, para que não tenha como a demarcação cair na Justiça, enquanto o povo fica esperando o processo andar, o que, geralmente, se arrasta por muitos anos. Precisamos nos organizar e agir, porque a gente já sabe como é a nossa Justiça”, afirmou.

     

    Leia manifesto na íntegra

     

    Nesse longo e demorado caminho na luta pela posse do território tradicional, diversas lideranças são criminalizadas, a exemplo do que vem ocorrendo na Bahia, Pernambuco e Mato Grosso do Sul. Por isso, a bancada cobra do governo a garantia do direito constitucional do povo à terra. “Nossas lideranças são perseguidas e criminalizadas, na maioria das vezes por agentes do poder público que deveriam exercer a função de proteger e zelar pelos direitos indígenas. Reivindicamos então, que também sejam punidos os mandantes e executores de crimes cometidos contra nossos povos e comunidades”.

     

    Agenda comum

     

    Em sua fala, o ministro Cardozo garantiu aos indígenas que fará uma reunião, preferencialmente até a semana que vem, para que construam conjuntamente uma agenda comum entre governo e bancada indígena e indigenista. “O MJ não tratará a questão indígena como secundária, podem ter certeza. Queremos trabalhar junto com vocês e com a Funai, dando prioridade a essas demandas, porque isso é dever do Estado”, garantiu.

     

    Marcos Xukuru avalia positivamente a participação e, acima de tudo, o comprometimento, do ministro. “Com essa vinda, ele abre as portas para atender as pautas apresentadas pela bancada. Ele se comprometeu aqui a ter uma agenda comum, tratando com prioridade todas as questões do movimento”, avaliou. Ele ainda ressalta que espera confiante que o governo cumpra com a promessa e que se empenhe em atender às solicitações. “Sabemos que existem pressões contrárias à nossa, pressão regida pelos interesses econômicos e pelos latifundiários, por isso, é necessário que nos organizemos e busquemos participação do governo”, falou.

     

    Leia manifesto na íntegra

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  • 30/03/2011

    Carta Final: II Encontro da Nação Guarani

    COMUNIDADE INDIGENA PAÏ TAVYTERÄ, JAGUATI

     

    DEPARTAMENTO DE AMAMBAY – PARAGUAI, 24 A 26 MARÇO DE 2011

     

    Os representantes de diferentes comunidades e organizações da Nação Guarani de Argentina, Paraguai, Bolívia e Brasil reunidos na comunidade indígena Paî Tavyterâ de Jaguati do departamento de Amambaí, República do Paraguai, e seguindo os lineamentos e propostas do I Encontro dos Povos Guarani da América do Sul realizado em Tekoha Añetete, município de Diamante D’Oeste, estado de Paraná, realizamos a seguinte declaração com o lema Yvy maraê’y tetã Guarani mbareteverã, e no espírito de nossos ancestrais e nossos inumeráveis irmãos que morreram ao longo destes séculos, na resistência, por manter sua identidade, dignidade como povo e suas tradições, seu modo de ser, sua cultura.

     

    Considerando

     

    ü       Que a Nação Guarani sempre se desenvolveu e transitou em um espaço territorial sem fronteiras e sob o estrito domínio de suas normas de convivência e seus costumes.

    ü       Que para o Guarani seu território é o lugar onde viviam seus ancestrais e onde se articulam a biodiversidade, a cultura e a espiritualidade.

    ü       Que a identidade, pensamento e espiritualidade Guarani, constituem a base da cultura que acredita na unidade inseparável da natureza e o ser humano, que protegeu sempre seu entorno e acreditou com respeito nos elementos: o fogo, o ar, a terra e a água, como geradores de vida.

    ü       Que culturalmente a Nação Guarani mantém una convivência pacífica, porém uma postura firme e decidida na defesa de seus irmãos, seu território e sua cultura.

    ü       Que tem como um valor fundamental a palavra que se traduz em sua língua milenar que resistiu a séculos de conquista, exploração, opressão, descriminação e destruição em alguns casos.

    ü       Que as reclamações e reivindicações da Nação Guarani não têm resposta efetiva de parte das autoridades e governos dos Estados que se assentam sobre seu espaço territorial ancestral.

    ü       Que a Constituição, o convênio 169 da OIT, a Declaração Universal dos DDHH das Nações Unidas, as leis, tratados e convenções internacionais que protegem os direitos dos povos originários, entre eles o Guarani, não são cumpridos pelos diferentes governos de países nos quais em seus territórios se  encontram assentadas comunidades guaranis.

    ü       Que os distintos povos da Nação Guarani cada vez perdem mais território e seus habitantes submetidos a situações  infra-humanas, sem garantias mínimas de saúde  vivenda e alimentação.

    ü       Que a ampliação agressiva da fronteira agrícola que dá passo ao cultivo intensivo e mecanizado de soja transgênica envenena a terra, os cursos de água e as populações guaranis que vivem em suas proximidades, abandonadas pelos governos e seus órgãos de assistência integral e de proteção.

    ü       Que a educação indígena, em quase todos os países da territorialidade Guarani, segue reproduzindo o modelo ocidental da transculturalização e assimilacionista, violando o princípio de autodeterminação e autonomia no desenvolvimento de pedagogias originárias, saberes e conhecimentos próprios para a transmissão de costumes, usos e tradições e manter assim sua cultura, a ética ancestral e os valores consuetudinários.

     

    Exigimos:

     

    1. A consulta e participação permanente e oportuna à nossa Nação por parte dos poderes do Estado em todos os casos que afetem nossos povos originários e em especial para a elaboração, sanção e promulgação de leis.

    2. O cumprimento por parte dos governos nacionais, departamentais e municipais e os Estados (os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário) das leis, em particular o Convênio 169 e a Constituição Nacional, normas de proteção e de direitos da Nação Guarani.

     

    3. O respeito à autonomia e a livre determinação de nossos povos que constituem nosso direito coletivo a decidir como viver, como aplicar nossas pautas e normas e como nos desenvolver.

     

    4. O reconhecimento político de nossa nação por parte dos países assentados sobre o espaço territorial ancestral guarani e de sua livre determinação.

     

    5. O livre trânsito por nosso território ancestral porque as fronteiras não existem para nossos povos porque preexistimos antes que os Estados.

     

    6. O respeito e proteção do espaço territorial da Nação Guarani que inclui não só a propriedade da terra sino o espaço geográfico onde ancestralmente se desenvolveu e desenvolve atualmente a cultura guarani.

     

    7. A proteção de os recursos naturais, em especial o aqüífero guarani que forma parte do subsolo da territorialidade de nosso povo que abarca Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai.

     

    8. Indenização pelo uso, exploração e destruição da terra e de outros recursos naturais dos territórios e tekoha guarani.

     

    9. A garantia e a efetiva demarcação das terras.

     

    10. O fim da criminalização dos povos originários e o fim da perseguição e morte de nossos irmãos e líderes.

     

    11. Justiça em todos os casos de detenção, desaparecimento e morte de nossos irmãos.

     

    12.  Julgamento de responsabilidade penal e civil aos assassinos e criminosos que atentaram o ou atentam contra qualquer membro da Nação Guarani e suas organizações.

     

    13. Proteção e respeito ao direito coletivo sobre os saberes, espiritualidade, usos medicinais e demais demonstrações e expressões de nosso patrimônio cultural material e imaterial.

     

    14. O cumprimento das leis sobre proteção ambiental, com maior rigor nos casos de cultivos com usos de agrotóxicos que destroem comunidades, envenenam os cursos de água e a terra, destrói a biodiversidade, em especial a vida humana.

     

    15. Garantia política social à Nação Guarani desde seus próprios usos, costumes e tradições.

     

    16. O respeito e declaração da língua guarani como idioma oficial nos países situados sobre a territorialidade da Nação Guarani.

     

    17. A vigência imediata de educação diferenciada e específica utilizando nossas próprias línguas; e a formação dos professores com cosmo-visão política, social, econômica, espiritual e cultural da Nação Guarani; incluindo como mestres a nossos avôs e nossas avós.

     

    18. O cumprimento do direito à consulta previa à comunidade ou povo afetado, e em todos os casos, cumprindo tratados internacionais, para a exploração de hidrocarbonetos e outros minérios.

     

    19. A garantia para o acesso das comunidades a água potável e de qualidade.

    20. O cumprimento das sentenças da Corte Interamericana de DDHH sobre restituição de terras ancestrais aos irmãos indígenas do Chaco (enxet) e a solução de outros conflitos existentes sobre reclamações de terra dos povos originários.

     

    Resolvemos

     

    Primeiro: O território e todo o que nele existe são direitos fundamentais aos que não renuncia nem renunciará a Nação Guarani porque é parte de sua existência, de sua identidade, de sua vida física, cultural e espiritual.

     

    Segundo: Reivindicar a territorialidade como parte da extensão física e cultural da Nação Guarani.

     

    Terceiro: Se ratifica nele reconhecimento do Conselho Continental como instancia organizadora, articuladora e representativa da Nação Guarani, integrado pelos representantes de Argentina, Brasil, Bolívia e Paraguai.

     

    Quarto: Que a Nação Guarani não formará parte da estrutura do MERCOSUL e que se abocará ao fortalecimento de suas organizações de base e o Conselho Continental. O plenário discutiu a proposta inicial do I Encontro de criar una instância em nível do mercado comum e decidiu por enquanto não dar curso à proposição.

     

    Quinto: Não considerar o Bicentenário da independência do Paraguai como aniversário para celebrar porque para nossos povos só foram 200 anos de despojo, discriminação  humilhação, avassalamento, perseguição, saques e morte.

     

    Sexto: Solidariedade com todos os povos originários irmãos, apoio a suas lutas e resistência por manter sua terra, sua identidade e sua cultura.

     

    Sétimo: Ratificar a decisão do Conselho de nomear o Encontro como da Nação Guarani. Assim mesmo assume que desde agora todos os encontros serão convocados pelo Conselho Continental, denominando ao próximo como III encontro da Nação Guarani no país ou Estado que esta Grande Assembleia – Aty Guasu defina.

     

    Jaguatí, Amambay, Paraguai, 26 de março de 2011.

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  • 30/03/2011

    Algumas reflexões sobre mudanças climáticas

    Por Gilberto Vieira dos Santos

    Tendo como lema “Com a Mãe Terra recriar o ambiente da vida”, realizou-se em Luziânia (GO), o II Simpósio Mudanças Climáticas e Justiça Social. O evento que aconteceu entre os dias 14 e 16 de março foi promovido pelo Fórum de Mudanças Climáticas e Justiça Social, organização que tem o papel de articular as pastorais sociais da CNBB, movimentos sociais e entidades da sociedade civil no intuito de "disseminar informações, gerar consciência crítica e mobilizações da cidadania, visando contribuir no enfrentamento das causas estruturais do aquecimento global que provoca Mudanças Climáticas em todo o planeta Terra".

    O Fórum tem realizado diversos seminários e encontros nas grandes regiões do Brasil para debater e amadurecer enfrentamentos ao fato que pouco negam: o planeta está aquecendo e as consequências, muitas já sentidas, tendem a atingir em breve populações pelo mundo todo. 

    Embora já tenha sido publicado um manifesto e uma Carta Compromisso elaborada a partir dos temas debatidos pelos mais de cem participantes, creio que é sempre interessante um olhar sobre este tema, para o qual espero contribuir. Tentarei fugir do estilo "relatório", já que não é este o objetivo aqui.

    Poderia começar apontando para os problemas já elencados e sobre os quais muitos vem se dedicando há anos: a impressão de que o clima esta descontrolado. Foi notícia pelo mundo a seca na Amazônia em 2005 e 2010; as chuvas concentradas em várias regiões do país com efeitos desastrosos para populações fragilizadas, nas encostas dos morros no Rio de Janeiro e neste caso, também atingindo à classe média invasora de ambientes que deveriam ser destinados à preservação e não especulação imobiliária. As enchentes assustam e vem causando inúmeros danos aos moradores que foram empurrados para as áreas de risco, para os espaços que lhes restou.

    Certamente, estes fenômenos metereológicos não são casuais e inúmeros estudos apontam o aquecimento global como causa destas mudanças climáticas. O grupo de cientistas que compõe o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), vem demonstrando estes fatos através de seus relatórios. Embora interesses escusos questionem os relatórios do IPCC, dizendo serem fantasiosos e exagerados, creio ser um tanto difícil negar a importância deles. Para o quarto, publicado em 2007, por exemplo, foram consultados 2.500 cientistas em mais de 130 países. O relatório final foi assinado por 450 cientistas. Será que há tantos cientistas loucos no mundo? E se concentram justo em um órgão das Nações Unidas?

    Se este é o fato, eu fico com estes "loucos do clima". Não basta, contudo, identificar que o planeta aquece. Sabedores de que as causas são diversas, que vai do escapamento dos carros ao das vacas, do CO2 ao metano, das derrubadas na Amazônia, das carvoarias do cerrado às fábricas da China, das termoelétricas ao metano gerado pela hidroelétricas, é preciso ir além. Todas as causas estão ligadas, umbilicalmente, ao processo de desenvolvimento da sociedade capitalista que transformou tudo em mercadoria, subjugou a natureza e, para transformá-la também em mercadoria, perdeu os limites do racional. Neste sentido a Revolução Industrial foi, também, uma involução na relação com a natureza e gerou um brutal processo de agressão ao planeta. A solução para este grave problema não é amena: só é possível com uma nova perspectiva de relação com o planeta, com o cuidado para com a criação, com a mudança radical na aceleração do que se defende ‘desenvolvimento’. É preciso tirar o pé do acelerador e pisar no freio!

    Este é um lado da análise do que se debateu nestes dias entre as pessoas que vieram de várias cidades brasileiras e de outros países da América Latina. O outro lado foi a manifestação da contradição. Enquanto todos os dados nos indicam para a necessidade de mudança de rumos, vimos como o governo federal se preocupa com os desafios do aquecimento global através de seu Plano Nacional de Mudanças Climáticas que tem na base, para o enfrentamento da situação a construção de hidrelétricas – no Plano Decenal de Energia – e a ampliação da produção de agrocombustíveis. E ainda chama de energia limpa. Certamente devem pensar que não são sujas as obras que desalojaram várias famílias, inundaram ou inundarão terras férteis, vilas, cidades; não deve ser suja para o governo a prostituição de jovens nos canteiros de obras, os ‘vale prazer’ distribuídos pelas empresas construtoras das barragens, as mortes nas obras, a situação de escravidão de diversos trabalhadores neste setor. Não deve ser suja para o governo os mais de oito litros de água que perde por dia um cortador de cana, que realiza esforços que encurta sua vida, o trabalho escravo de muitos destes; não deve ser suja para o governo o etanol produzido pela cana queimada, mesmo com a inserção de máquinas, já que a queima aumenta o teor de sacarose e produz mais álcool.

    Também, no cúmulo da contradição, o Plano de Mudanças Climáticas do governo federal prevê a inserção no absurdo mercado de carbono, através dos mecanismos de Redução de Desmatamento e Degradação (REDD). Na prática os maiores poluidores mundiais como China e Estados Unidos vão pagar para que preservemos as matas, enquanto não reduzem em nada suas emissões. E vão empurrando com a nossa barriga o protocolo de Quioto. Aliás, poderão até reduzir com a energia limpa do etanol produzido no Brasil em uma usina construída sobre território do povo Guarani Kaiowá, utilizando mão-de-obra escrava que cortará a cana queimada e sua limpa emissão de CO2. Poderá ser mais limpa ainda, se o agrocombustível que alimentará a insustentável frota de veículos destes países for produzido pela soja transgênica produzida em Lucas do Rio Verde, ou em Campo Verde, ou em Primavera do Leste. Nestes e em outros municípios, a soja poderá contribuir para o bem estar dos norte-americanos com o limpo combustível, apesar do leite materno, da água, dos solos e das pessoas contaminadas pelos agrotóxicos nestes lugares. No fim, tudo poderá ser pago com os recursos provenientes do norte. E se não houver produção suficiente de alimentos, já que é preciso dar lugar para os monocultivos, poderemos comer um mac-big-x-tofu acompanhado de caldo de cana. 

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  • 29/03/2011

    Carta aberta: Povo Karitiana denuncia abandono por parte da Funai

    Denúncia é referente à demora no processo de revisão do território tradicional Karitiana, em Porto Velho

     

    A dívida que o governo brasileiro tem com nosso povo, ainda não foi quitada, pois continuamos abandonados pela Funai e pelos órgãos públicos. A luta pelo nosso território tradicional teve início em 1996, porque mais de trinta antigas aldeias e lugares sagrados foram deixados fora da demarcação da terra. Nestes locais, está a verdadeira história do povo Karitiana.

     

    Depois de muita luta da comunidade conquistamos, em 1998, a criação do Grupo de Trabalho para estudo de revisão dos limites da Terra Indígena Karitiana, em Porto Velho, Rondônia. Esta conquista foi em parte, pois se passaram 13 anos e embora já confirmado os verdadeiros limites da demarcação de nosso território tradicional, pelo relatório final do GT, até agora a Funai em Brasília não publicou este relatório.

     

    Já são 15 anos de reivindicação de nossa terra, e tudo foi comprovado pelo estudo, mesmo assim nosso território continua invadido por fazendeiros, madeireiros e pescadores, e nossas riquezas sendo roubadas livremente, e ainda pior, com autorização de órgãos públicos, como Ibama e Sedan, ligados aos governos Federal e Estadual.

     

    Repudiamos a morosidade dos órgãos públicos em legalizar nosso território, direito que nos é garantido na Constituição Federal e na convenção 169 da OIT. Estas atitudes geram conflitos ainda mais sérios, pois entendemos que esta morosidade beneficia os invasores, em detrimento da nossa comunidade e da mãe terra. Não podemos ficar de braços cruzados assistindo os invasores de nosso território destruir os lugares sagrados e levar nossas riquezas.  

     

    Nós, povo Karitiana, estamos impactados pelo projeto do complexo hidroelétrico do Rio Madeira com a construção das hidroelétricas Santo Antônio e Jirau.  A pressão está cada vez mais forte sobre nosso território. Diante de plena discussão sobre o aquecimento global continuam invadindo e destruindo a natureza, nossa mãe terra.

     

    Exigimos que dentro das compensações do empreendimento, sejam garantida a demarcação e a integridade de nosso território tradicional. Isto deve ser o mínimo diante de tanto mal causado à nossa população. 

     

    Povo Karitiana

     

    Porto Velho, 29 de março de 2011

     

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  • 29/03/2011

    Pela suspensão dos financiamentos do BNDES a obras que violam os direitos dos trabalhadores

    Organização pede fim dos financiamentos do BNDES a obras que violam direitos dos trabalhadores

     

    Nos últimos dias, uma série de violações dos direitos mais elementares dos trabalhadores em obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) têm sido noticiadas pela imprensa: na construção das usinas hidrelétricas de Jirau e Santo Antônio, no Rio Madeira; na construção da Refinaria de Abreu e Lima, em Pernambuco; e na termelétrica de Pecém, no Ceará.  Apesar destes direitos trabalhistas estarem consolidados em lei, as suas recorrentes violações não fizeram com que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), maior financiador das obras do PAC, suspendesse os financiamentos a essas polêmicas obras.  Além disso, o Banco continua a não submeter os critérios de aprovação aos financiamentos e o monitoramento de contratos ao debate público e à fiscalização.

     

    Em setembro de 2008, uma carta do GT Hidrelétricas da Plataforma BNDES dirigida ao banco já alertava para os graves riscos dos projetos energéticos no Rio Madeira e demandava a suspensão do crédito até que as dúvidas fossem sanadas.  Dentre os riscos financeiros, ambientais e legais, a carta alertava para “a bomba demográfica e social a eclodir na região em função da constituição de um pólo de atração migratória” e solicitava a abertura de um canal de diálogo com a população afetada pelos empreendimentos, além de informações sobre o tratamento dado pelo banco aos passivos sociais e ambientais gerados por seus financiamentos para a construção de hidrelétricas.

     

    Desde a sua criação, a Plataforma BNDES tem demandado do Banco iniciativas que confiram transparência aos seus financiamentos de modo que a opinião pública e as populações atingidas possam conhecer e incidir sobre os critérios que definem a tomada de decisão e a avaliação dos empreendimentos apoiados.

     

    Apesar de ter respondido à solicitação da Plataforma com a criação de uma “Janela de Transparência”, o acesso à informação ainda é muito restrito e seletivo.

     

    Neste momento, torna-se explícito como a transparência da atuação do BNDES – maior banco de fomento do Brasil e um dos maiores do mundo – é fundamental, já que o Banco tem financiado empreendimentos que violam gravemente os direitos dos trabalhadores, além de muitas outras violações.  Estes recentes acontecimentos evidenciam que o BNDES precisa divulgar publicamente os critérios que utiliza para conceder seus financiamentos e para monitorar o andamento das obras.

     

    No dia 23 de fevereiro, vinte dias antes de começarem as mobilizações dos trabalhadores de Jirau e Santo Antônio, uma equipe técnica do Banco visitou as obras e fez uma avaliação positiva do empreendimento.  A visita foi noticiada por um jornal local: “Equipe técnica do departamento de energia elétrica do órgão avaliou positivamente a construção do empreendimento.  Equipe formada por técnicos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) acompanhou na quarta-feira, 23, o andamento das obras na Usina Hidrelétrica Jirau e Nova Mutum Paraná.  O diretor Administrativo e Financeiro da Energia Sustentável do Brasil, Paulo Mantuano, recepcionou o grupo de engenheiros, economistas e advogados do órgão (…) “Trimestralmente acompanhamos o empreendimento através de relatórios, avaliamos o andamento físico e financeiro do projeto, ações socioambientais e obrigações contratuais”.[1][1]

     

    Importa lembrar ainda que no início de 2008 o Banco anunciou em seu site eletrônico a criação de Cláusulas Sociais, que, dentre outros aspectos, prevêem a suspensão ou exigência pelo Banco do vencimento antecipado do contrato de financiamento, mediante constatação de desrespeito à legislação que trata do combate à discriminação de raça ou de gênero, ao trabalho infantil e ao trabalho escravo ou de eventuais práticas criminosas em projetos financiados pela instituição.[2][2] No entanto, a falta de transparência impede que a opinião pública exerça qualquer tipo de controle social sobre as regras, políticas e cláusulas sociais criadas pelo próprio Banco.

     

    Diante disso, as organizações e movimentos sociais que integram a Plataforma BNDES, demandam:

     

    1. A imediata suspensão dos desembolsos do BNDES para os consórcios responsáveis (Energia Sustentável do Brasil – Suez, Camargo Côrrea, Eletrosul e Chesf; e Santo Antônio Energia – Odebrecht, Furnas, Cemig, Andrade Gutierrez, Santander e Banif) pelas obras das Usinas Hidrelétricas de Jirau e Santo Antônio, até que todas as demandas dos trabalhadores sejam atendidas e as cláusulas sociais respeitadas;

    2. Uma prestação de contas detalhada dos recursos liberados pelo BNDES e utilizados pelos consórcios até o momento e a publicização desta pelo BNDES;

    3. A instalação de uma Auditoria Pública para investigar a aplicação dos recursos que já foram liberados pelo BNDES para estas duas usinas;

    4. A realização de uma missão permanente do BNDES na região, que tenha como objetivo promover o imediato diálogo com as organizações sociais, de atingidos e de trabalhadores e buscar as devidas soluções para os problemas decorrentes da instalação dos projetos;

    5. A liberação imediata de recursos para a implementação de uma política de recuperação das comunidades e municípios atingidos pelas obras de Jirau e Santo Antônio, com controle social, onde os recursos devam ser planejados, controlados e aplicados prioritariamente em questões sociais, especialmente para os trabalhadores e populações atingidas;

    6. Que o BNDES divulgue em sua página na internet os relatórios de acompanhamento do andamento físico e financeiro dos projetos financiados, ações socioambientais e obrigações contratuais previstas nos contratos, começando pelas Usinas de Jirau e Santo Antônio;

    7. A definição de políticas de Transparência e Controle Social, de modo a contribuir para que o acompanhamento dos desembolsos em investimentos públicos em infra-estrutura sejam de domínio público, e para que haja maior rigor quanto ao cumprimento das metas estabelecidas nos contratos de crédito;

    8. Que o governo brasileiro responda aos questionamentos formulados pelo governo da Bolívia sobre os impactos transfronteiriços gerados pela construção das represas de Jirau e Santo Antônio.

     

    Reforçando o nosso compromisso de luta por uma sociedade justa, solidária e igualitária, em que, necessariamente, os financiamentos públicos são orientados para a eliminação das desigualdades sociais – e não o contrário –, aguardamos um retorno o mais rápido possível.

     

    Plataforma BNDES, 29 de março de 2011.

     

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  • 29/03/2011

    Eletronorte se recusa a cumprir sentença em favor de índios atingidos pela usina de Tucuruí

    O processo judicial chegou ao fim, mas a empresa entrou com recurso protelatório alegando que não tem os dados para comprar as terras indicadas pela Justiça

     

    O Ministério Público Federal no Pará mandou manifestação à Justiça pedindo que a Eletronorte seja obrigada imediatamente a comprar terras para compensar a área que os índios Akrãnkykatejê, conhecidos como Gavião da Montanha, perderam com a construção da usina hidrelétrica de Tucuruí.

     

    O caso tramita desde 1989 na Justiça Federal e teve decisão transitada em julgado – sem possibilidade de recurso. A decisão veio do Tribunal Regional Federal da 1ª Região em Brasília e originou uma ordem, em que o juiz Ronaldo Destêrro, da 9ª Vara Federal em Belém, determina à Eletronorte que compre as terras do Condomínio Bela Vista, um conjunto de fazendas já aprovados pela Funai e pelos índios.

     

    A ordem judicial data de junho de 2010, mas, em vez de cumpri-la, a Eletronorte interpôs no mês passado Embargos de Declaração, tipo de recurso cabível apenas para esclarecer dúvidas quanto a uma sentença. “A leitura dos embargos revela o intuito meramente protelatório, como forma de adiar o efetivo cumprimento da ordem judicial emanada”, afirma o procurador da República Felício Pontes Jr na manifestação à Justiça.

     

    A Eletronorte alega que desconhece “elementos básicos de um contrato de compra e venda imobiliária, como por exemplo, proprietário, valor, localização do cartório de registro de imóveis competente”. Acrescenta que a ordem de entregar o imóvel rural à comunidade indígena é de “difícil cumprimento: qual pessoa, física ou jurídica, representará a referida comunidade nesse ato?”

     

    O MPF considera as alegações absurdas: “Durante todas as fases processuais, por inúmeras vezes, a ré Eletronorte manifestou-se nos autos quanto à área indicada pela comunidade indígena, e emitiu até um parecer em que pedia apoio da Funai para trabalhos de melhoria da qualidade ambiental”. Em dezembro de 2009, inclusive, houve reunião da Eletronorte com a Funai, os índios e o MPF para definir a escolha das terras.

     

    “É o típico comportamento do setor elétrico com as populações indígenas na Amazônia. Causam impactos irreversíveis no modo de vida dos índios e depois empurram com a barriga por décadas as indenizações, compensações e mitigações”, afirma Felício Pontes Jr, que acompanha o caso dos Gavião da Montanha.

     

    Saga – Os índios Akrãnkykatejê ou Gavião da Montanha, moravam na região onde hoje existe o lago de quase 3 mil quilômetros quadrados da hidrelétrica de Tucuruí. Expulsos pela construção da usina, a montanha sagrada que os identificava foi submersa e a eles restou se mudarem para a Terra Indígena Mãe Maria, onde morava outro grupo de índios Gavião, próximo da cidade de Marabá, no sudeste do Pará.

     

    Desde o enchimento do lago da Usina de Tucuruí há controvérsias sobre a remoção do povo Gavião da Montanha, com acusações contra a Eletronorte de que usou de violência e ardis desonestos contra os índios para obrigá-los a deixar as terras, reconhecidas pelo governo paraense como indígenas desde 1945. O processo judicial contra a empresa, para obrigá-la a comprar terras equivalentes para a população indígena foi iniciado em 1989.

     

    O MPF ressalta na manifestação enviada à Justiça “que as compensações materializadas no curso do processo com a sentença terminativa, revestem-se da condição de minimizar os danos causados pela UHE-Tucuruí, jamais compensar integralmente, posto que o patrimônio intangível, os vínculos culturais desenvolvidos na terra inundada não se traduzem em valores econômicos, tampouco se revestem de um critério financeiro aferível”.

     

    O processo tramita com o número 89.00.01377-7 e pode ser consultado pelo link: http://ven.to/fY2

     

    Ministério Público Federal no Pará

    Assessoria de Comunicação

    Fones: (91) 3299-0148 / 3299-0177

    E-mail: ascom@prpa.mpf.gov.br

    Twitter: http://twitter.com/MPF_PA

     

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  • 29/03/2011

    Conjuntura da Semana. A rebelião de Jirau

    A análise da conjuntura da semana é uma (re)leitura das ‘Notícias do Dia’ publicadas, diariamente, no sítio do IHU.  A análise é elaborada, em fina sintonia com o Instituto Humanitas Unisinos – IHU, pelos colegas do Centro de Pesquisa e Apoio aos Trabalhadores – CEPAT – com sede em Curitiba, PR, parceiro estratégico do Instituto Humanitas Unisinos – IHU.

     

    Índice:

     

    A rebelião de Jirau


    – A questão social

    – A luta por respeito e dignidade

    – O caos social

    – Reação tardia

    – Pacto pelo PAC

    – Jirau explica o modelo

    – A questão ambiental

    – Revolta de Jirau não sensibiliza esquerda e ambientalistas

     

    Conjuntura da Semana em frases

     

    Eis a análise.

     

    A rebelião de Jirau

     

    O maior canteiro de obras do Brasil, localizado no sítio do Jirau, cidade de Porto Velho em Rondônia, ardeu em chamas no dia 15 de março e em poucas horas virou cinzas. Alojamentos e ônibus foram queimados ou destruídos, além do posto de saúde, de escritórios e do almoxarifado. A destruição do canteiro de obras foi resultado de um levante operário. 22 mil trabalhadores estavam envolvidos na construção da usina que forma o complexo hidrelétrico do Madeira junto com a usina de Santo Antônio.

     

    Os acontecimentos em Jirau são significativos porque é a maior obra em andamento do Programa de Aceleração do Crescimento – PAC e síntese do modelo desenvolvimentista que reedita o projeto de um Brasil grandioso como à epoca de Vargas, JK e o período militar. Um modelo baseado em grandes obras, sobretudo de exploração energética com vistas a suprir o gigantismo consumista de energia de uma nação emergente exportadora de commodities.

     

    Jirau é significativo por outro aspecto, situa-se na Amazônia legal, região em que se desbrava a última fronteira do capitalismo brasileiro. É na Amazônia legal que se trava a luta para amansar os grandes rios – Madeira, XinguTapajósTeles Pires –  e sujeitá-los ao projeto desenvolvimentista. Jirau, nessa perspectiva, também é importante porque é revelador de uma concepção de desenvolvimento que dá as costas para a questão ambiental. Jirau é um filme já visto – ItaipuBalbinaTucuruí  – e antecipa Belo Monte.

     

    A questão, porém, mais impressionante de Jirau é a questão social. A explosão da revolta operária contesta o modelo do Brasil moderno. Direitos desrespeitados, truculência e autoritarismo das empreiteiras, sofrimento imposto aos trabalhadores é o outro lado da história que ninguém viu e percebeu. Empreiteiras, sindicatos e governo ficaram surpresos com a revolta que truncou o acelerado andamento do projeto.

     

    Jirau se insere na lógica da modernização conservadora e manifesta todas as contradições do país, ou seja, por um lado revela a pujança e o vigor do crescimento econômico, por outro, produz no seu entorno exploração e miséria. Jirau diz respeito ao Brasil potência – 8º PIB da economia mundial e o 73º IDH  –  incapaz de mitigar os efeitos do seu gigantismo.

     

    Em Jirau a questão social e a questão ambiental estão relegadas em segundo plano. Jirau coloca em xeque o modelo desenvolvimentista e também o governo de esquerda de Dilma. Jirau reproduz os mesmos erros dos militares onde o social não entra e menos ainda o ambiental. A diferença agora é que no lugar das tropas militares, ocupam o canteiro de obras a Força Nacional – agrupamento policial especializado em combater motins.

     

    Jirau interpela também o movimento social, a esquerda militante, as pastorais, os sindicatos, os ambientalistas. A repercussão dos acontecimentos de Jirau foram poucas e esparsas. Os sites de organizações sociais, dos movimentos, das ongs pouco falaram de Jirau. Encontra-se mais e farto material dos acontecimentos do Japão e da Líbia do que aconteceu no norte do Brasil.  Como destacou o jornalista Jânio de Freitas, “a violência assumida pela revolta em Jirau (RO) e pela dos árabes tem semelhança, mas as recepções aqui, aos dois casos, foram opostas”.

     

    A revolta operária em Jirau também pouco sensibilizou os ambientalistas e suas organizações. Céleres em denunciar, organizar manifestos e repercutir agressões ao meio ambiente, as organizações ambientalistas pouco falaram da questão social de Jirau. Percebe-se uma grande dificuldade do movimento ambientalista em conectar os temas sociais aos ambientais. A abordagem faz-se geralmente de forma isolada.

     

    Compreender, portanto, o que acontece em Jirau auxilia na compreensão do que vem se transformando o Brasil e contribui para uma análise autocrítica da esquerda.

     

    A questão social. Jirau vivia sob tensão reprimida

     

    A revolta dos milhares de operários no canteiro de obra em Jirau transformando tudo em terra arrasada  pegou todos de surpresa, empreiteiras, sindicatos e governo. O consórcio Energia Sustentável do Brasil – ESBR formado pelas empresas Suez Energy, Eletrosul, Chesf e Camargo Corrêa – responsável pela obra se disse surpresa com a insurreição que qualificou como ação de vândalos. Segundo o consórcio "tudo estava tranquilo". “Não havia descontentamento”, disse Victor Paranhos, presidente do Energia Sustentável do Brasil. "É preocupante porque não sabemos qual é a motivação. Não há sequer uma liderança", afirmou perplexo.

     

    Na realidade não “estava tudo tranquilo” como diz o Consórcio. “Jirau vivia sob tensão reprimida”, afirmou o Ministério Público do Trabalho de Rondônia após os acontecimentos. Segundo o Ministério, a quebradeira nos canteiros de obras foi resultado de uma "tensão longa e reprimida" nos alojamentos isolados na floresta amazônica.

     

    É importante destacar que conflitos anteriores já tinham acontecido. Em julho de 2010, o canteiro de obras da usina de Santo Antônio virou um campo de batalha. As péssimas condições de trabalho e a super-exploração da mão-de-obra levaram a ações similares as que aconteceram nos últimos dias em Jirau com ônibus apedrejados e queimados e parte do alojamento depredado.

     

    A tragédia em Jirau foi anunciada. Dias antes de eclodir o conflito, Maria Ozânia da Silva da Pastoral do Migrante de Rondônia concedeu entrevista à IHU On-Line onde relatava desrespeito aos direitos dos trabalhadores. A entrevista foi publicada um dia antes dos acontecimentos como que prenunciando os fatos. O relato de Maria Ozânia é importante porque revela que muitos trabalhadores já haviam sido enganados por “gatos” antes de chegar ao canteiro de obras.

     

    Milhares de vagas do canteiro de obra da usina hidrelétrica de Jirau foram preenchidas por migrantes que receberam promessas de "gatos" – agentes que intermediam mão-de-obra.  As construtoras recorrem às mesmas práticas de recrutamento de trabalhadores dos tempos do "Brasil Grande", nos anos 70, quando o País viveu um surto de desenvolvimento econômico no período do regime militar.

     

    Porém, os “gatos” dos anos 2000 sofisticaram os mecanismos de exploração envolvendo o Sistema Nacional de Emprego – Sine, cobrando taxa para garantir o emprego – utilizando-se de boleto bancário – e responsabilizando os próprios trabalhadores  pelo pagamento do seu deslocamento e alojamento até a contratação definitiva. Milhares começaram trabalhando sentindo-se enganados. O ganho médio de um trabalhador de Jirau gira em torno de R$ 1.000,00.

     

    No canteiro de obra surgiram outros problemas: não pagamento de horas extras; falta de pagamento de benefícios e participação dos lucros; diferenciação de salários entre as empreiteiras; truculência dos seguranças; falta de pagamento da "hora itínere" – tempo gasto pelo trabalhador sem alojamento para chegar a um local de trabalho distante; custos alto de medicamentos; desrespeito ao cumprimento da "embaixada" – período em que o trabalhador visita a família, entre outros.

     

    "Fui descobrir aqui que a Camargo Corrêa não paga hora extra. Você acha que eu iria vir para trabalhar só oito horas? Ficar fazendo nada o resto do dia?", questionou José Benedito Cotrin,  de Abaetetuba (PA).  Outro trabalhador, disse que a empresa se recusava a pagar a viagem de volta dos que pediam demissão e que o local é um "presídio em que o trabalhador controla o horário do banho de sol".

     

    A queixa, aliás, da truculência dos seguranças do canteiro é uma das que mais ficou latente: "Os seguranças não sabiam conversar. Nos finais de semana, quando o pessoal passava um pouquinho da conta na bebida, eles tratavam os bêbados na pancada, como vagabundos", relata  Antônio César Souza da Silva de Belém (PA). Muitos trabalhadores de Jirau dizem ter sofrido ”violência física” por parte de funcionários da Camargo Corrêa e que eram obrigados a comprar produtos a preços exorbitantes no canteiro da obra.

     

    Uma disputa entre sindicatos ligados à CUT e à Força Sindical também teria contribuído na deflagração dos conflitos. O Sticcero (Sindicato dos Trabalhadores na Indústria da Construção Civil de Rondônia) criado em 1986 é filiado à Central Única dos Trabalhadores – CUT e o Sintrapav-RO (Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Pesada de Porto Velho) criando em 2008 é ligado à Força Sindical. Ambos disputam a representatividade da categoria. O Sticcero acusa o sindicato adversário de incentivar o quebra-quebra. "O clima entre os sindicatos não está bom. Eles estão brigando na Justiça para saber quem tem representatividade", afirmou o procurador regional do Trabalho de Rondônia Francisco Cruz. Reduzir, entretanto, como setores da imprensa propagam os conflitos em Jirau à briga de sindicatos é simplificar o problema que como se viu tem razões sociais.

     

    Sobre as condições de alojamento há controvérsias. Não chegou a ser apontado como um dos principais problemas. Muitos deles eram climatizados, algo anunciado por Lula num discurso para os operários de Jirau, em agosto do ano passado: "Isso [ar condicionado nos alojamentos] demonstra que os trabalhadores vão aprendendo a conquistar seus direitos, os empresários vão aprendendo que é importante que, quanto mais conforto, mais os trabalhadores produzem e assim a gente vai mudando a cara do nosso País", afirmou Lula na época. Destaque-se, porém, que o tratamento não era o mesmo dispensado a todos os trabalhadores. Assim como havia diferenciações salariais dentro do mesmo canteiro em função de várias empresas terceirizadas, as condições de alojamento não eram necessariamente a mesma para todas.

     

    A tentativa de desqualificação – “coisa de vândalos” – do levante operário por parte das empreiteiras e o discurso similar do governo não se sustentam. A revolta operária em Jirau é uma questão social. “Uma coisa dessa magnitude não acontece sem um motivo forte. Ninguém se mobiliza dessa forma apenas em função de uma briga entre dois funcionários”, diz Elias Dobrovolski do Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB, em Rondônia.

     

    O jornalista Leonardo Sakamoto,  lembra que uma fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego, no ano passado, produziu 330 autos de infração e a interditou equipamentos que estavam colocando em risco os trabalhadores da obra. Destaca ainda que um grupo de 38 pessoas foi libertado de trabalho análogo à escravidão pela Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de Rondônia. As vítimas estavam trabalhando para a Construtora BS, que prestava serviço ao consórcio responsável pela construção de Jirau.

     

    A luta por respeito e dignidade

     

    A revolta de Jirau, entretanto, não se deu apenas por melhores condições de trabalho e salários. Relatos colhidos pelo Ministério Público do Trabalho de Rondônia dão conta de que parte importante das reivindicações dos trabalhadores é por respeito e dignidade. Entre as reclamações ouvidas pelo Ministério do Trabalho encontram-se:

     

    1 – Fim da truculência de seguranças e encarregados – xingamentos, empurrões, cárcere privado temporário e piadas;

    2 – Tratamento respeitoso aos trabalhadores que chegarem aos alojamentos alcoolizados. A dependência de álcool é vista como uma doença;

    3 – Respeito na relação entre o "sala fria" e o ”peão", sem assédio moral. Em Jirau, "sala fria" é o funcionário que trabalha em salas com ar-condicionado;

    4 – Pagamento por "hora itínere" – o tempo de viagem para canteiros de obras fora do perímetro urbano (só para quem não mora em alojamentos). Flexibilidade no transporte de áreas de trabalho isoladas para centros urbanos nas horas de folga;

    5 – Serviços eficientes nos refeitórios, para evitar que o tempo da fila do bandejão não consuma boa parte do período do almoço. Refeições adequadas e alojamentos higiênicos;

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  • 28/03/2011

    Jirau foi só o começo

    Por Carlos Tautz

    De uma hora para outra, o Brasil descobre que a construção da hidrelétrica Jirau, a maior obra em andamento do PAC, juntava 20 mil trabalhadores em uma espécie de campo de concentração perto de Porto Velho (RO).  Sem condições adequadas de alojamento e ganhando salários de miséria, eles tocam fogo nos seus abrigos e só a intervenção da Força Nacional de Segurança, como sempre polícia para reprimir quem trabalha, suspendeu os protestos.  Mais preocupado em começar logo a gerar energia para faturar, o consórcio que ganhou a concessão para construir a usina tratava de acelerar a obra.  A qualquer preço.

    Na mesma semana, descobre-se que outros projetos do PAC também enfrentam problemas de descumprimento da legislação trabalhista.  É o caso das obras dos complexos portuários de Suape (PE) e Pecém (CE), além da usina São Domingos (MT).  No Brasil, seriam pelo menos 82 mil trabalhadores em greve contra projetos privilegiados pelo dinheiro fácil e barato do BNDES.  Uma equipe do banco visitou Jirau 20 dias antes dos conflitos, mas conseguiu não ver qualquer irregularidade.

    Imediatamente, sindicalistas oficiais, os mesmos que há três anos defendiam Jirau e que há 15 dias foram entronizados em polpudos conselhos de estatais pela Presidenta da República, correm para amortecer a situação e propõem a criação de “conselhos de fábrica” (sic), aquela forma tradicional de se cooptarem mais sindicalistas oficiais.  Outro sindicalista, que também é deputado federal, reconhece que as centrais não sabem lidar com… massas de trabalhadores!

    Apesar de surpreendente, a situação de Jirau e das demais obras era esperável.  No caso da usina rondoniense, o próprio Ibama recusava-se a emitir licenças devido à fragilidade dos estudos de impacto social e ambiental.  Lula demitiu diretores do órgão para conseguir os documentos e agora se vê exatamente o que os técnicos previam e que o ex-presidente negava: dispararam os índices de violência em Rondônia devido à chegada de milhares de pessoas oriundas de ouras regiões, sem que tenham sido criadas as mínimas condições de moradia, acesso a serviços de saúde, saneamento etc. Além, é claro, do pagamento de salários de fome, porque o consórcio tem pressa para concluir Jirau.

    Como se isso não bastasse, a área em que Jirau está sendo erguida é contígua à pelo menos quatro terras de indígenas que sequer foram contactados.  Não se sabe de qualquer ação da Funai para atenuar os impactos da proximidade dessa massa de gente com os indígenas.  Entretanto, ao que tudo indica, Jirau foi apenas o começo e o pior ainda está por vir.

    Outra central sindical oficial, daquelas que não sabem lidar com trabalhadores, estima que no auge das construções para a Copa de 2014 e Olimpíadas de 2016 cerca de um milhão de operários estejam envolvidos em obras que têm tudo para repetir o grau de açodamento e irresponsabilidade do governo e das empreiteiras.

    O esquema, já se sabe, será o mesmo: muito dinheiro público subsidiando a festa das construtoras e regras de concessão amolecidas – como já se diz que fará a Autoridade Olímpica, a ser presidida pelo esportivo ex-presidente do BC Henrique Meirelles.  E o melhor (para os empreiteiros, lógico): prazos como sempre estourados, porque assim é que se constroem obras três, quatro vezes mais caras do que o previsto e com pouca ou nenhuma transparência.

     

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  • 27/03/2011

    Mineração em terras indígenas: 12ª Reunião Ordinária da Comissão Especial

    A 12ª Reunião Ordinária da Comissão Especial de Mineração acaba de ocorrer em Brasília e, como de costume, estavam convidados apenas os interessados na aprovação do Projeto de Lei do Senador Romero Jucá que autoriza a mineração em terras indígenas. O Amazonas foi representado pelo Dep. Estadual Sinésio Campos (PT/AM), sempre mais sintonizado com o poder e seus interesses e cada dia mais distante da causa do povo pobre e espoliado. Presente também o secretário de Geodiversidade e Recursos Hídricos, Daniel Nava, que não perde oportunidade de levar a proposta da mineração em áreas indígenas, mesmo que seja sob vaias, como ocorreu na 1ª. Conferência Nacional de Meio Ambiente em Brasília / 2004. Bonifácio Baniwa representou a Secretaria de Assuntos Indígenas, uma criação do Governo do Estado para amolecer a resistência dos povos indígenas, desde 1500 roubados e prejudicados com a mineração em suas terras.

     

    Gostaria de lembrar a esses companheiros, defensores do projeto de Lei sobre mineração em terras indígenas que o autor da mesma, Romero Jucá, já é um velho ator da ditadura da mentira. Como presidente da FUNAI em 18 de maio de 1987 assinou a Portaria DNPM/01/87, que autorizaria a exploração de minério em áreas indígenas não fosse derrubada pelo Congresso Nacional. E expulsou um casal de professores da área Waimiri-Atroari por esclarecerem os índios sobre a atuação da Mineradora Paranapanema que se apossara de suas terras. Romero os acusou de servirem “a interesses estrangeiros”, acobertando assim, pela mentira, as empresas estrangeiras que então controlavam o minério estratégico do Pitinga, as japonesas, Marubini e Industrial Bank of Japan. E o casal de professores brasileiros foi substituído por um casal de lingüistas norte-americanos. Mais recentemente, a Paranapanema passou ao controle de peruanos. Tanto o já senador Jucá, como o deputado Sinésio Campos e Daniel Nava, silenciam o fato.

     

    A proposta do deputado Sinésio de querer “trabalhar a exploração mineral em Terras Indígenas no Amazonas nos moldes da mineração praticada pelos indígenas no Canadá” é, no mínimo, cínica. Se tiver dúvidas sobre esta grave acusação peço ao deputado que leia National Geographic de março 2009: “O Boom do Petróleo no Canadá: Terra Devastada”. Leia com atenção e interprete o texto com toda a sinceridade. Veja os Chipewyan e Cree que viveram até 1963 felizes e sadios em sua terra. Veja o destino que lhes foi imposto com a invasão das empresas de betume Syncrude e Suncor. É por esse caminho que vocês querem levar as comunidades e os povos indígenas da Amazônia? E meu caro Bonifácio Baniwa, sim, “O indígena de hoje, não é o mesmo da época do descobrimento do Brasil”, mas a entrada na academia não lhe garante maior sabedoria sobre aqueles que ao longo da História, vendo seu povo ludibriado e roubado, morreram resistindo contra a iniqüidade.

     

    Ao longo de toda a História brasileira, a exploração mineral tem sido sempre uma atividade feita “na escuridão”. E como no tempo do Brasil Colônia, hoje, o minério (bem não renovável) continua saindo do país sem vantagem para a população local. Enquanto os pobres e excluídos não ocuparem as cadeiras no painel das discussões, interesses poderosos continuarão “conquistando leis” e, como em Vila Rica e em Sabará, os índios, os garimpeiros e até os “bandeirantes” e os “descobridores” das minas desaparecem de mãos vazias. Apenas, lá do outro lado, alguns “emboabas”, ou estrangeiros, apoiados por políticos e funcionários corruptos daqui, se enriquecem.

     

     

    Uma das Crateras de Pitinga que contaminam as águas dos Waimiri-Atroari.

    Foto: Ângelo Ricardo S. Chaves (Dezembro de 2008).

     

    Situação emblemática assistimos aqui em Presidente Figueiredo, onde desfilam diariamente mais de uma centena de carretas, carregadas de minério, deixando para trás apenas crateras e a rodovia BR-174 cheia de buracos. Há meio ano, reunidos na Câmara Municipal e na presença do deputado Sinésio e de Daniel Nava, o próprio Prefeito Municipal se queixou dos donos da Mineração Taboca ou Paranapanema, hoje peruanos que sequer se teriam apresentado ao mandatário municipal. E exploram aqui no Pitinga a maior mina de minérios estratégicos do país, enquanto as principais obras do município são todas financiadas pelo Governo Federal.

     

    Em 1991, a Associação Profissional dos Geólogos do Amazonas estimou a perda de receita, somente no projeto Pitinga, na ordem de US$ 63 milhões. E o Prof. José Aldemir de Oliveira, da Universidade Federal do Amazonas, na tese de doutoramento “Cidades na Selva” cita as palavras de um funcionário da SEFAZ que assim descreveu o mecanismo de fiscalização: “Não sabemos na verdade quanto nem o que está sendo fiscalizado. Mesmo que parássemos as carretas e fiscalizássemos, teríamos dificuldades para identificar se o minério que a empresa diz ser cassiterita realmente o é. Então não fazemos nenhuma fiscalização. Mensalmente, um funcionário da Taboca nos telefona comunicando o número da guia e o valor correspondente que eles recolheram ao Banco referente ao imposto”.

     

    Quando leio o relato de Frei Carvajal, sobre a viagem do Conquistador Orellana pelo rio Amazonas em 1540 e comparo o que passava pelas suas cabeças naquele tempo, com o que passa pelas cabeças do Governador do Amazonas e de seus secretários e assessores, Sinésio e Daniel hoje, não vejo diferença alguma. Mesmo navegando diariamente no meio da felicidade e da abundancia das aldeias indígenas, eles só sonhavam com minério, minério e mais minério, oficializando ao longo do rio Amazonas o que os espanhóis já praticavam na costa do Pacífico e no Altiplano. O bem-estar das aldeias, a abundância de comida, só era motivo de admiração e de inescrupuloso saque. Nada mais interessava ao Orellana e seus acompanhantes, inclusive, ao “santo” dominicano Carvajal. Mutantis mutandi, o que interessa aos governantes do Amazonas e de seus assessores, Sinésio e Daniel, é oficializar o que a Paranapanema já vem praticando na terra roubada aos índios Waimiri-Atroari no Pitinga ou o que a Syncrude e Suncor praticam nas terras dos Chipewyan e Cree, no Canadá.

     

    Travestir uma ou outra liderança em “empresário” para serviços sujos da firma, como o faz a Syncrude com Jim Boucher e a Mineração Rio do Norte com lideranças quilombolas no Rio Trombetas / PA, é mero engodo.

     

    Concluo com National Geographic: O índio “tem consciência do preço que tem de ser pago. ’É uma luta para equilibrar as necessidades de hoje e as de amanhã, quando se pensa no ambiente em que vamos viver’, diz Boucher. Na região norte da província de Alberta (Canadá), a questão de como alcançar tal equilíbrio foi colocada nas mãos do mercado, e uma das respostas dele foi deixar de lado o futuro. O amanhã não é de sua conta.”

     

    Presidente Figueiredo (AM), 20 de março de 2011.

     

    Egydio Schwade

    Casa da cultura do Urubuí

     

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