• 23/08/2012

    TRF1 sobre Belo Monte: “Não podemos admitir um ato congressual no estado democrático de direito que seja um ato de ditadura”

    A Norte Energia já paralisou as obras civis. O acórdão com a ordem para realização das consultas indígenas foi divulgado hoje

     

    A Norte Energia S.A, responsável pela construção da usina de Belo Monte, paralisou hoje as obras civis em Altamira e Vitória do Xingu, depois de receber o acórdão da 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, que determinou a paralisação. A decisão atendeu pedido do Ministério Público Federal no Pará e anulou o decreto legislativo 788/2005 e todas as licenças concedidas pelo Ibama para o empreendimento.

     

    Para a 5ª Turma do TRF1, formada pelos desembargadores Antonio Souza Prudente, João Batista Moreira e Selene Almeida, o decreto que autorizou Belo Monte só poderia ter sido aprovado pelo Congresso Nacional depois dos estudos de impacto ambiental e das consultas indígenas. Eles consideram que, pela Convenção 169 da OIT e pela Constituição brasileira, os índios têm o direito de exercer a participação democrática e decidir previamente sobre seu destino e o das futuras gerações.

     

    “Somente será possível ao Congresso nacional autorizar o empreendimento Belo Monte, consultadas previamente as comunidades indígenas, diante dos elementos colhidos no estudo de impacto ambiental e respectivo relatório conclusivo, porque, do contrário, a letra da Constituição é letra morta, é um faz de conta. Não podemos admitir um ato congressual no estado democrático de direito que seja um ato de ditadura, um ato autoritário, um ato que imponha às comunidades indígenas um regime de força”, diz o voto do relator Antonio Souza Prudente, acolhido por unanimidade pela 5ª Turma.

     

    Para o Tribunal, Belo Monte causará “interferência direta no mínimo existencial-ecológico das comunidades indígenas, com reflexos negativos e irreversíveis para a sua qualidade de vida e patrimônio cultural”. Portanto, o debate sobre a consulta indígena em Belo Monte se sobrepõe a qualquer outro interesse de cunho político e econômico, “é questão que excede o mero interesse individual das partes e afeta de modo direto o interesse da comunidade em geral”.

     

    “Embora possa estar aqui pregando no deserto, não posso deixar de mencionar que talvez estejamos, no caso de Belo Monte, apenas diante da primeira construção de uma grande usina, com potenciais de impacto imenso no meio ambiente, e que afetará populações indígenas e ribeirinhos e, eventualmente, outras populações tradicionais que não são mencionadas nos autos. Não podemos começar errando”, disse a desembargadora Selene Almeida em seu voto.

     

    “Nossos quinhentos anos de erros relativamente ao trato com os povos indígenas não mais se justificam, à luz do Direito Internacional dos Direitos Humanos e da consciência social e ética que este país adquiriu, principalmente após a redemocratização”, completou. A desembargadora Selene Almeida questionou ainda o planejamento do setor energético: “se o Estado brasileiro sabe, a priori, quais serão os locais de possível construção, não existe motivo para a improvisação que ora se assiste no tema de consulta prévia de povos indígenas relativamente às obras que os afetarão de forma permanente, irreversível”

     

    O desembargador João Batista Moreira afirmou que o que o Ibama, a Funai e a União vêm alegando serem as consultas indígenas não passaram de processo de informação às comunidades. “Estas não foram ouvidas, mas simplesmente ouviram o que os servidores do Poder Executivo tinham para lhes dizer. Não foi um processo de audiência, mas processo inverso, unidirecional”, afirmou.

     

    Guinnes Book – Ao contrário do que havia definido o desembargador Fagundes de Deus no julgamento anterior do mesmo caso, os desembargadores afirmaram agora que o decreto 788/2005 jamais foi considerado constitucional pelo Supremo Tribunal Federal. No julgamento anterior, o desembargador Fagundes de Deus apresentou a tese de que uma decisão monocrática da então presidente Ellen Gracie havia declarado a constitucionalidade do decreto.

     

    O acórdão refutou a tese de Fagundes de Deus: só decisão colegiada da maioria absoluta dos membros do STF pode declarar a constitucionalidade. “O decreto Legislativo 788/2005 tem um histórico bem estranho nos anais do Congresso Nacional. Tudo indica que é um decreto encomendado para ser empurrada uma autorização goela adentro para a implantação do projeto hidrelétrico Belo Monte”, diz o voto de Souza Prudente.

     

    Na época da votação, o então senador pelo Pará, Luiz Otavio Campos, chegou a se espantar com a rapidez da tramitação do decreto 788. “Isso não bate! Essa história de que Belo Monte vai resolver o apagão, essa obra é para 10, 15, 20 anos. Então o motivo não é o apagão. Não é possível, em uma sessão como a de hoje, chegar aqui de pára-quedas o projeto, e termos de votá-lo hoje. Porque tem que ser hoje? Em quatro dias! É recorde mundial. Com certeza esse projeto vai para o Guinness Book”, registram as notas taquigráficas da sessão do Congresso, citadas pelo TRF1 na decisão que parou Belo Monte.

     

    Processo número 2006.3903.000.711-8

     

    Íntegra do acórdão

     

    Outros trechos da decisão

     

    Ministério Público Federal no Pará

    Assessoria de Comunicação

    (91) 3299-0148 / 3299-0177

    ascom@prpa.mpf.gov.br

    http://www.prpa.mpf.gov.br

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    http://www.facebook.com/MPFPara

     

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  • 23/08/2012

    Todo apoio do Povo Ka’apor à luta contra Belo Monte

    Prezados parentes e amigos que estão sofrendo ameaças com a construção de Belo Monte. Assim como vocês estão sofrendo ameaças com a construção dessa hidrelétrica, nós, Povo Ka’apor, do Maranhão, estamos sofrendo com as ameaças e invasões de madeireiros e fazendeiros em nosso território por causa de nossos bens naturais, as nossas florestas e tudo que existe nela. São fazendeiros, madeireiros, donos de serraria, prefeitos, e outras pessoas que comandam a invasão de nosso território. Não temos nenhum apoio e nem proteção do governo do Estado, nem da FUNAI e outros órgãos que deveriam garantir a proteção de nosso território. A gente tem percebido que esses órgãos têm abandonado a proteção dos povos que protegem as florestas e rios.

    A gente ficou muito alegre com a notícia de que a Justiça suspendeu as obras de Belo Monte, que mostra o desrespeito das empresas, do governo federal e estadual com os direitos dos povos que vivem e depende do Rio Xingu para viver. A gente é solidário à luta de vocês contra esse monstro. Nós estivemos em outubro de 2011 com vocês no Seminário dos Povos do Xingu, em Altamira, Pará, e vimos como deve ser difícil enfrentar as ameaças dessas empresas que estão invadindo, ameaçando o Rio Xingu. Continuem contando sempre com nossa solidariedade, nosso apoio. Vamos continuar torcendo e lutando com vocês para continuarem vivendo e protegendo o Rio Xingu.

    Associação Ka’apor ta hury do Rio Gurupi – KAAPORTARUPI

    Comissão de Educação Ka’apor.

    Povo Ka’apor da Terra Indígena Alto Turiaçu

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  • 23/08/2012

    Movimento Tapajós Vivo realiza encontro

    Por Guenter Francisco Loebens,

    de Itaituba, Pará

     

    Com o objetivo de organizar a resistência contra a imposição das hidrelétricas do rio Tapajós foi realizado nos dias 21 e 22 de agosto, de 2012, um encontro na comunidade ribeirinha de Pimental, município de Itaituba/PA, promovido pelo Movimento Tapajós Vivo, com a presença do Procurador Dr. Felício Pontes do MPF/PA e 60 lideranças comunitárias, indígenas, religiosas e de organizações da sociedade civil.

     

    O complexo hidrelétrico previsto para o rio Tapajós é composto pelas hidrelétricas São Luiz do Tapajós, Jatobá, Cachoeira do Caí, Jamanxim e Cachoeira dos Patos, nos rios Tapajós e Jamanxim.

     

    Para uma melhor compreensão dos possíveis impactos sócio-ambientais que as barragens, se construídas provocarão no rio Tapajós, das estratégias governamentais que serão usadas para sua instalação e das formas de resistência popular, Antonia Melo (Movimento Xingu Vivo) e Márcia Nunes Maciel (Instituto Madeira Vivo) fizeram um relato sobre as experiências de enfrentamento das hidrelétricas no Rio Xingu e no Rio Madeira.

     

    O líder de Pimental, Odair Pereira Matos denunciou o desrespeito das empresas a serviço do projeto de construção da hidrelétrica São Luís, que chegam à comunidade com o objetivo de realizar pesquisas, sem pedir licença.  Pimental é uma das comunidades a ser alagada pelo empreendimento. O Estudo de Impacto Ambiental da hidrelétrica de São Luis (EIA) está em pleno andamento.

     

    As lideranças Munduruku das terras indígenas do médio rio Tapajós, que serão afetadas, manifestaram-se veementemente contrárias à construção das barragens, assim como as lideranças comunitárias de Pimental. “Quando eu penso nos meus filhos dói no meu coração”, afirmou um líder Munduruku.

     

    De acordo com o Procurador, a exemplo do que ocorreu com Belo Monte, no Rio Xingu, que teve sua licença prévia de instalação invalidada pelo Tribunal Regional Federal 1º(TRF 1º), também em relação às hidrelétricas do rio Tapajós está sendo desrespeitado o direito das comunidades indígenas e ribeirinhas de serem consultados de forma prévia, livre e informada, como determina a Convenção 169 da OIT. No caso dos povos indígenas o direito de consulta também é uma disposição constitucional e a oitiva deve ser realizada pelo Congresso Nacional. Isso quer dizer que de acordo com a lei existe um vício de origem e que tudo o que foi feito até agora não tem validade.

     

    O Movimento Tapajós Vivo ao final do encontro estabeleceu como seu objetivo maior “defender a vida do rio Tapajós contra todas as ameaças e morte e o direito dos povos indígenas, ribeirinhos e das populações locais”. Com base nesse objetivo formulou suas estratégias de articulação, mobilização e enfrentamento.

     

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  • 22/08/2012

    Mensagem da Assembleia do Regional Goiás/Tocantins em celebração aos 40 anos do Cimi

    À beira do rio Tocantins, em Miracema (TO), bispos, missionários e missionárias, indígenas dos estados de Goiás e Tocantins, nos reunimos para celebrar os 40 anos de uma nova forma de presença, luta e testemunho missionário junto aos povos indígenas.

     

    Foi um grande momento de agradecimento e louvor ao Deus da Vida pela caminhada esperançosa de quatro décadas junto aos povos indígenas.

     

    A memória perigosa e o sangue dos mártires nos reanimaram em nosso compromisso com a causa desses povos, em sua caminhada de luta, resistência e afirmação de seus projetos de vida, de Bem Viver.

     

    Vemos com alegria que povos praticamente condenados ao desaparecimento, como os Avá Canoeiro, assumiram a luta pelos seus direitos, especialmente seu território tradicional. Igualmente vemos com esperança a crescente participação e protagonismo das mulheres nas lutas pela vida e direitos dos povos indígenas da região.

     

    Constatamos que os decretos de extermínio dos povos indígenas perpassaram esses 40 anos e continuam se atualizando a cada dia, através de um sistema perverso de negação e violação dos direitos desses povos.

     

    Após os sofrimentos e ameaças dos grandes projetos, como as hidrelétricas, agora pesam sobre os povos da região e do país, as ameaças da extração mineral (Projeto de Lei 1.610), com seu mar de lama e destruição do meio ambiente e impacto mortífero sobre as populações.

     

    Com eles denunciamos as intenções e práticas genocidas embutidos na portaria 303, no PEC 215 e outras iniciativas e ações advindas dos três poderes, que desrespeitam e ferem a Constituição e os direitos originários desses povos, por seus territórios, recursos naturais e formas plurais de viver em paz e serem felizes.

     

    Continuaremos apoiando os processos de informação e formação das comunidades indígenas, na perspectiva de fortalecer seu poder de mobilização na luta pelos seus direitos e construção da autonomia em seus territórios.

     

    Continuaremos honrando o sangue mártir dos que tombaram e deram sua vida pela causa indígena nestes 40 anos do Cimi, selando e renovando nosso compromisso e testemunho com essa causa.

     

    Que as águas revoltas dos rios represados e os fortes ventos de agosto nos embalem no renovado vigor de nossa missão com a vida, direitos e Bem Viver dos povos indígenas de Abya Yala, Ameríndia, América.

     

    Miracema, TO, 22 de agosto de 2012.

     

    Cimi Regional Goiás/Tocantins

     

    Povos: Avá Canoeiro, Xerente, Krahô, Karajá, Apinajé, Krahô-Kanela, Karajá de Xambioá, Tapuia, Javaé

     

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  • 22/08/2012

    Declaração do Encontro Nacional Unitário dos Trabalhadores e Trabalhadoras e Povos do Campo, das Águas e das Florestas

    Terminou hoje o Encontro Unitário dos Trabalhadores, Trabalhadoras e Povos do Campo, das Águas e das Florestas. Reunidos desde o dia 20 em Brasília, sete mil representantes de organizações camponesas, agricultores, pescadores, quilombolas, povos indígenas e tradicionais aprovaram um declaração exigindo “o redirecionamento das políticas e ações do Estado brasileiro, pois campo não suporta mais [a política do governo]”, aponta o texto. O documento também indica a necessidade do fortalecimento da luta e da unidade política entre as organizações sociais.


    Para as lideranças indígenas que participaram do encontro, é fundamental que surja uma articulação nacional como essa, de resistência e de luta pela garantia da terra do território entre os indígenas e o campo e a cidade, que prepare pautas comuns e processos unitários de luta entre si em torno da luta por direitos, por autonomia e por soberania.


    Repressão

    Na quarta, 22, os participantes finalizaram o encontro realizando uma marcha do Parque da Cidade até a Praça dos Três Poderes. O protesto, chamado de “Manifestação dos Povos do Campo, das Águas e das Florestas”, foi recebido com spray de pimenta, cassetetes, cães e bombas de gás lacrimogêneo pela Tropa de Choque do Exército, pela Polícia Militar e pela segurança do Planalto – além da presença tradicional dos Dragões da Independência – apelidados de “paquitos” pelos manifestantes.


    Leia o documento final na íntegra.


    Por Terra, Território e Dignidade!

     

    Após séculos de opressão e resistência, “as massas camponesas oprimidas e exploradas”, numa demonstração de capacidade de articulação, unidade política e construção de uma proposta nacional, se reuniram no “I Congresso Nacional dos Lavradores e Trabalhadores Agrícolas sobre o caráter da reforma agrária”, no ano de 1961, em Belo Horizonte. Já nesse I Congresso os povos do campo, assumindo um papel de sujeitos políticos, apontavam a centralidade da terra como espaço de vida, de produção e identidade sociocultural.

     

    Essa unidade e força política levaram o governo de João Goulart a incorporar a reforma agrária como parte de suas reformas de base, contrariando os interesses das elites e transformando-se num dos elementos que levou ao golpe de 1964. Os governos golpistas perseguiram, torturaram, aprisionaram e assassinaram lideranças, mas não destruíram o sonho, nem as lutas camponesas por um pedaço de chão.

     

    Após décadas de resistência e denuncias da opressão, as mobilizações e lutas sociais criaram condições para a retomada e ampliação da organização camponesa, fazendo emergir uma diversidade de sujeitos e pautas. Junto com a luta pela reforma agrária, a luta pela terra e por território vem afirmando sujeitos como sem terra, quilombolas, indígenas, extrativistas, pescadores artesanais, quebradeiras, comunidades tradicionais, agricultores familiares, camponeses, trabalhadores e trabalhadoras rurais e demais povos do campo, das águas e das florestas. Neste processo de constituição de sujeitos políticos, afirmam-se as mulheres e a juventude na luta contra a cultura patriarcal, pela visibilidade e igualdade de direitos e dignidade no campo.

     

    Em nova demonstração de capacidade de articulação e unidade política, nós homens e mulheres de todas as idades, nos reunimos 51 anos depois, em Brasília, no Encontro Nacional Unitário de Trabalhadores e Trabalhadoras, Povos do Campo, das Águas e das Florestas, tendo como centralidade a luta de classes em torno da terra, atualmente expressa na luta por Reforma Agrária, Terra, Território e Dignidade.

     

    Nós estamos construindo a unidade em resposta aos desafios da desigualdade na distribuição da terra. Como nos anos 60, esta desigualdade se mantém inalterada, havendo um aprofundamento dos riscos econômicos, sociais, culturais e ambientais, em conseqüência da especialização primária da economia.

     

    A primeira década do Século XXI revela um projeto de remontagem da modernização conservadora da agricultura, iniciada pelos militares, interrompida nos anos noventa e retomada como projeto de expansão primária para o setor externo nos últimos doze anos, sob a denominação de agronegócio, que se configura como nosso inimigo comum.

     

    Este projeto, na sua essência, produz desigualdades nas relações fundiárias e sociais no meio rural, aprofunda a dependência externa e realiza uma exploração ultrapredatória da natureza. Seus protagonistas são o capital financeiro, as grandes cadeias de produção e comercialização de commodities de escala mundial, o latifúndio e o Estado brasileiro nas suas funções financiadora – inclusive destinando recursos públicos para grandes projetos e obras de infraestrutura – e (des)reguladora da terra.

     

    O projeto capitalista em curso no Brasil persegue a acumulação de capital especializado no setor primário, promovendo super-exploração agropecuária, hidroelétrica, mineral e petroleira. Esta super-exploração, em nome da necessidade de equilibrar as transações externas, serve aos interesses e domínio do capital estrangeiro no campo através das transnacionais do agro e hidronegócio.

     

    Este projeto provoca o esmagamento e a desterritorialização dos trabalhadores e trabalhadoras dos povos do campo, das águas e das florestas. Suas conseqüências sociais e ambientais são a não realização da reforma agrária, a não demarcação e reconhecimento de territórios indígenas e quilombolas, o aumento da violência, a violação dos territórios dos pescadores e povos da floresta, a fragilização da agricultura familiar e camponesa, a sujeição dos trabalhadores e consumidores a alimentos contaminados e ao convívio com a degradação ambiental. Há ainda conseqüências socioculturais como a masculinização e o envelhecimento do campo pela ausência de oportunidades para a juventude e as mulheres, resultando na não reprodução social do campesinato.

     

    Estas conseqüências foram agravadas pela ausência, falta de adequação ou caráter assistencialista e emergencial das políticas públicas. Estas políticas contribuíram para o processo de desigualdade social entre o campo e a cidade, o esvaziamento do meio rural e o aumento da vulnerabilidade dos sujeitos do campo, das águas e das florestas. Em vez de promover a igualdade e a dignidade, as políticas e ações do Estado, muitas vezes, retiram direitos e promovem a violência no campo.

     

    Mesmo gerando conflitos e sendo inimigo dos povos, o Estado brasileiro nas suas esferas do Executivo, Judiciário e Legislativo, historicamente vem investindo no fortalecimento do modelo de desenvolvimento concentrador, excludente e degradador. Apesar de todos os problemas gerados, os sucessivos governos – inclusive o atual – mantêm a opção pelo agro e hidronegócio.

     

    O Brasil, como um país rico em terra, água, bens naturais e biodiversidade, atrai o capital especulativo e agroexportador, acirrando os impactos negativos sobre os territórios e populações indígenas, quilombolas, comunidades tradicionais e camponesas. Externamente, o Brasil vem se tornando alavanca do projeto neocolonizador, expandindo este modelo para outros países, especialmente na América Latina e África.

     

    Torna-se indispensável um projeto de vida e trabalho para a produção de alimentos saudáveis em escala suficiente para atender as necessidades da sociedade, que respeite a natureza e gere dignidade no campo. Ao mesmo tempo, o resgate e fortalecimento dos campesinatos, a defesa e recuperação das suas culturas e saberes se faz necessário para projetos alternativos de desenvolvimento e sociedade.

     

    Diante disto, afirmamos:

     

    1) a reforma agrária como política essencial de desenvolvimento justo, popular, solidário e sustentável, pressupondo mudança na estrutura fundiária, democratização do acesso à terra, respeito aos territórios e garantia da reprodução social dos povos do campo, das águas e das florestas.

     

    2) a soberania territorial, que compreende o poder e a autonomia dos povos em proteger e defender livremente os bens comuns e o espaço social e de luta que ocupam e estabelecem suas relações e modos de vida, desenvolvendo diferentes culturas e  formas de produção e reprodução,  que marcam e dão identidade ao território.

     

    3) a soberania alimentar como o direito dos povos a definir suas próprias políticas e estratégias sustentáveis de produção, distribuição e consumo de alimentos que garantam o direito à alimentação adequada a toda a população, respeitando suas culturas e a diversidade dos jeitos de produzir, comercializar e gerir estes processos.

     

    4) a agroecologia como base para a sustentabilidade e organização social e produtiva da agricultura familiar e camponesa, em oposição ao modelo do agronegócio. A agroecologia é um modo de produzir e se relacionar na agricultura, que preserva a biodiversidade, os ecossistemas e o patrimônio genético, que produz alimentos saudáveis, livre de transgênicos e agrotóxicos, que valoriza saberes e culturas dos povos do campo, das águas e das florestas e defende a vida.

     

    5) a centralidade da agricultura familiar e camponesa e de formas tradicionais de produção e o seu fortalecimento por meio de políticas públicas estruturantes, como fomento e crédito subsidiado e adequado as realidades; assistência técnica baseada nos princípios agroecológicos; pesquisa que reconheça e incorpore os saberes tradicionais; formação, especialmente da juventude; incentivo à  cooperação, agroindustrialização e comercialização.

     

    6) a necessidade de relações igualitárias, de reconhecimento e respeito mútuo, especialmente em relação às mulheres, superando a divisão sexual do trabalho e o poder patriarcal e combatendo todos os tipos de violência.

     

    7) a soberania energética como um direito dos povos, o que demanda o controle social sobre as fontes, produção e distribuição de energia, alterando o atual modelo energético brasileiro.

     

    8) a educação do campo, indígena e quilombola como ferramentas estratégicas para a emancipação dos sujeitos, que surgem das experiências de luta pelo direito à educação e por um projeto político-pedagógico vinculado aos interesses da classe trabalhadora.  Elas se contrapõem à educação rural, que tem como objetivo auxiliar um projeto de agricultura e sociedade subordinada aos interesses do capital, que submete a educação escolar à preparação de mão-de-obra minimamente qualificada e barata e que escraviza trabalhadores e trabalhadoras no sistema de produção de monocultura.

     

    9) a necessidade de democratização dos meios de comunicação, hoje concentrados em poucas famílias e a serviço do projeto capitalista concentrador,  que criminalizam os movimentos e organizações sociais do campo, das águas e das florestas.

     

    10) a necessidade do reconhecimento pelo Estado dos direitos das populações atingidas por grandes projetos, assegurando a consulta livre, prévia e informada e a reparação nos casos de violação de direitos.

     

    Nos comprometemos:

     

    1. a fortalecer as organizações sociais e a intensificar o processo de unidade entre os trabalhadores e trabalhadoras, povos do campo, das águas e das florestas, colocando como centro a luta de classes e o enfrentamento ao  inimigo comum, o capital e sua expressão atual no campo, o agro e hidronegócio.

     

    2. a ampliar a unidade nos próximos períodos, construindo pautas comuns e processos unitários de luta pela realização da reforma agrária, pela reconhecimento, titulação, demarcação e desintrusão das terras indígena, dos territórios quilombolas e de comunidades tradicionais, garantindo direitos territoriais, dignidade e autonomia.

     

    3. a fortalecer a luta pela reforma agrária  como bandeira unitária dos trabalhadores e trabalhadoras e povos do campo, das águas e das florestas.

     

    4. a construir e fortalecer alianças entre sujeitos do campo e da cidade, em nível nacional e internacional, em estratégias de classe contra o capital e em defesa de uma sociedade justa, igualitária, solidária e sustentável.

     

    5. a lutar pela transição agroecológica massiva, contra os agrotóxicos, pela produção de alimentos saudáveis, pela soberania alimentar, em defesa da biodiversidade e das sementes.

     

    6. a construir uma agenda comum para rediscutir os critérios de construção, acesso, abrangência, caráter e controle social sobre as políticas públicas, a exemplo do PRONAF, PNAE, PAA, PRONERA, PRONACAMPO, pesquisa e extensão, dentre outras, voltadas para os povos do campo, das águas e das florestas.

     

    7. a fortalecer a luta das mulheres por direitos, pela igualdade e pelo fim da violência.

     

    8. a ampliar o reconhecimento da importância estratégica da juventude na dinâmica do desenvolvimento e na reprodução social dos povos do campo, das águas e das florestas.

     

    9. a lutar por mudanças no atual modelo de produção pautado nos petro-dependentes, de alto consumo energético.

     

    10. a combater e denunciar a violência e a impunidade no campo e a criminalização das lideranças e movimentos sociais, promovidas pelos agentes públicos e privados.

     

    11. a lutar pelo reconhecimento da responsabilidade do Estado sobre a morte e desaparecimento forçado de camponeses, bem como os direitos de reparação aos seus familiares, com a criação de uma comissão camponesa pela anistia, memória, verdade e justiça para incidir nos trabalhos da Comissão Especial sobre mortos e desaparecidos políticos, visando a inclusão de todos afetados pela repressão.

     

    Nós, trabalhadores e trabalhadoras, povos do campo, das águas e das florestas exigimos o redirecionamento das políticas e ações do Estado brasileiro, pois o campo não suporta mais.  Seguiremos em marcha, mobilizados em unidade e luta e, no combate ao nosso inimigo comum, construiremos um País e uma sociedade justa, solidária e sustentável.

     

    Brasília, 22 de agosto de 2012.

     

    Associação das Casas Familiares Rurais (ARCAFAR)

    Associação das Mulheres do Brasil (AMB)

    Associação Brasileira de Reforma Agrária (ABRA)

    Associação Brasileira dos Estudantes de Engenharia Florestal (ABEEF)

    Articulação Nacional de Agroecologia (ANA)

    Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB)

    Conselho Indigenista Missionário (Cimi)

    Cáritas Brasileira

    Coordenação Nacional dos Quilombolas (CONAQ)

    Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG)

    Comissão Pastoral da Pesca (CPP)

    Comissão Pastoral da Terra (CPT)

    Central dos Trabalhadores do Brasil (CTB)

    Central Única dos Trabalhadores (CUT)

    Federação dos Estudantes de Agronomia do Brasil (FEAB)

    Federação dos Trabalhadores da Agricultura Familiar (FETRAF)

    Fase

    Greenpeace

    Inesc

    Marcha Mundial das Mulheres (MMM)

    Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB)

    Movimento Camponês Popular (MCP)

    Movimento das Mulheres Camponesas (MMC)

    Movimento das Mulheres Trabalhadoras Rurais do Nordeste (MMTR-NE)

    Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA)

    Movimento dos Pescadores e Pescadoras Artesanais (MPP)

    Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST)

    Movimento Interestadual das Mulheres Quebradeiras de Coco Babaçu (MIQCB)

    Oxfam Brasil

    Pastoral da Juventude Rural (PJR)

    Plataforma Dhesca

    Rede Cefas

    Sindicato Nacional dos Trabalhadores em Pesquisa e Desenvolvimento Agropecuário (SINPAF)

    SINPRO DF

    Terra de Direitos

    Unicafes

    Via Campesina Brasil

     

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  • 21/08/2012

    Belo Monte parou: as mentiras da Norte Energia e as demandas de reversão de danos

    Na última semana, a 5ª turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) votou pela nulidade do decreto legislativo nº 788, de 2005, que permitiu o licenciamento de Belo Monte e o início das obras da usina antes mesmo da realização de estudo de impacto ambiental (EIA). O projeto foi paralisado até que os indígenas sejam consultados pelo Congresso Nacional – com poder de veto -, e todo o processo de discussão da viabilidade e autorização da hidrelétrica seja reiniciado em conformidade com a lei.


    A decisão do TRF acatou parcialmente um recurso do Ministério Público Federal e anulou um dos maiores atropelos da Constituição Federal e da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) cometidos pelo governo brasileiro nos últimos anos, como esclareceu o desembargador Antonio de Souza Prudente, relator do processo.


    Ainda na última semana, em resposta à decisão da Justiça – classificada como “inadmissível” pela Norte Energia S.A -, a empresa divulgou uma nota em que desfia um rosário de incongruências:

    – Afirma que norteia suas ações pelo respeito à Constituição, o que foi evidentemente desmentido pela decisão do TRF1.

     

    – Afirma ter cumprido rigorosamente todas as exigências legais de Belo Monte, enquanto é alvo de multa de R$ 7 milhões do Ibama e várias ações do MPF por descumprimento das condicionantes das licenças prévia e de instalação da obra.

    – Afirma que nenhuma terra indígena será diretamente afetada pela hidrelétrica, enquanto negocia – e não cumpre – medidas de minimização de impactos. Incoerentemente, na mesma nota em que diz que os indígenas não serão afetados, afirma que “durante as reuniões nas aldeias, foram prestadas todas as informações sobre o projeto, o que incluiu seus impactos, mitigações e compensações estabelecidas no componente indígena, aprovado pela Funai”.

    – Afirma que prestou todos os esclarecimentos necessários aos indígenas, enquanto seus funcionários foram retidos na aldeia Muratu por uma semana exatamente por falta de clareza sobre os mecanismos que alegadamente iria adotar para possibilitar a navegação do Xingu após o barramento completo do rio.

    – Afirma que os povos indígenas, por livre arbítrio, apóiam Belo Monte, enquanto durante todo o processo de implantação das obras multiplicaram-se manifestações indígenas contrárias à hidrelétrica, que culminaram numa ocupação de semanas da barragem provisória da usina, entre os meses de junho e julho.

    – Afirma que a paralisação de Belo Monte deixará mais de 20 mil desempregados, enquanto seus próprios números contabilizam 12 mil funcionários, sendo 9 mil empregos diretos e 3 mil indiretos.

    – Por fim, faz ameaças de retaliação ilegal ao afirmar, como se estivesse falando em nome do governo, que o financiamento público do Plano de Desenvolvimento Regional Sustentável do Xingu (PDRSX), que visa o atendimento das populações de 11 municípios da área de impacto de Belo Monte, será suspenso.

    Posto isso, e diante da realidade da paralisação da hidrelétrica, o  Movimento Xingu Vivo para Sempre publicamente demanda agora da Norte Energia e do governo os seguintes esclarecimentos:

    Visto que o decreto que ilegalmente autorizou as obras de Belo Monte foi anulado, e junto com ele as licenças prévia e de instalação, em que prazo serão encaminhadas as seguintes medidas emergenciais de reversão dos principais impactos sobre as populações afetadas e o meio ambiente:

    – destruição das três ensecadeiras (barragens provisórias) já construídas no Xingu e restauração do livre fluxo do rio e de sua navegabilidade.

    – recomposição da mata nativa dos 238 hectares desmatados para a construção de canteiros da usina e das demais áreas degradadas pelas obras, como os igarapés do Paquiçamba.

    – restituição das áreas de pequenos agricultores compulsoriamente desapropriadas.

    – recomposição dos plantios de culturas, principalmente de cacau, das áreas desapropriadas.

    – restituição das áreas e reconstrução das casas de ribeirinhos compulsoriamente desapropriadas e demolidas, como as da Vila de Santo Antonio.

    – Indenização das comunidades rurais, ribeirinhas, indígenas e de pescadores por danos econômicos, morais, ambientais e culturais.

    O Movimento Xingu Vivo para Sempre cumprimenta, parabeniza e honra a decisão da 5ª turma do TRF1 e do desembargador Antonio de Souza Prudente, de devolver ao país um pouco de fé na Justiça e na premissa de que a Constituição há que ser respeitada à revelia de interesses econômicos e políticos.

    Comemoramos a paralisação de Belo Monte como uma reafirmação da justeza da nossa luta e da de milhares de defensores do meio ambiente e dos direitos humanos no Brasil e no mundo. Estaremos mobilizados para apoiar e defender esta decisão histórica da Justiça, a Constituição Federal e os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil contra todos os ataques que venham a sofrer.

     

    Mas consideramos que não basta parar um crime; é necessário sanar e curar todos os males que causou.

    Pela vida do Xingu, Justiça já!
    Movimento Xingu Vivo para Sempre

     

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  • 21/08/2012

    Manifesto do Fórum Permanente de Presidentes dos Conselhos Distritais de Saúde Indígena pela revogação integral da Portaria 303 da AGU

    Nós, lideranças indígenas, Presidentes dos Conselhos Distritais de Saúde Indígena, membros do Fórum Permanente de Presidentes de CONDISI, reunidos em nossa VI Reunião Ordinária, no período de 20 a 24 de agosto de 2012, vimos manifestar publicamente o nosso repúdio contra a publicação da Portaria N°. 303/2012 da Advocacia Geral da União – AGU, considerando o ataque frontal praticado pelo Governo da Presidente Dilma Rousseff, aos direitos territoriais dos nossos povos com a edição dessa portaria.

     

    Nos solidarizamos a todos os manifestos feitos pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) e demais organizações parceiras contra esta medida autoritária, própria de um regime ditatorial, cujo único propósito é restringir e reverter os direitos dos povos indígenas garantidos pela Constituição Federal de 1988 e por instrumentos internacionais ao qual o Brasil é signatário, como a Convenção 169 da OIT, que é lei no país desde 2004, e a Declaração das Nações Unidas (ONU) sobre os direitos dos Povos Indígenas.

     

    Repudiamos esta medida praticada justamente por quem deveria defender os direitos dos nossos povos, mas que decidiu arbitrar em favor dos inimigos históricos dos povos indígenas, que sempre foram secularmente submetidos a constantes ataques de toda ordem nos distintos âmbitos do Estado, em clima permanente de insegurança jurídica e social. Não admitimos que os nossos povos e comunidades continuem a serem taxados como empecilhos ao desenvolvimento do país, à implantação dos empreendimentos do Programa de Aceleração do Crescimento e muito menos sermos considerados constantes ameaças à segurança nacional, à integridade política e territorial do nosso país. Em um contexto político em que o Governo Federal senta com os povos indígenas para construir uma regulamentação do direito de consulta estabelecido na Convenção 169 da OIT; em um contexto positivo pós Rio+20, quando os governos e a sociedade civil do mundo perceberam que o modelo de desenvolvimento hegemônico é predatório e que é preciso aprender com os conhecimentos dos povos indígenas de respeito e manutenção das florestas, a AGU lança a Portaria nº 303/2012, deixando claro o alinhamento do governo com o agronegócio e estabelecendo os limites às conquistas dos povos indígenas voltadas para a promoção de direitos. Da forma mais hipócrita, porém, o Governo insiste em chamar as nossas organizações e lideranças para espaços e instâncias de diálogo, usando-os como massa de manobra de interesses escuros ou de artimanhas voltadas a nos manipular para legitimar decisões como a Portaria 303/2012 e outras como os Decretos de reestruturação da Fundação Nacional do Índio (FUNAI) e o Decreto da PNGATI, editado com alterações que não foram aprovadas pelos povos indígenas e que contraria de forma absurda os direitos dos nossos povos, em favor dos interesses que dão sustentação às políticas de governo, notadamente empreiteiras envolvidas com os grandes empreendimentos, latifundiários e donos ou representantes do agronegócio e outras corporações interessadas nas terras indígenas e nas riquezas que elas abrigam.

     

    Por estas e outras razões já explicitadas em manifestações das nossas organizações de base e pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), e por diversas instituições, inclusive governamentais, personalidades, organizações e movimentos sociais aliados, fundamentados na Constituição Federal de 1988, na Convenção nº 169 da OIT, na Declaração dos Direitos dos Povos Indígenas da ONU e em toda a legislação internacional e nacional aplicável aos povos indígenas no Brasil, É QUE EXIGIMOS A IMEDIATA REVOGAÇÃO INTEGRAL DA PORTARIA Nº 303/2012, por absoluta ilegalidade e inconstitucionalidade da mesma.

     

    Brasília-DF, 20 de agosto de 2012.

     

    Presidentes dos Conselhos Distritais de Saúde Indígena

     

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  • 20/08/2012

    Encontro Unitário: indígenas defendem guerra contra agronegócio

    Por Ruy Sposati,

    de Brasília

     

    Sete mil pessoas estão reunidas em Brasília para o Encontro Unitário dos Trabalhadores, Trabalhadoras e Povos do Campo, das Águas e das Florestas. Uma delegação de setenta indígenas participa do encontro, que começou nesta segunda-feira, 20, e segue até quarta-feira, 22.

     

    Organizado pelos movimentos sociais que compõem a Via Campesina, e pela Confederação dos Trabalhadores da Agricultura (Contag), Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq) e Federação de Trabalhadores da Agricultura Familia (Fetraf), o evento discutirá uma agenda unitária das organizações em torno da luta pelo direito à terra.

     

    O encontro tem como referencial histórico o I Congresso Nacional de Lavradores e Trabalhadores Agrícolas, realizado em Belo Horizonte, em 1961, durante o governo de João Goulart.

     

    Lindomar Terena fala aos participantes do EncontroUnitário. Foto: Ruy Sposati“Nós não aceitamos o modelo de desenvolvimento colocado por esse governo. Um modelo de desenvolvimento que ceifa vidas, que coloca lideranças que lutam por terra na prisão, que assassina o nosso povo. Isso nunca poderá ser chamado de desenvolvimento”. Foi com estas palavras que o indígena Lindomar Terena, liderança da Articulação dos Povos Indígenas do Pantanal e Região (Arpipan), entrou na discussão sobre análise de conjuntura na tarde de segunda, na abertura do encontro.

     

    Dividindo o painel de debate com dirigentes das principais organizações brasileiras de camponeses e trabalhadores rurais, Lindomar foi taxativo: “O [ex-presidente] Lula disse que os povos indígenas são o grande empecilho para o desenvolvimento desse país. Pra gente ficou claro que o governo optou por ficar ao lado do agronegócio e não da classe trabalhadora. Por isso, vamos à guerra contra o agronegócio”.

     

    Ir à guerra é uma tréplica à declaração de guerra do fazendeiro Lenço Preto – uma réplica à declaração de lideranças Guarani Kaiowá, que declararam “guerra contra a morosidade jurídica”. E a liderança indígena Guarani Kaiowá Otoniel Ricardo Guarani concorda: “estão construindo progresso de assassinar povo indígena do Brasil”.

     

    Em coletiva à imprensa brasileira e estrangeira, Otoniel denunciou os ataques de latifundiários que seu povo vem sofrendo sistematicamente no Mato Grosso do Sul.

     

    Otoniel Guarani Kaiowá durante coletiva à imprensa. Foto: Ruy Sposati/Cimi “Nós lutamos pelo território e pelo meio ambiente. Não adianta vir aqui bonitinho defender progresso de agronegócio – enquanto isso, a nossa terra, onde está? Antes de ontem um fazendeiro falou que estão se armando contra os indígenas Guarani Kaiowá que estão retomando terra, e que vai comprar arma e contratar mais pistoleiro. Cadê o nosso direito? Cadê a (Convenção)169? O Brasil conhece bem. E conhece a Constituição Federal”, cobra Otoniel.

     

    Para o cacique Babau Tupinambá, da Bahia, a Constituição está sob ataque. “Nós lutamos por terra coletiva. Por isso queremos território. Hoje o governo desrespeita, acha que a terra é dele. A terra é protegida por ele, mas não é dele. Os povos indígenas vivem na terra, são donos da terra. A Constituição garante isso. E por isso eles tentam mexer na Constituição, tentam alterar o direito dos povos indígenas de ter suas terras”, diz Babau referindo-se à Portaria 303, que permite proibir e revisar demarcações, além de autorizar a implantação de unidades militares, malhas viárias e empreendimentos hidrelétricos e minerais em terras indígenas.

    “Somos um milhão de pessoas que conseguimos viver sem propriedade, sem desmatamento e sem poluição. É contra isso que eles lutam, porque querem usar a terra para o agronegócio. Se o agronegócio está aí, é porque o governo permite. O agronegócio não faz as coisas sozinho”, conclui.

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  • 20/08/2012

    Manifesto dos povos do Xingu

    À Excelentíssima Srª Presidenta da República do Brasil

    Dilma Roussef

    CC: À Ministra da Cultura

    Srª Ana Maria Buarque de Hollanda

    CC: Ao Governador do Mato Grosso

    Silval da Cunha Barbosa

     

    Nós, as organizações e lideranças indígenas do Xingu, reunidas na cerimônia do Kuarup, em 18 de agosto de 2012, na Aldeia Yawalapíti, Território Indígena do Xingu (TIX), Mato Grosso, vimos manifestar nossa insatisfação diante dos seguintes atos de violação aos direitos indígenas: a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 215; o não-cumprimento da Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho, na realização de grandes projetos com impactos sobre terras indígenas, como Belo Monte; as modificações realizadas no Código Florestal; as propostas em tramitação para regulamentação das atividades de mineração em terras indígenas e a mais recente e grave Portaria nº 303 da Advocacia-Geral da União.

     

    Sendo assim, os povos indígenas do Xingu reforçam as manifestações de outros movimentos indígenas do Brasil e exigem: a) imediata revogação da Portaria nº 303 da AGU; b) pleno cumprimento da Convenção nº 169 da OIT, com destaque para o direito de consulta livre, prévia e informada dos povos indígenas; c) ação enérgica do Governo Federal para garantir a proteção de Matas Ciliares e Áreas de Preservação Permanente (APPs), tendo em vista a crescente degradação das cabeceiras dos rios que atravessam e alimentam as terras indígenas.

     

    No momento em que o Brasil se prepara para sediar um evento de caráter mundial, as Olimpíadas de 2016, o Governo Federal usa, como estratégia de marketing, a imagem de povos indígenas, especificamente xinguanos, o que contrasta com o crescente e assustador retrocesso de nossos direitos.

     

    É urgente que o Estado brasileiro faça mais do que valorizar as culturas indígenas de forma simbólica. É preciso que, na prática, sejam garantidos a manutenção e o cumprimento dos direitos já conquistados. Esta, sim, seria uma manifestação verdadeira de respeito aos povos indígenas, algo de que o Brasil poderia se orgulhar de mostrar ao mundo.

     

    Assinam as organizações: Associação Terra Indígena Xingu (ATIX); Instituto de Pesquisa Etnoambiental do Xingu (IPEAX); Portal do Xingu; Associação Yawalapíti Awapá (AYA); Associação Tulukai Waurá; Associação Mavutsinim Kamayurá; Associação Indígena Kuikuro do Alto Xinzu (AIKAX); Associação Moygu Comunidade Ikpeng (AMCI); Associação Indígena Kisêdjê (AIK); Associação Uyaipiuku Mehinako; Associação Indígena Yarikayu Yudjá; Centro de Organização Kawaiwetê; Associação Aweti.

     

    E os Povos indígenas do Xingu: Yawalapíti, Trumai, Ikpeng, Waurá, Kamayurá, Kuikuro, Kalapalo, Nahukwá, Matipu, Aweti, Mehinako, Yudjá, Kisêdjê, Kawaiwetê, Naruvutu, Tapayuna.

     

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  • 20/08/2012

    Carta de denúncia da atual política indigenista

    Nós, lideranças indígenas dos Estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, participantes do Encontro de Lideranças Indígenas da Região Sul, realizada na Terra Indígena Xapecó, Ipuaçú-SC, nos dias 16 e 17 de agosto de 2012, vimos através desta expressar nosso descontentamento e preocupação quanto ao rumo que vem tomando a política indigenista promulgada pelo Estado Brasileiro, bem como nosso desagravo em relação às ações oriundas de instituições do Estado no que diz respeito aos direitos indígenas.

     

    Estamos vivenciando um processo de deterioração contínua dos direitos indígenas, protagonizado pelo Estado Brasileiro, em nome de uma política de desenvolvimento que não reconhece a existência dos nossos Povos como sujeitos de direitos específicos, assegurados na legislação interna e internacional de direitos humanos, em especial a Constituição Federal e a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho-OIT.

     

    Este contexto se consolida a partir da PEC 215, da PEC 038 e da portaria 303/AGU, que somados ao processo de desmonte da FUNAI e ao enfraquecimento da política indigenista estabelecida pelo Decreto 7.056/2009, que reestruturou o órgão indigenista sem consulta aos Povos Indígenas, deixando os mesmos em situação de extrema vulnerabilidade, na medida em que ao mesmo tempo não lhe garante a efetivação dos direitos já conquistados, caminha para a supressão destes mesmos direitos.

     

    Lamentamos que estas afrontas estejam acontecendo em um governo democrático que outrora construiu conosco a esperança de que ao chegar ao poder nossas lutas seriam prioridade, tendo como base o respeito, o diálogo, a boa fé e transparência.

     

    Diante desta realidade perversa a que estamos submetidos, nós Povos Indígenas da Região Sul apoiamos a luta dos nossos parentes de todo o Brasil, e estamos comprometidos em fazer a resistência e seremos implacáveis na defesa e na garantia de nossos direitos.

     

    Manifestamos ainda, nosso apoio incondicional aos servidores da FUNAI que se encontram em greve, e o documento destes enviado às autoridades, reivindicando além de melhorias salariais o respeito aos direitos indígenas e a proteção, defesa e promoção dos seus direitos e territórios.

     

    Neste sentido, apelamos para o bom senso da AGU e das autoridades competentes, e exigimos a imediata revogação da portaria 303/AGU de 13 de julho de 2012, que viola frontalmente o direito à consulta, assegurado pela Convenção 169 da OIT, o qual solicitamos que seja regulamentado pelo Estado Brasileiro, garantindo assim a realização da consulta prévia, livre e informada aos Povos Indígenas sobre qualquer ação que afete seus direitos, bens e territórios.

     

    Terra Indígena Xapecó-SC, 17 de agosto de 2012.

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