• 13/10/2012

    Carta da IV Assembleia do Povo Indígena Xukuru Kariri

    Nós, povo Xukuru Kariri, das comunidades: Fazenda Canto, Mata da Cafurna, Coité, Cafurna de Baixo e Amaro, reunidos durante os dias 09, 10 e 11 de outubro de 2012, na retomada da aldeia Fazenda Canto, com nossos parentes Xukuru de Ororubá – Pesqueira – PE; e aliados como Conselho Indigenista Missionário (Cimi) ; Ministério Público Federal em Alagoas (MPF); Movimento das Comunidades Populares (MCP); Universidade Federal de Alagoas (Ufal) -; CESMAC; Rede de Educação Cidadã (Recid); Ôtto Coletivo; Movimento de Educação Popular e Saúde (Mops); Núcleo de Cultura Camponesa; Faculdade São Tomás de Aquino – FACESTA; Cáritas Diocesana de Palmeira dos Índios; Pastoral Social; Diocese de Palmeira dos Índios; Associação dos Agricultores Alternativos  (AAGRA); vereadora, Sheila Maria Duarte e deputado estadual, Ronaldo Medeiros, guiados pelo tema: A situação da Saúde, Educação e a Terra, a Luz do Bem Viver, analisamos questões da conjuntura nacional que tem paralisado os processos de demarcação dos territórios indígenas do Brasil e dos Xukuru Kariri; a gravíssima situação da saúde oferecida aos povos indígenas, os enormes problemas estruturais da educação escolar que tem resultado no continuo descaso em relação ao cumprimento das políticas públicas para os povos indígenas.

     

    Isto fere gravemente os direitos conquistados pelas organizações indígenas do país constitucionalmente. Inúmeros prazos têm sido descumpridos pelas esferas governamentais.Um Estado que fere o Bem Viver das comunidades indígenas, que não promove a efetiva demarcação e posse dos territórios tradicionais, provocando drasticamente o retardo da justiça social em nosso país. Neste sentido, o modelo de governo capitalista brasileiro não respeita os direitos das populações tradicionais, executando programas e propostas econômicas, a exemplo do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).

     

    Repudiamos a Portaria 303 da Advocacia Geral da União – AGU e a PEC 215, pois elas representam um retrocesso à luta dos povos indígenas do Brasil no âmbito legal, trazendo serias consequências para integridade física, política e cultural dos Povos indígenas. Está em curso a desconstitucionalização dos direitos e a criminalização das nossas lideranças.

     

    Como fruto desta assembleia, destacamos, para o nosso Bem Viver: ampliar o cuidado com a Mãe Terra, que inclui a preservação do meio ambiente, das águas, das plantas, animais, sementes nativas, utilização das ervas medicinais e refletir os atuais e novos processos de retomadas. Desse modo, “já sabemos o lugar que queremos ocupar na história”. Portanto, a assembleia garante maior participação das mulheres, jovens, crianças, idosos, lideranças, professores/as e agentes de saúde, em todos os momentos e espaços de luta do povo. Assegurando Igualdade plena de direito quanto à utilização da ocupação das terras tradicionais.

     

    Assim, fortalecidos/as pelos guerreiros e guerreiras, a exemplo de Maninha, reafirmamos, coletivamente os compromissos assumidos durante os dias da nossa assembleia para construção do Projeto de Bem Viver do Povo Xukuru Kariri.

     

    Fazenda Canto, Palmeira dos Índios – Alagoas, 11 de outubro de 2012.

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  • 11/10/2012

    Quatro crianças morrem em menos de 24 horas em Atalaia do Norte

    Acometidas de diarreia, vômito e febre, quatro crianças indígenas, sendo três do povo Kanamari e uma Mayoruna, morreram em menos de 24 anos em Atalaia do Norte, cidade que fica no extremo oeste, a 1.138 quilômetros em linha reta de Manaus, capital do Amazonas. “Tem muita gente doente e ainda vai haver mais mortes”, previa uma agente de saúde que prestava assistência aos indígenas.

     

    Há vários dias na cidade, cerca de 700 indígenas estão morando nas mais de 90 canoas que se encontram no porto de Atalaia do Norte. As canoas abrigam 20, 30 e até 40 pessoas, conforme constata a equipe do Conselho Indigenista Missionário – Cimi, que atua no Vale do Javari. Por falta de acesso a água potável, os indígenas são obrigados a beber água diretamente do rio – de onde também a água é utilizada para lavar roupa, louças e tomar banho pelos indígenas e por pessoas de outras embarcações de médio e grande porte.

     

    “A situação é gravíssima, é caótica”, enfatizou Eduardo Meira da Silva Júnior, presidente do Conselho Municipal de Saúde. Devido ao agravamento do quadro de saúde, os indígenas não poderão seguir viagem até que seja realizada investigação para detectar o tipo de doença que os está matando rapidamente.

     

    Segundo ele, só tem uma médica no município. Ela, quatro enfermeiros e agentes de saúde estão se esforçando para prestar atendimento, mas não tem pessoal qualificado para realizar a investigação epidemiológica. “Não podemos mandá-los de volta sem um diagnóstico”, disse Eduardo Meira.

     

    Por volta das 16 horas desta quinta-feira, 11, o Conselho Municipal de Saúde estava tentando se reunir para discutir e encaminhar soluções para o problema. Eles aguardavam o secretário municipal de Saúde, Adno Castro da Silva, que se encontrava em local ignorado.

     

    A maioria dos indígenas foi estimulada por políticos a se deslocar das aldeias para votar na sede municipal. Eles estão revoltados, sofrendo com a doença e obrigados a permanecer tanto tempo nas suas canoas porque a prefeitura não estaria mais disposta a fornecer combustível para o retorno às aldeias. A prefeita Anete Peres (PSD) não conseguiu se reeleger.

     

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  • 11/10/2012

    Ex-jornalista do Cimi fatura prêmio com matéria sobre crimes da ditadura contra indígenas

    Com a reportagem Crimes Contra Indígenas na Ditadura a jornalista Maíra Heinen, da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), venceu na categoria Rádio a 34ª Edição do Prêmio Vladimir Herzog de Direitos Humanos. A repórter trabalhou no Conselho Indigenista Missionário (Cimi) entre 2009 e 2011.

     

    O resultado foi divulgado nesta quarta-feira, 10, e a entrega do troféu ocorrerá no dia 23 do próximo mês, no Tuca, teatro da Pontifícia Universidade Católica (PUC), em São Paulo.

     

    Aos 26 anos e com apenas alguns meses de trabalho na Rádio Nacional da Amazônia, Maíra tem marcado seu trabalho por matérias de destacada qualidade envolvendo a questão indígena. Motivos não faltam: a jornalista trabalhou por dois anos no Cimi como editora do jornal Porantim, publicação com linha editorial indigenista e fundado nos anos 1970. A repórter jamais se desgarrou dos indígenas.

     

    “Foi no Cimi que eu aprendi sobre a questão indígena e mesmo depois de ter saído da entidade continuei ligada à temática”, diz. Maíra acredita que os povos indígenas são retratados de forma muito culturalista e que seu trabalho busca valorizar como as comunidades vivem, quais os problemas enfrentados e as necessidades.  

     

    “Acho super importante a questão estar nas redações porque sabemos que os índios sofrem muitas violações em seus direitos pela terra. Esse prêmio, portanto, eu não dedico apenas aos povos da Amazônia, mas para todas as comunidades do país”, declara.

     

    Maíra explica que a pauta surgiu depois que ela e seus editores leram a afirmação de um dos membros da Comissão Nacional da Verdade, sancionada pela presidenta Dilma Rousseff, de que o grupo iria tratar da questão indígena. Primeiro foi feita uma matéria pequena, mas como o assunto rendeu a jornalista aprofundou o material em uma reportagem.

     

    “Jualiana Nunes, editora da Rádio Agência Nacional, foi quem sugeriu que eu fizesse algo mais longo e depois inscrevesse no Herzog. Agradeço muito a ela pela sugestão”, destaca Maíra, que agradece também aos colegas Marcos Tavares (sonoplasta) e Wellington Barbosa (editor).

     

    A jornalista estudou na Universidade Federal de Goiás e desde que se formou trabalha com a temática dos direitos humanos. “Infelizmente é um tema não tratado e numa rádio pública existe mais essa possibilidade. O governo trata de forma estranha a questão indígena e precisamos quanto jornalistas olhar para o assunto”, encerra Maíra.

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  • 10/10/2012

    Informe nº1035: Essa terra tem dono: mineração assim não!

    Cratera de 15 metros de profundidade causada por garimpo ilegal na terra indígena Sararé, Mato Grosso. Foto: José Luis Medeiros/Arquivo Cimi.

    O Conselho Indigenista Missionário, Cimi, vem a público manifestar extrema preocupação e absoluto repúdio frente à proposta de substitutivo ao Projeto de Lei 1610/96, que dispõe sobre a exploração e o aproveitamento de recursos minerais em terras indígenas, disponibilizada pelo deputado federal Édio Lopes (PMDB/RR), relator da Comissão Especial da Câmara que trata do tema.

     

    O Cimi entende que a tramitação açodada da matéria e o teor do substitutivo em questão seguem na mesma esteira de um conjunto de instrumentos legislativos e administrativos que vem sendo intensivamente usados pelos setores anti-indígenas e pelo governo brasileiro para invadir, explorar e mercantilizar as terras indígenas. O intuito é um só: implementar o desenvolvimentismo agro-extratitivista exportador e aprofundar a territorialização e a acumulação do capital.

    O Cimi considera o substitutivo apresentado pelo deputado Édio Lopes flagrantemente inconstitucional, um acúmulo de equívocos e arbitrariedades que desconstroem os direitos dos povos e beneficiam exclusivamente as empresas potenciais mineradoras das terras indígenas.

    Dentre os inúmeros absurdos do substitutivo, chamamos a atenção para os seguintes aspectos:

    1- “Qualquer interessado” poderá requerer ao Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) o direito de minerar qualquer terra indígena no Brasil. Este elemento associado à anulação de todos os direitos minerários em terras indígenas, concedidos antes da promulgação da nova lei, deverá provocar uma verdadeira “corrida” de não-índios às terras indígenas do país.

    2- O direito de consulta livre, prévia e informada aos povos indígenas é reduzido a mero ato formal, denominado “consulta pública”. Inclusive às comunidades indígenas presentes na terra pretendida para exploração mineral “poderão participar” da consulta. No entanto, a vontade dos povos não terá qualquer influência sobre a continuidade do processo de exploração mineral na própria terra.

    3- Junto com o desrespeito ao direito de Consulta e na contramão dos preceitos Constitucionais, o substitutivo reaviva a figura da tutela sobre os povos indígenas. Caso não haja concordância “das comunidades indígenas” na realização das atividades de exploração mineral nas terras por eles ocupadas, o processo será encaminhado a uma “Comissão Deliberativa”, sem participação indígena, que “decidirá”, dentre as propostas apresentadas, “qual a melhor” para as comunidades indígenas afetadas.

    4- A autorização a ser emitida pelo Congresso Nacional para a exploração mineral em terras indígenas constituir-se-á em puro formalismo jurídico-legal. A mesma se dará após já ter sido feita a escolha da “melhor proposta” e respectiva empresa mineradora.

    5- A “consulta pública” da qual os indígenas “poderão participar”, a escolha da “melhor proposta”, a autorização do Congresso Nacional e a outorga, pelo DNPM, ao “detentor da proposta vencedora para a exploração de recursos minerais em terras indígenas” serão inócuas, pois se darão “às escuras”, antes de se saber o que realmente irá ser explorado e qual a dimensão da exploração na respectiva terra indígena. Isso porque a “pesquisa de bens minerais” na respectiva área indígena será feita, pelo “outorgado”, que terá até três anos para realizar mesma.

    6- Nenhuma salvaguarda constitucional é respeitada pelo substitutivo. A exploração mineral poderá ocorrer em todo e qualquer espaço no interior da terra indígena. Não há qualquer referência explícita, no substitutivo, que proíba a lavra de recursos minerais incidentes sobre monumentos e locais históricos, culturais, religiosos, sagrados, de caça, de coleta, de pesca ou mesmo de moradia dos povos. Isso, como é evidente, oferece risco incalculável à sobrevivência física e cultural dos povos.

    7- A mineração poderá ocorrer até mesmo em terras cujos procedimentos administrativos não estiverem conclusos. Para isso, bastará que o governo federal considere que exista na terra algum minério estratégico para a “segurança nacional” do país. Não há, no substitutivo, qualquer definição sobre o que pode ser considerado “mineral estratégico para a segurança nacional”.

    8- O “extrativismo mineral ou garimpagem” a ser feito por indígenas organizados em cooperativas se limitará a, no máximo, 100 hectares da respectiva terra. A multa por possíveis irregularidades cometidas pelos indígenas poderá ser de até dois milhões e quinhentos mil reais.

    9- O substitutivo incentiva as empresas mineradoras a cometerem todo tipo de irregularidades no procedimento de exploração mineral em terras indígenas. Faz isso ao determinar que a multa por “infrações administrativas”, inclusive no caso de descumprimento, total ou parcial, da obrigação de pagamento aos povos indígenas, não poderá ser superior a 3% do faturamento bruto da empresa mineradora no período em que tenha sido constatada a irregularidade. É notório que poderá ocorrer casos em que uma determinada irregularidade cometida tenha potencial para acarretar aumento superior a 3% no faturamento da empresa. Nesses casos, a empresa lucraria cometendo irregularidades.

    O Cimi considera que não existe razão plausível que justifique a pressa incontida em colocar a matéria em discussão e votação na Câmara dos Deputados – programada para depois do 2º turno das eleições municipais. O próprio substitutivo indica que a mineração em terras indígenas será regida, inclusive, pela legislação mineral do país. Ora, é de conhecimento público que o governo brasileiro está prestes a enviar ao Congresso Nacional proposta de um novo “marco regulatório” da mineração no Brasil. Qual o sentido, então, de se discutir e aprovar uma lei que regulamenta a mineração em terras indígenas antes de se discutir e a aprovar a nova legislação mineral do país que afetará, também, a mineração em terras indígenas?

    Além disso, os Artigos 176 e 231 da Constituição Federal determinam que a exploração mineral e de riquezas naturais existentes em terras indígenas somente poderá ser feita em caso de “interesse nacional” e “relevante interesse público da União, segundo o que dispuser a lei complementar”. Ocorre que, no Brasil, não existe lei que disponha sobre “relevante interesse público da União”, nem sobre “interesse nacional”. Qual a razão, então, de se aprovar uma lei que regulamenta a exploração mineral em terras indígenas antes de definir em que condições específicas essa exploração é permitida pela Constituição? O único motivo que salta aos nossos olhos é o de se afrontar a Constituição, abrindo a possibilidade de exploração mineral, sem qualquer tipo de limite, em todas as terras indígenas do país.

    O Cimi se solidariza com os povos indígenas frente a mais este cruel ataque patrocinado pelos interesses político-econômicos adversos, ao mesmo tempo em que se associa e reforça a reivindicação histórica do movimento indígena no Brasil segundo o qual o Congresso Nacional não deverá legislar, de forma fracionada, sobre temas que lhes dizem respeito.

    Por fim, o Cimi se compromete a junto com os povos indígenas fazer uso de todos os meios legítimos para evitar a consumação desta mortífera ferida aos direitos consagrados e ao futuro dos povos indígenas no Brasil.

    Conselho Indigenista Missionário – Cimi

    Brasília, 10 de outubro de 2012.

     

     

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  • 10/10/2012

    Justiça Federal nega pedido de reintegração de posse ao consórcio construtor de Belo Monte

    Por Luana Luizy,

    de Brasília

     

    Aproximadamente 100 indígenas dos povos Xipaia, Kuruaia, Parakaña, Arara e Assurini e 50 pescadores ocupam desde a segunda-feira, 8, a ensecadeira (dispositivo para contenção de águas) de um dos canteiros de obras da Usina Hidrelétrica de Belo Monte. A Justiça Federal negou à  Consórcio Norte Energia (Nesa), construtor da usina, um pedido de reintegração de posse. A ocupação, portanto, segue até o cumprimento das condicionantes.

     

    A Polícia Federal e a Funai compareceram ao local por volta 14 horas desta quarta-feira, 10, para averiguar as denúncias feitas pela Norte Energia de que os indígenas estavam depredando o local, além de ter ocorrido uma morte. A Justiça Federal acionou a Polícia Federal e Funai para averiguar as denúncias, comprovadas como falsas.

     

    “Surgiu o boato plantado pela Norte Energia de que tínhamos agredido funcionários e de que estávamos depredando os equipamentos. A Polícia Federal e a Funai vieram e não constataram nada. Trouxeram a mensagem para nós: a de que o juiz recusou o pedido de reintegração de posse da Nesa. Vamos continuar aqui por tempo indeterminado”, afirma Rodrigo Kuruaia.

     

    A oitiva prévia das comunidades indígenas afetadas pelo empreendimento também foi questionada. “Em momento algum houve consulta para construção do empreendimento. No acordo firmado em julho, ficou estipulado que fosse contemplada: a demarcação de nossos territórios, construção de escola diferenciada indígena e melhor infraestrutura na saúde, mas nenhum ponto do acordo foi cumprido”, critica Juma Xipaia, indígena que teve que sair da ocupação por problemas de saúde com sua filha – causado devido à falta de água potável, cortada pela Norte Energia.

     

    Indígenas relatam que o diretor socioambiental da Norte Energia Roberto Camilo da Cruz Oliveira afirmou que não vai haver negociação e que os indígenas estão invadindo a área. Uma pauta de reivindicações foi enviada na tarde de hoje ao Ministério Público Federal (MPF), à presidência da Funai e Ibama.

     

    Dentre as reivindicações dos pescadores, ribeirinhos, agricultores e indígenas da região estão: o direito de pescar e andar livremente no rio; revogação das portarias e decretos do Ibama sobre a fauna e flora do rio Xingu, pois segundo os indígenas e pescadores da região o rio já não é o mesmo depois das obras. Também, um fundo emergencial para as famílias que dependem do rio, dentre outras reivindicações.

     

    O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), em Brasília, havia pedido a paralisação das obras no último dia 14 de agosto. Por unanimidade, a 5ª Turma do TRF-1 alegou que foram ignoradas as obrigações do Brasil como signatário da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que determina que as comunidades indígenas sejam consultadas previamente em caso de empreendimentos que afetem seus territórios.  Entretanto, o ministro Carlos Ayres Britto, presidente Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu liminar 14 dias depois autorizando a retomadas das obras.

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  • 10/10/2012

    Casai de Altamira entra em colapso e condicionantes da UHE Belo Monte não são cumpridas

    Por Renato Santana,

    de Brasília (DF)

     

    Superlotação na Casai, segundo indígenas, é motivada pela UHE Belo Monte. Foto: Juma XipaiaSuperlotação, banheiros emporcalhados, doenças, falta de equipe técnica, hospitais insuficientes para darem conta dos atendimentos, morte e abandono estatal. Entrar na Casa do Índio (Casai) de Altamira, Pará, é se deparar com o caos e a vida real das comunidades submetidas ao projeto de desenvolvimento em curso no país. 

     

    O quadro da saúde indígena na região impactada pela Usina Hidrelétrica de Belo Monte é no mínimo diferente do anunciado pelo governo federal e Consórcio Norte Energia S/A (Nesa) como parte dos argumentos para justificar o mega projeto. Na mesma proporção, as tais condicionantes que resolveriam os problemas dos insistentes opositores à obra ainda estão apenas no papel. 

     

    Até o momento da publicação desta matéria, a condicionante de reestruturação do atendimento à saúde indígena pelo Distrito Sanitário Especial de Saúde Indígena (DSEI) em Altamira, imposta à Licença Prévia de Instalação da usina em 1º de fevereiro de 2010, não tinha sido cumprida pela Nesa. Tampouco a construção de um hospital de 100 leitos para desafogar as estruturas de atendimento médico em funcionamento. 

     

    Em meio a mais um episódio de resistência à construção do empreendimento, com a atual ocupação da ensecadeira do canteiro de obras Pimental por cerca de 120 pescadores e indígenas, os fatos trazem à tona uma realidade que não aparece nos televisores que as usinas hidrelétricas mantêm ligados Brasil afora.

     

    “Total abandono da nossa saúde. Existem índios que entram lá na Casai e saem piores. É uma reivindicação nossa que trazemos aqui para a ocupação da ensecadeira. Por parte das autoridades, se eles têm como manter ambulância e enfermeiro aqui (canteiro de obras), por que não lá em Altamira?”, questiona Leo Xipaia, da aldeia Cujubim, às margens do rio Iriri, cujas águas correm para o rio Xingu.

     

    Ca(o)sai

     

    A Casai é uma estrutura de passagem. Os indígenas convalescentes de tratamentos e atendimentos médicos usam o espaço para recuperação antes do retorno à comunidade. Algumas terras indígenas ficam a 10, 15 dias de barco do cais de Altamira, rio Xingu adentro. A estada na Casai, de uns anos para cá, passou a ser quase impossível. Com capacidade para atender simultaneamente 80 indígenas, a casa acolhe cerca de 200.    

     

    “A Casa do Índio está lotada e essa superlotação é por conta de Belo Monte, sem dúvida. Estou em Altamira há 20 anos e nunca foi assim. Isso aqui virou um inferno. O discurso deles (governo federal e Norte Energia) é bonito, mas na prática… na prática vivenciamos uma tragédia”, explica o vice-presidente do Conselho Distrital de Saúde Indígena de Altamira, Wiliam Xakriabá.

     

    Instalações deterioradas e banheiros emporcalhados são alguns dos problemas vistos na Casai. Foto: Juma XipaiaConforme é possível constatar nas fotos feitas pelos próprios indígenas, não fossem as redes armadas no quintal da casa a única alternativa para os usuários – doentes na maioria – seria dormir no chão. Para acentuar ainda mais o problema, a atual estrutura da Casai é um recente contrato de aluguel, sendo que há pouco tempo a estrutura de atendimento aos indígenas mudou de endereço.

     

    “Aqui (sede retratada nas fotos) melhorou muito, para se ter uma ideia da situação em que nos encontramos. Antes estava pior. Esperamos que até o dia 15 de março do ano que vem a sede própria, em construção, seja inaugurada. Lá teremos um espaço adequado, digno. Porém, inauguraremos com superlotação”, diz Wiliam. 

     

    O vice-presidente do Conselho Distrital de Saúde faz as contas: a nova estrutura terá condições de comportar o dobro da capacidade atual, ou seja, 160 indígenas. Porém, ainda sem o impacto da usina ter sido absoluto, 200 homens, mulheres e crianças acabam precisando utilizar a Casai.

     

    “Estamos aguardando de forma ansiosa uma estrutura que chegará esgotada. É um projeto antigo o da sede própria, com recursos do Ministério da Saúde, mas que infelizmente o desenvolvimento dessa usina está matando. Fazemos tudo o que podemos, mas lutamos contra um inimigo muito poderoso”, lamenta Wiliam.

     

    Condicionantes: letra morta     

     

    “Falta muita coisa e a saúde indígena está péssima. Sobretudo na cidade. Malária, diarreia, maus tratos na Casa de Saúde. Nosso povo vai se acabar todo se continuar assim de construir usina, não melhorar a saúde”, afirma Joaquim Lopes Kuruaia, que vive com sua comunidade às margens do rio Iriri.

     

    De acordo com o indígena, a Nesa não cumpre as condicionantes na parte da saúde indígena. O consórcio limitou-se a fornecer materiais para campanha contra a malária, que não focou apenas os povos indígenas. Wiliam conta que há tempos o Conselho Distrital está com um projeto emergencial para a saúde e a Nesa o transformou em parte do Programa Básico Ambiental (PBA).

     

    Para acertar, o consórcio impôs que nos primeiros 18 meses o projeto abarcará apenas as comunidades da Volta Grande do Xingu e Bacajá. Wiliam é taxativo quanto à proposta da Nesa: “É um absurdo. A usina está afetando a todos. Não concordamos também porque saúde pública tem que ser para todos, não para uma ou duas comunidades”.

     

    Além de interferir de forma negativa nos projetos desenvolvidos pelo Conselho Distrital e não cumprir as condicionantes indígenas, conforme relatam as lideranças, o consórcio também ainda não construiu 100 leitos hospitalares necessários para desafogar ao menos um pouco os centros de saúde em funcionamento. Dessa forma, os indígenas não conseguem atendimento, vagas em leitos de internação, os resultados dos exames demoram a sair. Tudo isso faz com que a permanência na Casai seja mais demorada.

     

    Convalescentes de enfermidades e tratamentos médicos, pacientes ficam 'acamados' em redes ao ar livre. Foto: Juma Xipaia“Tivemos um óbito esse ano por falta de médico. Nem isso eles cumpriram, a contratação de profissionais. Posso dizer que a Casai hoje não é só para passagem, mas lá acabamos vendo atendimentos de saúde. O lugar não é próprio para isso e não temos recursos e muito menos equipamentos”, afirma Wiliam. 

     

    O aumento das doenças é motivo de destacada preocupação entre os conselheiros distritais. Por enquanto as moléstias não possuem grande gravidade, conforme o vice-presidente. São diarreias, infecções respiratórias, mas que demandam cuidados especiais e medidas mais abrangentes de políticas públicas. No entanto, Wiliam é seguro ao afirmar que as cestas básicas e o alto fluxo de recursos despejados sobre os indígenas para dissuadi-los de contrapor Belo Monte trarão consequências danosas.

     

    “Muito alimento industrializado, refrigerantes. São doenças (câncer, diabetes, coração) que aparecem de forma silenciosa, aos poucos, mas que não ocorreriam se os parentes pudessem viver da terra, da pesca. Sem contar o lixo produzido, que fica na aldeia, foco de doenças”, analisa Wiliam Xakriabá. Para ele, com mais dinheiro, os indígenas aumentam o consumo de álcool, alavancado por uma maior presença na cidade e, assim, fechando o ciclo, nas dependências da Casai.

     

    O que se esperava         

     

    Desde o início, apesar da postura contrária à construção de Belo Monte, os conselheiros esperavam investimentos em estrutura hospitalar, veículos e voadeiras (embarcações velozes) para locomoção de pacientes, sendo tudo isso parte da reestruturação do DSEI de Altamira. Nada aconteceu e a situação piora a cada dia.

     

    “Esse pessoal (Nesa e governo federal) quer mesmo é fazer barragens, ferrar conosco e ir embora. Ninguém se importa, seja o governo, a Funai (Fundação Nacional do Índio). Essa história não vai terminar bem. Espero que tenha um remédio, mas não sei… é impossível medir o quanto a região ficou ruim. Talvez quem mora aqui há anos pode ter essa noção. Agora eu tenho para mim que muita coisa não será cumprida (pela Nesa e governo federal)”, encerra.    

     

    Para indigenistas e lideranças contrárias à usina, o conglomerado transnacional e multinacional construtor da obra acredita que Belo Monte é fato consumado, e que por isso não é mais necessário seguir despejando dinheiro nas comunidades indígenas e cumprir as condicionantes – apesar de em cada ocupação dos canteiros de obras a Polícia Militar do Pará impor seu efetivo contra os manifestantes com helicópteros e viaturas devidamente seladas pela marca da Nesa.

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  • 10/10/2012

    Indígenas ameaçam morrer coletivamente caso ordem de despejo seja efetivada

    Estava trabalhando na memória histórica dos últimos 40 anos, na perspectiva da reedição do documento Y Juca Pirama – "O Índio aquele que deve morrer". Em dezembro de 1973 foi dado esse grito, por bispos e missionários, contra o genocídio indígena em curso pelos governos da ditadura militar.

    Enquanto buscava reunir denúncias e violências, mortes e massacres de povos indígenas nestes 40 anos, vejo um email, urgente do Conselho da Aty Guasu Kaiowá Guarani. Ao ler o teor do comunicado fico estarrecido e me junto ao grito dos condenados- “que país é esse?".

    Diante do decreto de morte e extermínio surge a obstinada determinação dos povos de viver ou morrer coletivamente, conforme suas crenças, esperanças ou desespero. Esse grito certamente fará parte do manifesto "os povos indígenas, aqueles que devem viver", apesar e contra os decretos de extermínio.

    Não podemos calar ou ficar inertes diante desse clamor da comunidade Kaiowá Guarani, de Pyelito Kue/Mbarakay, no município de Iguatemi, Mato Grosso do Sul. Não se trata de um fato isolado, mas de excepcional gravidade, diante de uma decisão de morte coletiva. Continuaremos sendo desafiados por fatos semelhantes, caso não se tome medidas urgentes de solução da questão da demarcação das terras indígenas desse povo.

    O grito Kaiowá Guarani

    "Sabemos que seremos expulsas daqui da margem do rio pela Justiça, porém não vamos sair da margem do rio. Como um povo nativo e indígena histórico, decidimos meramente em ser morto coletivamente aqui. Não temos outra opção, esta é a nossa última decisão unânime diante do despacho da Justiça Federal de Navirai- MS." Esse é o comunicado da comunidade indígena para o Governo e Justiça Federal.    

     

    "Nos matem e enterrem coletivamente", gritam das margens do rio Hovy

    "Comemos comida uma vez por dia. Passamos isso dia-a-dia para recuperar o nosso território antigo Pyleito Kue/Mbarakay. De fato, sabemos muito bem que no centro desse nosso território antigo estão enterrados vários os nossos avôs e avós, bisavôs e bisavós, ali estão os cemitérios de todos nossos antepassados. Cientes desse fato histórico, já vamos e queremos ser mortos e enterrados junto aos nossos antepassados aqui mesmo onde estamos hoje, por isso, pedimos ao Governo e Justiça Federal para não decretar a ordem de despejo/expulsão, mas solicitamos o decreto da nossa morte coletiva e para nos enterrar aqui. Pedimos, de uma vez por todas, para decretar a nossa dizimação/extinção total, além de enviar vários tratores para cavar um grande buraco para jogar e enterrar os nossos corpos. Esse é nosso pedido aos juízes federais.

    "Já aguardamos esta decisão. Assim, se é para decretar a nossa morte coletiva Guarani e Kaiowá de Pyelito Kue/Mbarakay pedimos que nos enterrem todos aqui. Visto que decidimos integralmente a não sairmos desse local com vida e nem mortos. Sabemos que não temos mais chance em sobreviver dignamente aqui em nosso território antigo, já sofremos muito e estamos todos massacrados e morrendo de modo acelerado." (Carta da comunidade).

     

    Ao tomar ciência do teor da carta dessa comunidade, Eliseu Lopes, da Aty Guasu/APIB comentou. "É, isso vai se repetir muitas vezes se o governo não demarcar logo as nossas terras. Quando os nossos líderes religiosos decidem retornar aos tekoha (terras tradicionais de nossas comunidades) vão mesmo e ninguém segura”. Ele lamenta profundamente se chegar a esse ponto de desespero que poderá levar a muitas mortes.

     

    Leia a carta na íntegra

     

    Carta da comunidade Guarani-Kaiowá de Pyelito Kue/Mbarakay-Iguatemi-MS para o Governo e Justiça do Brasil

     

    Nós (50 homens, 50 mulheres e 70 crianças) comunidades Guarani-Kaiowá originárias de tekoha Pyelito kue/Mbrakay, viemos através desta carta apresentar a nossa situação histórica e decisão definitiva diante de da ordem de despacho expressado pela Justiça Federal de Navirai-MS, conforme o processo nº 0000032-87.2012.4.03.6006, do dia 29 de setembro de 2012. Recebemos a informação de que nossa comunidade logo será atacada, violentada e expulsa da margem do rio pela própria Justiça Federal, de Navirai-MS.

     

    Assim, fica evidente para nós, que a própria ação da Justiça Federal gera e aumenta as violências contra as nossas vidas, ignorando os nossos direitos de sobreviver à margem do rio Hovy e próximo de nosso território tradicional Pyelito Kue/Mbarakay. Entendemos claramente que esta decisão da Justiça Federal de Navirai-MS é parte da ação de genocídio e extermínio histórico ao povo indígena, nativo e autóctone do Mato Grosso do Sul, isto é, a própria ação da Justiça Federal está violentando e exterminado e as nossas vidas. Queremos deixar evidente ao Governo e Justiça Federal que por fim, já perdemos a esperança de sobreviver dignamente e sem violência em nosso território antigo, não acreditamos mais na Justiça brasileira. A quem vamos denunciar as violências praticadas contra nossas vidas? Para qual Justiça do Brasil? Se a própria Justiça Federal está gerando e alimentando violências contra nós.  Nós já avaliamos a nossa situação atual e concluímos que vamos morrer todos mesmo em pouco tempo, não temos e nem teremos perspectiva de vida digna e justa tanto aqui na margem do rio quanto longe daqui. Estamos aqui acampados a 50 metros do rio Hovy onde já ocorreram quatro mortes, sendo duas por meio de suicídio e duas em decorrência de espancamento e tortura de pistoleiros das fazendas.

     

    Moramos na margem do rio Hovy há mais de um ano e estamos sem nenhuma assistência, isolados, cercado de pistoleiros e resistimos até hoje. Comemos comida uma vez por dia. Passamos tudo isso para recuperar o nosso território antigo Pyleito Kue/Mbarakay. De fato, sabemos muito bem que no centro desse nosso território antigo estão enterrados vários os nossos avôs, avós, bisavôs e bisavós, ali estão os cemitérios de todos nossos antepassados.

    Cientes desse fato histórico, nós já vamos e queremos ser mortos e enterrados junto aos nossos antepassados aqui mesmo onde estamos hoje, por isso, pedimos ao Governo e Justiça Federal para não decretar a ordem de despejo/expulsão, mas solicitamos para decretar a nossa morte coletiva e para enterrar nós todos aqui.

     

    Pedimos, de uma vez por todas, para decretar a nossa dizimação e extinção total, além de enviar vários tratores para cavar um grande buraco para  jogar e enterrar os nossos corpos. Esse é nosso pedido aos juízes federais. Já aguardamos esta decisão da Justiça Federal. Decretem a nossa morte coletiva Guarani e Kaiowá de Pyelito Kue/Mbarakay e enterrem-nos aqui. Visto que decidimos integralmente a não sairmos daqui com vida e nem mortos.

    Sabemos que não temos mais chance em sobreviver dignamente aqui em nosso território antigo, já sofremos muito e estamos todos massacrados e morrendo em ritmo acelerado. Sabemos que seremos expulsos daqui da margem do rio pela Justiça, porém não vamos sair da margem do rio. Como um povo nativo e indígena histórico, decidimos meramente em sermos mortos coletivamente aqui. Não temos outra opção esta é a nossa última decisão unânime diante do despacho da Justiça Federal de Navirai-MS.     

     

    Atenciosamente, Guarani-Kaiowá de Pyelito Kue/Mbarakay

     

    Relatório do conselho Aty Guasu explica a situação dos Guarani Kaiowá de Pyelito Kue/Mbarakay

    Este relatório é do conselho da Aty Guasu Guarani e Kaiowá, explicitando a história e situação atual de vida dos integrantes das comunidades Guarani-Kaiowá do território tradicional Pyelito Kue/Mbarakay, localizada na margem de Rio Hovy, 50 metros do rio Hovy, no município de Iguatemi-MS. O acampamento da comunidade guarani e kaiowá de Pyelito Kue/Mbarakay começou no dia 08 de agosto de 2011.

     

    É importante ressaltar que os membros (crianças, mulheres e idosos) dessa comunidade proveniente de uma reocupação, no dia 23 de agosto de 2011, às 20h00, foram atacados de modo violentos e cruéis pelos pistoleiros das fazendas. A mando dos fazendeiros, os homens armados passaram permanentemente a ameaçar e cercar a área minúscula reocupada pela comunidade Guarani-Kaiowá na margem do rio que este fato perdura até hoje.

     

    Em um ano, os pistoleiros que cercam o acampamento das famílias guarani-kaiowá, já cortaram/derrubaram 10 vezes a ponte móvel feito de arame/cipó que é utilizada pelas comunidades para atravessar um rio com a largura de 30 metros largura e mais de 3 metros de fundura. Apesar desse isolamento pistoleiros armados ameaçam constantemente os indígenas, porém 170 comunidades indígenas reocupante do território antigo Pyelito kue continuam resistindo e sobrevivendo na margem do rio Hovy na pequena área reocupada até os dias de hoje, estão aguardando a demarcação definitiva do território antigo Pyelito Kue/Mbarakay.

     

    No dia 8 dezembro de 2009, este grupo já foi espancado, ameaçado com armas de fogo, vendado e jogado à beira da estrada em uma desocupação extra-judicial, promovida por um grupo de pistoleiros a mando de fazendeiros da região de Iguatemi-MS. Antes, em julho de 2003, um grupo indígena já havia tentado retornar, sendo expulso por pistoleiros das fazendas da região, que invadiram o acampamento dos indígenas, torturaram e fraturaram as pernas e os braços das mulheres, crianças e idosos. Em geral os Guarani e Kaiowa são hoje cerca de 50 mil pessoas, ocupando apenas 42 mil hectares. A falta de terras regularizadas tem ocasionado uma série de problemas sociais entre eles, ocasionando uma crise humanitária, com altos índices de mortalidade infantil, violência e suicídios entre jovens.

     

    No último mês a Justiça Federal de Navirai-MS, deferiu liminar de despejo da comunidade Guarani e Kaiowá da margem do rio Hovy solicitado pelo advogado dos fazendeiros e, no despacho cita “reintegração de posse”, mas observamos que o grupo indígena está assentado na margem do rio Hovy, ou seja, não estão no interior da fazenda como alega o advogado dos fazendeiros. De fato, não procede à argumentação dos fazendeiros e por sua vez do juiz federal de Navirai sem verificar o fato relatado, deferir a reintegração de posse. Não é possível despejar indígenas da margem de um rio. Por isso pedimos para Justiça rever a decisão de juiz de Navirai-MS.

     

    No sentido amplo, nos conselhos da Aty Guasu recebemos a carta da comunidade de Pyelito Kue/Mbarakay em que consta a decisão da comunidade que passamos divulgar a todas as autoridades federais e sociedade brasileira.

     

     

    Tekoha Pyelito kue/Mbarakay, 08 de outubro de 2012

    Atenciosamente,

    Conselho/Comissão de Aty Guasu Guarani e Kaiowá do MS.

     

     

    Egon Heck

    Povo Guarani Grande Povo

    Cimi 40 anos, 10 de outubro de 2012

     

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  • 10/10/2012

    Guarani Kaiowá: famílias de Passo Piraju são novamente ameaçadas de expulsão

    Por Ruy Sposati,
    de Dourados (MS)

    Liderança Carlito Guarani Kaiowá afirma não sair de Passo Piraju. Foto Ruy Sposati/CimiA população indígena Kaiowá do tekoha – ‘terra sagrada’, a aldeia – Passo Piraju volta a temer por seu futuro. Na última sexta-feira, 5, o Tribunal Regional da 3a. Região (TRF-3) publicou um acórdão derrubando a decisão que garantia a posse do território para os indígenas. São 20 hectares ocupados hoje pela comunidade, de uma área reivindicada pelos índios e ocupada por fazendas de soja e cana.

    A terra, localizada às margens do rio Dourados, entre os municípios de Dourados e Laguna Carapã, na região conhecida por Porto Kambira, foi retomada pelos Kaiowá em 2004.

    “Quando amanhecemos hoje de manhã, levantamos e já escutamos a história. Leram a notícia: tem um despejo na aldeia Passo Piraju. Leu, leu, repetiu 50 vezes, tomando mate”, conta Carlito de Oliveira, principal liderança da aldeia. “Nós queremos explicação. Nós não mexemos em nada. Tão plantando todo esse canavial dentro da nossa aldeia e nós não quebramos nem uma cana, nem um broto. Respeitamos a decisão. E por que que agora começaram a mexer de novo com esse despejo?”, questiona.

    Carlito se refere ao Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), estabelecido pelo Ministério Público Federal (MPF) com a Fundação Nacional do Índio (Funai) em 2007, para que fossem constituídos grupos técnicos para identificação e delimitação das terras indígenas, no sentido de agilizar o trabalho de demarcação de terras reivindicadas pelos Kaiowá e Guarani. Do TAC, surgiriam os grupos de trabalho que elaboraram os relatórios corroborando Passo Piraju como território tradicional dos Kaiowá.

    Decisão

    Hoje, laudos antropológicos em fase de publicação comprovam a ocupação histórica dos Kaiowá naquele território. Os indígenas estão produzindo na terra, sem ultrapassar os limites do TAC. Estão em área de preservação e protegem a mata de invasores e exploração ilegal. Já tem a posse do território consolidada e muitas benfeitorias, como poço, posto de saúde, escola de alvenaria e plantações de mandioca, batata, milho, arroz, feijão, cana e frutas, além de bovinos, equinos, suínos e ovinos. Uma rede de distribuição de água e uma caixa d’água estão em fase de construção.

    No entanto, o TRF-3 decidiu contrariamente à apelação do MPF, que garantia a posse do território aos indígenas, julgando a favor dos fazendeiros. Segundo a publicação, a posse da terra em nome do invasor estaria “suficientemente provada através de cópias da escritura pública do imóvel, do memorial descritivo, bem como da Declaração Anual do Produtor Rural do ano de 2002”. Também afirma que  “o esbulho [pelos indígenas] foi comprovado através de cópia do Boletim de Ocorrência e notícias publicadas na imprensa local(…)”. O desembargador conclui que “deve ser mantida a sentença que determinou a reintegração de posse aos autores [fazendeiros]”.

    Os subsídios que levaram o desembargador Federal Nelton dos Santos a tomar a decisão, contudo, passam longe da história contada pelos índios. “Esse juíz está dizendo que isso aqui nunca foi terra do índio. Que toda vida foi dos fazendeiro. Aí começa a cobrar para sair do lugar. Eu vou contar a história”, começa.

    “Antes tudo morava aqui, era região cheia. Meus parente tudo”. Carlito volta à primeira metade do século 20 para introduzir o histórico de pressões e espoliações que sua família sofreu por conta das invasões de fazendeiros e das políticas de captura e confinamento do antigo órgão indigenista oficial do Brasil, o Serviço de Proteção ao Índio (SPI).  

    Alinhado ao espírito integracionista do Estado brasileiro, o SPI expulsava e encurralava os indígenas em pequenas teras, estabelecendo uma relação de dependência com as comunidades indígenas, que se transformaria em fonte de mão de obra desqualificada e barata para servir aos fazendeiros. A família de Carlito, nesse contexto, foi se dispersando.

    “Quando começou, começou como agora, essa notícia que apareceu hoje cedo chegou igual naquele ano. Eu saí daqui guri de 12, 13 anos. Eu saí daqui empurrado junto com meus pais, que já morreram. Naquele tempo chamava captura. É a mesma coisa”, compara. “Era uma montoeira de cavaleiro falando para o finado meu pai, finado meu tio, dizendo que era para deixar fazenda".

    Carlito teme reviver mais uma vez as violências pelas quais seu povo vem passando: “Naquela vez eu escutei a mãe falando para o pai: ‘vamos levar nossas criança, porque os homens já avisaram vocês, eles vão vir fazer as coisas erradas com nós’. E era verdade. Quando nós passamos para lá do rio, escutamos aqui tiroteio. À noite. No escurecê, uma base das 9 para as 10 horas da noite. Foi tiro. Ficou assim umas horas. E queimando as ogapysy (casa Kaiowá onde morava a família extensa). Só fogo naquelas ogapysy“.

    No entanto, o indígena retorna ao presente e crava: “Se a lei vai ter poder de tirar de nós o Passo Piraju, eu quero que a lei retire só as minhas crianças. Eu quero deixar a minha carne, o meu osso em cima dessa terra aqui. Eu vou deixar. Podem vim fazer o despejo. Só que daqui eu não saio. Eu quero que a morte, que minha catacumba seja no rio. Quero que minhas crianças, quando elas voltarem de novo, que elas cacem o meu osso para plantar de novo na aldeia. Eu quero que me plante aqui na aldeia Passo Piraju, porque aqui que eu nasci, daqui que fui expulso, aqui que eu vou poiá a minha catacumba. De novo aqui na aldeia Passo Piraju [chora]. Por que que eu estou chorando? Porque os finados meus avôs, não sei onde que está a catacumba deles. Nunca mais encontrei eles. Nunca mais encontrei minha vó, meus tios. Eu vou ser assim também. Eu quero”.

    Engessamento

    Os estudos sobre Passo Piraju fazem parte de um dos seis grupos de trabalho (GT) criados pela Funai em 2008 com o objetivo de identificar as terras Kaiowá Guarani no cone sul, conforme estabelecido pelo TAC.

    O prazo original do acordo exigia que a Funai iniciasse o procedimento de regularização das terras indígenas junto ao Ministério da Justiça até abril de 2010. Como os prazos não foram cumpridos, o MPF executou judicialmente o termo – que previa multa diária acumulativa de um mil reais no caso de descumprimento – e estabeleceu um novo cronograma de trabalho para o órgão indigenista.

    No caso de Passo Piraju, terra incluída no GT Dourados-Amambaipeguá, o Relatório Circunstanciado de Identificação (RCID) foi entregue pelo antropólogo à Funai em outubro de 2011. No entanto, segundo o último cronograma apresentado pela Funai na Aty Guasu de Rancho Jacaré, em julho, ainda não há previsão para a aprovação e a publicação dos relatórios.

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  • 09/10/2012

    Articulação inédita de indígenas e pescadores promove nova ocupação de Belo Monte

    Após o não cumprimento de acordos por parte da Norte Energia, ocupação permanecerá até que todas as reivindicações sejam atendidas, dizem indígenas

     

    Por volta das 19h desta segunda-feira (8), cerca de 120 manifestantes  indígenas das etnias Xipaia, Kuruaia, Parakanã, Arara do rio Iririr, Juruna, e Assurini uniram-se aos pescadores, que estão há 24 dias protestando contra o barramento definitivo do rio Xingu (PA), e ocuparam novamente a ensecadeira do canteiro de obras de Pimental para paralisar a construção de Belo Monte. Os indígenas tomaram as chaves de caminhões e tratores na ensecadeira, e os trabalhadores tiveram que deixar o local a pé.

     

    De acordo com os manifestantes, a ação, que é pacífica, ocorre em função do completo descumprimento dos acordos firmados pelo Consórcio Norte Energia com os indígenas depois da última ocupação da ensecadeira, entre junho e julho deste ano; o não cumprimento de grande parte das condicionantes; a total falta de diálogo da empresa com os pescadores; e a ameaça concreta de alagamento de parte de Altamira com o barramento definitivo do rio Xingu. Pequenos agricultores, moradores de Altamira e oleiros da região devem se juntar aos protestos ao longo da semana.

     

    Os manifestantes acusam o empreendimento de fechar o rio sem que tenha sido solucionada a transposição de barcos de um lado a outro da ensecadeira, como exige a Licença de Instalação (LI) outorgada pelo Ibama.

    De acordo com o órgão, o fechamento do rio não poderá ocorrer e a empresa não poderá interromper o fluxo de embarcações até que o sistema provisório de transposição de embarcações esteja em pleno funcionamento (item 2.6 da LI).

     

    Segundo os pescadores, a ensecadeira, que tem mais de 5 km, deve ser concluída nos próximos dias. “O que temos aqui é uma cena de terra arrasada. A ilha de Pimental foi completamente destruida, só é árvore no chão, e a água está podre. É muito chocante”, afirma um dos manifestantes.

     

    De acordo com os indígenas, desta vez a ocupação deve permanecer até que todos os acordos firmados em julho tenham sido cumpridos. Os pescadores também reafirmam a intenção de permanecer por tempo indeterminado.

     

    Fotos da ilha de Pimental em maio de 2011 e maio de 2012 (autor: Phil Clarke-Hill)

    Apoio


    Todo o apoio aos manifestantes neste momento é essencial. Nesse sentido, qualquer contribuição financeira para a luta é muito importante é bem-vinda. Aqueles que desejarem ajudar podem depositar qualquer quantia nas contas:

     

    Mutirão pela Cidadania
    Caixa Economica Federal –  Agencia- 0551   OP- 003  Conta/Corrente – 1532-7
    Banco Bradesco – agencia -1011   C/C- 32955-0

     

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  • 09/10/2012

    Mato Grosso do Sul – Passo Piraju, a um passo da cova

    Roça da comunidade indígena. Foto: Ruy Sposati/Cimi MS

    Querem decididamente a comunidade kaiowá Guarani, embaixo da terra, há sete palmos.  Conforme pedido do senhor Esmalte, confirmado pelo juiz de primeiro grau, já em 2004: "O MM. Juiz de primeiro grau, então, determinou seja o cacique Carlitos de Oliveira advertido a não mais autorizar, incentivar ou permitir que os indígenas sob sua chefia ingressem na propriedade do autor e que a FUNAI providencie "a retirada dos índios da margem da propriedade do autor, assentando-os em local distante" (f. 159).

     

    Quase uma década de tribulação, tormento e desassossego permanente. Talvez seja a comunidade Kaiowá Guarani da Terra Indígena Passo Piraju, emblemática de uma comunidade indígena sitiada, cercada de soja, cana e ódio. "Reduzidos sim, mas não vencidos", diziam comunidades indígenas da Amazônia, quando da Marcha e Conferência Indígena do ano 2000.

     

    Neste período vi as lágrimas deslizando no rosto de Carlitos, ao narrar tudo que passou nas décadas de luta pela terra e vida de seu povo. Ele recebeu a visita de dezenas de personalidades, delegações de Direitos Humanos e aliados, do Brasil e do mundo. Narrou com a mesma dignidade e fidelidade os acontecimentos, desde a expulsão de seu pai e comunidade do Passo Piraju, da área onde hoje se encontram.

     

    Apesar de doenças, mortes, tensões e conflitos, pressões e enganações de toda ordem, Carlitos e sua comunidade, enfrentaram todas essas adversidades com muita fé e convicção de que Tupã, Nhanderu, fará um dia justiça para seu povo. Agora se encontra diante de uma nova ordem de despejo.

     

    A pergunta crucial que fica é o que se quer de fato dos Kaiowá Guarani. Serão os sete palmos de terra, para consumar de vez o genocídio nunca estancado? Para os arautos dos decretos e práticas de extermínio é muito mais importante ampliar as lavouras de soja, uma vez que na bolsa de valores a cotação do grão maldito está alto, bem acima da vida de qualquer indígena.

     

    Dos 44 indígenas assassinados neste ano, conforme dados divulgados pelo Cimi, 63% ocorreram no Mato Grosso do Sul, confirmando a triste estatística de campeão de violência contra os povos indígenas. Com certeza ações de reintegração de posse, além de ser um ato de violência em si, propiciam o desencadear de mais violências e mortes. No Estado recentemente três reintegrações de posse foram expedidas: Pueblito Kuê-Mbarakay (Iguatemi) Kadiwéu (Bodoquena) e agora Passo Piraju (Dourados).

     

    Para Eliseu Lopes, representante da Aty Guasu na Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), é inconcebível que se continue provocando mais violência ao invés de resolver o problema das terras indígenas de uma vez. Ele está participando de várias iniciativas dos Direitos Humanos "para que haja uma somatória de forças para impedir a continuação da violação dos direitos do nosso povo Kaiowá Guarani", afirma Eliseu. Ele está cobrando do governo e em especial da Funai, a urgente publicação dos relatórios de identificação de todas as terras indígenas no Mato Grosso do Sul. "A APIB continua exigindo a revogação da portaria 303 da AGU, que é uma das causadoras de violência”.

     

    Nesta semana foi instalado em Amambai um grupo de 20 integrantes da Força Nacional, para evitar a violência contra a população indígena em 12 municípios da fronteira com o Paraguai. Espera-se uma ação eficaz, especialmente em áreas em que as lideranças estão ameaçadas de morte, como em Arroio Korá.

     

    Comissão da Verdade Indígena

     

    Até que enfim neste país se resolve começar a fazer justiça, ou ao menos dar visibilidade, às violências, crimes, torturas e mortes contra comunidades indígenas em todo o país, ocasionando milhares de mortes. Embora tardiamente, e possivelmente contra a vontade de setores das elites do país, à semelhança da Comissão Camponesa.

     

    Para o ex-secretário do Cimi, Saulo Feitosa a instauração de uma Comissão de Verdade Indígena, além de um valor simbólico muito grande, traz em seu bojo a possibilidade (e necessidade) de uma reparação aos povos afetados.

     

    Egydio Shwade e a Comissão da Verdade em Manaus estarão entregando, na próxima semana, um relatório com mais de 200 documentos comprovando o massacre de mais de dois mil Waimiri Atroari, por ocasião da construção da estrada BR-194 que liga Manaus(AM) a Boa Vista (RR). A estrada foi construída durante a ditadura militar, nas décadas de 1960 e 1970.

     

    Esse será um momento importante para esclarecer a morte de mais de 1.500 Yanomami, em decorrência da invasão de seu território, especialmente por garimpeiros e empresas mineradoras., na década de 1980. Também será o momento de esclarecer os massacres dos Juma (Tapauá-AM), do massacre do paralelo 11, Cinta Larga, dentre muitos outros. Quem sabe se comece a reescrever a história fazendo justiça a esses povos.

     

    Egon Heck

    Povo Guarani Grande Povo

    Cimi 40 anos, 9 de outubro de 2012

     

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