• 08/11/2012

    Povos Indígenas do Maranhão em Brasília

    Viemos para guerra,

    queremos nossa terra,

    demarcada, respeitada,

    livre de invasões,

    sem madeireiras ou fazendeiros,

    sem mineradoras ou garimpeiros!

    livres dos males civilizados,

    queremos justiça e paz.

     

     

     

    Da aldeia aos três poderes

    Aos poucos foram  chegando, das diversas regiões do Estado do Maranhão, para uma longa viagem de quase mil e quinhentos quilômetros. Corpos pintados, cocares, bordunas pesados, flechas certeiras. O destino é chegar aos que decidem, aos detentores do poder, para lhes dizer: queimem a portaria 303, revoguem aos leis que ferem nossos direitos, respeitem os povos indígenas do Maranhão e de todo país. 

    Em frente ao Congresso as fotos e filmagens diante de casas tão estranhas. Forte sensação de quem só conhecia essa paisagem por alguma foto ou notícia de radio.

    Portas fechadas, corações indignados

     As portas fechadas do Ministério da Justiça ou o temor dos seguranças do palácio do Planalto não os intimidaram. Os rituais, cantos e danças não pararam. Foram horas tentando dizer à presidente Dilma -nós existimos, estamos aqui. Queremos ser ouvidos e respeitados. Demarque nossas terras. Chega de invasão e destruição!

    No auditório da Funai, tiveram encontro com a presidente do órgão, Marta Azevedo e sua equipe. Puderam rapidamente expor os graves problemas que muitas comunidades enfrentam, especialmente aos invasões de fazendeiros , madeiros, garimpeiros e grandes projetos do governo. Diante disso exigiram ações mais eficazes da Funai e mais agilidade e datas para os processos de regularização de seus territórios. Apesar da descrença pela histórica omissão do governo, puderam expressão sua indignação e expor suas exigências.

    Em seu manifesto, expressam as razões de presença em Brasília

     “Nós, povos indígenas do estado do Maranhão Guajajara, Gavião, Krikati, Rankokamekra, Mermortumre, Apaniekra, Kaapor, Awá-Guajá, Krepymkateyê e Krenyê, vimos respeitosamente exigir de Vossa Excelência, a revogação imediata da Portaria 303, por entendermos que a mesma vem usurpar os nossos direitos, e não admitimos apenas a suspensão temporária deste equivocado e inconstitucional ato jurídico-administrativo que restringe de forma absurda os direitos originários e fundamentais dos nossos povos.

    Os povos indígenas do Maranhão reafirmam o posicionamento já publicado pelas organizações e delegações indígenas das outras regiões que desde final de julho, após a edição dessa Portaria, manifestam-se veementemente por sua revogação integral e imediata.

    Reforçamos aqui a nossa insatisfação com a conjuntura política atual que demonstra claramente os acordos do governo com os grupos econômicos desse país, cujos interesses são a exploração das riquezas naturais, construção de hidrelétricas, refinarias, plantios de monocultivos, ferrovias, hidrovias e rodovias, que facilitam a exportação e mercantilização dos territórios indígenas.

    Portanto, nós povos indígenas do Maranhão, juntamente com os demais povos do Brasil, só cessaremos a luta quando os nossos direitos forem respeitados e a Portaria definitivamente revogada. "

     Brasília, 05 de Novembro de 2012.

     

     Lutar juntos

    Uma Assembleia Indígena dos Povos do Maranhão. É essa a impressão que tive ao se apresentarem e externarem seu sentimento “Precisamos lutar juntos”, nos unir. “Será que vamos ficar embaixo de uma moita que nem jaboti”, perguntava outro. Precisamos usar nossa sabedoria para impedir que os brancos façam leis contra nós. E deixaram claro por que vieram de tantos e tão longínquos lugares: “estamos aqui para queimar essa lei, os decretos e portarias".  Parecia uma atualização dos momentos de luta contra o projeto de “emancipação” em 1978. Naquela ocasião os povos indígenas fizeram uma Assembleia e exigiram que o ministro general Rangel Reis, queimasse definitivamente esse projeto. E conseguiram. Nunca mais voltaram a falar nisso. É o que se espera agora com a portaria 303 da AGU. A respeito dessa portaria uma liderança assim se manifestou “essa lei pra nós é o fim do mundo. Respeitem nossos direitos”.

    Egon Heck

    Povo Guarani Grande Povo

    Cimi 40 anos, Brasília 8 de novembro de 2012

     

     

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  • 07/11/2012

    Carta da Aty Guasu Guarani e Kaiowá aos diversos movimentos sociais e atos nacionais em defesa do nosso povo

    Foto: (CC BY-SA) Fora do Eixo

    Carta da Aty Guasu Guarani e Kaiowá aos diversos movimentos sociais e atos nacionais em defesa do nosso povo

     

    “Saiam às ruas, pintem os rostos, ocupem as praças,

    ecoem o grito do nosso povo que luta pela vida, pelos territórios!”

     

    Esta é uma carta das lideranças do Aty Guasu (Grande Assembleia) direcionada especialmente às diversas “mobilizações contra o genocídio do nosso povo Guarani e Kaiowá”, previsto para o dia 09 de novembro em várias cidades do país e do mundo. Queremos agradecer por todas estas iniciativas de solidariedade em defesa das nossas terras e nossas vidas.

     

    Hoje somos 46 mil pessoas sobreviventes de um contínuo e violento processo de extermínio físico e cultural acarretado principalmente pela invasão histórica de nossos territórios tradicionais (tekoha guasu) e por assassinatos de nossas lideranças e famílias. Por isso reafirmamos que o Estado Brasileiro é o principal responsável por este estado de genocídio, ora por participação, ora por omissão.

     

    Nossa Aty Guasu é responsável nos últimos 35 anos pela organização política regional e internacional do nosso povo e por nossa luta na defesa e efetivação de nossos direitos fundamentais e constitucionais, de modo prioritário a retomada dos territórios tradicionais. Por esse motivo, nosso povo possui a maior quantidade de comunidades atacadas por pistoleiros e de lideranças assassinadas na luta pela terra do Brasil República.

     

    Por isso, através desta carta queremos unir nossas vozes a de todos vocês e promover o mesmo grito pela vida de nosso povo com as seguintes prioridades:

     

    – A imediata demarcação de nossos territórios tradicionais e a desintrusão dos territórios já declarados e homologados.

    – Que a Funai publique, ainda este ano, os relatórios de identificação dos territórios em estudo.

    – Que diante do processo legítimo de retomada de nossos territórios, nosso povo não seja despejado, uma vez que roubaram nossas terras por primeiro e nos confinaram em pequenas reservas.

    – Que o Conselho Nacional de Justiça – CNJ crie mecanismos para que as ações judiciais envolvendo nossos territórios sejam julgados com prioridade máxima, de modo, a não se arrastarem por anos nas instâncias do judiciário, enquanto nosso povo passa fome à beira das estradas em Mato Grosso do Sul.

    – Que haja uma efetiva ação de segurança de nossas comunidades e lideranças em área de conflito e ameaçadas.

    – Que os fazendeiros e pistoleiros assassinos de nosso povo sejam julgados e condenados.

    – A imediata revogação da inconstitucional portaria 303 da Advocacia Geral da União e o fim das iniciativas do Congresso Nacional em destruir nossos direitos garantidos na Constituição Federal de modo unânime as PECs 215, 38, 71, 415, 257, 579 e 133. Não aceitaremos mudança constitucional!

     

    Por fim, que todas as manifestações não se encerrem em 9 de novembro, mas que esta data seja o início de um contínuo engajamento da sociedade não indígena na defesa da vida de nosso povo e de pressão sobre o governo.

     

    Junto com todos vocês, nosso Povo é mais forte e venceremos o poder desumano do agronegócio explorador e destruidor de nossas terras. A ganância deste sistema não vencerá a partilha de nossos povos.

     

    Vamos continuar a retomada de todas as nossas terras tradicionais! Somos todos Guarani e Kaiowá! Muito obrigado pela SUA VOZ SAGRADA PROTETORA: “TODOS POR GUARANI E KAIOWÁ!”

     

    Dourados, 7 de novembro de 2012.

     

    Conselho do Aty Guasu Guarani e Kaiowá

     

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  • 07/11/2012

    Indígenas do Maranhão e Vale do Javari exigem revogação da Portaria 303

    Indígenas dos povos Guajajara, Awá-Guajá, Käapo, Gavião, Krikati, Kenyiê, Krepumkatjê, Kanela, do Maranhão e Kanamari, Marubo, Mayoruna e Kulina, do Vale do Javari, no Amazonas estão em Brasília para reivindicar dos órgãos federais providências na assistência indígena e revogação da Portaria 303. 

    “São 200 indígenas aqui reunidos. O principal motivo da presença da delegação dos povos do Maranhão em Brasília é exigir a imediata revogação da Portaria 303. Pretendemos ficar aqui toda a semana até ouvir uma posição positiva da revogação da portaria”, reitera Flaubert Guajajara.

     

    Ontem, 6 de novembro, bloquearam as três passagens de entrada do Palácio do Planalto até que recebessem resposta sobre uma reunião com o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo e o advogado-geral da União, Luís Inácio Adams. A reunião não aconteceu, pois José Eduardo Cardozo estava em São Paulo, entretanto o advogado-geral da União, Luís Adams, se encontrava em Brasília.

     

    “O Luís Adams não precisou de ninguém para publicar a Portaria 303. E por que agora ele precisa da presença do ministro da Justiça para se reunir com a gente, se ele disse que fez a portaria sozinho? ”, questiona Sônia Bone, indígena Guajajara que integra a coordenação da Articulação dos Povos indígenas do Brasil (APIB) e a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab).

     

    A Portaria 303 determina, entre outras medidas, que as terras indígenas podem ser ocupadas por unidades, postos e demais intervenções militares, malhas viárias, empreendimentos hidrelétricos e minerais de cunho estratégico, sem consulta aos povos.  “Hoje mesmo com as terras demarcadas ficamos sem liberdade e proteção dentro de nossas próprias terras, imagina se essa portaria passa, como vamos ter segurança dentro de nossas terras, se ela abre precedente para a revisão do limite de terras, entrada de terceiros, como exércitos, construção de grandes empreendimentos. Como vamos ter paz e segurança?”, comenta Sônia Guajajara. 

     

    Transtornados sobre o descaso do governo a respeito da proteção nas terras indígenas e sem assistência, os indígenas foram recebidos na parte da tarde pela presidente da Funai, Marta Azevedo. “Queremos ações que foram passadas e não foram cumpridas pela Funai. Todas as comunidades aqui presentes sofrem algum tipo de ameaça. Não é só colocar em pauta é preciso ter execução”, diz Flaubert Guajajara.

     “Onde está a criação do Grupo de Estudo (GT) para o levantamento do território do povo Krenjê. O representante da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) disse que temos direito sim, mas sem território nada acontece. Ficou acordado também que a Funai mandaria cesta básica, mas ela estipulou que só receberiam aqueles que tivessem família, ou seja, quem não tem família não come?”, aponta Raimundo Krenjê.

     

    Um dos principais conflitos com os povos indígenas no Maranhão se dá pela exploração ilegal de madeira dentro das terras. Os indígenas reivindicam a desintrusão dos não-índios de suas terras, constantemente invadidas por fazendeiros e madeireiros. “Hoje não há espaço para caça, nem pesca em nossa terra, pois os madeireiros a estão invadindo, não sei por quantos mil processos já passamos e nada avança”, reclama Ambrósio Gavião.

     

    Saúde indígena: estado de calamidade

     

    A Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) não possui estrutura adequada para atender os indígenas e dar a assistência necessária, política pública que se reflete no estado de calamidade pública da saúde indígena na região. “A Sesai foi criada e não dá o atendimento mínimo. Não sabemos a que ela veio. A Funai nunca conseguiu chegar nas aldeias, então a gente não conhece o trabalho da Sesai. As mortes por desassistência são bastante comuns, muitos morrem por falta de transporte e hospitais adequados”, afirma Sônia Guajajara.

     

    Grandes empreendimentos x terras indígenas

     

    O Maranhão é dos estados que sofre mais impacto dos grandes empreendimentos desenvolvidos governo de Dilma Rousseff. Construção de ferrovias e hidrelétricas ameaçam a sobrevivência dos povos indígenas, inclusive dos isolados.  Os povos Krikati e Gavião estão sendo afetados diretamente em suas terras pela expansão do eucalipto pela empresa de papel e celulose, Suzano.

     

    “A gente apostou muito nos governos Lula e Dilma, que ia ser um governo democrático e popular, mas na verdade o PT só atende aos interesses dos empresários, latifundiários, agronegócio e grandes produtores. Classes mais vulneráveis, como quilombolas e ribeirinhos são vistas como empecilhos, povos que atrapalham o progresso”, argumenta Sônia Guajajara.

     

    Levantamento do Conselho Indigenista Missionário relaciona um total de 204 povos indígenas atingidos por diferentes empreendimentos em todo o país, em um total de 448 terras indígenas. Os impactos envolvem 527 empreendimentos, dos quais 263 são da área de energia, 20 de mineração, 19 do agronegócio, e só no estado do Maranhão são 14 empreendimentos.

     

    A expansão da ferrovia Carajás, pela mineradora Vale do Rio Doce, aumentará impactos sobre o povo Awá-Guajá. Caso seja concretizada, sua expansão promoverá o desaparecimento das florestas e da fauna, fonte de vida dos Awá-Guajá. Suas terras são invadidas por madeireiros que abrem estradas clandestinas, desmatam áreas próximas a lagoas, privilegiadas em caça e pesca, locais de fundamental importância para a sobrevivência física e cultural deste povo.

    Fotos: Gustavo Macedo / APIB

     

    Confira a agenda dos indígenas para os dias 8 e 9:

     

    Quinta-feira, dia 8/11

    Sexta-feira, dia 9/11

    11hs: Audiência com os ministros Gilberto Carvalho, da Secretaria-Geral da Presidência da República, e Luis Adams (Advocacia Geral da República)

    08hs30min.: Audiência com ministro da Justiça, Eduardo Cardozo e advogado-geral da União- Luis Adams

     

    15hs: Audiência pública da Comissão de Direitos Humanos, no Congresso Nacional, Plenário 1, Anexo 2

     

     

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  • 07/11/2012

    Atentados físicos e políticos: o monólogo do latifúndio na Terra Indígena Marãiwatsédé, Mato Grosso

    Gilberto Vieira dos Santos

    Coordenador do Cimi Regional Mato Grosso

     

    Um indígena Xavante de Marãiwatsédé voltava de Barra do Garças para aldeia depois de ter deixado outros Xavante para tratamento de saúde, no último dia 3 de novembro. Na cidade de Água Boa foi abordado por um não indígena que perguntou se ele era filho do cacique Damião, o que ele, com medo, negou. Mais adiante, depois da cidade de Ribeirão Cascalheira, foi perseguido por dois carros com pessoas que reconheceu serem de Posto da Mata, núcleo da invasão no território indígena Marãiwatsédé.

     

    Segundo informações de lideranças da comunidade, os homens de Posto da Mata perseguiram o motorista Xavante ao longo da rodovia BR 158 em alta velocidade. Nas proximidades do Posto Malu, o motorista viu outros homens com mais três carros querendo parar e cercar o veículo. Ao tentar escapar da perseguição o motorista capotou o veículo, tendo perdido temporariamente os sentidos, sofrendo algumas escoriações. Felizmente, por ser uma região movimentada, caminhoneiros chegaram e o pior foi evitado.

     

    Na somatória deste (fa)nordeste matogrossense: um indígena abalado pela violência, um veículo queimado pelos perseguidores, deixando a comunidade indígena sem transporte para atender seus futuros pacientes e mais uma manifestação do “poder de diálogo” que tem os invasores de Marãiwatsédé.

    Enquanto isso, preparando os atentados políticos, fazendeiros se utilizando de suposta organização religiosa, articulam mais uma “apelação”, entre as tantas que já fizeram para postergar o que não podem mudar: a desintrusão.

     

    Mulheres bloqueiam ruas em Brasília e apelam para a condição de mulher da presidente Dilma, e dizem ter as mesmas supostas provas, já tantas vezes desmascaradas, de que Marãiwatsédé não é Marãiwatsédé. Em todos estes tristes fatos reside a inegável verdade: os direitos dos povos indígenas não são considerados.

     

    Portanto, não se ouvirá os invasores dizerem que foram enganados, que mesmo sabendo ser terra indígena pensavam e foram levados a pensar que nunca sairiam. Que os políticos, inclusive prefeitos da região e outros que ocupam cargos na Assembleia Legislativa, que ou incentivaram a invasão ou fazem de tudo para mantê-la, são essencialmente anti-indígenas, antes de serem pró-invasores. Que os interesses são outros, não defender “indefesos pequenos agricultores”, mas reafirmar que em Mato Grosso, terra do agronegócio, não deve haver lugar para povos indígenas. E para isso todos os recursos serão acionados, sejam financeiros, o lobby, a pistolagem e os falsos argumentos, sem uma ordem definida.

     

    Não obstante, como o mundo não é feito apenas de más notícias, ao mesmo tempo em que o agronegócio reafirma seu monólogo, diversas organizações e pessoas sensíveis a vida se mobilizam em apoio aos povos indígenas. Por intermédio das mais diferentes formas de manifestação chama a atenção para a “verdade verdadeira”: os direitos dos povos indígenas são inalienáveis, indisponíveis, imprescritíveis. E para reafirmar esta verdade, unirão seu grito: Somos todos indígenas, somos todos Guarani, SOMOS TODOS MARÃIWATSÉDÉ!!!

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  • 06/11/2012

    IHU – Conjuntura da Semana. O silencioso, duradouro e doloroso martírio do povo Guarani-Kaiowá

    A análise da Conjuntura da Semana é uma (re)leitura das Notícias do Dia publicadas diariamente no sítio do IHU. A análise é elaborada, em fina sintonia com o Instituto Humanitas Unisinos – IHU, pelos colegas do Centro de Pesquisa e Apoio aos Trabalhadores – CEPAT, parceiro estratégico do IHU, com sede em Curitiba-PR, e por Cesar Sanson, professor na Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN, parceiro do IHU na elaboração das Notícias do Dia.

     

    Sumário:

     

    A indizível violência contra um povo

     

    A terra na vida dos Guarani-Kaiowá

    Guarani-kaiowá enfrentam o agronegócio e o Estado

    Politizar a luta dos Guarani-Kaiowá

     

    Conjuntura da Semana em frases

     

    Tuitadas da Semana

     

    Eis a análise.


    A indizível violência contra um povo


    A carta da comunidade de 170 índios Guarani-Kaiowá (50 homens, 50 mulheres e 70 crianças) que vivem confinados em uma pequena área em Iguatemi/MS ecoou como um grito de desespero que impressionou até mesmo indigenistas experientes como Egon Heck: “Ao ler o teor do comunicado, fico estarrecido e me junto ao grito dos condenados – que país é esse?". 


    Afirma a carta: “Sabemos que seremos expulsas daqui da margem do rio pela justiça, porém não vamos sair da margem do rio. Como um povo nativo/indígena histórico, decidimos meramente em ser morto coletivamente aqui. Não temos outra opção,  esta é a nossa última decisão unânime diante do despacho da Justiça Federal de Navirai-MS”.


    A comunidade que integra a comunidade Pyelito Kue/Mbarakay – que quer dizer terra dos ancestrais – diante da ameaça de despejo pediu para o governo para ser enterrada ali mesmo junto aos antepassados: “Solicitamos para decretar a nossa morte coletiva e para enterrar nós todos aqui. Pedimos, de uma vez por todas, para decretar a nossa dizimação/extinção total, além de enviar vários tratores para cavar um grande buraco para  jogar e enterrar os nossos corpos”, afirma o texto. 


    A carta manifesto da comunidade de Iguatemi/MS espalhou-se rapidamente entre ativistas e ganhou as redes sociais – muitos mudaram o seu perfil no facebookassumindo identidade Guarani-Kaiowá – e repercutiu internacionalmente. A carta foi interpretada como ameaça de suicídio coletivo e criou comoção. 


    O CIMI preocupado com interpretações equivocadas esclareceu que a expressão “morte coletiva” precisa ser contextualizada na cultura guarani. O CIMI esclarece que quando os Guarani-Kaiowá “usaram a expressão ‘morte-coletiva’, que é diferente de suicídio coletivo, se referiam ao contexto da luta pela terra. Isto é, se eles forem forçados a sair de suas terras pela Justiça ou por pistoleiros contratados por fazendeiros, estariam dispostos a morrer todos nela, sem jamais abandoná-la, pois vivos não sairiam do chão de seus antepassados”.


    Por outro lado, diante do estupor nacional de que índios no Mato Grosso do Sul ameaçam se matar, o CIMI esclarece "que o suicídio entre os índios Kaiowá e Guarani ocorre, já há algum tempo, sobretudo entre os jovens. Entre 2003 e 2010 foram 555, motivados porém, por situações de confinamento, falta de perspectiva, violência, afastamento das terras tradicionais e vida de acampamento às margens de estradas. Nenhum dos referidos suicídios ocorreu de maneira coletiva, organizada ou anunciada”.


    A carta da comunidade de Pyelito Kue na verdade é mais um capítulo da crônica de violência étnica em Mato Grosso do Sul que vem vitimando indígenas. Há um ano, a violenta, dolorosa e desumana morte do cacique Nísio Gomes dava conta dessa infindável história de atrocidades, assim como o assassinato dos professoresguarani Rolindo Véra e Genivaldo Véra.


    Faz tempo que os indígenas afirmam “quase não temos mais chance de sobreviver neste Brasil". Como não lembrar a inquietante afirmação do kaiowá Guarani Anastácio? "Aqui o boi vale mais do que uma criança guarani". A situação dos índios no Mato Grosso do Sul já foi definida pela vice-procuradora-geral da República, Deborah Duprat como "a maior tragédia indígena do mundo".


    Desaldeamento, intimidações, destruição de plantações, queima de barracos, humilhação, fome, doenças, perseguições, sequestros e assassinatos seguidos da crueldade do desaparecimento de corpos fazem parte da vida cotidiana da comunidade indígena Guarani-Kaiowá. 


    A carta denúncia da comunidade Pyelito Kue escancarou a verdadeira guerra contra os indígenas na capital do agronegócio – o Mato Grosso do Sul. No modeloplantation, da soja, do milho, da cana de açúcar e das pastagens não cabem os Guarani-Kaiowá. 


    Os grupos indígenas representam um empecilho ao agronegócio. A pesquisadora Iara Tatiana Bonin, afirma que são vistos como “ervas daninhas que devem ser erradicadas dos jardins do latifúndio para deixaram o caminho livre para os planos dos ‘jardineiros do progresso’”. 


    O indigenista Antonio Brand (falecido recentemente), em entrevista à Revista IHU On-Line – Os Guarani. Palavra e Caminho, alertava para o fato de que “o assédio às terras ocupadas por povos indígenas sempre foi enorme. Terras remanescentes e ricas foram alvo de mineradoras, depois de fazendeiros para a expansão do agronegócio – soja, arroz, cana-de-açúcar, eucalipto – e da pecuária. Por fim, também de obras de infra-estrutura – como estradas ou hidrovias – e de produção de etanol, com enormes impactos ambientais e sociais. Não raro essa dinâmica exploratória contam com recursos públicos provenientes do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC)".


    “De um lado, se tem um dos estados de economia mais florescentes do País, baseado na monocultura de milho, na criação de gado e, agora, na monocultura da cana-de-açúcar entrando com muita força. E, por outro lado, muitas populações expulsas do campo, dentre elas principalmente as indígenas. Essas são as mais afetadas, pelo fato de suas terras se situarem, em geral, nas áreas mais férteis que são as de mata Atlântica, no extremo sul do estado, as terras Guarani-Kaiowá”, destaca o indigenista Egon Heck. 


    A arbitrariedade é tamanha, que segundo Heck, “o gado dispõem de 3 a 5 hectares de terra por cabeça, enquanto os índios Guarani-Kaiowá não chegam a ocupar um hectare por índio. Assim, com falta de terra, centenas de sem terras indígenas são obrigados a se deslocar para a beira das estradas. Essa é uma situação calamitosa para essas populações, além de gritante em termos de injustiça para com os povos indígenas e os trabalhadores sem-terras”, enfatiza o indigenista.


    A situação calamitosa atinge a todos nas comunidades indígenas, mas vale destacar o drama da mulher indígena, pois antes “ocupava um lugar de grande prestigio no interior da sociedade guarani (…) Hoje, as mulheres guarani, em muitos casos, acabam isoladas e confinadas, em casas e quintais cada vez mais reduzidos e precários e, como consequência, mais dependentes dos homens e do dinheiro que estes trazem dos contratos nas usinas de produção de açúcar e álcool.  Como educar seus filhos nesse contexto? Lembra a pesquisadora Paz Grünberg. 


    O interesse do agronegócio fundado na exploração desmedida e predatória do meio ambiente entra em choque frontal com a perspectiva indígena do bem viver e do significado que para eles têm a terra. “Eles não são contrários ao progresso e ao desenvolvimento, apenas tem uma outra concepção de desenvolvimento – menos depredadora dos recursos naturais e assentada sobre uma outra cosmovisão –, razão pela qual conflitam com o modelo de produção e de desenvolvimento dominante, baseado na grande propriedade, na monocultura e na exploração predatória dos recursos naturais e humanos”, diz Iara Tatiana Bonin. 


    O significado da terra na vida dos Guarani-Kaiowá


    Todos os estudiosos, pesquisadores, militantes, agentes de pastoral que acompanham a luta dos Guarani-Kaiowá afirmam que a terra está no centro do conflito. Na visão etnocentrista do capital o índio é um estorvo. Com diz Eduardo Viveiros de Castro, “índio não produz, vive”, logo quem não produz não tem lugar no sistema produtivista consumista, deve ser afastado, confinado e até mesmo eliminado.


    O território para os Guarani reveste-se de sentidos e significados muito diferentes daqueles que motivam a ambição dos fazendeiros, com a expansão do agronegócio no Mato Grosso do Sul, projeto que segue o mesmo ritmo de outras regiões do Brasil. A truculência do fazendeiro, que por meio de seus jagunços age com extrema violência contra esses indígenas, é apenas a concretização mais vil da visão etnocêntrica de uma sociedade que pouco entende sobre o “outro”, denominado genericamente como índio. Cabe, aqui, destacar alguns pontos da forte ligação entre o guarani e o seu território e as consequências da expropriação dos mesmos.


    Em geral, um guarani se refere ao seu território como “tekoha”. O significado desta expressão para essa etnia, de acordo com o pesquisador Bartomeu Melià, em entrevista à revista IHU On-Line – Os Guarani. Palavra e Caminho, está intrinsecamente presente na forma como se veem no mundo. A palavra “teko” significa o “modo de ser, o sistema, a cultura, a lei e os costumes”, assim, “tekoha” “é o lugar e o meio em que se dão as condições de possibilidade do modo de ser guarani”. Desta forma, há uma inseparabilidade entre a vida e o território que proporciona um sentido e direção, ou seja, não é possível para um guarani se imaginar fora da relação com um território. 


    Nota-se, por aí, que a noção de território para esses indígenas é envolvida por uma visão holística, muito distante das desencantadas relações capitalistas que envolvem os homens de negócios, que se apropriam da terra. Como Roberto Antonio Liebgott e Iara Tatiana Bonin analisam, uma vez que “os vínculos dos guarani com seu território são profundos e envolvem elementos materiais e espirituais”, não podem aceitar qualquer espaço como um “tekoha”. “Para os guarani, a vida, em toda a plenitude e potencialidade, só pode se concretizar em um tekoha – um espaço específico onde se pode viver ao estilo guarani. Portanto, o local precisa garantir as condições “para que se realize o modo de ser guarani, e ele deve apresentar uma série de características que envolvem aspectos ambientais, sociais e sobrenaturais”.  Sendo assim, em geral, “um tekoha deve ter água e matas, campos, animais, ervas, espaço para plantar e cultivar alimentos (o milho, a mandioca, batata doce, amendoim, feijão, melancia, abóbora)”, dizem os indigenista na revista IHU On-Line dedicada aos guarani.


    É sob esta construção da identidade dos povos guarani que é possível compreender a importância de garantir que acessem os seus territórios. Contextualizando o cenário de resistência dos Guarani-Kaiowá, no Estado do Mato Grosso do Sul, Tonico Benites destaca que “ao lutar pela recuperação dos territórios, já nas terras reocupadas/retomadas, os Guarani e Kaiowá demonstram e acionam claramente a sua especificidade e condição de pertencimentos aos territórios de origem”. Essas comunidades “foram expropriadas e expulsas de seus territórios antigos, sendo, na maioria dos casos, transferidas e confinadas nas Reservas Indígenas e/ou Postos Indígenas do Serviço de Proteção dos Índios (SPI)”. Certamente, este é um dos grandes dramas vivenciado pelos Guarani-Kaiowá, que permanecem sistematicamente sob a ameaça de um aniquilamento total. 


    Fazendo um balanço histórico, o indigenista Egon Heck destaca algumas fases do processo de expropriação das terras dos Guarani-Kaiowá. Primeiramente, salienta que muitos deles foram mortos na Guerra do Paraguai, no século XIX. Contudo, em seguida, a etnia conseguiu permanecer na floresta, já que o plantio de erva mate não prejudicava extensivamente o meio ambiente. Posteriormente, “de 1915 a 1928, o Serviço de Proteção ao Índio (SIP) demarcou oito pequenas áreas indígenas”, desta forma, “foi acontecendo um processo de implantação lenta da pecuária e de derrubada da mata para plantações de capim. Os índios foram, inclusive, utilizados nesse trabalho de desmatamento”. A tragédia mais brutal veio por meio do “plano do governo de Getúlio Vargas de ocupação da fronteira oeste através da colonização e da implantação massiva da agricultura”, pela qual “estabeleceu-se a colônia agrícola de Dourados, com mil famílias em mil lotes de 30 hectares. Isso afetou profundamente os índios, que tinham locomoção por toda a região e acabaram confinados em pequenas áreas”. Todo esse processo leva Heck a concluir que “as reservas são, na verdade, confinamentos de índios. São depósitos onde eles são colocados para serem disponibilizados como mão-de-obra agrícola”.


    Em continuidade, nos anos 1980, “os índios iniciam um processo de retomada de suas terras tradicionais”, e nos anos 1990 promoveram mais de 10 marchas de retorno aos seus territórios, uma vez que “essas terras são inerentes à cultura dos Guarani-Kaiwoá, lá estão os seus antepassados”, sem contar que possuem o direito constitucional de viverem nelas. Infelizmente, diante da força dos fazendeiros, com seus jagunços, os que não se confinaram em pequenas áreas oferecidas pelo governo, tiveram que se contentar com as beiras de rodovia. 


    Para o historiador Antonio Brand, o “confinamento e a superpopulação no interior das reservas demarcadas reduziram o espaço disponível, provocando o esgotamento de recursos naturais importantes para a qualidade de vida numa aldeia kaiowá e guarani e dificultou a produção de alimentos. Transformou povos que, durante séculos, produziram alimentos não só suficientes, mas abundantes, como atesta a documentação histórica, dependentes do fornecimento de cestas básicas e de toda a sorte de ajudas externas”. 


    Assim, a situação de confinamento dos Guarani-Kaiwoá é considerada insustentável do ponto de vista de suas formas de organização social, política e cultural.Roberto Antonio Liebgott e Iara Tatiana Bonin ressaltam que “viver em pequenas porções de terra não é adequado a um povo para quem a terra é fonte de vida, é lugar onde se restabelecem elos entre eles e seus ancestrais, onde se celebra a vida, onde se cultiva a porção divina que vive em cada pessoa, e onde se organiza o viver”. Com o modo de ser guarani, “essa teimosia histórica em viver, em se movimentar num amplo espaço territorial, em proferir sua palavra”, pode-se “problematizar certas maneiras de pensar e de viver, nos questionando sobre a estrutura fundiária concentradora, injusta, violenta, as relações com o meio ambiente que se baseiam na lucratividade e não no equilíbrio”.


    Além disso, como bem recorda o pesquisador Bartolomeu Melià, “falar de guarani se tornou quase sinônimo da busca da terra-sem-mal. Desse modo, uma experiência indígena se tornou exemplar e paradigmática para se pensar e trabalhar uma realidade mais ampla e geral, como é o projeto – a utopia – de uma sociedade mais solidária e humana”. Contudo, diante da evidência do genocídio desses índios, também é bom lembrar a ressalva de Melià: “Migrante e, portanto, frequentemente “trans-terrado”, o guarani, nunca antes havia sido tão des-terrado. Agora, em busca da terra-sem-mal, ele só teme o dia em que só haverá mal sem terra. Então, não haverá nem terra nem palavra”. Espera-se que ainda haja tempo e vontade política suficientes para erradicar todas essas atrocidades das quais já foram vítimas.


    Guarani-Kaiowá enfrentam o agronegócio e o Estado


    Contra os Guarani-Kaiowá não está apenas o agronegócio, está também a morosidade do Estado brasileiro e, sobretudo, do estado do Mato Grosso do Sul. É conhecida a postura anti-indígena do governador do Mato Grosso do Sul André Puccineli que já afirmou que o "MS não é terra de índio" e que deseja integrar os índios a partir do conceito de produção, para dar a eles a verdadeira independência. Recentemente o governador Puccinelli, zombou da ideia de que a terra, num estado como o Mato Grosso do Sul, cuja principal atividade econômica é a agricultura, poderia ser retirada das mãos dos produtores que cultivam a terra há décadas, para devolvê-las aos grupos indígenas. 


    Outro fato, que agrava sobremaneira a tensa conjuntura no Estado do Mato Grosso do Sul é o fato de que somente 30 a 40% dos agricultores possuem títulos legais no Estado, segundo levantamento do geógrafo Ariovaldo Umbelino de Oliveira, da Universidade de São Paulo. 


    Ao mesmo tempo em que há um sentimento de insegurança, desconfiança e temor com a forma como se comporta o estado local, os indígenas sentem-se também desprotegidos pelo governo federal. Carta denúncia dos povos indígenas do Mato Grosso do Sul, apresentada na Rio+20, denuncia que. “o Estado brasileiro é perverso, pois conhece as nossas necessidades territoriais, sabe que em nada dependemos destes territórios, que neles encontramos sentido de nossa existência e o futuro das crianças que nascerão amanhã. No entanto, o Estado que deveria nos proteger e constitucionalmente demarcar nossas terras, acabou por entregá-las aos fazendeiros, grileiros que hoje se passam por  ‘bons’ proprietários, mas continuam a ameaçar e a assassinar lideranças, nos fazendo de escravos, derrubando as matas, matando os animais e poluindo os rios”. 


    Segundo a Constituição de 1988, o processo de demarcação das terras indígenas no país deveria ter sido terminado em 1993. Entretanto, as pressões políticas dos fazendeiros retardaram o processo no Mato Grosso do Sul. No final de 2007, a Funai assinou acordo com o Ministério Público Federal para apressar a demarcação e, em função disso, seis grupos de trabalho para identificação e delimitação de terras indígenas foram lançados em julho de 2008. O fato gerou forte reação dos fazendeiros do Estado e, desde 2009, uma série de episódios violentos passaram a acontecer na região.


    "Os conflitos se devem, sem dúvida nenhuma, à lentidão inconcebível na demarcação das terras indígenas", afirma o procurador da República em Ponta Porã, Thiago dos Santos Luz. A ausência da demarcação tem outras consequências. As áreas onde os índios estão concentrados viraram locais de confinamento cuja expectativa de vida é semelhante à dos países mais pobres do mundo, 45 anos. 


    De acordo com o antropólogo da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Tonico Benites, cerca de 35 mil kaiowás-guarani vivem em 11 reservas com quase 33 mil hectares e outros dez mil sobrevivem em acampamentos na beira de estradas ou outros locais em litígio judicial. Para efeito de comparação, a reserva Raposa/Serra do Sol, demarcada em 2009, abriga 20 mil índios em 1,7 milhão de hectares.

     

    "Essas reservas se transformaram em favelas, guetos", afirma o antropólogo Spency Pimentel, da Universidade de São Paulo. A quantidade de terras reivindicadas pelos indígenas se aproxima de um milhão de hectares, cerca de 2,8% do território de Mato Grosso do Sul. Mas o pleito enfrenta resistência do governador, André Puccinelli (PMDB), e de fazendeiros da região.


    Os fazendeiros são radicalmente contrários a qualquer demarcação. A Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso – FAMATO se pronunciou dizendo que caso as novas áreas indígenas sejam criadas ou ampliadas, 1,1 milhão de ha de áreas já consolidadas pela agropecuária deixarão de ser produtivas.


    O discurso dominante propaga a ideia de que demarcações redundam "em muita terra para pouco índio", mas não se dá conta de que com o agronegócio se tem "muita terra para pouco branco".


    Apenas a garantia de espaço e direitos à terra dos povos indígenas poderá reduzir o número de conflitos e tensões que desencadeiam os casos de violência. "É fundamental que o Estado brasileiro aceite e respeite a reivindicação indígena por demarcação de terras", afirma a antropóloga Lúcia Helena Rangel.

     

    Politizar a luta dos Guarani-Kaiowá


    O sítio do IHU sistematicamente acompanha a luta dos povos Guarani-Kaiowá. Desde 2006 publica matérias, reportagens e entrevistas sobre o tema. Nesses anos todos reiteradas entrevistas com Antonio Brand e Egon Heck, entre outros pesquisadores e indigenistas que mais conhecem os Guarani-Kaiowá foram publicadas. 


    Ao longo desse doloroso acompanhamento do sofrimento a que é submetido esse povo, duas certezas calam fundo: 


     – A responsabilidade pela indizível violência contra os Guarani-Kaiowá é do agronegócio e do latifúndio;


     – A inoperância do Estado brasileiro que subordinado aos interesses do agronegócio e das forças atrasadas – latifúndio – optou pela judicialização do conflito e não empenha energias em exigir a demarcação dos territórios já definidas pela Constituição de 1988.


    A indignação que agora se assiste nas redes sociais – a palavra como arco e flecha – precisa se transformar em ação. Faz-se necessário que o governo aja com energia e trate a causa como prioridade. Não basta a ministra da Secretaria Nacional de Direitos Humanos, Maria do Rosário afirmar “lutaremos para agilizar o processo de estudos para demarcação desse território”; não basta o ministro da Justiça, José Eduardo Cardoso, dizer que “já estamos concluindo os estudos fundiários e, em 30 dias, será formalizado o despacho de análise antropológica”.  É muito pouco, é preciso uma estratégia ampla para demarcar os territórios indígenas. A ação do governo tem sido sempre reativa, é preciso que seja ativa.


    Faz-se necessário ainda politizar a luta dos povos indígenas. O coerente apoio à luta dos Guarani-Kaiowá pede uma posicionamento crítico ao modelo em desenvolvimento em curso.  A agressão sistemática contra os povos indígenas e até mesmo a tentativa de eliminá-los está relacionado ao modelo agrícola concentrador de terra e produtor de commodities voltado para o mercado internacional. Aqui reside a contradição. 


    O modelo econômico vigente estimula e favorece a plantation de commodities – soja, cana – e a commoditie pecuária – gado. Não basta o Estado brasileiro falar no respeito às minorias, nos direitos sociais, ambientais, culturais, mas ao mesmo tempo estimular o modelo econômico de commoditização da economia, viaBNDES, com generosos subsídios para as monoculturas da soja e cana-de-açucar e para a pecuária sem exigir radicais contrapartidas e empenhar-se pela imediata demarcação dos territórios que se arrasta há décadas. Ao mesmo tempo, as alianças com os grupos políticos que apoiam a política de extermínio indígena é outro fator que retarda e impede mudanças.


    O apoio à luta Guarani-Kaiowá pede uma leitura e um olhar crítico sobre o modelo econômico em curso. Essa luta se trava também no Palácio do Planalto.

     

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  • 05/11/2012

    Nota da Comissão de Professores Kaiowá Guarani sobre reportagem da revista Veja

    Ao contrário do que escreveram os jornalistas da Revista VEJA, Leonardo Coutinho e Kalleo Coura, quem luta pelos territórios tradicionais é sim o povo Kaiowá e Guarani. Somos nós que estamos retomando nossos territórios antigos.

     

    A matéria publicada foi racista, preconceituosa, discriminatória, estimulou o ódio contra os povos indígenas. Tenta desmotivar o nosso povo, ignora que nós temos língua própria, sentimento próprio, natureza própria. Não fala que a gente sabe o que a gente quer. Acaba colocando as pessoas contra nós, não a favor.

     

    A revista VEJA não está a serviço dos indígenas, nem dos mais pobres. Está a serviço de quem manda. Age com coronelismo. Parece estar a serviço de quem paga.

     

    Os jornalistas precisam estudar mais um pouco. Conhecer o que é índio, o que é cultura, o que é tradição, o que é história, o que é língua, o que é Bem Viver. A terra, para nós, é o nosso maior bem viver, coisa que ainda a imprensa não entendeu muito bem. Não entendeu que é possível escrever coisa boa sem prejudicar.

     

    O povo pobre não tem acesso à imprensa, quem tem são os latifundiários e os empresários. São eles que comandam. Nós somos brasileiros, somos filhos da terra. É preciso valorizar todas as culturas, o que a imprensa não faz. Mas precisava fazer.

     

    O direito à terra é um direito conquistado pelo povo brasileiro que precisa ser cumprido. E é possível fazer essa luta com solidariedade, com amor, com carinho, que é a competência do ser humano. Não é com maldade, como fez essa reportagem.

     

    A matéria quer colocar um povo contra outro povo. Quer colocar os não-índios contra os índios. Essa matéria não educa e desmotiva. Ao invés de dar vida, ela traz a morte. Porque a escrita, quando você escreve errado, também mata um povo.

     

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  • 05/11/2012

    Nota de repúdio contra o estado da saúde indígena no Maranhão

    Em nome da comunidade indígena do município de Arame, no Maranhão e representando os usuários do sistema no Conselho Distrital de Saúde Indígena (CONDISI-MA), comprometida na defesa dos direitos dos Povos Indígenas, em especial sobre real situação da saúde indígena das aldeias, localizado no município de Arame, repudiamos a ingerência, inoperância, omissão e negligência provocado pelo técnico responsável pelo Pólo Base de Arame, junto com sua equipe multidisciplinar contratada pela ONG, Missão Evangélica Caiua.

    Nós, lideranças, conselheiro, integrantes do movimento indígena, temos presenciado nas inúmeras reuniões, o descontentamento expresso dos povos, organizações e lideranças indígenas em relação a tais ações que constituem uma flagrante violação a Constituição Brasileira e a Convenção 169/OIT, já devidamente internalizada pelo ordenamento jurídico interno brasileiro, portanto com obrigatoriedade de cumprimento pelo estado Brasileiro das ações que dizem respeito à saúde indígena nas aldeias.

    Dentre as violações acima citadas a que mais tem afrontado os nossos direitos diz respeito a atuação da Secretaria Especial da Saúde Indígena (SESAI) e Dsei do Maranhão, que tem se eximido do seu papel de promover e prevenir a saúde dos povos indígenas, quando através de convênios e acordos com Organizações Não Governamentais que estão presentes e ocupando cargos políticos de confiança na estrutura da ONGs, SESAI e DSEI- MA.


    O que nos indigna é que a SESAI/DSEI – MA entregue nas mãos das pessoas que não tem compromisso e responsabilidade com a saúde indígena, exemplo maior é a ONG Missão Evangélica Caiua, o destino dos Povos Indígenas, principalmente que vivem em isolamento e aqueles ainda não contatados. Nos causa horror que a presidente da FUNAI credencie, através de convênio, uma ONG para captar recursos internacionais em nome dos povos indígenas. eximir

    É oportuno ressaltar que recentemente Tatiana Gomes Viana Guajajara, jovem de 22 anos, estudante 3º ano do Ensino Médio, Centro de Ensino Indígena Zezinho Rodrigues, estava doente durante três dias por falta de assistência de saúde na aldeia, foi para o Hospital Sagrada Família Ltda, na cidade de Arame – MA, local em que assistência para saúde indígenas é péssima e faleceu por desassistência, mas estamos procurando todos os meios legais para responsabilizar os técnicos de enfermagem da lotada Zutiua, pois sabiam que a jovem indígena passou três dias doente, uma vez que a mesma gritava de dor, por que não providenciaram remoção de caráter urgência para outra cidade e não na cidade de Arame, onde maiorias dos índios perderão suas vidas?

     

    Entendemos que a saúde indígena é da responsabilidade SESAI/Dsei e da ONG – Missão Evangélica Caiua, hoje percebemos que ainda continuam o processo de colonização e extermínio dos povos indígenas no Maranhão.

    A atuação da SESAI/Dsei,ONG e equipe Multidisciplinar do Pólo Base, nada trouxe resultados positivos para a saúde das comunidades indígenas, mas que realmente trouxe muita tristeza para as comunidades indígenas, onde em pleno século XXI os índios estão morrendo a mínguas nas aldeias, nos corredores dos hospitais por falta de condições de assistência médica, falta de transportes, medicamentos e omissão do profissionais que cuidam da saúde indígena. Enquanto existir ingerência no Pólo Base de Arame – MA, muitas mortes virão acontecer, sem nenhuma providência dos órgãos responsáveis pela gestão e funcionamento de saúde indígena.

    Relatamos para conhecimento do público, a nova missão dos profissionais de saúde contratada pela ONG, Missão Evangélica Caiua, lotada nas aldeias e no Pólo Base Arame –MA, estão colocando os pacientes indígenas para assinar O TERMO DE RESPONSABILIDADE, fazendo isso significar dizer que está tirando sua responsabilidade daquele paciente indígena, e logo imediatamente colocada(relatório) no consolidados onde é enviado para Dsei-MA, dizendo que o indígena recusou tratamento, utilizam pretexto para justificar as mortes dos indígenas. Existe outra situação preocupante: a Dsei coloca índios contra índios, denegrindo a imagem, desmoraliza o movimento dos indígenas, atestam que estão prestando serviços a saúde indígenas, mas na verdade não passam de funcionários anti-indígenas.

    Nos causa profunda revolta quando vemos os nossos parentes indígenas morrer nas aldeias, nos corredores de hospital por falta de condições de assistência médicas, como transportes, medicamentos e até mesmos omissão do profissionais específicos para cuidar dos pacientes indígenas, quando se plantam frente a rodovias, ferrovias, usinas hidroelétricas e prédios públicos como única forma de serem ouvidos minimamente, porém o resultado é a criminalização das nossas lideranças na defesa implacável dos direitos dos povos indígenas.


    É inaceitável que o Pólo Base de Arame, Equipe Multidisciplinar ou seja SESAI/Dsei –MA, nos obriga permanecer em tratamento de saúde no hospital ou município onde não tem mínima condições de salvar vidas, como já perdemos muitas vidas, em vez de nos aumentar estamos cada dias que passa estamos diminuindo. O que deve definir a forma do tratamento de saúde indígena como referência devem ser os próprios indígenas.


    É necessário e urgente que a presidenta da FUNAI e o Ministro da Justiça obriguem a SESAI/Dsei/MA a atuar dentro da legalidade, obedecendo e aplicando todos os princípios legais que asseguram a proteção dos nossos direitos como povos diferentes, não podemos e não vamos nos calar diante dos absurdos, do desrespeito e do descaso com que somos tratados, não somos ficção, somos seres humanos, somos povos e nações, sujeitos de direitos inerentes as nossas diferenças e seremos implacáveis na luta pela e fortalecimento garantia destes direitos.

    Queremos um basta nesses atos absurdos que nos trazem muitas revoltas e angústia diante da cooptação dos profissionais que se instalou na FUNASA, passando pela SESAI, DSEI e até o PÓLO BASE , para tanto solicitamos a imediata afastamento do atual representante do Órgão, Sr. Manoel de Jesus Barbosa da Silva.

    Paulo Gomes Guajajara
    Conselheiro Distrital

     

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  • 05/11/2012

    Nota de repúdio da Aty Guasu frente à divulgação de Guarani e Kaiowá na revista Veja

    Esta nota das lideranças de Aty Guasu Guarani e Kaiowá visa destacar a importância das manifestações públicas conscientes de cidadão (ã) do Brasil em defesa da vida Guarani e Kaiowá.

     

    Além disso, pretendemos repudiar reiteradamente a divulgação e posição racista e discriminante de jornalista Leonardo Coutinho da REVISTA VEJA.

    Observamos que na última semana, a REVISTA VEJA divulgou os temas: “VISÃO MEDIEVAL DE ANTROPÓLOGOS DEIXA ÍNDIOS NA PENÚRIA” E “NAÇÃO” GUARANI. Autor-jornalista é o Leonardo Coutinho.

     

    A princípio, nós lideranças Guarani e Kaiowá entendemos que os cidadãos (ãs) brasileiros (as) merecem respeito, em geral, esperam de um jornalismo democrático um resultado da investigação justa e séria dos fatos para divulgá-los com ética e responsabilidade, demonstrando fielmente versões das partes envolvidas de modo a que a opinião pública possa construir conhecimento isento a respeito do tema divulgado, não é o que se constata na REVISTA VEJA diante da situação do Guarani e Kaiowá em foco.

     

    Em primeiro lugar, constatamos que na divulgação mencionada de REVISTA VEJA há manifestação de racismo, preconceito e discriminação. Assim, fica evidente que o jornalista Leonardo Coutinho é racista, ele não procura compreender e divulgar a realidade dos Guarani e Kaiowá, faltando com a verdade total consigo mesmo, ou melhor, se desrespeitando e mentindo para todos (as) cidadãos (ãs) do Brasil. Visto que esse jornalista racista da REVISTA VEJA nem se preocupa em fazer o trabalho de jornalista a partir de uma aproximação minimamente científica, mas ele fez e divulgou o tema Guarani e Kaiowá de modo distorcida a partir de corpus de informações sem fundamento, meramente embasado em senso comum e sem valores científicos.

     

    No contexto atual, é importante se observar que diante da manifestação contínua dos cidadãos (ãs) do Brasil em favor da demarcação e devolução de territórios tradicionais aos Guarani e Kaiowá, a imprensa REVISTA VEJA, como sempre, não perdeu a oportunidade de apresentar, mais uma vez, a imagem dos Guarani e Kaiowá como seres incapazes, como nós indígenas não fossemos seres humanos pensantes, fomos considerados como selvagens e truculentos; assim, nesta manchete da REVISTA VEJA há, antes de tudo, incitação ao preconceito, a discriminação e ao ódio o que acaba por colocar em risco total toda a população Guarani e Kaiowá, alimentando violências, racismo, discriminação e estigmas sobre os Guarani e Kaiowá, por isso, nós lideranças da Aty Guasu pedimos as autoridades competentes para realizar uma investigação rigorosa e punição cabível ao autor, Leonardo Coutinho que foi responsável pela divulgação de imagem negativa Guarani e Kaiowá na REVISTA VEJA.

     

    Diante dessa divulgação infundada da REVISTA VEJA a respeito de luta Guarani e Kaiowá, nós lideranças indígenas não acreditamos que a maioria dos cidadãos (ãs) do Mato Grosso do Sul e do Brasil tenha conhecimento sobre Guarani e Kaiowá somente a partir do senso comum a distância, porém compreendemos que todos (as) brasileiros (as) manifestantes são educados e adquirem os seus conhecimentos sobre a situação atual Guarani e Kaiowá a partir de observações diretas da realidade do grupo social que por isso têm fundamentos para refletir e se manifestar como cidadão (ã). De fato, é isso que está ocorrendo no último mês no Brasil, cidadãos (ãs) conscientes se manifestaram e ainda se manifestam, através das redes sociais e em espaços públicos, em favor da vida dos Guarani e Kaiowá, exigindo as efetivações de direitos humanos e indígenas. Porém, o jornalista Leonardo da REVISTA VEJA considera que esses cidadãos (ãs) manifestantes seriam ignorantes e não conheceriam as situações dos Guarani e Kaiowá, os tachando de ignorantes aos cidadãos (ãs) em manifestação. Em nosso entendimento, como indígenas Guarani e Kaiowá, consideramos sim que esses cidadãos (ãs) manifestantes de várias federações do Brasil conhecem muito bem a nossa história e nossa situação atual, por essa razão ampla se manifestam em favor de nossa vida para garantir a nossa sobrevivência. Enquanto o Leonardo Coutinho da REVISTA VEJA tenta colocar os Guarani e Kaiowá em risco total além de ignorar os conhecimentos dos cidadãos (ãs) manifestantes.

     

    Queremos deixar evidentes que nós lideranças da Aty Guasu Guarani e Kaiowá de modo autônomos e conscientes vimos lutando pela recuperação de nossos territórios antigos, essa luta pelas terras tradicionais é exclusivamente nossa, nós somos protagonistas e autores da luta pelas terras indígenas, nós envolvemos os agentes dos órgãos do Estado Brasileiro, os agentes das ONGs e todos os cidadãos (ãs) do Brasil e de outros países do Mundo.

     

    Finalizando, nós lideranças da Aty Guasu Guarani e Kaiowá de modo conscientes vamos lutar sem parar pela recuperação de nossas terras antigas, juntamente com cidadãos (ãs) manifestantes do Brasil em destaque, continuremos a lutar contra GENOCÍDIO Guarani e Kaiowá e iremos insistir na necessidade premente do Estado brasileiro se envolver profundamente com o nosso problema Guarani e Kaiowá do Mato Grosso do Sul. Sabemos que Governo do Brasil tem seu dever Constitucional assumir e decidir com firmeza e rigor uma dinâmica eficaz para fazer respeitar Direitos Humanos e Indígenas no Mato Grosso do Sul. Entendemos perfeitamente que é dever do Estado brasileiro viabilizar recursos financeiros e humanos, refletir e planejar estratégias que culminem em soluções efetivas aos problemas fundiários dos Guarani e Kaiowá aqui focada. Diferentemente da REVISTA VEJA, temos grande esperança e entendemos que os apoios de manifestantes dos cidadãos (ãs) do Brasil deverão contribuir, no tempo, para melhorar a qualidade de vida dessa grande parcela do nosso povo Guarani e Kaiowá do Mato Grosso do Sul.

     

    Por fim, prestamos o nosso imenso agradecimento a todos (as) cidadãos (ãs) manifestantes pela compreensão e atenção merecida. A nossa luta continua contra GENOCÍDIO.

     

    Atenciosamente,

    Tekoha Guasu Guarani e Kaiowá, 04 de novembro de 2012

    Lideranças da Aty Guasu Guarani e Kaiowá-MS

     

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  • 04/11/2012

    Vergonha nacional: duas comunidades indígenas, com mais de 200 pessoas, são confinadas em um hectare

     

    "Concedo o efeito suspensivo ao agravo de instrumento, para determinar a mantença dos silvícolas da comunidade de Pyelito Kuê exclusivamente no espaço de 1 (um) hectare, ou seja, 10 mil metros quadrados, até o término dos trabalhos que compreendem a delimitação e demarcação das terras na região"… (Decisão da 3ª Região da Justiça Federal, São Paulo 30 de outubro de 2012)

     

    Portanto fica decretado a manutenção de uma família da Fazenda Cambará em 761 hectares, enquanto duas comunidades indígenas, com mais de 200 pessoas, são confinadas em um hectare.

     

    Um minuto de silêncio. Senadores, deputados, lideranças Kaiowá Guarani, repórteres, representantes de órgãos do governo e do Ministério Público, aliados da causa, em pé, homenageiam a memória dos professores Genivaldo e Rolindo, que há exatos três anos foram cruelmente assassinados quando retornaram à sua terra, tekoha Ypo’i, município de Paranhos, no Mato Grosso do Sul. Até hoje o corpo de Rolindo não foi localizado e nenhum dos assassinos punidos. Aplausos. Os lutadores indígenas tem sua memória reverenciada, apesar de sua luta pela terra continuar emperrada, na malvadeza e burocracias do poder.

     

    Na parede fria de um dos auditórios do Senado Federal, onde se realizava uma audiência pública sobre a questão Kaiowá Guarani, estavam projetadas as imagens do corpo do professor Genivaldo Vera, boiando nas águas do rio ypo’i, o "sorriso matado", do cacique Nisio Gomes, a líder Damiana junto a seus barracos queimados, à beira da estrada, lembrando seu marido e três filhos mortos por atropelamento, outro membro da comunidade de Apika’y espancado por ocasião da expulsão de sua terra… Um quadro tétrico, retrato da "barbárie civilizada"! Ou genocídio do século XXI como muitos tem visto a violência contra os Guarani Kaiowá.

     

    Como podemos ficar felizes?

     

    No décimo andar de um belo edifício em Brasília, um anúncio eufórico de uma "vitória". Os índios de Pyelito Kuê não serão despejados. A liminar acaba de ser caçada na 3ª Vara da Justiça Federal, em São Paulo. O ministro da Justiça José Eduardo Cardoso leu pausadamente a decisão. "Por tudo quanto foi exposto, a melhor solução é circunscrever a permanência dos índios num espaço de 1 (um) hectare, ou seja, 10 mil metros quadrados, até o término do procedimento administrativo de delimitação e demarcação  das terras na região" e a sábia e douta decisão continua: "Os índios  devem ficar exatamente onde estão agrupados, com a ressalva de que não podem estender o espaço a eles reservado em nenhuma hipótese".  O cantador popular concluiria: "É a parte que lhes cabe neste latifúndio!" (dia 30 outubro de 2012. Século 21). A justiça decide reeditar os "confinamentos" ou "campos de concentração", conforme manifestação de lideranças indígenas, parlamentares e representantes dos movimentos sociais. A deputada Érica Kokay afirmou que "confinamento é genocídio" e que é esse o processo em curso no Mato Grosso do Sul. A deputada Janete Capibaribe afirmou que a realidade dos Kaiowá Guarani envergonha a sociedade e a nação brasileira. Nesse mesmo tom, o deputado Pe. Ton, presidente da Frente Parlamentar em Defesa dos Povos Indígenas, afirma que o que acontece com os Kaiowá Guarani se assemelha ao que se passou com os judeus no tempo do nazismo.

     

    As lideranças Guarani, dentre os quais o cacique Lide Lopes, de Pyelito Kuê, Otoniel Ricarte, Eliseu Lopes, dentre outros, manifestaram em diversas oportunidades, nesta semana, sua contrariedade com a decisão judicial. "Ficamos meio felizes, porque a comunidade não vai ser expulsa, mas ficamos por inteiro envergonhados, porque nos fecharam dentro de um hectare". Lindomar Terena disse considerar um absurdo deixar os índios dentre de um "chiqueirinho".

     

    Até o linguajar – "mantença e silvícolas" – nos remete a séculos passados. Não serão necessários grandes esforços para imaginar o drama de sobrevivência dessa comunidade, até que o governo conclua o trabalho de identificação e demarcação das terras na região. Quantos anos de tortura e sofrimento estarão contidos nessa decisão? Quantos meses, anos ou décadas ainda se arrastarão os infindáveis processos de regularização das terras indígenas na região?

     

    Semana Kaiowá Guarani em Brasília

     

    Lideranças expressivas do povo Kaiowá Guarani e Terena, do Mato Grosso do Sul, tiveram uma intensa agenda de debates, visitas a autoridades dos três poderes, conversas com ministros e parlamentares, manifestações públicas e contatos com a imprensa nacional e internacional.

     

    No Ministério Público Federal ouviram das procuradoras Débora Duprat e Raquel Dodge a promessa de atitudes enérgicas de cobrança, inclusive judicial, das responsabilidades do Governo Federal com relação ao não cumprimento do Termo de Ajustamento de Conduta-TAC, no qual todos os relatórios de identificação das terras Kaiowá Guarani deveriam ter sido publicados até 30 de junho de 2009.

     

    Do ministro da Justiça ouviram os encaminhamentos do governo, para evitar a expulsão da comunidade de Pyelito Kue, aumento dos contingentes da Força Nacional e da Polícia Federal na região e de que dentro de 30 dias estaria sendo publicado o relatório circunstanciado dessa terra indígena, pela Funai. Disse ainda que "a presidente Dilma quer que se cumpra a Constituição".

     

    O conselheiro do CDDPH, Eugenio Aragão, que coordena o grupo especial Kaiowá Guarani, criado no âmbito desse órgão, lamentou que o governo só age e se movimenta quando acontecem catástrofes, quando se está à beira do abismo. Cobrou energicamente uma revisão dos métodos de atuação com relação à demarcação e garantia das terras indígenas e ação urgente para pagar a dívida histórica para com esse povo. Salientou a importância da participação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que criou uma comissão especial com propósito de agilizar a demarcação das terras Kaiowá Guarani.

     

    O procurador Marco Antonio Delfino, do Ministério Público de Dourados, acompanhou a intensa maratona de atividades, dentre as quais a conversa com vários ministros do Supremo Tribunal Federal. Insistiu na inadiável ação do governo no sentido de começar a encontrar caminhos para resolver a gravíssima situação das terras indígenas no Mato Grosso do Sul. Externou os dados que revelam essa situação insustentável, dentre os quais o fato de que os últimos dez anos os Kaiowá Guarani conseguiram efetivamente apenas dois mil hectares, e de que as terras ocupadas por esse povo representam apenas 0,1% do território do Estado.

     

    O secretário do Cimi, Cleber Buzatto, em vários momentos chamou atenção para a morosidade e omissão do governo, enquanto nos três poderes avançam iniciativas que visam tirar direitos constitucionais dos povos indígenas e agravar ainda mais a situação de violência. Falou da importância das iniciativas de ampla divulgação, especialmente nas redes sociais, da realidade indígena, para que desse processo de comoção nacional resultem ações e pressão pelo respeito aos direitos dos povos indígenas e a imediata regularização das terras indígenas.

     

    Tiveram reuniões de definição de ações estratégicas na Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), na Funai e outros órgãos e entidades. Levam em suas bagagens de retorno às aldeias a certeza de que a luta por seus direitos avançou, mas que devem se intensificar as alianças e solidariedade em nível mundial e as lutas de retorno às suas terras tradicionais, como afirmou Eliseu Lopes: "Estamos cansados de bonitos discursos e promessas. Vamos continuar nossas ações de retomar nossas terras".

     

    Egon Heck e Laila Menezes

     

    Povo Guarani Grande Povo!

    Cimi 40 anos, 2 de novembro de 2012.

     

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  • 01/11/2012

    Informe nº1038: Kadiwéu: “vamos resistir até o final”, afirmam indígenas; PF inicia retirada das famílias

    Ruy Sposati,
    de Campo Grande (MS)

    A Polícia Federal (PF) iniciou a retirada de 60 famílias Kadiwéu de uma área de cerca de 160 mil hectares de terra indígena demarcada em 1900 e homologada em 1984, no município de Porto Murtinho, na região do Pantanal do Mato Grosso do Sul. A área fica dentro da Terra Indígena (TI) Kadiwéu.

    "Nós vamos continuar na terra até que seja dada a decisão no Supremo [Tribunal Federal]", afirma o presidente da Associação das Comunidades Indígenas da Reserva Kadiwéu (ACIRK), Francisco Matchua. "A gente respeita autoridade. Mas no momento em que não respeitam a gente, a gente não pode deixar que eles abusem da autoridade. Eles tem que ter respeito com a comunidade. A terra é nossa".

    O território estava completamente ocupado por 23 fazendas de gado até que, em abril deste ano, os Kadiwéu retomaram a área e expulsaram os fazendeiros.

    Uma decisão da Justiça Federal, contudo, concedeu liminar aos pecuaristas, determinando a retirada dos indígenas da área.

    O Ministério Público Federal (MPF) do Mato Grosso do Sul entrou com um recurso contra a decisão, ainda não julgado, e uma liminar que pedia a suspensão da reintegração e descupação. O pedido foi negado pela Justiça.

    Em solidariedade aos Kadiwéu, um grupo de 50 indígenas Terena da região do Pantanal se deslocou para a área da retomada.

    Os indígenas estão concentrados em uma das fazendas, onde o prazo dado para a reintegração de posse foi de 30 dias. No restante, a Justiça deu cinco dias para que os indígenas deixassem o local. "Nós vamos resistir até o final", conclui Francisco.

    ATAQUE
    No último sábado, 27, um historiador, um advogado e quatro lideranças indígenas foram perseguidos por cerca de 20 homens armados em seis caminhonetes.

    "Fui literalmente perseguido por pistoleiros", conta. Advogado do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), o indígena Terena Luiz Henrique Eloy, disse ter sentido na pele "a guerra instalada em Mato Grosso do Sul contra os índios".

    A perseguição aconteceu durante uma visita do grupo ao território dos indígenas. "Na qualidade de advogado da comunidade, desloquei-me até a área de conflito dos Kadiwéu. Na saída da área retomada, fomos literalmente perseguidos por homens armados – pistoleiros – que estavam em seis caminhonetes. Na carroceria, homens com armas de cano longo", detalha.

    "Como eu estava na direção, imediatamente manobrei o carro, no sentido de retornar para área onde estava o acampamento da comunidade. Foram momentos assustadores vivenciado por mim e meus companheiros", relata. "Os pistoleiros só não nos alcançaram por conta das inúmeras porteiras das fazendas".

    "Isso aconteceu por volta das seis e meia da noite. Conseguimos sair por uma estrada pela mata guiado pelos nossos patrícios Kadiwéu. Só fomos chegar no local onde pega celular às quatro da manhã". Ninguém ficou ferido.

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