• 29/11/2012

    Informe nº 1042: Juíz determina reintegração de posse de comunidade já expulsa da terra

      Por Ruy Sposati, de Dourados (MS)

    Uma nova decisão da Justiça do Mato Grosso do Sul determinou a reintegração de posse da área reivindicada por uma comunidade Guarani Kaiowá, conhecida como Apyka’y, a sete quilômetros de Dourados. Eles estão acampados há 14 anos na beira da estrada.

    A decisão afirma que "invasores aparentemente indígenas (…) praticaram terrorismo" contra proprietários de fazendas sobre terras reivindicadas pelos indígenas.

    Só havia um problema: a comunidade já fora expulsa da área, em 2009, num processo envolvendo decisão judicial de reintegração de posse e tentativa de genocídio por parte dos proprietários de fazendas que incidem sobre os territórios tradicionais dos Kaiowá e Guarani.

    Mortes


    Desde que foram expulsos do tekoha – "o lugar onde se é", em Guarani -, em 2009, cinco pessoas da comunidade de Apyka’y já morreram. Todos parentes da principal liderança da comunidade, a Kaiowá Damiana. "Aqui perdi meu marido, dois filhos, um neto e uma tia".

    A morte da tia decorreu de contaminação por agrotóxicos utilizados nas plantações das fazendas que circundam a área. A liderança relembra o episódio. "Minha tia velhinha tava no meio da plantação de trigo, sozinha lá. O avião passou três vezes jogando veneno. Meu filho correu pra me avisar. De noite, três da manhã, minha tia morreu. O cheiro muito forte, tia não aguentou, não. Morreu". Segundo a comunidade, o uso de agrotóxicos é recorrente. "Eles jogam muito veneno aqui. A última vez [o avião] passou de noite. Graças a Deus ninguém morreu [dessa vez]".

    Todos os outros mortos foram vítimas de atropelamento. "Meu marido morreu aqui também. Ali, quando passa a ponte [aponta]. Morreu na hora. Enterramo aqui também. Ele tava de bicicleta. Bicicleta amassou tudo. O guri tava junto. O guri não morreu não, graças a Deus. Machucou só um pouquinho", conta. "Perdi dois filhos. Dois guerreiros. Também atropelados. Esse ano. Um morreu numa semana, 15 dias depois morreu o outro". Além dos dois filhos, Damiana também perdeu um neto, vítima de atropelamento.

    Histórico


    O tekoha desta comunidade, conhecida também por "Curral de Arame", é chamado Jukeri’y ou Apika’y.

    Segundo Damiana, as famílias de Apyka’y estão acampadas há 14 anos às margens da rodovia BR-463, no trecho que liga os municípios de Dourados e Ponta Porã, na fronteira do Brasil com o Paraguai.

    "Aqui nós somos 15 famílias. Quando morava dentro da área, eram 130. Aí saiu, saiu… Foram indo para Kaarapó, Jaguapiru, Bororó, Nhuporã…", conta Damiana.

    Já houve duas tentativas de retomada do território originário, ocupado atualmente por grandes fazendeiros. A última ocorreu em junho de 2008. Os indígenas ocuparam uma pequena parte da Fazenda Serrana, próximo à mata da Reserva Legal da área, estabelecendo pequenas roças.

    No período em que ficaram acampados ali, foram vigiados por uma empresa particular de segurança. A Funasa e Funai foram impedidas de prestar atendimento.

    A ocupação durou até abril de 2009, quando a Justiça determinou a reintegração de posse em favor do fazendeiro. Desde então, o grupo está acampado à beira da rodovia.

    Com a expulsão das terras, os índios foram obrigados a ocupar a outra margem da BR 463, por causa das obras de duplicação da rodovia. Cerca de vinte pessoas formaram o acampamento, onde foram construídos seis barracos.

    Um dos maiores problemas dos indígenas de Apyka’y é a obtenção de água potável. Atualmente, eles se valem da água poluída de um córrego para beber, cozinhar e para higiene pessoal.

    Um relatório do MPF-MS sobre a situação da comunidade de Apyka’y, publicado em 2009, afirmou que “crianças, jovens, adultos e velhos se encontram submetidos a condições degradantes e que ferem a dignidade da pessoa humana. A situação por eles vivenciada é análoga à de um campo de refugiados. É como se fossem estrangeiros no seu próprio país”.

    Ataque


    Em setembro de 2009, um grupo armado atacou o acampamento, atirando em direção aos barracos. Um Kaiowá de 62 anos foi ferido por tiros, outros indígenas agredidos e barracos e objetos foram queimados.

    Damiana conta que o ataque, realizado a mando dos fazendeiros, ocorreu já depois que os indígenas foram despejados da área, e que teve relação com o uso da água de um córrego que fica dentro da área da fazenda. "Queimou barraco, roupa, queimou celular, bicicleta, tudo. Logo depois do despejo. Fizeram isso porque a gente queria pegar água, a gente pediu licença. Mas o seguranças [da fazenda] não deixam não".

    O ataque ocorreu por volta da 1h da madrugada, quando o grupo de índios dormia no acampamento improvisado construído no dia anterior na altura do km 10 da Rodovia BR-463, ao lado da Fazenda Serrana.

    A fazenda


    Segundo apuração da ONG Repórter Brasil, a propriedade foi arrendada para o plantio de cana-de-açúcar pela Usina São Fernando. A usina, por sua vez, é um empreendimento da Agropecuária JB (Grupo Bumlai) com o Grupo Bertin, um dos maiores frigoríficos da América Latina.

    Instalada em Dourados (MS) em 2009, a Usina São Fernando é tocada por uma parceria da Agropecuária JB (Grupo Bumlai), especializado em melhoramento genético de gado de corte, e o Grupo Bertin, um dos maiores frigoríficos produtores e exportadores de itens de origem animal das Américas.

    Na época, procurado para comentar o ataque aos indígenas, o Bertin, através de sua assessoria de imprensa, afirmou que "os seguranças da usina [São Fernando] não andam armados e não se envolveram em nenhum conflito. Não temos nenhuma notícia em relação ao fato e estamos apurando a informação. A Usina São Fernando não é proprietária de nenhuma terra na região".

    Já o diretor-superintendente da Usina São Fernando, Paulo César Escobar, confirmou que "existe um contrato de parceria agrícola entre a Usina e a Fazenda Serrana, ou seja, a usina planta cana na área de fazenda e divide os frutos com o proprietário". Ele teria sido informado que "o conflito não ocorreu na área de plantio de cana (onde ocorre a parceria com a Usina São Fernando), mas em outra parte da fazenda", o que contraria o parecer emitido pela Funai. O diretor também negou qualquer relação com a Gaspem, que teria sido contratada pelo proprietário da Fazenda Serrana. A Gaspem também foi procurada pela Repórter Brasil na época, mas não houve quem se manifestasse pela empresa.

    *


    Apyka’y, em Guarani, signfica "banco pequeno" ou "banquinho". Para os Kaiowá, é nele em que a criança fica sentada durante os nove meses de gestação.

    Com informações da Repórter Brasil, Funai e MPF-MS.

     

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  • 28/11/2012

    O agronegócio e a manipulação midiática: o caso dos conflitos fundiários em Mato Grosso do Sul e o papel da Antropologia

    Uma decisão judicial revertendo uma reintegração de posse e tendo como beneficiária uma comunidade indígena, e, ademais, determinando que o Estado brasileiro (através do órgão indigenista oficial) promova a conclusão dos estudos para identificação e delimitação de uma terra indígena é seguida de uma chuva de artigos em jornais, revistas e blogs, que estão com ela diretamente relacionados. Em seu cerne, estes artigos focam-se num ataque aos antropólogos que são os profissionais responsáveis por tais tipos de estudos. Tal coincidência de fatos merece uma devida contextualização e uma análise, que passaremos a delinear.

     

    “No que toca aos indígenas em especial a Veja tem exercitado com inteira impunidade o direito de desinformar a opinião pública, realimentar velhos estigmas e preconceitos, e inculcar argumentos de encomenda que não resistem a qualquer exame ou discussão”.
     
    As matérias mentirosas, caluniosas e carregadas de preconceito “não devem ser vistas como episódios isolados, mas como manifestações de um poder abusivo que pretende inviabilizar o cumprimento de direitos constitucionais, abafando as vozes das coletividades subalternizadas e cerceando o livre debate e a reflexão dos cidadãos”.


     João Pacheco de Oliveira, Coordenador da CAI, maio de 2010

     

    O artigo expressa o ponto de vista da Associação Brasileira de Antropologia-ABA.

     

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  • 27/11/2012

    Munduruku foi executado por delegado da PF, acusam indígenas

    Viu as dragas e as balsas pegando fogo, enquanto sobrevoava o rio Teles Pires. Uma bomba passa ao lado do avião, à direita. No campo de visão de V., não havia indígenas.

     

    O bimotor desce – a pista de pouso não fora destruída. Havia rastros de sangue no chão, marcas de bala nos telhados e nas paredes. Espalhados pelo caminho, restos de cartuchos, munições e carcaças de bombas. Todas as casas estavam com as portas arrombadas.

     

    E então a comunidade começa a sair e ir ao encontro de V.. Estavam todos escondidos nas casas, assustados com a chegada do avião. Reúnem-se no barracão e explicam à liderança Munduruku do que tinham medo.

     

    V. ouve, então, os relatos de uma série de pessoas baleadas, machucadas, queimadas, ainda afetadas pelo spray de pimenta. Uma mãe chorava desesperadamente: sua filha de cinco anos estava desaparecida. Achava que poderia estar morta, pois havia se perdido dela na mata. Havia uma mulher com o rosto inchado por causa de um soco que o policial lhe deu. Os professores não-índios que trabalham na comunidade também foram agredidos.

     

    V. ouve, então, os relatos de uma série de pessoas baleadas, machucadas, queimadas, ainda afetadas pelo spray de pimenta. Uma mãe chorava desesperadamente: sua filha de cinco anos estava desaparecida. Achava que poderia estar morta, pois havia se perdido dela na mata. Havia uma mulher com o rosto inchado por causa de um soco que o policial lhe deu. Os professores não-índios que trabalham na comunidade também foram agredidos. Todas as embarcações foram explodidas ou fuziladas e afundadas. Os barcos de pesca foram danificados ou destruídos. As armas de caça, quebradas ou levadas. Dinheiro e ouro foram roubados. Computadores – entre eles, da saúde e das escolas – foram inutilizados. A escola foi alvejada por tiros e bombas nas paredes e telhado. Celulares e câmeras foram tomados, esmigalhados, jogados no rio ou tiveram seus cartões de memória apreendidos. Os motores de popa da saúde foram lançados ao rio. Fiações do telefone comunitário foram cortadas e o rádio da aldeia confiscado, impedindo qualquer contato de indígenas com outras aldeias. O carro da aldeia foi carbonizado.

     

    V. chegara na aldeia em 8 de novembro, um dia depois de uma comunidade de indígenas Munduruku, Kayabi e Apiaká, em Jacareacanga, no Pará, divisa do estado do Pará com o Mato Grosso, ter sofrido um violento ataque da Polícia Federal.

     

    Neste mesmo dia, uma comissão especial do Poder Legislativo esteve no local para apurar as denúncias que haviam chegado à cidade. No relatório da visita, o presidente da Câmara Municipal de Jacareacanga, Elias Freire (PSDB), afirmou haver "indícios de vários crimes praticados pela força policial inclusive com exposição de vulneráveis, o que contraria disposições legais do Estatuto da Criança  e do Adolescente". O vereador Raimundo Santiago (PT), o Raimundinho do PT, mostrou-se "pasmo com a violência praticada contra os indígenas" e disse que "as imagens que viu comprovam sobejamente que ocorreu crime contra o povo da aldeia Teles Pires".

     

    Os indígenas entregaram à comissão uma relação (veja) dos bens destruídos pelos policiais. Minutos antes dos indígenas contarem a V. o que havia acontecido, um Munduruku havia sido encontrado boiando no rio Teles Pires. Era o corpo inchado de Adenilson Kirixi Munduruku. Ele havia sido assassinado no dia anterior, 7 de novembro, durante a ação policial.

     

    7 de novembro

     

    Na manhã daquele dia, 400 botas pularam de três helicópteros camuflados e de voadeiras alugadas de ribeirinhos, espalhando-se estrategicamente pelo território indígena, amassando as formigas da aldeia Teles Pires.

     

    Era a Polícia Federal (PF) e a Força Nacional de Segurança, acompanhados da Fundação Nacional do Índio (Funai) e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama), executando manobras da Operação Eldorado, uma mega ação de desmantelamento de esquemas de garimpagem ilegal nos estados de Mato Grosso, Pará, Rondônia, Amazonas, São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. Chegaram 244 anos depois do vigário José Monteiro de Noronha ter anotado pela primeira vez em seu caderninho, em 1768, a presença dos primeiros Munduruku – chamados por ele de “Maturucu” – às margens do rio Maués, no hoje estado do Amazonas.

     

    Depois do pouso, E. M. e um grupo de lideranças saíram à procura de representantes da Funai e do chefe da operação para conversar. Só encontraram o delegado da Polícia Federal, Antônio Carlos Moriel Sanches, que, segundo as lideranças, responsável pela intervenção. "O delegado falou que não tinha conversa com autoridade, com indígena, tinha que fazer o que foram fazer", conta E. M.. "Uma liderança [indígena] telefonou para Brasília, e de lá falaram que era pra avisar o delegado que não fizesse nada até que alguém de Brasília chegasse lá".

     

    "Nessa hora, só estava a Polícia Federal. O pessoal da Funai e do Ibama estavam juntos com os policiais, sobrevoando em dois helicópteros e deixando os policiais em locais estratégicos para invadir a aldeia", assinala E. M..

     

    "O delegado começou a empurrar as lideranças. Eu também fui empurrado. O delegado disse que não tinha conversa com ninguém, nem com cacique nem com liderança". Nesse momento, segundo E. M., estavam presentes as lideranças, caciques, seguranças de caciques, mulheres e crianças.

     

    "Foi quando o delegado tirou o revólver para atirar na liderança que ele empurrou. Foi nessa hora que o segurança do cacique empurrou o braço do delegado, que escorregou e caiu na água, porque ali era um declive e chão é liso", explica.

     

    Foi então que a Polícia Federal abriu fogo contra os indígenas. "Os dois primeiros tiros contra a vítima foram dados pelo delegado, que ainda estava dentro d’água, com a água pela cintura. Vários policiais começaram a atirar contra os indígenas".

     

    Segundo os relatos, três tiros acertaram as pernas da vítima Adenilson Kirixi, que perdeu o equilíbrio e caiu na água, sem conseguir se levantar novamente. "Nessa hora, o delegado deu um tiro na cabeça do Adenilson, que caiu morta e afundou no rio". Segundo os indígenas, o delegado foi resgatado pelos policiais e levado para cima da draga. "Aí os policiais jogaram uma bomba no Adenilson, quando o corpo já estava afundando no rio".

     

    Quando os indígenas tentaram resgatar o corpo do parente, foram alvejados pelos policiais que estavam em terra. "Eles diziam que não era para pegarmos o corpo. Do helicóptero, a polícia atirava e jogava bombas de efeito moral na aldeia, no meio de todo mundo, com as mulheres, as crianças", relata.

     

    Procurada pela reportagem, a Polícia Federal não quis se manifestar sobre as acusações. Segundo a assessoria de comunicação, talvez a PF e a Funai se manifestem conjuntamente sobre o caso nos próximos dias.

     

    Meu irmão

     

    G. K. era irmão de Adenilson. "Quando ouvi o tiroteio, fui correndo para a beira do rio. Estavam dizendo que meu tio tinha morrido. Eu queria saber se era verdade. Os policiais jogaram bomba e spray de pimenta. Meu olho ardeu e eu fiquei sem rumo".

     

    O indígena relata que um terceiro helicóptero teria chegado nesse momento, com mais policiais. Foi quando ele saiu correndo em direção à mata, perseguido pela PF. "Me escondi embaixo das árvores, ouvindo o barulho das bombas, dos helicópteros e dos tiros. Tinha mais gente escondida lá também", relembra. Três horas depois, G. K. volta à aldeia e insiste em apurar informações sobre a morte do irmão.

     

    "Os policiais me diziam que não tinha ninguém morto, que os feridos estavam no hospital. Meu irmão não estava lá". O Munduruku encontrou, então, o servidor da Funai, Paulão – os indígenas não sabem de onde veio -, que acompanhava a Operação. Ele também lhe negara ter havido alguma morte. Segundo todos os relatos, Paulão teria sido o servidor da Funai responsável pelo acompanhamento da Operação.

     

    O laudo cadavérico realizado pela Polícia Civil do Mato Grosso (veja) confirmou que Adenilson Kirixi levou três tiros nas pernas e um tiro frontal na cabeça. Não há informação se houve apreensão e perícia na arma que efetuou – ou nas armas que efetuaram – os tiros.

     

    Parte dos indígenas fugiu para a mata, parte para as residências, imaginando que ali estariam seguros. Durante a fuga, dois indígenas foram gravemente feridos pelos policiais. E. M. e O. K. estão hospitalizados em Cuiabá. Outros indígenas também foram levados para o hospital. O pelotão, então, invadiu a aldeia, arrombando portas e janelas, jogando bombas dentro dos domicílios "Levaram tudo o que tinha dentro das casas, nossos facões, facas, espingarda de caça", atesta.

     

    "Chutaram meu pai"

     

    "Eu vi os tiros e saí correndo pra pedir socorro no rádio e na internet. "Quem estava no rádio comigo ouvia os tiros", conta I. W.. "O meu pai chegou onde eu estava, ferido. Tinha levado um tiro de bala de borracha. A gente saiu começou a gritar pra eles pararem de atirar, mas eles não pararam", relata I. W.. "Corriam atrás da gente e atiravam. Atiraram na mulher do meu irmão, que está grávida de 8 meses. Atiravam com bala de borracha e com bala de verdade também".

     

    "Então entramos de novo em casa, com mais umas dez pessoas. A polícia arrombou a porta e entrou jogando bombas de gás lacrimogêneo na gente. Tinha uma mulher com um bebê de dois meses lá dentro". Segundo I.W., os policiais mandaram todos saírem da casa e colocarem as mãos na cabeça. "Chutaram o meu pai e agrediram todos os homens que estavam ali. Eu dizia pra eles que a gente não era bandido pra ser tratado daquele jeito".

     

    Segundo I. W., aos homens – também idosos e crianças – foi ordenado que deitassem no chão com as mãos na cabeça, enquanto as mulheres e crianças foram mantidas como reféns, separadamente, no campo, com armas apontadas para elas. "As mulheres e crianças ficaram o dia inteiro debaixo do sol, com os policiais armados em volta. A gente pediu comida, mas não deram. Não deixavam a gente falar a nossa língua, só português". "Eu gritava, e o policial me perguntou se eu estava com raiva. Eu respondi que sim, porque estavam invadindo a aldeia e as casas. Os policiais disseram que tinham um mandado judicial e que só estavam cumprindo sua obrigação. Eu perguntei pra eles se o juiz também tinha autorizado que eles invadissem as casas e agredissem as pessoas".

     

    "Arrombaram o posto de saúde, jogaram uma bomba de gás e apontaram uma arma para a cabeça da técnica de enfermagem, L. R.. Jogaram os remédios no chão e quebraram os medicamentos. Também atiraram na escola, jogaram bombas e quebraram as telhas", relata. I. W. chorou muito ao contar esta história.

     

    "O tiroteio durou 30 minutos. Parecia filme de guerra. Quando pararam de atirar, um grupo de policiais saiu em busca do corpo que havia afundado no rio, enquanto outros recolhiam cascas de munição e bombas que encontravam pela frente", relembra E. M.. "A gente ficou cercado pelos policiais. Levaram o nosso rádio. Destruíram o motor que gerava energia para a aldeia".

     

    Os índios feridos foram levados de helicóptero para atendimento no Hospital Regional de Alta Floresta, em estado grave. Segundo as lideranças indígenas, ainda estão internados. Os agentes da PF receberam atendimento no local.

     

    E. M. relata as prisões posteriores ao ataque. "Eles levaram 17 pessoas para a fazenda Brascan, onde havia uma base da polícia", conta. O irmão de E. M. também havia sido preso. Uma indígena que acompanhava o irmão que havia sido preso, também foi levada. Eles foram enviados a Sinop, no Mato Grosso – a aldeia fica em Jacareacanga – e depuseram à polícia. Os depoimentos teriam sido acompanhados por um Procurador da Funai de Cuiabá cujo nome não souberam dizer. Posteriormente, foram levados de volta à aldeia pela polícia.

     

    Foi no final da operação, ainda no dia 7, que as dragas e balsas foram destruídas. Segundo os indígenas, cada uma das 11 embarcações destruídas no leito do rio tinham de 30 a 40 mil litros de combustível, além de baterias. Eles relatam que os peixes estão morrendo e que não podem usar o rio, agora contaminado pelos fluídos.

     

    Segundo os indígenas, a polícia permaneceu nas proximidades por mais três dias.

     

    Os professores e profissionais de saúde não-índios não querem voltar para a aldeia. Os alunos não querem ir às aulas. A comunidade possui cerca de 500 pessoas, contando com mais duas aglomerações, a dos Kayabi e a dos Apiaká, que também dependem da estrutura de Teles Pires.

     

    Blitzkrieg bop

     

    No dia 6, W. U. conta que indígenas Kayabi compartilharam pelo rádio a informação de que helicópteros estavam sobrevoando suas terras. "Achávamos que eles estavam vindo pra se reunir com a gente", relata. Contudo, segundo W. U., o que estava acontecendo ali era a construção das bases da Operação Eldorado. A primeira fora construída na Fazenda Brascan, localizada no Vale Ximari, em Apiacás (MT), a dez quilômetros da comunidade Kayabi. A segunda base da Operação foi montada a um quilômetro da aldeia, no igarapé Buretama. Foi neste local, "onde há apenas um morador", que um grupo de guerreiros Munduruku foi ter com os policiais para entender o que estava acontecendo.

     

    Quando os indígenas encontraram os policiais, eles estavam evacuando uma das balsas que seria destruída. "Perguntamos o que eles iriam fazer. Eles disseram que não queriam conversa, que vieram fechar o garimpo e explodir as dragas, que tinham uma ordem judicial pra isso". Os indígenas pediram para ver o mandado que autorizava a Operação e insistiram sobre a necessidade de uma reunião entre a polícia e as lideranças. "Explicamos que o garimpo era o nosso sustento, que não poderiam fechar assim. Trouxemos o documento do acordo com a Funai sobre o garimpo", explica. "Aí começou o desentendimento. Um policial quebrou uma flecha e deu um empurrão num cacique de uma aldeia próxima. Eles falaram pra gente tirar o que a gente quisesse da draga, porque a draga ia ser explodida, e assim foi feito". Segundo W. U., os indígenas retornaram à aldeia para contar ao cacique e outras lideranças que a polícia estava na área e havia destruído uma das embarcações. Os policiais suspenderiam a destruição e só voltariam no dia seguinte.

     

    W. U. foi atingido por bombas e está com marcas de queimadura no corpo.

     

    Segundo todos os relatos, a Força Nacional de Segurança não se envolveu nos momentos de violência da Operação. A Polícia Federal em Mato Grosso decidiu suspender temporariamente a Operação. O MPF do Mato Grosso e do Pará abriram investigação sobre o caso.

     

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  • 27/11/2012

    Por que mataram Adenilson Munduruku?

    E a vida corria bem seu curso para os Munduruku, desde quando Karosakaybu[1] os criara, na aldeia Wakopadi, nas cabeceiras do rio Krepori. E então os pariwat[2] chegaram; para nós, era o século XVIII, com nossas frentes colonizadoras. As coisas nunca são as mesmas, e ali, definitivamente, nunca mais foram as mesmas para os Munduruku.

     

    Os Munduruku, hoje, totalizam pouco mais de 11 mil pessoas, espalhadas em áreas indígenas reivindicadas, demarcadas ou homologadas. A difícil localização e situação de quase isolamento das comunidades – num cenário de pressão das espoliações para a exploração exógena de suas terras e riquezas – os colocaram, ao longo da história, em contextos complexos de conflito com a sociedade envolvente.

     

    Um exemplo disso foi o episódio ocorrido em julho deste ano. Um Munduruku foi barbaramente assassinado com 21 facadas e pauladas que destruíram seu rosto. O corpo da vítima foi encontrado por um morador jogado em um terreno baldio, próximo à residência do pai.  À época, dois dos quatro suspeitos de serem autores do crime foram deixados em liberdade pela polícia civil. A falta de investigação e providências das autoridades foi o estopim para que, enfurecidos, os indígenas cercassem a delegacia da Polícia Civil de Jacareacanga exigindo que a polícia permitisse que eles fizessem justiça com as próprias mãos. A delegacia foi depredada e incendiada pelos Munduruku – a cidade, sitiada.

     

    Em 2002, a situação do garimpo nas terras indígenas estava calamitosa. Centenas de garimpeiros trabalhavam clandestinamente, viviam dentro das terras indígenas e traziam consigo toda uma cadeia extremamente perversa que orbitava a atividade. Exploração de mão de obra, dominação, drogas e prostituição eram algumas delas. Foi então que os Munduruku também tiveram de começar a resolver as coisas com as próprias mãos, e retiveram os garimpeiros e funcionários da Funai para pressionar o órgão a realizar um acordo que desaguasse numa operação de retirada dos mineradores da área.

     

    "Sabemos perfeitamente que o garimpo, além de ilegal, é ruim para o nosso rio e para a nossa gente", explica V.. "Acontece que essa foi a única forma que encontramos para sobreviver nos últimos tempos", expõe. "Mas nós sempre quisemos acabar com os garimpos".

     

    E então V. apresenta um documento ao qual ainda não foi dada nenhuma publicidade por parte do governo, e que confirma a vontade dos indígenas em terminar com os garimpos. Um ofício registrou uma reunião que ocorrera entre indígenas Munduruku, Kayabi e Apiaká e diversas coordenações da Funai regional e nacional, junto ao MPF-PA, em setembro de 2005, onde os indígenas apresentaram propostas para a substituição do garimpo por um projeto de desenvolvimento e geração de renda para a comunidade.  Como alternativa à extração do ouro, os indígenas exigiam suporte para implantar e consolidar projetos de "produção de artesanato, produção de mel de abelhas, piscicultura, avicultura, implantação de casa de farinha e agricultura (consórcio de culturas). Dentre essas propostas, a mais discutida e que os índios priorizaram foi a de produção de artesanato (…). Quando o índio vai caçar, pega sementes, cipó e vigia a área", relatava o ofício, protocolado nas quatro instituições.

     

    "Façamos"

     

    "Com esses projetos, gradativamente iríamos acabar com o garimpo. Só que esse eles nunca saíram do papel", expõe V.. Então, as comunidades começaram a interferir diretamente na extração ilegal, no sentido de reduzir os impactos causados pela atividade. "Morria muito branco, índio, tinha tráfico de drogas e a Funai não tomava nenhuma providência. E a gente continuava escravo do garimpo. Então nós mesmos tomamos providências". V. relata, então, que os próprios indígenas estabeleceram com os garimpeiros novas regras sobre como se daria o trabalho na área. Proibiram os garimpeiros de portarem armas, levarem bebidas e comercializarem drogas, entre outras coisas. Colocaram placas pela comunidade, para que todos que entrassem informassem o que iriam fazer ali. Em 2010, sob o conhecimento da Funai e do Ibama – e portanto dos ministérios da Justiça e Meio Ambiente – estas regras tornariam-se um "Acordo de parceria para atividade de mineração" entre indígenas Kayabi e os proprietários das balsas.

     

    Com o dinheiro do garimpo, os Munduruku mantinham uma casa de apoio em Jacareacanga. Garantiam a geração de energia para a aldeia. "Os alunos que estudam fora eram mantidos com o dinheiro da mensalidade do garimpo, e tudo o que era comprado [com esse dinheiro] é de toda a comunidade. A manutenção de equipamentos das aldeias vem daí. Quem trabalha dentro da aldeia também recebia daí".

     

    Além das comunidades receberem um pagamento mensal dos proprietários das balsas pela exploração do rio, alguns indígenas trabalham diretamente na mineração. Outros vendem produtos como farinha de puba, polvilho, tapioca, frutas, pecados e artesanatos. "Hoje, depois do que aconteceu, nós simplesmente não temos condições de nos manter", lamenta V..

     

    V. explica

     

    Embora considere injusta, V. poderia ao menos compreender uma operação que se limitasse a destruir os instrumentos de extração do minério. Contudo, ele é taxativo ao apontar que "a ação policial não foi só no garimpo. Foi dentro da aldeia. E não existia garimpo dentro da aldeia. Por que atacaram a aldeia, então?"

     

    É certo, então, que esta ação belicosa ofensiva não se explica por si só, levando em conta o acordo citado acima e o contraponto da narrativa dos indígenas à versão da Polícia Federal – ou seja, a retificação de que não houvera "emboscada" alguma dos indígenas contra a operação, conforme declarou a PF em nota pública (leia), justificando publicamente o uso da violência e culpabilizando os indígenas pelo ocorrido. Por que, então, mataram aquele Munduruku? Por que invadiram e aterrorizaram de maneira brutal e desastrosa toda uma aldeia?

     

    V. tem uma explicação. "Nós já dissemos [à Funai e ao governo] que não permitimos estudos de impacto ambiental  na nossa terra para hidrelétricas. A operação da Polícia Federal tem ligação com a nossa resistência à construção das barragens. Eles querem fragilizar as comunidades pra ficar mais fácil de construí-las. Mas nós nunca vamos aceitar trocar nossas terras por migalhas. O que eles fizeram só fortalece a nossa luta", diz.

     

    I. W. concorda com V.. "Eles acham que, tirando o garimpo, ficamos sem dinheiro, e vamos ter que aceitar a barragem. Só que nós estamos firmes de não aceitar  barragem na nossa terra". Funcionários do órgão indigenista oficial que não podem se identificar concordam que a perseguição se dá por conta da total contrariedade dos Munduruku a empreendimentos hidrelétricos e hidroviários, e afirmam ser a aldeia Teles Pires o principal foco dessa resistência.

     

    Os Munduruku se opõem frontalmente à construção de dois complexos de barragens do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), do Governo Federal. São os complexos Hidrelétricos Tapajós e Teles Pires, conjunto de treze hidrelétricas previstas para a região.

     

    Parte delas está sendo licenciada pelo órgão federal responsável, o Ibama; parte pela Secretaria Estadual de Meio Ambiente do Mato Grosso. O complexo Tapajós está todo inventariado, mas apenas duas das sete usinas com processo de licenciamento abertos, em fase de estudos. No último dia 21, a Justiça Federal em Santarém proibiu a concessão de licença ambiental para uma delas, a pedido do MPF-PA, enquanto não forem realizadas consulta prévia aos índios afetados e avaliação ambiental integrada de todas as usinas planeadas para a bacia do rio Tapajós no Pará. 

     

    Para viabilizar os licenciamentos das barragens do Tapajós –  e o início da operação das usinas Santo Antônio e Girau, no rio Madeira (RO) -, a presidenta Dilma Rousseff publicou, em janeiro, uma medida provisória (MPV) que reduzia sete unidades de conservação em áreas atingidas pelos empreendimentos. a MPV foi convertida em lei em junho, dois dias depois da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável na Rio +20. Tanto a medida quanto a lei foram contestadas pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel, no Supremo Tribunal Federal.

     

    Indígenas vão a Brasília denunciar ataque da PF

     

    Quase duas semanas depois dos acontecimentos e sem nenhuma resposta, uma comissão de uma dúzia de Munduruku, Kayabi e Apiaká – entre eles, quatro testemunhas do ataque – veio a Brasília na última semana. Queriam reforçar as denúncias das violações diretamente ao Ministro da Justiça, José Eduardo Cardoso; à presidenta da Funai, Marta Azevedo; à Ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira; e exigir a apuração e a punição dos responsáveis, bem como traçar, por intermédio destas instituições, uma ação emergencial de reparação aos danos causados. O grupo não foi recebido por nenhum deles.

     

    Um grupo de assessores foi ter com a comissão. Durante o encontro, os indígenas narraram os acontecimentos, a partir do testemunho das vítimas e dos relatos das comunidades. Ao que o secretário de articulação social da Secretaria Geral da Presidência, Paulo Maldos, respondeu: "Houve esse problema, vocês estão aqui trazendo informações pra gente, e a gente respeita, vai levar em consideração. Se houve problema de conduta errada, vai ser apurado."

     

    Os indígenas questionaram quem realmente havia autorizado a PF a realizar aquela ação. Um assessor do Ministério da Justiça, Marcelo Veiga, disse não saber a qual processo judicial se vincula a Operação Eldorado, mas afirmou aos indígenas que eles estavam executando uma decisão da Justiça Federal.

     

    "A gente não está jogando pra cima da Justiça Federal a responsabilidade. Há uma determinação da Justiça pra que aquela operação fosse realizada. Ninguém está fazendo jogo de cena aqui", disse Marcelo. "Não tem que ficar dúvida de vocês que a atuação e a parceria da Força Nacional e da Polícia Federal com a Funai [e os indígenas] é de muito sucesso. Esse foi um caso episódico, que pode ter havido abuso ou não. [Porque] A PF dialogou anteriormente com as lideranças indígenas [das aldeias atacadas durante a Operação]. A gente vai ter que apurar".

     

    Funai

     

    Expuseram detalhadamente que, sem os barcos, com o rio contaminado, sem os instrumentos de caça e pesca e sem a renda gerada a partir dos garimpos, os indígenas estão numa situação de urgência extrema.

     

    "A Funai está atrasada com suas ações de promoção naquela região", argumentou a diretora de Promoção ao Desenvolvimento Sustentável da Funai, Maria Augusta Boulitreau Assirati. "E não dá pra fazer, esse ano, nenhuma ação concreta. Vou ser sincera com vocês. [Mas] cesta básica a Funai jamais vai se negar [a distribuir], se for constatada necessidade".

     

    "Nós sabemos que o governo tem voltado um olhar pra toda a região ali do Tapajós e do Teles Pires", disse Maria Augusta. "Vocês nos disseram aqui diversas vezes que o governo diz que os índios são um empecilho ao desenvolvimento. Desenvolvimento não pode ser incompatível com a vida e com as formas tradicionais de vida dos indígenas", explicou. "Como os empreendimentos hidrelétricos. Tem que ouvir o que as comunidades pensam. Da mesma forma que vocês tem que ouvir a visão do governo. Por que o governo acha importante fazer uma hidrelétrica? Por que o governo acha importante fazer uma barragem? O processo de licenciamento acontece nesse sentido e para isso. Que vantagens traz [um empreendimento], que desvantagens traz?" Os indígenas perguntaram a eles quem era Paulão. Não souberam responder.

     

    A reportagem não teve acesso à relação detalhada de todos os participantes da operação, sejam eles da PF, da FN, da Funai, do Ibama ou de outros órgãos que tenham participado da ação.

     

    _______________

    As fotos utilizadas na matéria foram registradas por indígenas Munduruku e Kayabi.

     



    [1] O ‘deus’ Munduruku.

    [2] O homem branco.

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  • 27/11/2012

    Lançamento do relatório de Direitos Humanos

    O Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH), Processo de Articulação e Diálogo entre as Agências Ecumênicas Européias e Parceiros Brasileiros (PAD), Parceiros de MISEREOR no Brasil e Plataforma Brasileira de Direitos Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais (Dhesca Brasil), redes que coordenam desde 2004 a iniciativa conjunta do Projeto Monitoramento dos Direitos Humanos no Brasil, lançam o terceiro Relatório Periódico de Direitos Humanos.

     

    O lançamento do Relatório “Direitos Humanos no Brasil: Diagnósticos e Perspectivas, vol. III” será realizado na próxima quinta-feira (29), na Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados.


    Seguindo as experiências anteriores (Relatórios Periódicos I e II, lançados respectivamente em 2003 e 2007), o presente Relatório tem como finalidade contribuir no monitoramento político da situação concreta dos direitos humanos, com enfoque na situação dos sujeitos de direitos. Neste sentido o foco do relatório não está em analisar determinadas políticas ou aspectos orçamentários específicos, mas sim em fazer uma análise abrangente, com caráter analítico-político, podendo conter estudos de casos, denúncias e recomendações, tentando circunscrever o período a partir de 2007 até o presente momento.


    O Relatório possui 35 textos na sua totalidade e é estruturado em duas partes. Na primeira, que trata de aspectos gerais dos direitos humanos, são abordados temas como: Democracia e Participação Popular; Desenvolvimento e Direitos Humanos; Políticas Públicas e Direitos Humanos; Criminalização dos movimentos e lutas sociais; Territorialidade e luta por Direitos, entre outros. A segunda parte versa sobre enfoques específicos dos direitos humanos e traz textos que tratam de diferentes direitos e diferentes sujeitos, tais como: Meio Ambiente; Alimentação; Educação; Memória, Justiça e Verdade; Liberdade de Expressão, Culto e Religião; Direitos sexuais e Direitos reprodutivos; Saúde; Segurança Pública; Criança e Adolescente; LGBT; Afrodescendentes; Migrantes; Mulheres; Povos indígenas; Populações encarceradas; Populações de rua, entre outros.


    Com o prefácio escrito pelo Ex-Ministro Paulo Vannuchi e textos elaborados a partir da contribuição de autores e autoras ligados às organizações e entidades sociais e à academia, o Relatório se constitui numa mescla entre leituras numa perspectiva prática a partir da experiência cotidiana e a pesquisa numa perspectiva acadêmica. Trata-se de um importante instrumento de monitoramento dos direitos humanos no Brasil, que oferece informações, denúncias e análises sobre uma ampla gama de temas e uma rica plataforma de lutas em busca da garantia e realização dos direitos humanos no Brasil.

     

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    Serviço:

    Evento: Lançamento do Relatório “Direitos Humanos no Brasil: Diagnósticos e Perspectivas, vol. III”
    Dia: 29 de novembro
    Horário: 9 horas
    Local: Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara, Anexo II, Câmara dos Deputados, Plenário 09 – Brasília-DF


    Contatos:

    Secretário Executivo: Enéias da Rosa (62) 8141-0102
    MNDH: Joisiane Gamba (98) 8123-2222
    Parc. Miserior: Daniel Rech (61) 8134-6020

    Coordenação Geral:

    Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH)
    Processo de Articulação e Diálogo entre as Agências Ecumênicas Européias e Parceiros Brasileiros (PAD)
    Parceiros de MISEREOR no Brasil
    Plataforma Brasileira de Direitos Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais (Dhesca Brasil)

     

    Secretaria Executiva:

    Monitoramento dos Direitos Humanos no Brasil

    Av. Anhanguera, n. 5674 – Ed. Palácio do Comércio, 10 andar – sala 1008
    Goiânia – GO – 74043-010

    Fone / Fax: (62) 3223-6662/ 8141-0102 – secretaria.dhesc@gmail.com

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  • 27/11/2012

    Latuff dedica charge à campanha Causa Indígena – apóie você também!


    O cartunista e ativista brasileiro Carlos Latuff dedicou uma charge à campanha "Eu apóio a causa indígena". Na reta final da coleta de assinaturas, o movimento reivindica a demarcação de terras, a não aprovação da PEC 215, e o julgamento urgente de todas as ações em andamento no Supremo Tribunal Federal (STF) que envolvam os direitos dos povos indígenas.

    As assinaturas serão entregues ao STF, ao Congresso Nacional e à Presidência da República após uma audiência organizada pela Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, em Brasília, dia 4 de dezembro. Delegações indígenas de todo o Brasil farão a entrega pública do documento.

    Ainda não participou? Clique aqui e assine a petição

    Noam Chomsky, Wagner Moura, Eduardo Galeano e MC Leonardo, entre muitos outros, são algumas dos famosos que apóiam a campanha. Lançada em junho, o movimento é uma iniciativa do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e da Associação de Juízes para a Democracia (AJD), com o apoio de dezenas de organizações indígenas, indigenistas e movimentos sociais.

    VIOLAÇÕES


    O abaixo-assinado vem num momento de graves violações dos direitos indígenas. Na Amazônia, no último dia 7, um indígena Munduruku foi assassinado durante Operação da Polícia Federal em território indigena demarcado. No Mato Grosso do Sul, indígenas Kadiwéu são despejados de terra homologada há mais de um século, enquanto Guarani-Kaiowá sofrem ataques e pressões dos mais variados tipos.

    No Rio Grande do Sul, indígenas Kaingang e Mbyá vivem às margens das estradas, acampados sob o intenso frio do Sul do país, sobrevivendo há décadas em pequenos pedaços de terra entre as cercas do latifúndio e o asfalto das rodovias.

    Outro caso emblemático é dos Awá-Guajá, no Maranhão. Caso seja concretizada, a expansão da ferrovia Carajás pela mineradora Vale promoverá o desaparecimento das florestas e da fauna, fonte de vida daqueles indígenas, que hoje já tem suas terras invadidas por madeireiros, que abrem estradas clandestinas, desmatam áreas próximas a lagoas, privilegiadas em caça e pesca, locais de fundamental importância para a sobrevivência física e cultural deste povo.

    A APIB denunciou às Nações Unidas (ONU) a violação de direitos e o genocídio promovidos contra os povos indígenas da Brasil, destacando a PEC 215 e a Portaria 303 da Advocacia Geral da União (AGU) como instrumentos jurídicos contrários a Convenção 169 da OIT e a Declaração da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas.

    Ainda não participou? Assine a divulgue a campanha "Eu apóio a causa indígena"

    ENTENDA A PEC 215


    A Proposta de Emenda Constitucional 215/00 (PEC 215) tem o propósito de transferir para o Congresso Nacional a competência de aprovar a demarcação das terras indígenas, criação de unidades de conservação e titulação de terras quilombolas, que é de responsabilidade do poder executivo, por meio da Fundação Nacional do Índio (Funai), do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) e da Fundação Cultural Palmares (FCP). A aprovação da PEC 215 – assim como da PEC 038/99, em trâmite no Senado – põem em risco as terras indígenas já demarcadas e inviabiliza toda e qualquer possível demarcação futura.


    AUDIÊNCIA

     

    Na audiência pública estarão presentes representantes de diversos povos, inclusive dos jovens e mulheres indígenas, que serão ouvidos pelo Congresso Nacional. A sessão acontece no dia 4 de dezembro, terça-feira, às 10h da manhã, no plenário 9 do anexo 2 da Câmara dos Deputados, em Brasília. Participe!

     

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  • 25/11/2012

    Kátia, a antropóloga, criadora da abreugrafia

    Nelson Rodrigues só se deslumbrou com "a psicóloga da PUC" porque não conheceu "a antropóloga da Folha". Mas ela existe. É a Kátia Abreu. É ela quem diz aos leitores da Folha de São Paulo, com muita autoridade, quem é índio no Brasil. É ela quem religiosamente, todos os sábados, em sua coluna, nos explica como vivem os "nossos aborígenes". É ela quem nos ensina sobre a organização social, a distribuição espacial e o modo de viver deles.

     

    Podeis obtemperar que o caderno Mercado, onde a coluna é publicada, não é lugar adequado para esse tipo de reflexão e eu vos respondo que não é pecado se aproveitar das brechas da mídia. Mesmo dentro do mercado, a autora conseguiu discorrer sobre a temática indígena, não se intimidou nem sequer diante de algo tão complexo como a estrutura de parentesco e teorizou sobre "aborigenidade", ou seja, a identidade dos "silvícolas" que constitui o foco central de sua – digamos assim – linha de pesquisa.

     

    A maior contribuição da antropóloga da Folha talvez tenha sido justamente a recuperação que fez de categorias como "silvícola" e "aborígene", muito usadas no período colonial, mas lamentavelmente já esquecidas por seus colegas de ofício. Desencavá-las foi um trabalho de arqueologia num sambaqui conceitual, que demonstrou, afinal, que um conceito nunca morre, permanece como a bela adormecida à espera de alguém que o desperte com um beijo. Não precisa nem reciclá-lo. Foi o que Kátia Abreu fez.

     

    Com tal ferramenta inovadora, ela estabeleceu as linhas de uma nova política indigenista, depois de fulminar e demolir aquilo que chama de "antropologia imóvel" que seria praticada pela Funai. Sua abordagem vai além do estudo sobre a relação observador-observado na pesquisa antropológica, não se limitando a ver como índios observam antropólogos, mas como quem está de fora observa os antropólogos sendo observados pelos índios. Não sei se me faço entender. Mas em inglês seria algo assim como Observing Observers Observed.

    Os argonautas do Gurupi

     

    Todo esse esforço de abstração desaguou na criação de um modelo teórico, a partir do qual Kátia Abreu sistematizou um ousado método etnográfico conhecido como abreugrafia que, nos anos 1940, não passava de um prosaico exame de raios X do tórax, uma técnica de tirar chapa radiográfica do pulmão para diagnosticar a tuberculose, mas que foi ressignificado. Hoje, abreugrafia é a descrição etnográfica feita com o método inventado por Kátia Abreu, no caso uma espécie de raio X das sociedades indígenas.

     

    Esse método de coleta e registro de dados foi empregado na elaboração dos três últimos artigos assinados pela antropóloga da Folha: Uma antropologia imóvel (17/11), A Tragédia da Funai (03/11/) e Até abuso tem limite (27/10) que bem mereciam ser editados, com outros, num livro intitulado "Os argonautas do Gurupi". São textos imperdíveis, que deviam ser leitura obrigatória de todo estudante que se inicia nos mistérios da antropologia. A etnografia refinada e apurada que daí resulta quebrou paradigmas e provocou uma ruptura epistemológica ao ponto de não-retorno.

     

    A antropóloga da Folha aplicou aqui seu método revolucionário – a abreugrafia – que substituiu o tradicional trabalho de campo, tornando caducas as contribuições de Boas e Malinowski. Até então, para estudar as microssociedades não ocidentais, o antropólogo ia conviver lá, com os nativos, tinha de "viver na lama também, comendo a mesma comida, bebendo a mesma bebida, respirando o mesmo ar" da sociedade estudada, numa convivência prolongada e profunda com ela, como em ‘Lama’, interpretada por Núbia Lafayette ou Maria Bethania.

     

    A abreugrafia acabou com essas presepadas. Nada de cantoria. Nada de anthropological blues. Agora, o antropólogo já não precisa se deslocar para sítios longínquos, nem viver um ano a quatro mil metros de altura, numa pequena comunidade nos Andes, comendo carne de lhama, ou se internar nas selvas amazônicas entre os huitoto, como fez um casal de amigos meus. E tem ainda uma vantagem adicional: com a abreugrafia, os antropólogos nunca mais serão observados pelos índios.

     

    Em que consiste, afinal, esse método que dispensa o trabalho de campo? É simples. Para conhecer os índios, basta tão somente pagar entrevistadores terceirizados. Foi o que fez a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) que, por acaso, é presidida por Kátia Abreu. A CNA encomendou pesquisa ao Datafolha que, por acaso, pertence à empresa dona do jornal onde, por acaso, escreve Kátia. Está tudo em casa. Por acaso.

    Terra à vista

     

    Os pesquisadores contratados, sempre viajando em duplas – um homem e uma mulher – realizaram 1.222 entrevistas em 32 aldeias com cem habitantes ou mais, em todas as regiões do país. Os resultados mostram que 63% dos índios têm televisão, 37% tem aparelho de DVD, 51% geladeira, 66% fogão a gás e 36% telefone celular. "A margem de erro" – rejubila-se o Datafolha – "é de três pontos percentuais para mais ou para menos".

     

    "Eu não disse! Bem que eu dizia" – repetiu Kátia Abreu no seu último artigo, no qual gritou "terra à vista", com o tom de quem acaba de descobrir o Brasil. O acesso dos índios aos eletrodomésticos foi exibido por ela como a prova de que os "silvícolas" já estão integrados ao modo de vida urbano, ao contrário do que pretende a Funai, com sua "antropologia imóvel" que "busca eternizar os povos indígenas como primitivos e personagens simbólicos da vida simples". A antropóloga da Folha, filiada à corrente da "antropologia móvel", seja lá o que isso signifique, concluiu:

     

    – "Nossos tupis-guaranis, por exemplo, são estudados há tanto tempo quanto os astecas e os incas, mas a ilusão de que eles, em seus sonhos e seus desejos, estão parados, não resiste a meia hora de conversa com qualquer um dos seus descendentes atuais".

     

    Antropólogos da velha guarda que persistem em fazer trabalho de campo alegam que Kátia Abreu, além de nunca ter conversado sequer um minuto com um índio, arrombou portas que já estavam abertas. Qualquer aluno de antropologia sabe que as culturas indígenas não estão congeladas, pois vivem em diálogo com as culturas do entorno. Para a velha guarda, Kátia Abreu cometeu o erro dos geocêntricos, pensando que os outros estão imóveis e ela em movimento, quando quem está parada no tempo é ela, incapaz de perceber que não é o sol que dá voltas diárias em torno da terra.

     

    No seu artigo, a antropóloga da Folha lamenta que os índios "continuem morrendo de diarreia". Segundo ela, isso acontece, não porque os rios estejam poluídos pelo agronegócio, mas "porque seus tutores não lhes ensinaram que a água de beber deve ser fervida". Esses tutores representados pela FUNAI – escreve ela – são responsáveis por manter os índios "numa situação de extrema pobreza, como brasileiros pobres". Numa afirmação cuja margem de erro é de 3% para mais ou para menos, ela conclui que os índios não precisam de tutela.

     

    – Quem precisa de tutela intelectual é Kátia Abreu – retrucam os antropólogos invejosos da velha guarda, que desconhecem a abreugrafia. Eles contestam a pobreza dos índios, citando Marshall Sahlins através de postagem feita no facebook por Eduardo Viveiros de Castro:

     

    ‎"Os povos mais ‘primitivos’ do mundo tem poucas posses, mas eles não são pobres. Pobreza não é uma questão de se ter uma pequena quantidade de bens, nem é simplesmente uma relação entre meios e fins. A pobreza é, acima de tudo, uma relação entre pessoas. Ela é um estatuto social. Enquanto tal, a pobreza é uma invenção da civilização. Ela emergiu com a civilização…"

    Miss Desmatamento

     

    A conclusão mais importante que a antropóloga da Folha retira das pesquisas realizadas com a abreugrafia é de que os "aborígenes", já modernizados, não precisam de terras que, aliás, segundo a pesquisa, é uma preocupação secundária dos índios, evidentemente com uma margem de erro de três pontos para mais ou para menos.

     

    – "Reduzir o índio à terra é o mesmo que continuar a querer e imaginá-lo nu" – escreve a antropóloga da Folha, que não quer ver o índio nu em seu território. "Falar em terra é tirar o foco da realidade e justificar a inoperância do poder público. O índio hoje reclama da falta de assistência médica, de remédio, de escola, de meios e instrumentos para tirar o sustento de suas terras. Mais chão não dá a ele a dignidade que lhe é subtraída pela falta de estrutura sanitária, de capacitação técnica e até mesmo de investimentos para o cultivo".

     

    A autora sustenta que não é de terra, mas de fossas sépticas e de privadas que o índio precisa. Demarcar terras indígenas, para ela, significa aumentar os conflitos na área, porque "ocorre aí uma expropriação criminosa de terras produtivas, e o fazendeiro, desesperado, tem que abandonar a propriedade com uma mão na frente e outra atrás".

     

    Ficamos, então, assim combinados: os índios não precisam de terra, quem precisa são os fazendeiros, os pecuaristas e o agronegócio. Dados apresentados pela jornalista Verenilde Pereira mostram que na área Guarani Kaiowá existem 20 milhões de cabeças de gado que dispõem de 3 a 5 hectares por cabeça, enquanto cada índio não chega a ocupar um hectare.

     

    Um discípulo menor de Kátia Abreu, Luiz Felipe Pondé, também articulista da Folha, tem feito enorme esforço para acompanhar a produção intelectual de sua mestra, usando as técnicas da abreugrafia, sem sucesso, como mostra artigo por ele publicado com o título Guarani Kaiowá de boutique (9/11), onde tenta debochar da solidariedade recente aos Kaiowá que explodiu nas redes sociais.

     

    Kátia Regina de Abreu, 50 anos, empresária, pecuarista e senadora pelo Tocantins (ex-DEM,atual PSD), não é apenas antropóloga da Folha. É também psicóloga formada pela PUC de Goiás, reunindo dois perfis que deslumbrariam Nelson Rodrigues.

     

    Bartolomé De las Casas, reconhecido defensor dos índios no século XVI, contesta o discurso do cronista do rei, Gonzalo Fernandez de Oviedo, questionando sua objetividade pelo lugar que ele ocupa no sistema econômico colonial:

     

    – “Se na capa do livro de Oviedo estivesse escrito que seu autor era conquistador, explorador e matador de índios e ainda inimigo cruel deles, pouco crédito e autoridade sua história teria entre os cristãos inteligentes e sensíveis”.

     

    O que é que nós podemos escrever na capa do livro "Os Argonautas do Gurupi" de Kátia Abreu, eleita pelo movimento ambientalista como Miss Desmatamento? Que crédito e autoridade tem ela para emitir juízos sobre os índios? O que diriam os cristão inteligentes e sensíveis contemporâneos? Respostas em cartas à redação, com a margem de erro de 3% para mais ou para menos.

     

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  • 24/11/2012

    APIB denuncia à ONU a violação de direitos e o genocídio dos indígenas brasileiros

    A direção nacional da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB, representada pelo líder indígena Uilton Tuxá – também coordenador da APOINME – denunciou aos oficiais do Auto Comissionado das Nações Unidas para os Direitos Humanos a violação de direitos e o genocídio promovidos contra os Povos Indígenas da Brasil, diante do descaso e omissão do governo Dilma Rousseff.

     

    A reunião aconteceu na sede da ONU em Genebra, na Suiça, onde também foi entregue aos presentes um documento da APIB que destaca a PEC 215/00 e Portaria 303 da Advocacia Geral da União (AGU) como instrumentos jurídicos contrários a Convenção 169 da OIT e a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas.

     

    Desde o início do mês, em viagem pela Europa, o líder Uilton Tuxá tem denunciado à diversas organizações internacionais e à imprensa mundial a situação crítica enfrentada pelos Povos do Brasil. O objetivo é angariar o apoio internacional para a conscientização de nossos governantes sobre a necessidade urgente de medidas mais efetiva para por um fim à violência sistemática que vitima  diariamente homens, mulheres e crianças indígenas em todo país.

     

    Leia abaixo a íntegra da Carta da APIB às Nações Unidas.

     

    Carta da APIB às Nações Unidas sobre a situação dos Povos Indígenas do Brasil

     

    Genebra, 13 de Novembro de 2012.

     

    Assunto: Situação dos direitos indígenas no Brasil

     

    Para: Oficina do Alto Comissionado das Nações Unidas para os Direitos Humanos

     

    Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) organização indígena nacional composta pelas principais organizações indígenas em diferentes regiões do país:

     

    – A Articulação dos Povos indígenas do Nordeste e de Minas Gerais e Espírito Santo APOINME,

    – Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira – COIAB,

    – Articulação dos Povos Indígenas do Sul – ARPINSUL,

    – Articulação dos Povos Indígenas do Sudeste – ARPINSUDESTE,

    – Articulação dos Povos Indígenas e Região do Pantanal – ARPIPAN,

    – Grande Assembleia Guarani – ATY GUASU.

     

    Vem por meio desta, manifestar sua preocupação com o agravamento da violação dos direitos humanos e fundamentais de nossos povos indígenas no Brasil.

     

    O objetivo principal deste documento é solicitar que o sistema das Nações Unidas possa intervir junto ao Estado Brasileiro pedindo para acate suas recomendações e tome medidas urgentes visando assegurar o respeito aos direitos dos povos indígenas, de acordo com os tratados internacionais, conforme a Convenção 169 OIT e Declaração da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas, que estabelecem o direito dos povos indígenas ao consentimento livre, prévio e informado, frequentemente os nossos direitos são violados pelo Governo do Brasil, apesar das recomendações apresentadas pelo Relator Especial das Nações Unidas para questões indígenas sobre a situação dos direitos humanos e liberdades fundamentais dos povos indígenas e da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH/OEA).

     

    O Brasil tem sido visto no mundo como um dos países que mais cresceu economicamente na última década, e por tanto, saiu da condição de país do terceiro mundo, sendo parte dos países considerados emergentes, porém mesmo com o investimento no programa Bolsa Família visando acabar com a fome da população que vive em situação de extrema pobreza ainda há muitas famílias pobres e os povos indígenas brasileiros estão dentro desse contexto de pobreza.

     

    Apresentamos neste documento um panorama geral da situação dos povos indígenas no Brasil:

     

    Direitos sociais

     

    O respeito aos direitos dos povos indígenas constitucionalmente garantidos é uma realidade que está longe de ser alcançada, devido à ausência da aprovação de uma lei que regulamente o artigo 231 da Constituição Federal a falta desta lei contra diz os discursos dos líderes do atual governo como a presidente Dilma Rousseff e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

     

    De acordo com o Censo Demográfico de 2010, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), há uma população total de 817.963 indígenas em todo o Brasil. Destes, pelo menos 326.375 indígenas estão em situação de extrema pobreza (39,9%), o que representa quase quatro em cada dez índios. Diferente de outros seguimentos as sociedade brasileira que apresentam percentuais bem mais baixos que os indígenas a exemplo dos brancos que seu percentual chega a 4,7%, e os negros 10,0%, vale ressaltar que os indígenas no Brasil representam apenas 0,04% da população total do país.

     

    Terra e territórios indígenas

     

    O governo brasileiro conta vantagens ao afirmar que as terras indígenas no Brasil já estão quase que totalmente demarcadas, representando 95% das terras indígenas, porém, não explica que esse percentual está relacionado quase exclusivamente nas terras amazônicas e que algumas que foram demarcadas e outras que foram regularizadas contaram com o incentivo de expressivos apoios financeiro da cooperação internacional e pouco investimento dos recursos financeiros do governo do Brasil.

     

    A maioria da população indígena que sofre e vive em situação de extrema pobreza estão localizados exatamente no Norte (Amazônia) e Centro-Oeste, e muitos casos ocorrem em terras que já foram demarcadas mostrando que não é suficiente apenas demarcar terras indígenas sem oferecer condições dignas de trabalhar o uso sustentável da terra, os povos e comunidades indígenas como qualquer outro cidadão precisam de condições de sustentabilidade e proteção de seus territórios. Se as condições de pobreza são visíveis em regiões da terra demarcada, imagine então em outras regiões, como o sul e nordeste do país, onde muitas terras indígenas não são demarcadas e continuam invadidas por fazendeiros.

     

    A maioria dos povos indígenas do Brasil está sujeitos a vulnerabilidades, devido estar sofrendo pressão sobre suas terras, territórios e recursos naturais por causa da construção de grandes projetos de desenvolvimento econômico do governo, como estradas, pequenas e grandes hidrelétricas, transposição do curso de água no rio São Francisco, redes de transmissão de energia elétrica, a intrusão de mineração e exploração madeireira, expansão da fronteira agrícola, o monocultura, os conflitos com os proprietários e latifundiários.

     

    Como exemplo, podemos citar alguns casos dos povos indígenas como o povo Guarani Kaiowá está localizado no estado de Mato Grosso do Sul, o povo Pataxó Hã-Hã-Hãe, Pataxó e Tupinambá, no Estado da Bahia e dos Xavantes no estado de Mato Grosso. No primeiro caso os Guarani Kaiowá são submetidos a condições de discriminação aberta e etnocídio. Eles vivem em áreas extremamente pequenas estas terras estão sendo invadidas por fazendeiros e pistoleiros, agricultores e produtores de monoculturas como soja, cana de açúcar e eucalipto. Na terra indígena de Dourados, a taxa de homicídios é muito alta em função do conflito na disputa pela terra e existem casos em outros povos indígenas como os Pataxó Hãhãhãe no estado da Bahia, que estão esperando a mais de 20 anos atrás, que a Corte Suprema da Justiça Federal brasileira resolvesse a situação de seu território, este ano foi julgado em 2 de maio, a suprema corte improcedente e nulos os títulos de propriedades que o governo da Bahia concedeu a fazendeiros da região, no entanto o governo federal que é o responsável pela demarcação de terras indígenas no Brasil ainda não fez nada para a retirada dos vários fazendeiros do território indígena.

     

    O caso do povo Xavante no Estado de Mato Grosso está revelando o propósito das classes hegemônicas de descaradamente violar os direitos constitucionais dos povos indígenas, que, segundo as leis do país são de responsabilidade do governo federal. A Terra Indígena Maraiwatséde foi homologada em 1998, com direito a posse permanente e uso exclusivo do povo Xavante, no entanto, o governo federal, através do órgão indigenista, a Fundação Nacional do Índio (FUNAI), não retirou os fazendeiros até o momento, para o desespero do povo Xavante, como se não bastasse recentemente, a Assembleia Legislativa do Estado do Mato Grosso, aprovou um projeto de lei propondo que os Xavantes sejam transferidos para um parque estadual para que os produtores e fazendeiros não indígenas permaneçam no território indígena. Além disso, como os Kaiowá nos estados da região sul do país existe cerca de 50 acampamentos aguardando a demarcação do território tradicional indígena ou esperando pela desintrusão dos mesmos.

     

    Como pode ver o destino dos povos indígenas do Brasil está ameaçado, porque sabemos que sem terras e territórios assegurados e sem condições de proteção e sustentabilidade toda a perspectiva de vida dos povos indígenas tornam-se inviáveis.

     

    Megaprojetos

     

    A respeito de projetos de desenvolvimento de infraestrutura do governo brasileiros, pelo menos 434 devem afetar territórios indígenas destes, destacamos dois megaprojetos: a Hidrelétrica de Belo Monte, na região amazônica e Transposição das águas do Rio São Francisco, no nordeste do país, em ambos os casos o governo brasileiro não tem respeitado o direito dos povos indígenas ao consentimento livre, prévio e informado.

     

    O projeto de Belo Monte, resiste a mais de 20 anos atrás não foi executado por força da luta dos povos indígenas serão afetados, este projeto é considerado uma grande tragédia ambiental que trará grandes problemas sociais para os povos que serão impactados, ele vai inundar uma área de 500 quilômetros quadrados.

     

    O desvio das águas do rio Xingu, no estado do Pará, deixar sem água, sem peixe e sem meio de transporte fluvial povos indígenas e comunidades tradicionais, principalmente aqueles localizados em uma área de até 130 quilômetros, do projeto estas comunidades sofrerão impacto em suas formas tradicionais de produção e cultura da região, sem citar os conflitos e problemas sociais que serão causados pela imigração de 20 mil operários de várias regiões do país em busca de trabalho e melhores condições de vida.

     

    A Transposição do rio São Francisco para os estados de Pernambuco, Paraíba, Ceará e Rio Grande do Norte, que supostamente traria água para a população carente desses estados é realmente planejado como um projeto que visa favorecer e atender as demandas do agronegócio e aos interesses econômica e políticos outros setores região.

     

    O rio São Francisco desde o seu nascimento até a foz, atravessa territórios tradicionais ocupados por mais de 9000 anos pelos povos indígenas da região nordeste. Tem uma extensão de 2.800 km, e em sua bacia há 32 povos indígenas, ocupando 38 territórios tradicionais dos seguintes povos: Kaxagó, Kariri-Xocó, Tingui-Boto, Akona, Karapotó, Geripancó, Xoco, Katokin, Koiupanká, Karuazu, Kalankó, Pankararu, Fulni-ô, Xucuru-Kariri, Pankaiuká, Tuxá, Pipipã, Kambiwá, Kapinawá, Xukuru, Pankará, Tupan, Truká, Pankararé, Kantaruré, Atikum, Tumbalalá, Pankaru, Kiriri, Xacriabá, Kaxixó e Pataxó, com população aproximada de 70.000 indígenas.

     

    O Rio São Francisco para esses povos é de vital importância para a sua sobrevivência física e cultural, tanto para o modo de produção para a continuidade de seus rituais e cultura. No entanto, o governo ignora todo esse contexto e principalmente o grito de repúdio dessas pessoas indígenas e não indígenas e decidiu autorizar as obras de implantação do projeto, violando o direito à consulta prévia.

     

    No Brasil, a Convenção 169 da OIT não é respeitada e por isso não se aplica um exemplo de violação é o fato que ocorreu em 2011 quando a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) pediu ao governo brasileiro para suspender o processo de licenciamento e construção de Belo Monte enquanto não devidamente consultado os povos indígenas interessados.

     

    Então o governo brasileiro, informou caluniosamente em 5 de abril que tinha cumprido o seu papel institucional para esclarecer a consultar as comunidades indígenas. Quando na verdade houve encontros de socialização de informações simples que formam manipulados para se caracterizar como consultas, até mesmo eventos marcados por denúncias de divisão e práticas de cooptação ou descaracterização de líderes indígenas.

     

    Claramente está faltando “boa-fé” por parte do Estado Brasileiro, não há vontade política de aceitar que os povos indígenas segam realmente consultados sobre os projetos que irão impactá-los e que sejam também envolvidos nas instâncias de tomadas de decisões sobre as “medidas legislativas e administrativas que possam afetá-los diretamente”.

     

    Criminalização, saúde e outros aspectos

     

    A violação dos direitos indígenas no Brasil é preocupante em todos os aspectos de acordo com o último relatório anual do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), divulgado em 30 de junho de 2011, 92 crianças morreram em 2010 devido à falta de cuidados médicos, 60 índios foram mortos e há 152 ameaças de morte. Dos 60 índios assassinados, 34 estavam no estado de Mato Grosso do Sul, onde estão localizados os Guarani Kaiowá.

     

    O atendimento à saúde dos povos indígenas é pobre, a Secretaria Especial de Saúde Indígena, criado em 2010 não consegue funcionar adequadamente e dispõe de uma estrutura insuficiente para promover uma assistência básica de saúde adequada, o mesmo se repete com a Fundação Nacional do Índio (FUNAI) que, apesar da promessa de ter sido reestruturada parta melhorar suas ações nas bases principalmente nos processos fundiário de regularização dos território indígenas ainda não é possível identificar tais mudanças. Na verdade o órgão indigenista passa por um sucateamento proposital da parte do governo justamente para não avanças nos processos de demarcações de terras.

     

    Direitos indígenas

     

    No aspecto dos direitos indígenas estamos a mais de 20 anos esperam que o Congresso Nacional Brasileiro aprove o novo Estatuto dos Povos Indígenas que tramita sob o nº PL 760/2011 que propõe regulamentar os artigos 231 e 232 da Constituição Federal do Brasil que trata dos direitos indígenas. Aguardamos também a aprovação do projeto de lei nº PL 3571/2008 que criação o Conselho Nacional de Política Indigenista (CNPI), que tramita na Câmara dos Deputados. Esses pleitos legislativos não avançam no congresso devido a falta de compromisso do atual governo que na verdade não quer aprovar leis que garantam os nossos direitos devido o interesse de explorar nossos território tradicionais através dos projetos do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC).

     

    Pleitos Legislativos anti indígenas

     

    PEC 215/2000. Em sentido contrário à proteção dos direitos indígenas esperada, foi aprovada em 21 de março deste ano, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, a admissibilidade da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215/00. A PEC tem o propósito de transferir para o Congresso Nacional a competência de aprovar a demarcação das terras indígenas, criação de unidades de conservação e titulação de terras quilombolas, que é de responsabilidade do poder executivo, por meio da FUNAI, do Ibama e da Fundação Cultural Palmares (FCP), respectivamente. A aprovação da PEC 215 – assim como da PEC 038/ 99, em trâmite no Senado, põem em risco as terras indígenas já demarcadas e inviabiliza toda e qualquer possível demarcação futura. O risco é grande uma vez que o Congresso Nacional é composto, na sua maioria, por representantes de setores econômicos poderosos patrocinadores do modelo de desenvolvimento em curso.

     

    Projeto de Mineração PL 1610/1996. A bancada da mineração, integrada por parlamentares da base aliada do governo, tem o propósito de aprovar também, o Projeto de Lei (PL) 1610/96 que trata da exploração mineral em terras indígenas. O texto do relator, ignora totalmente salvaguardas de proteção da integridade territorial, social, cultural e espiritual dos povos indígenas, desburocratiza a autorização da pesquisa e lavra mineral em terras indígenas, com fartas facilidades e condições que permitem o lucro fácil e avolumado das empresas envolvidas. Ou seja, o texto se preocupa apenas, de forma escandalosa, em disponibilizar as terras indígenas e seus potenciais ao capital financeiro-especulativo, principalmente minerador. Cria as condições para a corrida descontrolada, da grande mineração, pelo ouro nos territórios indígenas; decreta o ataque aos povos indígenas isolados ou de pouco contato, ao submeter o seu destino aos princípios da segurança nacional; relativiza ou afasta de forma ridícula a participação do Ministério Público Federal do seu papel de proteger os direitos indígenas; enterra a autonomia dos povos indígenas, ao submeter a sua decisão de não querer mineração à deliberação de uma comissão governamental deliberativa que deverá dizer qual é a melhor proposta para as comunidades, ressuscitando dessa forma o indigenismo tutelar, paternalista e autoritário. Enfim, minimiza o alcance do direito de consulta estabelecido pela Constituição Federal e a Convenção 169 da OIT;

     

    Os povos e organizações indígenas são contrários a este projeto, pelos estragos que poderá acarretar, e reivindicam que o assunto da mineração seja tratado no texto do Estatuto dos Povos Indígenas, discutido e consensuando amplamente pelo movimento indígena com o Governo Federal nos anos de 2008 e 2009.

     

    Medidas administrativas e jurídicas contrárias aos direitos indígenas

     

    O Governo Federal tem publicado nos últimos dois anos uma série de Decretos e Portarias que tem o propósito de inviabilizar a demarcação de terras reivindicadas pelos povos indígenas e a abertura dos territórios e seus recursos naturais à exploração descontrolada por parte de empresas nacionais e do capital financeiro especulativo transnacional. Destacamos entre essas medidas as seguintes:

     

    Portaria 2498/2011 que objetiva a participação dos entes federados (Estados e municípios) no processo de identificação e delimitação de terras indígenas; ao editar esta medida, o governo ignorou o Decreto 1775/96 que institui os procedimentos de demarcação das terras indígenas e que já garante o direito do contraditório alegado para a criação desta Portaria.

     

    Portaria 419/2011, que regulamenta a atuação do órgão indigenista, a Fundação Nacional do Índio (FUNAI), em prazo irrisório, nos processos de licenciamento ambiental, para facilitar a implantação de empreendimentos do Programa de Aceleração do Crescimento – PAC (hidrelétricas, mineração, portos, hidrovias, rodovias, linhas de transmissão etc.) nos territórios indígenas.

     

    Portaria 303/2012, que se propõe “normatizar” a atuação dos órgãos jurídicos da Administração Pública Federal direta e indireta em relação às salvaguardas institucionais às terras indígenas. Atendendo o anseio dos latifundiários e do agronegócio, a Portaria, na verdade, busca estender para todas as terras indígenas as condicionantes decididas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na Ação Judicial contra a Terra Indígena Raposa Serra do Sol (Petição 3.888-Roraima/STF). O Governo editou a Portaria mesmo sabendo que a decisão do STF sobre os embargos declaratórios da Raposa Serra do Sol ainda não transitou em julgado e estas condicionantes podem sofrer modificações ou até mesmo serem afastadas pela Suprema Corte. A Portaria afirma que as terras indígenas podem ser ocupadas por unidades, postos e demais intervenções militares, malhas viárias, empreendimentos hidrelétricos e minerais de cunho estratégico, sem consulta aos povos e comunidades indígenas e à FUNAI; determina a revisão das demarcações em curso ou já demarcadas que não estiverem de acordo com o que o STF decidiu para o caso da Terra Indígena Raposa Serra do Sol; ataca a autonomia dos povos indígenas sobre os seus territórios; limita e relativiza o direito dos povos indígenas sobre o usufruto exclusivo das riquezas naturais existentes nas terras indígenas assegurado pela Constituição Federal; transfere para o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBIO) o controle de terras indígenas, sobre as quais indevida e ilegalmente foram sobrepostas Unidades de Conservação (UCs); e cria problemas para a revisão de limites de terras indígenas demarcadas, que não observaram integralmente o direito indígena sobre a ocupação tradicional.

     

    Petição

     

    Diante da situação a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) vem junto aos Mecanismos de Direito Humanos das Nações Unidas, reivindicar medidas necessárias para um acompanhamento mais rigoroso da situação dos direitos indígenas no Brasil, e sobre tudo da violação desses direitos, talvez permitindo ação conjunta com vários relatores, promovendo, por exemplo, uma missão conjunta com a Comissão de Peritos em Aplicação de Convenções e Recomendações (CEACR), para verificar a aplicação da Convenção 169 da OIT e a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas.

     

    Na oportunidade gostaríamos de sugerir as Nações Unidas que se crie um sistema online de tradução de idiomas para que qualquer seguimento de países membro da ONU que não fala língua oficial também possa fazer suas denuncias como é o nosso caso dos povos indígenas do Brasil.

     

    Confiantes de contar com o vosso apoio e atenção nos despedimos ao mesmo tempo em que dispomo-nos a esclarecer qualquer questão abordada neste documento.

     

    Cordialmente,

     

    Manoel Uilton dos Santos / Indígena do Povo Tuxá

    Pela Diretoria Nacional de Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB

     

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  • 23/11/2012

    Informe nº 1041: Nota de repúdio contra a ação criminosa da Polícia Federal praticada na Aldeia Teles Pires, do povo Munduruku

    O Cimi vem a público manifestar seu veemente repúdio à ação virulenta e assassina praticada pela Polícia Federal, na chamada Operação Eldorado. Usando o pretexto de cumprimento de ordem judicial que determinava a destruição de dragas de garimpos no Rio Teles Pires e de pontos ilegais de mineração, o delegado Antonio Carlos Muriel Sanchez comandou a invasão, no dia 07/11/2012, à Aldeia Indígena Teles Pires, no município de Jacareacanga, estado do Pará. De acordo com depoimentos prestados à 6ª. Câmara do Ministério Público Federal, lá praticaram todo tipo de atrocidades, como espancamentos, assassinato, tentativa de assassinato, destruição de moradias, de escola, posto de saúde, celulares, computadores, aparelho de radiofonia, embarcações de pesca, de transporte e as dragas utilizadas no garimpo. Além disso, os indígenas não estão podendo pescar, pois o rio ficou contaminado pelo combustível que estava nas dragas, destruídas pela Polícia Federal.

     

    Os indígenas Munduruku relataram que, sem nenhuma explicação, o delegado Muriel e policiais federais acompanhados de dois representantes da Funai e Ibama, entraram na aldeia, invadiram casas e destruíram tudo que encontravam pela frente. Os líderes indígenas, na tentativa de estabelecer diálogo foram agredidos, com tapas no rosto e humilhações, sendo que num dos momentos o delegado sacou seu revólver e o apontou para o cacique da comunidade, quando então, um dos indígenas tentou desviar a arma, momento em que o delegado caiu no rio. Ainda, segundo os depoimentos prestados ao MPF, os agentes da Polícia Federal que acompanhavam o delegado, passaram a disparar contra os indígenas, foi quando Adenilson Kirixi recebeu três disparos nas pernas e também caiu no rio. O delegado, que estava na água, também atirou contra o indígena. Seu corpo foi encontrado boiando no rio no dia seguinte. No mesmo instante, helicópteros sobrevoavam a aldeia e jogavam bombas. Outros três indígenas ficaram gravemente feridos e estão internados. Muitas crianças ficaram feridas e em estado de choque, em função da violência, das bombas e dos disparos de balas de borracha.

     

    De acordo com os depoimentos das vítimas, o garimpo que se pratica no Rio Teles Pires é regular, pois vem sendo feito mediante acordos estabelecidos entre os Munduruku, a Funai, o Ministério da Justiça e o Ibama.

     

    Nos depoimentos os Munduruku afirmam que servidores da Funai e do Ibama foram anteriormente à região, na tentativa de convencer a comunidade a dar sua anuência para o estudo de impacto ambiental, tendo em vista a construção de hidrelétricas no Rio Teles Pires. Na ocasião, a comunidade se manifestou, em consonância com as demais comunidades e povos de toda a região, contra tais empreendimentos e informou que não dará nenhum tipo de anuência a estas iniciativas do governo.

     

    Conclui-se, com isso, que a ação criminosa da Polícia Federal não tem relação com a exploração garimpeira, exercida há décadas. Foi sim uma tentativa de intimação e desastrosa demonstração de força do Governo Federal, no intuito de calar a voz de resistência do povo Munduruku, contra a construção do complexo de hidrelétrico previsto para a região do Tapajós.

     

    Na opinião do Cimi, as autoridades públicas responsáveis pelas questões indígena e ambiental devem ser responsabilizadas. São elas: a presidente Dilma Rousseff, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardoso, a presidente da Funai, Marta Azevedo, a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, o presidente do Ibama, Volney Zanardi Junior. Estas autoridades deveriam agir e exercer suas funções com zelo e cuidado no sentido proteger as comunidades, especialmente aquelas que se encontram em situação de risco, como é o caso da comunidade indígena Munduruku, da Aldeia Teles Pires.

     

    O Conselho Indigenista Missionário manifesta solidariedade ao povo Munduruku e exige que medidas sejam adotadas imediatamente, no sentido de garantir a segurança e a proteção aos Munduruku, bem como se preste toda assistência aos feridos e à comunidade que perdeu tudo que tinha no ataque criminoso. É necessário que se garanta acompanhamento médico e sejam levados alimentos para a comunidade.

     

    No entender do Cimi, esse ataque policial criminoso constitui-se em tentativa de genocídio, visto que o poder público avalizou uma ação policial virulenta contra toda uma comunidade indígena, dentro de uma área demarcada pelo Governo Federal.

     

    Brasília, 23 de novembro de 2012.

     

    Cimi – Conselho Indigenista Missionário

    Cimi 40 anos

     

    * Imagens do ataque: Comunidade Mundukuru

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  • 22/11/2012

    O bem viver e a missão

    Em todo rito há uma mescla de mística e de militância, pois o “ser enviado” e o “assumir a missão” supõem uma textura existencial e histórica em que se mesclam fios de mística e urdiduras de militância.

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