• 30/10/2013

    Yvy Katu: comunidade Guarani Ñandeva sofre pressões diante de prazo definido por ruralistas

    Sob a justificativa de protesto pacífico, desde ontem, terça-feira, 29, cerca de 120 ruralistas estão acampados próximos à ponte que dá acesso ao tekoha – lugar onde se é – Yvy Katu, municípios de Japorã e Iguatemi, Mato Grosso do Sul, do povo Guarani Ñandeva. Os ruralistas chegaram ao local na data prometida como limite à adoção de medidas próprias para caso o governo federal não apresentasse proposta concreta (leia aqui) sobre o “litígio de terras” no estado.  

     

    Tal proposta parece não ter chego. Todavia, as comunidades indígenas também aguardam medidas do Poder Público: “Há dez anos que aguardamos a homologação de Yvy Katu. Todo o procedimento demarcatório está completo”, declara Valdemar Guarani Ñandeva. A liderança lembra que este ano o Tribunal Regional da 3ª Região (TRF-3) negou pedido de reintegração de posse de uma das áreas do tekoha. “Não estamos invadindo nada. A terra é de nosso povo”, afirma Valdemar. A presença dos ruralistas, porém, preocupa a comunidade.

     

    A liderança resgata na memória episódio similar ocorrido em 2005, retratado no filme Sementes de Sonhos (assista aqui). Na ocasião, ruralistas e fazendeiros alegaram protesto pacífico na mesma ponte para uma tentativa de expulsão dos Guarani Ñandeva do território. Desarmados, os indígenas tentaram impedir a passagem se posicionando na frente dos fazendeiros, que atiraram ferindo alguns indígenas. Os Guarani Ñandeva iniciaram uma reza e logo após ela ter início uma tempestade de vento e trovões afastou os invasores.

     

    Passados oito anos, a história se repete. Representantes do Ministério Público Federal (MPF) estiveram no local para averiguar a situação. Por enquanto não foram registrados conflitos, mas conforme as lideranças alguns fazendeiros ameaçam adotar medidas para retirar os Guarani Ñandeva de áreas retomadas, localizadas na terra indígena pronta a ser homologada. "Estamos preparados para defender nosso povo e nossa terra", pontua Valdemar.

     

    O governo federal, por intermédio do Ministério da Justiça e da Secretaria Geral da Presidência da República, tenta intermediar esta e outras situações de conflitos no estado através de uma mesa de diálogo, iniciada depois da morte de Oziel Gabriel Terena, pelas mãos da polícia, na Terra Indígena Buriti, em junho deste ano. Por enquanto, não há resultados objetivos, tanto no sentido de indenizar ocupantes de boa-fé de terras indígenas, quanto de garantir tais terras tradicionais aos povos indígenas.       

     

    Histórico

     

    Cerca de 30 famílias Guarani Ñandeva retomaram no último dia 14 de outubro parte da Terra Indígena Yvy Katu, no município de Japorã (MS), fronteira com o Paraguai. No mesmo local, pouco mais de uma semana antes cerca de 30 famílias ocuparam outra área de 600 hectares, abandonada pelos proprietários há ao menos quatro anos, mas fora da posse dos indígenas. Com processo de demarcação praticamente finalizado – os marcos físicos que limitam a área já foram fixados – eles aguardam há 10 anos que a presidência da República assine o decreto de homologação da terra.

     

    Iniciada há 29 anos, a demarcação da Terra Indígena Yvy Katu, na qual Porto Lindo está incorporada, foi interrompida diversas vezes por recursos judiciais. Em 2003, para pressionar o governo e o judiciário, os indígenas realizaram a primeira retomada de seu território tradicional, expulsando não-indígenas de 14 diferentes fazendas na área reivindicada.

    Em junho de 2005, o Ministério da Justiça editou uma portaria declarando a terra como de posse permanente do grupo, com área de 9,4 mil hectares. A demarcação física já foi realizada, faltando apenas a homologação pela Presidência da República, ato final da demarcação. Os indígenas ocupam, atualmente, 10% do total da área demarcada, por força de decisão judicial.

    Em março deste ano, a Justiça considerou nulos os títulos de propriedade incidentes sobre a Terra Indígena Yvy Katu, atestando a validade do processo demarcatório da área.

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  • 29/10/2013

    Organizações visitam a Serra do Padeiro em solidariedade aos Tupinambá

    Cerca de 50 pessoas, representantes de diversas organizações regionais, estaduais e nacionais estiveram em visita, no último sábado, 26, na aldeia Serra do Padeiro, do povo Tupinambá de Olivença, na Bahia. A visita teve o caráter de prestar solidariedade e tomar conhecimento da luta deste povo por suas terras tradicionais. Entre as organizações, ao menos seis são ligadas aos pequenos agricultores, além da Associação dos Juízes Pela Democracia (AJD).   

    As entidades presentes se solidarizaram com a comunidade e externaram suas preocupações diante do quadro de perseguição e calunias que vem ocorrendo na região, em especial nas cidades de Buerarema e São José da Vitória. As entidades ligadas aos trabalhadores rurais presentes na visita (CETA, MLT, CPT, AATR, Polo Sindical, Central de Cooperativas do Litoral Sul) colocaram a necessidade de esclarecer aos pequenos produtores todo este processo de demarcação para que eles percebam que o inimigo deles não são os Tupinambá, mas sim os governos Federal e Estadual, que se omitem de cumprirem seus papeis. Sendo assim, que juntos, indígenas e trabalhadores rurais, possam lutar pela garantia de seus direitos sem que se deixem ser usados.

    Na oportunidade, o cacique Rosivaldo Ferreira relatou a luta de seu povo para os presentes e todo o processo de criminalização que vem sofrendo a comunidade Tupinambá. Desde os ataques psicológicos até os mais cruéis e silenciosos, potencializados por meios de comunicação ligados ao latifúndio regional.

    Cacique Babau, como é chamado pelos Tupinambá, colocou que este processo vem se repetindo ao longo da história, citou como exemplo a luta do seu parente Marcelino José Alves, conhecido por Caboclo Marcelino, que na década de 1920 foi perseguido de forma violenta por defender o direito de seu povo. Ambos, Marcelino e Babau, foram chamados de “Lampião do sul da Bahia”. Babau finalizou afirmando que esta luta não começou agora e ele não é o primeiro a ser perseguidor e criminalizado.

    O cacique Babau foi categórico ao afirmar que a culpa de toda esta situação de violência e insegurança estabelecida na região é do governo federal, em especial do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, que não cumpre o seu papel e tenta enganar a todos com “conversa mole”. “O que todos nós precisamos é que ele assine a Portaria Declaratória e dê continuidade ao processo de demarcação devolvendo a nossa terra e garantindo os direitos dos pequenos agricultores”, falou o cacique.

     Os visitantes ainda tiveram a oportunidade de conhecer um pouco da aldeia Serra do Padeiro, sua organização, desfrutar de um delicioso almoço e no período da tarde conhecer mais uma obra inacabada do governo dentro da aldeia, uma ponte que em muito facilitará o escoamento da produção dos Tupinambá. A ponte está pronta faltando apenas as cabeceiras.

    As lideranças Tupinambá da aldeia Tucum entregaram à comitiva um extenso dossiê sobre a situação do povo Tupinambá. As reuniões tiveram como objetivo perceber “in-loco” a real situação estabelecida no sul da Bahia, e, a partir deste olhar e conversas, definir ações da AJD que possam vim a contribuir para a resolução deste grave problema. Estavam presentes, inclusive em relatos sobre o que viram em três dias de visitas, a juíza Drª Kenarik Boujikian, presidenta da AJD, Drº Reno Viana, coordenador da AJD na Bahia, Drº André Bezerra, conselheiro da AJD, Drº Naum Leite, advogado da comissão de Direitos humanos da OAB da Bahia e representando o Conselho Federal da OAB. Além de Isaac e Marcos Rocha, ambos da Articulação dos Conselhos da Comunidade da Bahia e D’Almeida, repórter fotográfico, o Ministério Público Federal, Dom Mauro Montagnoli, bispo de Ilhéus, Dom Ceslau Stanula, bispo de Itabuna, Drº Victor Cretella e Drª Maysa Pomponet, juízes federais de Itabuna, Polícia Federal, Força Nacional e o Conselho Indigenista Missionário (Cimi).  

    Fizeram-se presente na visita: Associação Juízes para a Democracia (AJD), Associação de Advogados de Trabalhadores Rurais (AATR), Associação para o Resgate Social (ARES), Associação de Docentes da Universidade de Santa Cruz (Adusc), Centro de Estudo, Pesquisa e Desenvolvimento do Extremo Sul da Bahia (Cepedes), Comissão Pastoral da Terra (CPT), Conselho Indigenista Missionário (CIMI), Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), Central de Cooperativas do Litoral Sul, Pastoral da Juventude (PJ), Pastoral da Criança, Articulação de Políticas Públicas da Bahia (APP), Missionárias Agostinianas Recoletas (MAR), Federação de Órgãos para assistência social e educacional (FASE), Levante Popular da Juventude, Movimento de Mulheres em Luta (MML), Movimento de Luta pela Terra (MLT), Coordenação Estadual dos Trabalhadores Acampados, Assentados e Quilombolas (CETA), Centro de Agroecologia e Educação da Mata Atlântica (OCA), Coletivo dos Alfabetizadores Populares da Região Cacaueira (Caporec), Escola Agrícola Comunitária Margarida Alves (EACMA), Movimento Negro Unificado (MNU), Polo Sindical de Itabuna,  Conselho da Comunidade Para Assuntos Penais da Comarca de Vitória da Conquista, Conselho de Cidadania Permanente, Ordem dos Advogados do Brasil (Conselho Federal), Fórum de Educação no Campo, Assessoria do Deputado Yulo Oiticica,  Estudantes e religiosos.

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  • 29/10/2013

    TRF1 suspende licença de Belo Monte e pagamentos do BNDES e manda parar a obra

    Na última sexta, 25, o desembargador Antonio de Souza Prudente, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), deferiu nova liminar para uma das Ações Civis Publicas (ACP) do Ministério Público Federal (MPF) contra Belo Monte. A decisão volta a paralisar as obras da usina, bem como desautoriza o BNDES a fazer repasses financeiros à hidrelétrica antes do cumprimento de condicionantes sociais e ambientais.

    Em decisão monocrática, Souza Prudente acatou a nona ACP do MPF, que denuncia que condicionantes da Licença Prévia não haviam sido cumpridas antes da emissão da Licença de Instalação, que autorizou o início das obras ilegalmente.

    Na notificação enviada ao Ibama, responsável pelo licenciamento irregular, o desembargador defere, liminarmente, o pedido de antecipação de tutela recursal formulado pelo MPF, “para determinar a imediata suspensão do licenciamento ambiental e das obras de execução do empreendimento hidrelétrico UHE Belo Monte, no Estado do Pará, até o efetivo e integral cumprimento de todas as condicionantes estabelecidas na Licencia Previa 342/2010, restando sem eficácia as Licenças de Instalação e as Autorizações de Supressão Vegetal – ASV já emitidas ou que venham a ser emitidas antes do cumprimento de tais condicionantes, e ordenar ao BNDES que se abstenha de repassar qualquer tipo de recurso (ou celebrar qualquer pacto nesse sentido) enquanto não cumpridas as aludidas condicionantes”.

    O desembargador também estabeleceu uma multa ao Ibama de R$ 500 mil por dia de atraso no cumprimento desta decisão.

    Descumprimento

    Apesar da ordem judicial, de acordo com trabalhadores de usina e moradores de Altamira, a Norte Energia, responsável por Belo Monte, não paralisou os trabalhos nos canteiros nesta segunda, 28. A vários jornalistas que procuraram a empresa pela manhã, a assessoria da Norte Energia afirmou que esta não teria recebido a notificação do TRF1.

    Já o Tribunal garante que a notificação foi expedida às 9:00h da manhã. As 11:14h, a secretária executiva da empresa enviou ao TRF1 fax acusando o recebimento do documento, fato deliberadamente omitido à imprensa. Deliberada também foi a decisão de descumprir a ordem da Justiça e dar continuidade aos trabalhos em Belo Monte.

    Clique aqui para ler a íntegra da decisão do TRF1

     

     

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  • 29/10/2013

    Direitos são garantidos para povos da Terra Indígena Raposa Serra do Sol

    Por Maurício Hashizume,

    de Roraima

    Mais de mil pessoas de diversos povos de Roraima se reuniram na comunidade do Barro, região do Surumu, na Terra Indígena Raposa Serra do Sol, nesta quarta-feira (23), para reafirmar a relevância do cumprimento dos direitos indígenas, enquanto o Supremo Tribunal Federal (STF) se reunia para julgar os embargos de declaração relativos à decisão do mesmo tribunal que, em 2009, garantiu a homologação em área continua da reserva.

    Lideranças e participantes do ato público comemoraram a posição da Corte no que se refere à manutenção da integridade do território indígena, conquistado ao longo de décadas de luta, e à limitação das 19 condicionantes – incluídas na sentença de 2009 e contestadas por comunidades indígenas e pela Procuradoria-Geral da República (PGR) ao caso específico da Raposa Serra do Sol. Ao menos do ponto de vista jurídico, tal desvinculação afasta a aplicação de medidas consideradas restritivas à garantia de direitos de povos de outras áreas. A extensão das 19 condicionantes a outros casos de demarcação foi prevista na Portaria 303/2012, da Advocacia-Geral da União (AGU), que insiste em sinalizar com o instrumento (ora suspenso), mesmo diante do revés sacramentado pelos membros da Corte maior do país.

     

    “O saldo é positivo. Além de descartar a vinculação do caso específico da Raposa Serra do Sol para outras demarcações, o julgamento no STF acabou esclarecendo algumas questões importantes”, comentou a advogada Joenia Batista de Carvalho, da etnia Wapichana, que atua no departamento jurídico do Conselho Indígena de Roraima (CIR). “Para o contexto atual em que setores antiindígenas têm exibido a força de seus interesses, especialmente no Congresso Nacional, o julgamento foi um passo importante na linha da defesa de direitos indígenas”. Saiba mais sobre a que é considerada a maior ofensiva contra indígenas em 25 anos.

     

    Entre os pontos reforçados no decorrer do julgamento da Petição 3388, Joenia destaca a referência feita pelo ministro relator Luís Roberto Barroso, que teve o voto majoritariamente acatado pelos pares no STF, no sentido de que – a despeito da revalidação do conjunto de condicionantes que referendam o “princípio de soberania nacional” (especialmente nas áreas de defesa nacional, energia e meio ambiente) acima da posição das comunidades – não se deve “fugir” da consulta aos povos indígenas prevista na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

     

    Além disso, emenda a advogada do CIR à Repórter Brasil, o julgamento do STF realçou a prerrogativa do Poder Executivo quanto às demarcações de Terras Indígenas (TIs), inclusive abrindo a possibilidade de que a União promova ampliações por outros meios, como desapropriações. Para o relator, apenas o procedimento peculiar de demarcação de terras decorrente de elaboração de laudos antropológicos não deve ser refeito, com vistas a evitar “perene instabilidade jurídica”.

     

    Joenia e outros integrantes do CIR que acompanharam o julgamento em Brasília (DF) seguiram diretamente para a comunidade do Barro para transmitir o relato da decisão no STF e prestar esclarecimentos à multidão reunida há pelo menos dois dias no principal ponto de acesso à Raposa Serra do Sol, mesmo local em que a demarcação em área contínua foi comemorada.

     

    Manifestações

     

    A reportagem acompanhou a manifestação no Surumu, nesta quarta-feira (23), que reuniu um grande número de lideranças (conhecidos como “tuxauas”) da região, assim como amplos coletivos de jovens estudantes indígenas. O professor local macuxi Evaldo Silva Alves empunhou o microfone para denunciar os seguidos ciclos econômicos que impulsionaram invasões ao território indígena – do início da colonização às “fazendas reais” que introduziram a pecuária extensiva nos idos de 1850, do espalhamento das atividades do garimpo (1940) à intensificação do agronegócio dos largos monocultivos de arroz (1990). “Todos com muita violência, dominação e aculturação, de modo predatório aos modos de vida indígenas.”

     

    Daí que, segundo ele, é preciso resistir contra as ofensivas correntes que visam enfraquecer os direitos indígenas, que incluem não apenas as 19 condicionantes – rechaçadas pelos movimentos -, mas a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215, que transfere a prerrogativa das demarcações ao Congresso Nacional; e a Proposta de Lei Complementar (PLP) 227, que busca viabilizar explorações econômicas dentro de terras indígenas.

     

    Ao longo do dia até à noite, foram feitos discursos e realizadas apresentações culturais que sublinharam a história de luta das comunidades locais, a importância de mais uma “batalha vencida” com alguns dos posicionamentos principais após o julgamento do STF e, sobretudo, a necessidade de manter a “chama acesa” das mobilizações contra as ameaças que seguem preocupando os povos indígenas não apenas de Roraima, mas de todo o Brasil.

     

    O repúdio às mesmas iniciativas também se repetiu em debate realizado na última terça-feira (22), durante a Reunião do Conselho Local de Saúde da Região das Serras, também acompanhado pela Repórter Brasil. Mais de uma centena de conselheiras e conselheiros questionaram, entre outros itens, as razões pelas quais o Estado brasileiro teria ratificado a Convenção 169 da OIT, uma vez que não parece estar disposto a promover, de fato, consultas livres e informadas acerca de empreendimentos que afetam os povos indígenas.

     

    Quanto à gestão das áreas de conservação, por exemplo, defenderam a atuação das próprias comunidades em detrimento da intervenção do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), conforme propugna parte das condicionantes aceitas pelo STF.

     

    Coordenadora de mulheres do Maturuca e integrante do conselho local, Elenia Maria de Souza cobrou a aprovação do Estatuto do Índio que, diferentemente das propostas que desagradam os povos e tramitam pelos Parlamentos, está parado. “Muitas questões importantes para o nosso movimento indígena estão lá”.

     

    Os participantes condenaram ainda a tentativa de campanhas antiindígenas de associar a Raposa Serra do Sol à miséria e à fome. O suposto quadro de extrema vulnerabilidade e carência social – propagado por determinados veículos da imprensa regional e nacional, e inclusive repetido pelos ministros Marco Aurélio Mello e Gilmar Mendes no decorrer do referido julgamento – contrasta com a ampla e variada produção atestada pelos indígenas. Tal caracterização tem por finalidade, segundo as conselheiras e conselheiros locais reunidos no Centro Maturuca, depreciar a imagem indígena e “justificar” perversos preconceitos.

     

    “O homem branco faz tantas leis que ninguém entende mais qual é a que ampara as pessoas. Fazem leis que deixam de servir de uma hora para outra. E criam outras novas. Ninguém sabe qual é”, avalia o “tuxaua” macuxi Orlando Pereira, que também já foi pajé na comunidade Uiramutã. “A nossa lei é a da vida de cada dia. Precisamos de terra e de meios para garantir plenamente as nossas vidas. Vamos respeitar os povos indígenas. Não aceitamos humilhação”.

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  • 28/10/2013

    Indígenas, quilombolas e organizações denunciam violações aos direitos humanos em Washington, Estados Unidos

    Vítimas de violações de direitos, que representam os indígenas Guarani Kaiowá e o Quilombo Brejo dos Crioulos, apoiadas por organizacões de direitos humanos, participarão de audiência da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, em Washington (EUA), nesta terça-feira, 29, às 11 horas (horário de Brasília), sobre a situação dos defensores de direitos humanos no Brasil. A Audiência poderá ser acompanhada ao vivo pelo site da Organização dos Estados Americanos (OAS). Na foto ao lado, túmulo de criança Guarani Kaiowá atropelada em acampamento indígena às margens de rodovia no Mato Grosso do Sul.  

    Genito Gomes, liderança Guarani Kaiowá do Mato Grosso do Sul e José Carlos Oliveira Neto, presidente da Associação Quilombola de Brejo dos Crioulos, darão depoimentos sobre as ameaças e intimidações de que são vítimas devido a luta em defesa do direito ao território. Estes dois casos representam a situação histórica de violações aos direitos dos povos e comunidades tradicionais no Brasil. As organizações apoiadoras presentes são: Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Fian (Nacional e Internacional) e Justiça Global.    

    A liderança Guarani Kaiowá, Genito Gomes, da comunidade de Guayviry, situada no município de Aral Moreira (MS), que fica na fronteira com o Paraguai, também prestará depoimento. Nisio, seu pai, foi assassinado em 18 de novembro de 2011, quando a comunidade foi atacada  por um grupo armado, envolvendo produtores rurais, advogados, organização sindical, políticos locais e empresa de segurança privada. Sobre este fato, está em trâmite Ação Penal na Justiça Federal de Ponta Porã, porém sem punição aos responsáveis apontados por inquérito do Ministério Público Federal (MPF). 

     

    A comunidade de Guayviry, além de não ter acesso ao território, condição básica para realização do direito humano à alimentação adequada, não tem acesso à água potável,  pois a água do rio que abastece a comunidade está contaminada por agrotóxicos das plantações. A comunidade não tem acesso à educação, pois sem o território  regularizado o município alega não ter o dever de prestar atendimento educacional. De igual forma, o atendimento à saúde com qualidade não é provido, e os indígenas vivem a mercê de “pistoleiros” contratados, visto que a localização geográfica é local oportuno para o trabalho de pistolagem (fronteira com Paraguai).

     

    Quilombolas

     

    José Carlos de Oliveira Neto há 14 anos luta junto com a comunidade pela garantia do direito ao território, e desde então vem sofrendo ameaças e intimidações por parte de milícias a mando de fazendeiros. O quilombo de Brejo dos Crioulos, localizado no norte do Estado de Minas Gerais, é composto por cerca de 503 famílias que reivindicam o território que lhes foi sendo expropriado. As famílias quilombolas vivem em pequenas áreas que não garantem os direitos básicos das famílias, em especial à alimentação adequada.

     

    “A audiência nos permitirá informar a Comissão o conflito agrário Brasil, em especial aos que se referem aos povos e comunidades tradicionais,  homologação de territórios. (As ameaças) estão se intensificando devido a demora nos processos de titulação dos territórios. Este fato gera um choque entre o modelo de desenvolvimento enconômico, baseado na expansão de monocultivos, que grila terras e a resistência dos povos e as comunidades tradicionais que estão mobilizados na defesa de seu direito ao território”, afirman as organizações que participarão na audiância.

    As mesmas organizações ressaltam: "Devido a luta para garantir o acesso aos seus territorios ancestrais, estes povos tradicionais vem sofrendo uma série de ameaças e violências que tentam ser reparadas pelo Estado através de seus programas de proteção de defensores de direitos humanos. Os programas atuam nos casos de Genito e José, respectivamente aqueles organizados em nível federal e estadual, porém não tem sido capazes de dar a resposta necessária. Além do sucateamento que vem sofrendo nos últimos anos, os programas de proteção tem apresentado uma dificuldade em tratar o problema de fundo, sem o qual o risco não cessará. Problemas com seu lado mais operacional, como disponibilização de escolta, também tem sido constantemente relatados."

    Contatos:

    CIMI – Flávio Vicente Machado, Coordinador Regional del Conselho Indigenista Missionário (en Mato Grosso do Sul: +(67) 33845551/33845551 cimims@terra.com.br

    Justiça Global  – Eduardo Becker: +55 21 2544 2320, eduardo@global.org.br

    FIAN Brasil – Jônia Rodrigues, Coordenadora do Programa de Seguimento de Casos de Violação ao Direito Humano à Alimentação Adequada: + 55 62 30924611 /81309943 jonia@fianbrasil.org.br

    FIAN Internacional – Angélica Castañeda Flores, Coordenadora do Programa para América Latina de FIAN Internacional: +4962216530042 castaneda-flores@fian.org

    Por favor una-se a nosso chamado para exigir que as autoridades Brasileiras não aprovem as propostas de lei retrocederão os direitos humanos básicos dos povos indígenas e comunidades tradicionais no Brasil assinando a petição disponível aqui.

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  • 28/10/2013

    AGU quer tratorar decisão sobre demarcação de terras

    Por Marcelo Zelic

    Nem bem assentou a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Luís Adams, Advogado-Geral da União já retomou a ofensiva para implementar a portaria 303 da AGU, tal qual deseja a bancada ruralista. Ele sequer deu tempo para que a sociedade e o Estado brasileiro reflitam em seus outros poderes o decidido pelo STF na demarcação da Raposa Serra do Sol e suas implicações para os direitos humanos no Brasil.

    O STF definiu pela não vinculação das 19 condicionantes deste caso a outros processos de demarcação de terras indígenas. Afinal, são 241 povos existentes no Brasil, cada qual com suas situações específicas, não só cultural, mas também territorial, pois viveram em épocas diversas e de distintas formas os processos de violência e esbulho de suas terras, sendo este um processo permanente no Brasil.

    Ao reconhecer a diversidade e individualidade destes povos, a Justiça brasileira se expressou a favor de um conceito plural de evolução em sociedade, reafirmando por ampla maioria, que apesar de atípica, a decisão levou em conta também o dever, enquanto nação, de nos relacionarmos povo a povo para construir um ambiente de respeito às garantias constitucionais dos indígenas brasileiros e a demarcação de suas terras.

    Os Pataxó na Bahia, por exemplo, tiveram duas aldeias inteiras exterminadas com a inoculação proposital do vírus da varíola, fato denunciado no Relatório Figueiredo de 1968. Em 1988, as terras eram fazendas, cuja origem violenta nunca foi apurada, apesar das denúncias publicadas em jornais da época apontarem políticos de grandes patentes como beneficiários do ocorrido, onde até chegou-se a falar em genocídio.

    O mesmo Estado brasileiro que realiza a Comissão Nacional da Verdade e as caravanas da Anistia não deveria tratar a questão indígena de forma a educar a sociedade, deixando-a mais aberta e receptiva aos direitos indígenas? Sendo todos iguais perante à lei não é correto reconhecer o igual direito à reparação dos Pataxó por terem sofrido violência praticada pelo Estado para a tomada de suas terras?

    Além da questão do direito originário às terras do povo Pataxó, é somado o dever de reparação por parte do Estado, o que demonstra o acerto do voto do ministro Luís Roberto Barroso, do STF, que aponta como o caminho de efetivação da justiça o cuidar de cada caso sem pasteurizar cada situação como defende o ministro da AGU na portaria 303.

    O ministro Luís Adams, em matéria publicada no G1, expressa a posição do governo Dilma? Ou é uma posição pessoal, parcial e açodada? Diz ele:

    “[A decisão] reforça a portaria da AGU. O que a portaria é, é uma orientação técnica do advogado-geral à área jurídica dizendo que, na interpretação da norma constitucional, na aplicação da norma constitucional, nós temos que observar as condicionantes. Então, em todos os casos que venham à análise do advogado-geral, ou do advogado público ou do procurador, ao atuar nos casos, eles têm que observar o precedente, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que, aliás, é a regra geral. Nós fazemos isso em todos os casos”, explicou Adams.

    A portaria 303 da AGU já foi motivo de muito protesto por índios e não-índios. Muitos povos indígenas têm se manifestado nos últimos meses em Brasília, enquanto terras indígenas são retomadas em vários estados, buscando encerrar a demorada definição judicial de suas demarcações.

    Se o Ministério da Justiça desmarcou uma reunião no Senado onde discutiria a questão das demarcações de terras indígenas, para aguardar a decisão do STF, por que o ministro Luís Adams estica a corda desta forma tão logo terminou o julgamento da Raposa Serra do Sol?

    Fazendo coro ao ministro Adams contra os direitos indígenas, o senador Ruben Figueiró (PSDB-MS) publicou em seu site que:

    “a chula desculpa para não comparecer ao debate na Comissão de Agricultura do Senado seria aguardar a decisão do Supremo Tribunal Federal a respeito dos embargos declaratórios à Reserva Raposa Serra do Sol, em Roraima.”

    E segue destilando ameaças ruralistas ao governo:

    Os produtores rurais assinalaram aguardar pela ação governamental apenas até o final de novembro. Decepcionado, repito, com a fuga do ministro da Justiça da audiência no Senado para discutir o impacto das demarcações de terras indígenas na agricultura brasileira, a minha esperança é a de que a Presidência da República, pelas posições que sempre acreditei da ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, e do ministro Gilberto Carvalho, puxe a orelha do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo. A não ser – o que não creio – que o governo deseje a contundência de um conflito fundiário entre brasileiros índios e não índios [grifos em negrito são meus].

    Se houver coerência na palavra da ministra Gleisi Hoffmann, da Casa Civil da Presidência da República, a portaria 303 da AGU não deverá ser reapresentada, uma vez que em 05/08/2013 em audiência no Congresso, ela afirmou que, apesar da ansiedade, adotaria as condicionantes conforme decidido no STF:

    “Todos aguardamos com ansiedade as decisões do Supremo Tribunal Federal, índios e não índios, mas todos os brasileiros com responsabilidades devidas em relação ao futuro do país. Foi esse entendimento que fez com que o governo, ao buscar alinhamento jurídico nas ações dos advogados nas questões indígenas, optasse por adotar as condicionantes depois e conforme a decisão do Supremo” [grifos em negrito são meus].

    O ministro Luís Roberto Barroso em seu voto, acompanhado pela maioria do STF, assentou: “a decisão proferida não vincula juízes e tribunais quando do exame de outros processos relativos a terras indígenas diversas’. Assim cai a portaria 303 da AGU como procedimento padrão. É conforme esta decisão que deve se pautar a Casa Civil e a Secretaria Geral da Presidência, afastando os ímpetos tratorísticos da Advocacia Geral da União.

    A demarcação das terras e sua desintrusão, a recuperação das áreas degradadas, o respeito à consulta prévia aos índios e às suas posições quanto ao desenvolvimento de projetos e mineração em suas reservas, o respeito à cultura e o manejo sustentável de suas terras, bem como a reparação das violências do passado (sendo alguns casos objeto de estudo na Comissão Nacional da Verdade), são atitudes que proporcionam e estimulam a sociedade a avançar na democratização do país, a respeitar os direitos indígenas.

    O voto do ministro Barroso valoriza essas atitudes, que convergem para o fortalecimento da democracia, quando, por exemplo, esclarece que “não se pode confundir a mineração como atividade econômica com formas naturais praticadas nas quais a coleta se configura um modo de vida”.

    Já o campo ruralista busca protelar as demarcações, para sobrepor o direito de propriedade aos direitos originários dos povos indígenas, apresentando cenários de conflito violento entre as partes, chantageando o governo através de prazos — final de novembro–, quando ocorrerá o esgotamento do limite da paciência ruralista, conforme dito pelo Senador Figueiró, tentando impor o medo e a desestabilização do Congresso por meio da obstrução da pauta, uma lógica de solução dos problemas inadequada a uma democracia e muito distante do que foi proferido no plenário do STF.

    A solução do conflito é cumprir a Constituição, é expandi-la para a prática de suas leis na sociedade, de modo a educar os brasileiros e as brasileiras ao respeito à diferença. Assim, demarcar o quanto antes as terras indígenas é reafirmar direitos, é fortalecer direitos humanos e democracia, por isso é a forma de enfrentarmos de forma cidadã este problema.

    Há um mês o Instituto Socioambiental (ISA) publicou artigo em que abre algumas gavetas do governo:

    O governo federal mantém parados 21 processos de demarcação de Terras Indígenas (TI): 14 aguardam a assinatura de decreto de homologação pela presidenta Dilma Rousseff e outros sete a portaria declaratória do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo. As áreas somam quase dois milhões de hectares.

    Três destas áreas estão na Bahia, uma delas do povo Pataxó. Demarcá-las de forma simultânea — só falta o ato de assinatura das autoridades brasileiras– é promover mecanismos de não repetição, é educar a sociedade a não matar índio para tomar suas terras, que esta população tem direito igual de existir e usar a terra de forma diferente do que a que usamos como agricultura. E é, fundamentalmente, efetivar a reparação deste passado sombrio.

    O governo tem a faca e o queijo para continuar a deslocar o eixo deste conflito para a legalidade. E, como mostra artigo publicado no Correio Brasiliense, recursos em caixa para essas demarcações existem. Se forem usados, será um grande avanço para a superação destes conflitos:

    “Dos R$ 89 milhões previstos no orçamento da Fundação Nacional do Índio (Funai) para demarcação e regularização de terras indígenas no país este ano, menos de 10% saíram dos cofres até agora. Apenas R$ 7,3 milhões foram efetivamente pagos, já considerando os restos a pagar (empenhos de anos anteriores quitados no atual exercício). Embora os recursos destinados a resolver problemas fundiários que envolvem essas comunidades tenham aumentado quase seis vezes este ano em relação a 2012 — quando o montante foi de apenas R$ 16,9 milhões —, a lentidão na execução das ações se reflete na crise atual da política indigenista brasileira.”

    Reapresentar a portaria 303 da AGU, como quer o ministro Adams, ceder à bancada ruralista como “exige” o senador puxador de orelhas ou manter na gaveta a demarcação destas 21 terras, enfraquecerá mais ainda os direitos humanos no Brasil, que vive de vitórias efêmeras, como a proibição de uso de balas de borracha em manifestações públicas e despejos, que não durou um mês e meio nos estados do Rio de Janeiro e São Paulo e sequer a portaria da Secretaria de Direitos Humanos chegou a ser aplicada nos demais estados da federação. É preciso efetivar os direitos originários dos povos indígenas do Brasil e desligar o trator da portaria 303 da AGU.

    A questão indígena, pela fragilidade histórica desta população em ter seus direitos reconhecidos em nossa sociedade, é a régua que mede a situação e os rumos do respeito aos direitos humanos no Brasil. Dependendo do caminho que o governo decidir seguir, poderemos ter décadas de lutas e avanços colocados de lado.

    Marcelo Zelic é vice-presidente do Grupo Tortura Nunca Mais-SP e membro da Comissão Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo. Coordenador do Projeto Armazém Memória.

    Fotomontagem de Marcelo Zelic

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  • 28/10/2013

    O retorno à terra dos Tupinambá

    “O velho João, meu sogro, cansou de dizer: ‘Aqui nessa região ainda vem época de o rico desejar ser pobre’. Porque, quando viesse a vassoura-de-bruxa, os ricos iam perder tudo e os pobres já não tinham nada mesmo”, diz dona Maria da Glória de Jesus, mulher do pajé da aldeia Tupinambá de Serra do Padeiro, aludindo à derrocada da cacauicultura, que dominou o sul da Bahia até o final da década de 1980. “Deus mandou a bruxa para poder salvar o pobre. Só fala que foi desgraça quem não conhece da terra, quem não quer viver na terra. Porque o pobre, de primeiro, era pisado, tinha que trabalhar ali e se matar. E pobre não tinha direito de terra. Se fosse no tempo em que não tinha a vassoura-de-bruxa, os índios estavam se apoderando de terra? Uma peste que estavam! Ô, meu Deus, os ricos mandavam matar tudo!”

    A reorganização dos índios Tupinambá – que tiveram seus antepassados aldeados, a partir de 1680, na redução jesuítica de Nossa Senhora da Escada (hoje Olivença, distrito de Ilhéus) – coincide, de um lado, com a decadência dos coronéis de cacau e, de outro, com o início de uma nova etapa, inaugurada pela Constituição Federal de 1988, que passou a reconhecer os direitos territoriais indígenas. A análise de dona Maria é perspicaz. Apesar de enfraquecidos, contudo, filhos e netos dos coronéis de outrora vêm juntando forças com outros setores da elite regional – em especial, o turístico –, para inviabilizar a reparação das injustiças historicamente cometidas contra os Tupinambá.

    Recentemente, o emprego de métodos que remontam ao tempo do cacau, como a contratação de jagunços e a realização de tocaias, intensificou-se. Na noite de 14 de agosto, os estudantes da Escola Estadual Indígena Tupinambá Serra do Padeiro voltavam para suas casas quando um balaço acertou o para-brisa do caminhão em que viajavam. Ninguém foi atingido pelo disparo, mas os estilhaços de vidro feriram Lucas Araújo dos Santos, 18 anos, e Rangel Silva Calazans, 25, no rosto e no peito. O ataque ocorreu em represália à realização de uma série de “retomadas de terras” (ações de recuperação, pelos indígenas, de áreas por eles tradicionalmente ocupadas e que se encontravam em posse de não índios) entre junho e agosto.

    O processo de demarcação da Terra Indígena (TI) Tupinambá de Olivença – que se estende por cerca de 47 mil hectares, abarcando porções dos municípios de Buerarema, Ilhéus e Una – teve início em 2004. Vivem na área cerca de 4,7 mil indígenas. Todas as contestações à demarcação foram indeferidas e não restam dúvidas sobre a tradicionalidade da ocupação indígena. Contudo, descumprindo os prazos estabelecidos legalmente, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, ainda não assinou a portaria declaratória da TI, para que o processo então se encaminhe para as etapas finais, incluindo o pagamento das indenizações devidas aos ocupantes não indígenas e o reassentamento daqueles que têm perfil de cliente da reforma agrária. O governador Jacques Wagner, por sua vez, tem prestado declarações ecoando os argumentos da elite regional, que tenta convencer a opinião pública de que a demarcação provocará uma “tragédia” de grandes proporções.

    Os dias que se seguiram à emboscada contra o veículo escolar foram marcados por protestos violentos no município de Buerarema, organizados por indivíduos e grupos contrários à demarcação. Imagens veiculadas pela imprensa regional mostram veículos de órgãos públicos como a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai/MS) e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) sendo retidos e incendiados pelos manifestantes. Apesar de a Força Nacional de Segurança ter sido deslocada para a área, os ataques persistiram: prédios públicos foram depredados e, no dia 24 de agosto, indígenas tiveram suas casas incendiadas. Na imprensa local, os Tupinambá são apresentados como “criminosos que se dizem índios”. Em um editorial publicado no final de agosto, lê-se: para frear a ameaça indígena, “só restam as armas”.

    Para o Procurador da República em Ilhéus, Ovídio Augusto Amoedo Machado, “a conclusão do processo demarcatório é essencial para a pacificação da região, pois trará segurança jurídica para ambas as partes”. O Ministério Público Federal comprometeu-se a buscar meios para acelerar sua conclusão, bem como a instaurar investigações para apurar a autoria dos ataques contra os Tupinambá. Uma campanha pela urgente conclusão do processo demarcatório, incluindo uma petição online, foi lançada em agosto. Na ocasião, dezoito pesquisadores que desenvolveram estudos acerca dos Tupinambá, junto a diferentes universidades, divulgaram uma carta pública, enfatizando que apenas a conclusão da demarcação fará cessar o conflito territorial.

    Uma orelha pregada na parede. Nas décadas de 1920 e 30, lê-se nos jornais da época, o “bando” comandado por um “criminoso perigosíssimo e hediondo” esteve à solta no sul da Bahia. Após sucessivos confrontos com a polícia, seu líder foi preso e, em 1937, desapareceu. Tratava-se de Marcellino José Alves, indígena que, junto a alguns companheiros, mobilizou-se para tentar barrar a penetração de não índios em suas terras, no que ficou conhecido como o “levante do caboclo Marcellino”, um dos muitos episódios de resistência territorial levados a cabo pelos Tupinambá.

    Quando procuravam Marcellino, certa noite, os policiais invadiram um sítio habitado por três indígenas – os irmãos Flaviano, Lourenço e Rufino – e suas famílias. Para que informassem o paradeiro do “bando”, os irmãos foram amarrados, açoitados com varas e interrogados. Os filhos menores de Rufino foram poupados, mas os dois mais velhos, Estelina Maria Santana e seu irmão Pedro, levaram uma surra de bainha de facão. Estelina morreu em 1987. A história quem conta é um de seus filhos, que vive em uma área retomada. Em sua perspectiva, o imperativo de recuperar o território tem a ver, junto às questões materiais, com uma obrigação moral, em memória de Estelina. Também participa do processo de retomada a filha de outro indígena torturado na perseguição a Marcellino, Manoel Liberato de Jesus, o Duca, que teve unhas arrancadas a saibro e a orelha esquerda pregada na parede. Ao fazê-lo, os policiais avisaram: se ainda estivesse ali quando voltassem, morreria. “Meu pai fez força, rasgou a orelha e saiu.” O lóbulo acabou permanentemente mutilado, como se pode ver no retrato em sua carteira de filiação ao Sindicato Rural de Ilhéus, guardada pela filha.

    Estes e outros casos indicam que a constatação de uma injustiça, ruminada por décadas, conecta as retomadas de terras à violência historicamente perpetrada contra os indígenas da região. Não faltam casos de tortura, estupros, desaparecimentos e massacres, inclusive no século 20 – nem mesmo na literatura memorialística escrita pelos “vencedores”. A “pacificação dos índios” remonta aos primórdios da colonização. Em 1559, a praia do Cururupe, extremo norte da TI, foi cenário da sangrenta Batalha dos Nadadores, comandada por Mem de Sá. Segundo relato do próprio governador-geral, quando dispostos ao longo da praia, os corpos dos indígenas assassinados estendiam-se por quase uma légua.

    O aldeamento jesuítico de Nossa Senhora da Escada, se, por um lado, minimizou as dificuldades enfrentadas pelos colonos para dominarem a Capitania de São Jorge dos Ilhéus – liberando terras, contendo as investidas dos índios e reservando mão-de-obra –, por outro, nunca foi capaz de desarticular completamente a sociedade indígena. Antes, a resistência expressava-se em incêndios de engenhos e fugas conjuntas de “negros da terra” (indígenas escravizados) e “negros da Guiné” (africanos escravizados), entre outras ações. Agora, em uma correlação de forças mais desfavorável, os índios aldeados punham em marcha estratégias mais ou menos silenciosas, ao passo que outros se refugiavam na mata, fora do alcance dos jesuítas.

    A penetração dos não índios no território só se intensificaria com o desenvolvimento da agricultura cacaueira, a partir do final do século 19 e, mais ainda, em meados do século 20. Foi o tempo dos coronéis, como Manoel Pereira de Almeida, recordado pelos índios mais velhos por suas perversidades; de jagunços como Salu Barbadura, Testa de Ferro e Bode Preto; e das tomas de terra. Mesmo aquela que seria considerada a mais moderna agroindústria da área, a Unacau Agrícola S.A., continuou com as práticas do período “heroico” do coronelismo. Criada em 1978, a Unacau adquiriu diversas áreas contíguas nas imediações do rio das Caveiras, em Una. “Tomaram muita roça aí nessa Unacau”, conta um indígena nascido em 1937, exemplificando com o caso de um homem conhecido como Zequinha da Manteiga, que detinha uma posse lindeira à Unacau e teria sido assassinado por capangas da empresa. Indígenas que moram nos arredores lembram-se dos “três maiores pistoleiros da Unacau”; dois eles, conhecidos como Zé Bagueiro e Antonio Silvino, já estão mortos.

    Rapidamente, a Unacau tornou-se uma das maiores produtoras de cacau do país. O avanço da vassoura-de-bruxa, porém, levou-a ao declínio e, a partir da década de 1990, já sob controle do grupo Gafisa, passou a produzir pupunha e café, com financiamento público. Nos anos subsequentes, a empresa foi autuada por crime ambiental; as fazendas, arrendadas; denunciou-se o emprego de trabalho escravo na produção de café; e, em 2006, iniciou-se o processo administrativo de desapropriação de parte da área para a reforma agrária. Em maio de 2012, os Tupinambá retomaram a porção da Unacau localizada no interior da TI e, desde então, vêm tratando de recuperar as roças de cacau e introduzir novos cultivos.

    A elite regional hoje se ocupa em negar a presença histórica dos indígenas na área, sustentando que os Tupinambá teriam sido “extintos” no século 17. Silva Campos, um insuspeito cronista, escrevendo no final da década de 1930, afirma: “Ainda agora o tipo indígena, quase indene de miscigenação de outros sangues, prepondera na massa da população”. Em 1985, Duca Liberato – o indígena que teve a orelha mutilada –, acompanhado de um parente, seu Alício Francisco do Amaral, viajou a Brasília, para pedir o apoio de Mário Juruna, então deputado federal: “viemos a fim das nossas terras, porque as nossas terras estão tomadas, e nós precisamos delas pra trabalhar”, seu Alício lembra de ter dito. A visita, contudo, não resultou em qualquer ação do Estado em defesa dos indígenas.

    Durante o período em que estiveram “invisíveis” para além das fronteiras regionais, os Tupinambá aferraram-se em profecias sobre o “retorno da terra”, que se multiplicaram. Em sonhos ou momentos de “loucura”, indígenas previam: um dia, as terras onde estavam os cemitérios velhos, as terras onde muitos índios nasceram e tiveram seus umbigos enterrados, seriam libertadas. E os indígenas expropriados poderiam voltar.

    “Os fazendeiros tomaram a liberdade de cada um de nós”. “Nós somos já os brotos, que nascemos dos troncos velhos. Nós estamos brotando e criando, renovando tudo de novo.” É assim que Manezinho*, 80 anos, explica o processo de retomada. No tórax, traz uma marca da violência desatada contra os indígenas em luta: a cicatriz de um tiro de bala de borracha, disparado por um agente da Polícia Federal à paisana, em uma operação de reintegração de posse significativamente batizada “Terra Firme”, realizada em 2008. “Fiquei cuspindo sangue mais de mês”, lembra. Filho de um índio e de uma não índia vinda do norte do estado, Manezinho nasceu na mata e perdeu a mãe ainda molecote. Transtornado com a perda, o pai encantou-se pela rua e partiu, depois de trocar a terra onde vivia pela promessa de uma casa, que desabou tão logo ele chegou.

    “Eu fui criado no mundo, perdido”, conta Manezinho. Trabalhou em fazendas de cacau – inclusive nas terras de Gileno Amado, conhecido coronel –, aprendeu a bater facão, cantar vaquejadas e fez “um bocado de filho por aí, esparramado”. A certa altura, como não tinha terra onde parar, refugiou-se perto do topo da Serra do Padeiro, que, apesar de cercado pelas fazendas dos não índios, continuava pouco devassado. Essa formação rochosa é um marco simbólico para os indígenas da área. Ali é a morada dos encantados, entidades não humanas que, segundo a cosmologia tupinambá, são os donos da terra. Na mesma serra, Marcellino e seus companheiros refugiaram-se da perseguição policial. Durante cerca de seis anos, Manezinho viveu ali, sob uma grande pedra, dormindo em uma cama de vara, forrada de folhas. Hoje, ao cabo de uma vida inteira “dando o dia” para os fazendeiros em troca de quase nada, vive em uma área retomada. “Agora, eu não trabalho para ninguém”, sorri.

    Desde as primeiras retomadas de terras, realizadas em 2004, centenas de indígenas expropriados retornaram ao território. Antes do reconhecimento pelo Estado da existência dos Tupinambá, alguns indígenas que resistiam em pedaços de terra diminutos cumpriam um papel centrípeto, dando guarida ocasional aos parentes espalhados. Contudo, um retorno que se pretendesse mais amplo e definitivo – permitindo a recomposição do povo – só se tornou possível no processo de retomada. É o caso da família de Ana Zilda Ferreira da Silva: nos últimos nove anos, mais de 20 descendentes da indígena já falecida retornaram à Serra do Padeiro, em sucessivas levas, vivendo agora em quatro retomadas. “Hoje eu luto pela terra e quero terra para ter todos os meus parentes dentro”, explica uma filha de Ana Zilda. “Porque já chegou ao ponto do meu pessoal dormir no meio do tempo, sem ter um teto. A pior coisa é ver seu irmão, sua irmã sair com uma trouxa nas costas sem saber para onde ir.”

    Nascida na Serra do Padeiro, Ana Zilda perambulou por boa parte do território. Uma filha mudou-se para outro estado, outra desapareceu, filhos e filhas trabalharam em fazendas. A história repetiu-se. “Minha mãe criou a gente em fazenda dos outros”, conta Lena*, 35 anos, neta de Ana Zilda. “Os fazendeiros tomaram a liberdade de cada um de nós.” Para ajudar a mãe com as despesas, aos 20 anos, Lena deixou os dois filhos pequenos e foi atrás de uma promessa de trabalho como empregada doméstica em São Paulo. “Só fui com o dinheiro da passagem, mais nada. A mulher disse que pagava 150 reais de salário; no final de um mês, ela deu cinco.” Experiências com trabalho escravo – em fazendas de cacau ou “servindo em casa de família” – povoam os relatos dos Tupinambá.

    A expropriação territorial foi particularmente cruel com as mulheres indígenas. “Minha mãe me pariu chorando e xingando”, conta dona Rosa*, 58 anos, filha de uma índia Kariri-Sapuyá e de um não-índio, esposa de um Tupinambá. A mãe de dona Rosa, conhecida como Nita, nasceu na Reserva Indígena Caramuru-Catarina Paraguaçu, próxima ao território tupinambá. O pai de dona Rosa só conseguiu se deitar com Nita – que trabalhava para ele em uma quinta de café – depois de presenteá-la com um corte de tecido enfeitiçado. Em seguida, abandonou-a. Como tinha de sustentar a si e aos filhos e a reserva indígena estava tomada pelos brancos, aonde havia trabalho, Nita ia. Junto à mãe, dona Rosa trabalhou na roça, lavou roupa de ganho, quebrou pedra em uma jazida de mármore azul: “Trabalhei desde que nasci”.

    Quando dona Rosa conheceu o pai, aos seis anos de idade, ele lhe deu um minúsculo frasco amarelo de perfume, mas não o sobrenome. Adulta, tornou a vê-lo. Ele lhe disse que poderia pedir o que quisesse, mas ela já não queria nada: “Nasci nua, já estou vestida”, teria respondido. Após quatro décadas resistindo junto ao marido em um pequeno sítio aos pés da Serra do Padeiro – que lhes tentaram tomar com tocaias, cercas que se moviam à noite e cartas de advogados –, ela se entusiasma com o processo de retomada: “Na aldeia, dá para viver bem. Tem lugar para andar, para correr… Aldeia dá para tudo, até para gente virar bicho”.

    *nomes fictícios

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  • 25/10/2013

    Professor indígena é baleado em área reivindicada pelo povo Pataxó

    Patrícia Bonilha,

    de Brasília

     

    Na manhã de hoje (25), por volta das 5h30, um grupo de mais de 200 indígenas Pataxó que há nove dias ocuparam uma área reivindicada por eles foi surpreendido por quatro homens armados que deflagraram disparos de armas de fogo. Na tentativa de proteger algumas crianças, o professor indígena José Marcos Rodrigues da Silva, de 28 anos, foi atingido no braço direito, na altura do ombro. Levado às pressas para o hospital regional de Porto Seguro (BA), ele foi informado que a bala atravessou o seu braço e saiu do outro lado. Após receber os procedimentos médicos necessários, ele teve alta à tarde. Denominada de Gleba C, esta área ocupada ficou de fora do processo de demarcação da Terra Indígena Coroa Vermelha, finalizado em 1998.

    Segundo Karuãs Pataxó, presidente da Associação da Aldeia Arueira, era ainda muito cedo quando quatro homens numa caminhonete mitsubish vermelha, com placa do município de Eunápolis, chegaram na área onde os indígenas estão acampados procurando o cacique Nengo. Os indígenas que estavam ali naquele momento pediram para eles descerem para conversar com o cacique. “Eu achei que eram agentes da justiça. Quando estava saindo, escutei os tiros. Eles estavam com colete à prova de balas, munidos de pistola e submetralhadoras. Fizeram sete disparos. Alguns indígenas se jogaram no chão, outros correram para o mato, as crianças começaram a chorar. E o professor José Marcos foi atingido quando entrou na frente de algumas crianças. Daí, eles atravessaram as barreiras de madeira que tínhamos feito e entraram em uma mata da empresa Veracel”, conta o cacique Nengo.

    As polícias Federal (PF) e Militar (PM) se deslocaram para a área, recolheram as capas das balas (calibre 380) e afirmaram que iniciaram um processo de investigação. Os indígenas afirmam que as fazendas vizinhas estão cheias de pistoleiros. “Não são pessoas conhecidas por nós e não são trabalhadores. É gente que veio de fora para nos intimidar”, afirma Karuãs. Ele e o cacique Nengo afirmam que os indígenas já vinham recebendo ameaças desde a semana passada. “O filho do fazendeiro, Lino Miguel Rosa Junior, levou duas vezes a Polícia Florestal para ameaçar a gente. Foi um grande desrespeito. A própria polícia arrebentou a cancela com o carro e afirmaram que estávamos envolvidos com o corte e venda de madeira, o que não é verdade”, garante o cacique. Dos 1.492 hectares da Terra Indígena Coroa Vermelha, 827 estão preservados, segundo Karuãs. Nesta semana, os indígenas ouviram tiros na mata, o que consideram uma explícita forma de intimidação a eles.

    As lideranças garantem que a situação que já estava tensa na área, piorou com o ataque realizado na manhã de hoje. “Apesar de não termos armas como eles, não vamos nos intimidar. Se o governo e a justiça não agirem rapidamente, é provável que vai ter alguma morte aqui porque achamos que os pistoleiros, a mando dos fazendeiros, vão voltar”, prevê o cacique Nengo. Ele afirma que mais indígenas estão chegando para fortalecer o movimento de resistência. Preocupa também o fato de que estão acampados na área mais de 60 crianças, vários idosos e alguns doentes. Karuãs afirma que já solicitaram à coordenação da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) atendimento aos doentes, mas até agora não houve qualquer manifestação da Sesai neste sentido.

    Histórico

    Em 1998, a TI Coroa Vermelha foi homologada com um total de 1.493 hectares. No entanto, as glebas C e D ficaram de fora dos estudos de demarcação feitos na época. Em setembro de 2005, a Funai criou um Grupo de Trabalho para avaliar a revisão de limites da área, requisitada de modo a englobar, como território tradicional, a Gleba D, com as áreas de Nova Coroa e Tapororoca, dentre outras, localizadas nos municípios de Santa Cruz Cabrália e Porto Seguro. Esta revisão encontra-se em processo de conclusão de relatório antropológico pela Funai.

    Em relação à Gleba C, onde há mais de 10 anos estão localizadas as aldeias Juerana e Arueira, após a realização de levantamento de terras, benfeitorias e avaliação de bens pela Funai, foi acordado que será feita a aquisição das terras pelo Estado por interesse social para uso do povo Pataxó e repassadas as comunidades indígenas. Atualmente, a área está sendo usada por três fazendas, uma delas, a de Lino Miguel Rosa, com plantação de café.

    No dia 12 de abril de 2012, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, enviou à presidente Dilma Rousseff, o projeto de decreto para a desapropriação do imóvel rural, com superfície de 2.299 hectares. Segundo o ofício assinado pelo ministro, “Os recursos destinados ao pagamento dos imóveis incidentes na área objeto da desapropriação são decorrentes da União, Ação de Demarcação e Regularização de Terras Indígenas”. No dia 09 de outubro deste ano, indígenas Pataxó estiveram reunidos com o ministro Cardozo. “Ele afirmou que o caso está sendo avaliado e que em novembro esta questão estaria resolvida. Mas diante das ameaças que começamos a sofrer, só nos restou a alternativa de ocupar a área. Não queremos conflito, queremos agilidade no processo de requisição das terras. A partir daí, vamos iniciar a recuperação das áreas que foram totalmente desmatadas”, adianta o cacique Nengo.

    Segundo Karuãs, a população na TI Coroa Vermelha, incluindo as aldeias Juerana e Arueira, é atualmente de 9 mil indígenas. Até as 20h30 de hoje, lideranças indígenas dos povos do sul da Bahia, Pataxó, Tupinambá e Pataxó Hahahãe, estavam em reunião com o ministro Cardozo, em Salvador. Os indígenas demandam a conclusão definitiva das demarcações de suas terras tradicionais na região. “Foi aqui na Bahia que os portugueses chegaram no Brasil há 513 anos. Depois de cinco séculos, ainda somos mutilados e temos nosso sangue derramado em busca do reconhecimento de nossos direitos. Apesar de todas as nossas dificuldades, vamos continuar a resistir o tempo que for preciso”, conclui Karuãs Pataxó.

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  • 25/10/2013

    Apib protocola pedido de revogação da Portaria 303 e exoneração do ministro Adams, da AGU

    Por Renato Santana,

    de Brasília (DF)

     

    O movimento indígena não perdeu tempo. Na manhã desta sexta, 25, sete lideranças da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) protocolaram carta (leia aqui) na Advocacia-Geral da União (AGU) pedindo a revogação da Portaria 303 e a exoneração do advogado-geral, ministro Luís Inácio Adams. Mesmo depois da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de não vincular as 19 condicionantes de Raposa Serra do Sol às demais terras indígenas do país (Petição 3388), Adams insiste na portaria.  

     

    “Queremos a revogação total da Portaria 303. Ela fixa regras danosas aos povos indígenas baseadas em condicionantes que não valem para todo país, mas apenas para Raposa, o que já é muito ruim para os parentes de lá”, destacou Ceiça Pitaguary, da Apib, na entrega da carta ao subprocurador-geral federal, Antônio Roberto Basso, no refeitório da AGU. Além da revogação, as lideranças frisaram as razões que levaram o movimento a pedir a exoneração do ministro Adams.   

     

    Ceiça lembra que a AGU nunca buscou portarias ou adotou medidas tratando de direitos indígenas. Com Adams a história passou a ser outra: o ministro fez a Portaria 303 e amiúde está atrelado a orientações jurídicas de como os ruralistas devem proceder, caso do PLP 227. “Adams está acirrando conflitos entre indígenas e não-indígenas no país. Pedimos a exoneração imediata dele ou será que o Palácio do Planalto o apóia?”, questiona Márcio Kokoj Kaingang.

     

    Em nota publicada na manhã desta sexta, o STF se pronunciou ressaltando que as condicionantes não se estendem para terras indígenas além de Raposa. Questionado por jornalista sobre de onde a AGU tiraria argumentos para justificar a efetivação da portaria, o subprocurador-geral se restringiu a responder de acordo com nota da própria advocacia (leia aqui): o ministro vai aguardar a publicação do acórdão do julgamento da Petição 3388 para ter clareza da decisão. Com este mantra, Basso respondeu a todas as perguntas.

     

    Sobre o pedido de exoneração do ministro Adams, o subprocurador-geral defende que “os indígenas possuem esse direito, mas não vamos nos pronunciar quanto a isso”. Logo após a passagem pela AGU, as lideranças da Apib protocolaram a carta na Procuradoria Geral da República (PGR), na 6ª Câmara de Coordenação e Revisão, Presidência da República e Ministério da Justiça (MJ). Na nota, a AGU afirma também que irá esperar a definição dos novos critérios para demarcação de terras indígenas, em elaboração no MJ.

     

    “Hoje estamos em apenas sete, mas não sairemos daqui de Brasília e já estamos providenciando a vinda de delegações. Conseguimos informações e há terras indígenas em processo de revisão que tiveram os processos suspensos por conta dessa portaria. A AGU está buscando conflito e queremos saber se o governo federal irá bancar isso”, pontua Ceiça Pitaguary.

     

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  • 25/10/2013

    APIB demanda a imediata e definitiva revogação da Portaria 303 e a exoneração do ministro Adams, da AGU

    A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), face às decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) tomadas no julgamento do dia 23 de outubro de 2013 a respeito dos embargos declaratórios da Petição 3388 (Caso da Terra Indígena Raposa Serra do Sol), manifesta mais uma vez o seu total rechaço às incabíveis pretensões do governo Dilma, por meio do ministro Luis Inácio Adams, da Advocacia Geral da União, de reeditar a Portaria 303/2012.

    Esta abominável medida, que pretendia estender a todas as terras indígenas as condicionantes instituídas por ocasião do julgamento da homologação da Raposa Serra do Sol, em 2009, mesmo suspensa agravou até o momento a insegurança jurídica e social, as ações de violência, perseguições, ameaças e assassinatos promovidas por invasores de terras indígenas, notadamente aqueles vinculados ao agronegócio e à bancada ruralista, interessados em avançar sobre os territórios indígenas e explorar a exaustão os recursos naturais e demais riquezas por eles abrigados. Mesmo suspensa, a Portaria 303 empoderou os ruralistas e chegou a ser utilizada pelo governo para paralisar a demarcação de terras indígenas.

    Considerando esses efeitos perniciosos e a decisão da Suprema Corte de afastar de uma vez por todas a pretensa generalização para todas as terras indígenas das condicionantes, pois a decisão de 2009 “não é vinculante em sentido técnico para juízes e tribunais quando do exame de outros processos relativos a terras indígenas diversas”, conforme o voto do relator Luiz Roberto Barroso, a       APIB exige do Poder Executivo a imediata e definitiva revogação da Portaria 303/2012 e a exoneração também imediata do Ministro Luis Inácio Adams, aliado declarado dos inimigos confessos dos povos indígenas e, portanto, nosso inimigo.

    Ao invés de insistir com esta medida, e outras tantas que igualmente afrontam e buscam desconstruir os direitos dos nossos povos, em favor dos interesses do agronegócio, o governo deveria se empenhar em destravar a demarcação das terras indígenas, paralisada durante seu mandato, em cumprimento de sua responsabilidade constitucional – ato administrativo – confirmada pelo Supremo Tribunal, que inclusive reafirmou o direito originário dos nossos povos sobre as terras que tradicionalmente ocupam. Basta de omissões, conivência e descaso. Ou então o governo e seus integrantes passarão para a história como o mais desqualificado no tocante ao respeito, proteção e efetivação dos direitos indígenas.

    A APIB reitera a determinação dos povos e organizações indígenas que nos últimos dois anos têm se mobilizado contra todas as tentativas de restringir ou anular os direitos indígenas, seja no âmbito do Executivo, por intermédio de portarias e decretos, ou do Legislativo, através de Projetos de Lei (PLs) e Propostas de Emendas à Constituição (PECs). Continuará, em aliança com outros movimentos e organizações sociais e populares, vigilante e lutando em defesa dos direitos indígenas assegurados pela Constituição Federal e pelos tratados internacionais assinados pelo Brasil, em especial a Convenção 169 sobre Povos Indígenas e Tribais da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e a Declaração da ONU sobre os direitos dos Povos Indígenas.

     

    Brasília-DF, 24 de outubro de 2013.

     

     

    ARTICULAÇÃO DOS POVOS INDÍGENAS DO BRASIL – APIB

    PELA DEFESA DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL

    E DOS TERRITÓRIOS INDÍGENAS

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