• 09/10/2013

    “DIVIDE ET IMPERA”: Intervenção Federal gera Conflitos e Violências na Região do Tapajós

    Dom Erwin Kräutler

    Bispo do Xingu e presidente do Cimi

     

    Atribui-se ao imperador romano Júlio César (+44 a.C.) a expressão “Divide et impera”. O ditado sugere que para um povo perder sua força e seu brio e assim ser mais facilmente dominado, a estratégia é dividir, criar discórdia, jogar uns contra os outros. Provocar a divisão entre os povos e populações locais é uma estratégia histórica e sistematicamente usada pelos governos e grupos econômicos interessados na exploração dos recursos naturais até então de usufruto exclusivo destes povos e populações.

     

    Os governos e grupos econômicos usam esta estratégia da divisão para romper ou enfraquecer a resistência destes povos que, evidentemente, não se conformam e não aceitam o fato de terem suas terras invadidas, sua cultura agredida, seus projetos de vida destruídos.

     

    Os governos e grupos econômicos não hesitam em provocar, favorecer e alimentar fraturas políticas entre potenciais aliados dos povos e populações locais que se opõem aos seus interesses. Usam esta artimanha a fim de colocar em lados opostos pessoas e organizações que poderiam estar articuladas e atuando conjuntamente no apoio e fortalecimento da resistência destes povos e populações.

     

    Os governos e grupos econômicos defendem a tese segundo a qual os povos, populações locais e organizações de apoio seriam os “sujeitos da violência” nesses processos. Por isso, qualquer mobilização que se contraponha aos interesses do governo e dos grupos econômicos é rotulada de  “baderna”, “arruaça”, “confusão”, “agitação”, “violência”. É o típico caso de “culpabilização da vítima”. Tentam assim camuflar o fato de que são eles próprios os protagonistas da violência e justificam o uso da força policial do Estado para implementar seus interesses. Invariavelmente aplicam a estratégia da “criminalização” de lideranças a fim de enfraquecer qualquer resistência.

     

    Os governos e grupos econômicos nunca assumem a responsabilidade pelos desequilíbrios e fraturas políticas. Sempre jogam a culpa em alguma organização, alguma pessoa ou grupo de pessoas que atuam nas respectivas regiões.

     

    Essas premissas se aplicam hoje perfeitamente à região do Tapajós, onde o governo pretende construir o chamado “Complexo Hidroelétrico do Tapajós”. Representantes do governo bem treinados e desprovidos de qualquer tipo de senso ético atuam com grande afinco na região, de modo especial junto aos Munduruku, povo que impõe a maior resistência ao projeto governamental.

     

    Preocupados damo-nos conta de que o governo federal e os grupos econômicos têm alcançado relativo sucesso nesta estratégia, especialmente no que tange à provocação de divisões e desequilíbrios entre os Munduruku e potenciais aliados deles na região. A obstinação do governo federal em cumprir o calendário de viabilização do Complexo Hidroelétrico do Tapajós está causando sérios conflitos e violências. A “divisão interna” provocada pela intervenção federal entre os Munduruku e daqueles que lutam em defesa do projeto de vida do povo, contribui para que o governo, as empreiteiras e os grupos econômicos avançam, desdenhando de quem não reza por sua cartilha, na implementação de seu projeto de morte.

     

    O momento exige bom senso, serenidade, ausculta aguçada às necessidades do povo e diálogo entre caciques, guerreiros e demais lideranças Munduruku na busca de consenso sobre as formas de ações que possam efetivamente impedir a construção das hidroelétricas no Tapajós e a consequente desestruturação do povo.

     

    Afirmamos nosso compromisso e disposição de apoio irrestrito à luta dos Munduruku contra os projetos de morte que os ameaçam.

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  • 09/10/2013

    A falta de uma política de atenção à saúde indígena: uma realidade inaceitável!

    Os povos indígenas no Brasil acompanham à distância os preparativos da V Conferência Nacional de Saúde Indígena. Digo a distância porque as conferências locais, que deveriam se constituir em espaços primordiais de debates, avaliações e definições de propostas a serem encaminhadas para a etapa nacional, acontecem sem a efetiva participação das comunidades e de suas lideranças. Aliás, na maioria das regiões do país, as etapas locais vêm sendo realizadas longe das aldeias, geralmente em hotéis ou sedes da FUNASA/SESAI, como ocorreu no Rio Grande do Sul por ocasião da conferência local do Distrito Sanitário Especial Indígena – DSEI – Litoral Sul.

     

    Os lugares das reuniões, quando geograficamente distantes das comunidades, geralmente são espaços impróprios pela sua artificialidade, uma vez que em nada lembram as realidades onde vivem os povos indígenas. As comunidades, em sua maioria, estão submetidas a condições inadequadas de sobrevivência pela ausência de saneamento básico, assistência médica, de ações preventivas que poderiam impedir as mortes de crianças por viroses ou doenças relacionadas a verminoses (parasitoses), como ocorre atualmente.

     

    O fato de as etapas locais da V Conferência Nacional de Saúde Indígena ocorrerem distante das aldeias é ainda mais grave porque impede que aquelas pessoas, as que vivenciam cotidianamente os graves problemas decorrentes da desassistência, participem das discussões, avaliações e apresentem suas críticas e propostas.

     

    Há, ao que parece, certo temor dos gestores públicos em se aproximar das comunidades indígenas. Talvez seja o medo de se depararem com a inegável realidade de fome, com a escassez de água potável, com a disseminação de doenças, especialmente em comunidades situadas no Amazonas, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Rio Grande do Sul.

     

    Para exemplificar essa triste realidade, pode-se recorrer às informações divulgadas pelo DSEI – Distrito Sanitário Especial Indígena do Mato Grosso do Sul, relativas ao período compreendido entre 2010 e 2012. Naquele estado, 118 crianças morreram ao nascer, outras 208 crianças foram a óbito antes de completar o primeiro ano de vida e 87 morreram antes dos cinco anos.

     

    Esses números correspondem a índices muito superiores aos verificados na média nacional, que são de 23 mortes para cada mil nascidos. Lideranças indígenas do Conselho da Aty Guasu denunciam que a mortalidade infantil está inserida no contexto de uma política de Estado, que promove o genocídio silencioso dos povos Guarani e Kaiowá.

     

    Os dados orçamentários do DSEI/MS corroboram com este argumento, pois apontam que, dos 60 milhões de reais disponibilizados em 2012 para a saúde indígena em Mato Grosso do Sul, 90% foram destinados ao pagamento de RHs (Recursos Humanos). Ou seja, a maior parte deste montante de dinheiro é direcionada para pagamento dos profissionais de saúde, e apenas 10% é reservado para a compra de medicamentos, equipamentos, assistência efetiva e continuada nas áreas indígenas, formação dos agentes de saúde, bem como para a implementação de ações e serviços voltados à prevenção das doenças.

     

    Em âmbito nacional, os dados do Ministério do Planejamento denunciam que a execução orçamentária nas ações em saúde indígena, durante o ano de 2012, foi deplorável. Na rubrica Saneamento Básico foram previstos R$ 67.986.192 e gastos somente R$ 86.403,00, um percentual irrisório de 0,13%. Na ação de Estruturação de Unidades de Saúde para Atendimento à População Indígena, dos R$ 26.650,00 previstos, apenas R$ 2.318.188, foram executados, o que corresponde a 8,7%. Também na rubrica Promoção, Vigilância, Proteção e Recuperação da Saúde Indígena, os recursos orçamentários destinados, na ordem de R$ 708.000.000, não foram totalmente liquidados, restando, de seu montante, 15%, o que corresponde a R$ 102.563.699,00, recursos que pod eriam ter sido utilizados para ações de combate a mortalidade infantil, por exemplo.

     

    A situação não parece ser diferente no ano em curso. Em 2013, os dados da execução orçamentária disponibilizados pelo Programa Siga Brasil do Senado Federal revelam que, de janeiro a setembro, a rubrica Saneamento Básico não executou um único centavo dos R$ 59.400.000 autorizados. Nas demais rubricas os dados orçamentários revelam a inoperância da Secretaria Especial de Saúde Indígena e nos dão a dimensão da nefasta negligência dos gestores da política de atenção à saúde dos povos indígenas. Os dados revelam que, transcorridos nove meses, o governo utilizou apenas R$ 1.983.003 dos  R$ 40.000.000 destinados a Estruturação de Unidades de Saúde para Atendimento a População Indígena. Na rubrica Promoção, Vigilância, Proteção e Recuperação da Saúde Indígena foram executados R$ 540.563.372 dos R$ 838.000.000, um pouco mais de 60%.

     

    Quando os gestores da política de Atenção à Saúde Indígena enchem a boca  ao falar que há dinheiro para a atenção em saúde, deveríamos denunciá-los pelo mau uso deste dinheiro e por atentarem contra a vida, não apenas de indivíduos isoladamente, mas de comunidades e povos, pois não investem os recursos em ações fundamentais, especialmente em saneamento básico, uma das mais recorrentes demandas apresentadas pelas comunidades. Sem saneamento básico não há possibilidade de que as demais ações e serviços em saúde, a exemplo da prevenção das endemias, tenham qualquer possibilidade de êxito.

     

    Os dados orçamentários são reveladores de que a política de atenção à saúde das populações indígenas é ineficiente, inaceitável e pode ser caracterizada como criminosa uma vez que, por causa dela, centenas de crianças morrem a cada ano. Os dados da mortalidade infantil registrados em Mato Grosso do Sul são alarmantes e configuram, como alertaram as lideranças indígenas do Conselho da Aty Guasu, um lento e doloroso processo de genocídio. E infelizmente não se trata de uma realidade isolada, e sim de uma grave situação que atinge diversos povos indígenas na atualidade.

     

    O Ministério Público Federal, ao tomar conhecimento dos dados orçamentários, de sua pífia execução e das informações de que crianças morrem pela ineficiência ou omissão dos gestores públicos, pode abrir uma ampla investigação para apurar as denúncias e, sendo estas comprovadas, exigir que tais gestores sejam exonerados de seus cargos e, se for o caso, processados e condenados.

     

    Num país em que vidas de crianças indígenas valem menos do que um boi no pasto, somente medidas exemplares trarão esperanças de que os direitos humanos podem prevalecer sobre interesses políticos, econômicos e mercantis.

     

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  • 08/10/2013

    Líder Guarani Mbya é encontrado morto na Lagoa dos Patos

    Inácio Lopes, líder político e religioso Guarani Mbya foi encontrado morto na manhã de hoje, 08, boiando na Lagoa dos Patos, próximo a uma ilha onde habitam algumas famílias do povo Guarani Mbya, no município de Palmares do Sul.

     

    A referida ilha vem sendo oferecida à comunidade Guarani Mbya por fazendeiros do município de Capivari do Sul, como alternativa à terra reivindicada pela comunidade indígena. A Funai iniciou os estudos de identificação e delimitação da Terra Capivari e desde então a comunidade passou a ser visitada por representantes dos fazendeiros que pressionam para que eles se mudem para a ilha.

     

    Inácio se destacou, ao longo dos últimos anos, por sua liderança junto à Comissão de Terra Guarani, posteriormente denominada de Conselho de Articulação do Povo Guarani-CAPG. Colaborou decisivamente para a rearticulação das comunidades acampadas à beira de estradas e afetadas pelas duplicações das rodovias. Inácio também foi cacique da Terra Passo Grande, área que está em estudo de identificação e delimitação pela Funai.

     

    Atualmente, Inácio vivia na área indígena de Torres, uma terra adquirida pelo governo federal como compensação pelos impactos da duplicação da BR-101, que cortou ao meio a terra onde viviam dezenas de famílias Guarani Mbya, na divisa dos estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina.

     

    Depois de ter passado por intensos processos de estudos, reflexões e aprendizados sobre a religiosidade de seu povo, Inácio estava se destacando como liderança religiosa (Karaí). Na primeira semana de outubro ele foi convocado pelas famílias que vivem na ilha da Lagoa dos Patos para realizar rituais de cura em uma criança que se encontrava muito doente. No domingo, dia 06, as famílias Guarani sentiram falta de Inácio, começaram a procurá-lo e, na manhã de hoje, o corpo foi localizado boiando próximo à ilha.

     

    As causas da morte ainda são desconhecidas. O corpo foi levado para o Instituto Médico Legal em Porto Alegre.

     

    Os Guarani Mbyá sentem a perda dessa importante liderança política e religiosa, que há muito vinha lutando em defesa dos direitos de sua comunidade, e colaborando para restabelecer as condições de vida digna para todos.

     

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  • 07/10/2013

    Carta aberta do povo Nambikwara à população brasileira

    Os europeus se julgavam os donos da terra, não respeitavam a vida comunitária dos povos que aqui viviam, não aceitavam sequer que estes povos possuíam alma, por serem portadores de culturas e religiões diferentes. Frei Bartolomé de Las Casas presenciou a invasão do Brasil e registrou (em 1511) a violência praticada contra os indígenas no século XVI:

     

     

    "Certa vez os índios vinham ao nosso encontro para nos receber, à distância de dez léguas de uma grande vila, com víveres e viandas delicadas e toda espécie de outras demonstrações de carinho. E tendo chegado ao lugar, deram-nos grande quantidade de peixes, de pão e de outras viandas, assim quanto tudo quanto puderam dar… Mas eis que os espanhóis passam a fio de espada, na minha presença e sem causa alguma, mais de três mil pessoas, homens, mulheres, crianças, que estavam sentadas diante de nós. Eu vi ali tão grandes crueldades que nunca nenhum homem vivo poderá ter visto semelhantes… Também na terra firme… na madrugada, estando ainda os índios a dormir com suas mulheres e filhos, os espanhóis se lançaram sobre o lugar, deitando fogo às casas, que eram comumente de palha, de sorte que queimavam todos vivos, homens, mulheres e crianças… Mataram a tantos que não se poderia contar e a outros fizeram morrer cruelmente… e a outros fizeram escravos e marcaram-nos com ferro em brasa…"        
    (LAS CASAS, 1984)     

    Em 1.560, Men de Sá, governador geral do Brasil, escreveu uma carta ao rei de Portugal contando com orgulho as suas façanhas na colônia: em uma noite, ele havia destruído e queimado uma aldeia próxima à vila, matado todos os indígenas que resistiram a este ataque e seu trunfo foi ter enfileirado os corpos ao longo de aproximadamente seis quilômetros de praia. E este é apenas mais um exemplo da violência que as pessoas que habitavam esta terra sofreram.       

    Os invasores travaram guerras contínuas e cruéis contra os indígenas. São Paulo, no séc. XVI, era um pequeno vilarejo e as expedições que se dirigiam ao interior do país eram chamadas de "bandeiras". Os bandeirantes eram pessoas especializadas em caçar e exterminar, ou escravizar os indígenas, ou quaisquer outros obstáculos que se opusessem à conquista do interior das terras brasileiras e suas riquezas.

    Algumas das técnicas de extermínio utilizadas pelos europeus consistiam em: doar alimentos contaminados com doenças (varíola, gripe, tuberculose…) contra as quais os indígenas não tinham defesa; estupros; disseminação de bebidas alcoólicas; chacinas; invasão e apropriação dos territórios indígenas; devastação do meio ambiente; entre outras.

     

    Apesar de se tratar de atrocidades ocorridas no início da colonização do Brasil, no Século XVI, os fatos narrados podem refletir o tratamento atual que os índios recebem em nosso país, portanto, qualquer semelhança com os dias atuais não é mera coincidência, é a pura realidade!

     

    Os insaciáveis por acumular riquezas a qualquer custo, mesmo assumindo o alto preço de provocar enorme e irreversível devastação ao meio ambiente, assumem, também, o risco de exterminar com a vida dos povos indígenas e acabar com sua cultura milenar. Estes estão, freqüentemente, disfarçados de “Homens com boas intenções”, dotados de um discurso hipócrita de que só querem contribuir com o desenvolvimento econômico de nosso país, quando na realidade só pensam nos benefícios próprios que poderão conquistar. Os homens e mulheres que se enquadram nesta descrição são os chamados “Ruralistas”, que podem ser identificados perfeitamente como os “Bandeirantes Modernos”, imbuídos no mesmo propósito de não reconhecer o índio como ser humano e cidadão brasileiro com direitos garantidos na Constituição Federal.  

     

    Estes novos “Bandeirantes Modernos” usam sua riqueza para se fortalecerem no meio político a fim de fazer valer suas vontades. A enorme Bancada Ruralista no Congresso Brasileiro é um exemplo claro de como uma minoria rica consegue eleger uma maioria no Legislativo para defender seus interesses.

     

    As diversas Propostas de Emendas à Constituição e Projetos de Lei que visam abolir os direitos constitucionais dos povos indígenas foram propostas pela Bancada Ruralista. Dentre elas estão:

     

    PECs nº 038/99 e 215/00 – Propõem transferir a atribuição da demarcação de terras indígenas do Executivo para o Legislativo;

    PEC nº 237/13 – Propõe permitir o arrendamento das terras indígenas para grandes produtores rurais;

    Projeto de Lei Complementar nº 227/12 – Propõe legalizar latifúndios e assentamentos dentro das terras indígenas;

    Projeto de Lei 1.610/96 – Propõe permissão a mineração em territórios indígenas demarcados;

     

     

    Todas estas propostas somente atendem aos interesses de empresários e produtores rurais e não correspondem aos nossos interesses como indígenas, habitantes originários das terras brasileiras. Autorizar que órgãos com interesses conflitantes como o Ministério de Desenvolvimento Agrário, Embrapa e FUNAI, devam decidir em conjunto sobre novas demarcações, será o mesmo que perpetuar a conclusão das demarcações de todas as Terras Indígenas, e, por conseqüência, perpetuar os conflitos agrários.

     

     A Constituição Federal Brasileira de 1988, ao ser promulgada, trouxe um capítulo exclusivo que reconhece os Direitos dos Índios:

     

    CAPÍTULO VIII

    DOS ÍNDIOS

     

    Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.

                                                                          (…)

    § 2º – As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes.

                                                                        (…)

    Art. 232 (…)

     

    Ainda, o artigo 67 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, da Constituição Federal, preconiza que:

     

    Art. 67. A União concluirá a demarcação das terras indígenas no prazo de cinco anos a partir da promulgação da Constituição.

     

    Porém, depois de 25 anos de sua promulgação, a Constituição Federal Brasileira ainda não foi cumprida na sua totalidade. Existem diversas áreas de terras indígenas a serem demarcadas e a Bancada Ruralista propõe mudanças usando a desculpa que é para evitar conflitos agrários, quando na realidade é a ganância por mais terras e mais riquezas que alicerça as Propostas de Emendas à Constituição.

                           

    Depois de 500 anos de opressões, invasões, massacres e mortes sofridas por nós índios, apesar de tardio, houve o reconhecimento justo dos nossos direitos no Brasil. Permitir alterações que venham suprimir ou diminuir os direitos dos índios será um retrocesso na história da evolução da própria população brasileira. 

     

    O que evitará os conflitos agrários entre produtores e nós indígenas será a conclusão da demarcação de todas as terras indígenas conforme preceitua a Constituição Brasileira.

     

    Entretanto, o que resolverá os conflitos agrários será a utilização mais racional e eficiente das terras NÃO INDÍGENAS E IMPRODUTIVAS das propriedades que estão em poder de grandes fazendeiros, muitos destes reconhecidos como RURALISTAS. 

     

    Como exemplo, pode ser citado o Município de Comodoro, no Estado de Mato Grosso, que tem 62% do total de sua área demarcada como Terra Indígena NAMBIKWARA, que, freqüentemente, sofrem pressão dos Ruralistas para serem exploradas economicamente. Todavia, dos 38% das terras remanescentes e NÃO INDÍGENAS, uma grande parte É IMPRODUTIVA OU SUBUTILIZADA, e está concentrada nas mãos de poucos proprietários que se quer moram no município ou trazem alguma vantagem econômica para a população comodorense.

     

    ASSIM, SE ESSAS ÁREAS NÃO INDÍGENAS E IMPRODUTIVAS RECEBESSEM A MESMA PRESSÃO PARA PRODUZIR E FOSSEM TRANSFERIDAS PARA A POSSE E PROPRIEDADE DE QUEM REALMENTE QUER TRABALHAR, NÃO HAVERIA CONFLITOS AGRÁRIOS E A RIQUEZA SERIA DISTRIBUÍDA DE FORMA MAIS JUSTA EM NOSSO PAÍS. NEM MESMO, HAVERIA NECESSIDADE DE SE COGITAR A EXPLORAÇÃO ECONÔNICA DAS TERRAS INDÍGENAS OU A MUDANÇA NA CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA, BASTARIA CUMPRIR AS LEIS VIGENTES E FAZER TODAS AS PROPRIEDADES CUMPRIR SUA FUNÇÃO SOCIAL.

     

    Além do mais, em regra, todo brasileiro tem alguma descendência ou ligação direta com algum antepassado indígena. Permitir que se cometessem injustiças com os índios seria o mesmo que permitir que se cometessem injustiças com alguém de nossa própria família.

     

    Posto isto, o Povo Indígena Nambikwara do Município de Comodoro, Estado de Mato Grosso, representado pelos membros de todas as suas aldeias e associações, requerem o arquivamento do processo de análise de todas as PECs e Projetos de Lei que venham alterar a Constituição Federal e trazer prejuízos aos índios do Brasil, principalmente, a PEC 215.

     

     

    Comodoro MT, 28 de setembro de 2013.

     

     

    Assinam os Presidentes das Associações do Povo Indígena Nambikwara

     

    Associação Nambikwara APINARÉ: Anael Nambikwara Halotesu

    Associação Manduka HAIYÔ: Raquel Nambikuara  Kithãulu

    Associação Negarotê APINETA: Apolônio da Silva Terena

    Associação Ikotindu Mamaindê: Nilo Mamaiandê

    Associação Indígena KOLIMACÊ:

    Sabanê, Tawandê, e Manduka: Valdir Sabanê

    Associação Indígena Mamaindê ETMÃNDU: Paulo Eduardo Mamaindê

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  • 06/10/2013

    Contra o mugido das vacas

    No momento em que a Constituição Federal comemora 25 anos de existência, se ouve o mugido das vacas, o relincho dos cavalos e o trote das mulas que invadem o plenário do Congresso Nacional e se misturam ao zumbido estridente da moto serra. É possível sentir o bufo agressivo que sai em jatos de ar pelas narinas de parlamentares. Essa é a voz da bancada ruralista formada por 214 deputados e 14 senadores, que querem anular os direitos constitucionais dos índios. Seus "argumentos" são relinchos, bater de cascos, coices no ar e, por isso, não conseguem convencer os brasileiros.

     

    Nas principais cidades do país ocorreram manifestações contra esta ofensiva do agronegócio. Nesta semana, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) organizou Mobilização Nacional em defesa dos direitos indígenas. A parte sadia do país disse um rotundo "não" ao pacote de dezenas de Projetos de Emenda Constitucional (PEC) ou Projetos de Lei Complementar (PLP) que tramitam no Congresso apresentados pela bancada ruralista e pela bancada da mineração.

     

    Esses parlamentares querem exterminar as culturas indígenas não por serem gratuitamente malvados, perversos e cruéis, mas porque pretendem abocanhar as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios. Para ampliar a oferta de terras ao agronegócio, lançam ofensiva destinada a mudar até cláusulas pétreas da Constituição. Exibem despudoradamente seus planos em discursos e através da mídia como os artigos na Folha de São Paulo da senadora Kátia Abreu (PSD-TO vixe, vixe), a muuuusa da bancada ruralista e do deputado Luis Carlos Heinze (PP-RS vixe vixe).


    Causa inconfessável

     

    Quase todos os parlamentares da bancada ruralista tiveram suas campanhas financiadas por empresas de capital estrangeiro como Monsanto, Cargill e Syngente, além da indústria de armas e frigorífico, conforme dados da Transparência Brasil. Afinal, é disso que eles vivem, dessa promiscuidade com o capital estrangeiro, sem o qual não poderiam exportar e comprar produtos. Querem agora liberar as terras indígenas para grandes empresas brasileiras e estrangeiras plantarem monoculturas com agrotóxicos, construir barragens no rios e extrair minérios para a exportação.

     

    No entanto, os ruralistas não podem confessar aos eleitores que seu objetivo é o lucro, apenas o lucro, nada mais que o lucro. Inventam, então, que estão defendendo "os interesses nacionais" e classificam como "anti-Brasil" os que não concordam com eles. Essa é uma velha tática, usada no século XIX, quando o agronegócio da época acusava os que defendiam a abolição dos escravos de representarem interesses estrangeiros. Trata-se de ganhar para uma causa indefensável os brasileiros crédulos que amam sua Pátria. Aí exploram o nacionalismo e apostam na desinformação.

     

    No artigo com título sugestivo – "Causa Inconfessável" – a senadora Kátia Abreu tenta desqualificar os índios e seus aliados com uma argumentação esdrúxula. Sem citar fontes, sem dizer de onde tirou a informação, ela jura que "são mais de 100 mil ONGs, a maioria estrangeira, associadas a dois organismos ligados à Igreja Católica: o CIMI ((Conselho Indigenista Missionário) e a CPT (Comissão Pastoral da Terra)".

     

    E por que cargas d’água milhares de ONGs estrangeiras defenderiam as terras indígenas? Na maior cara de pau, ofendendo a inteligência do leitor, a senadora Kátia Abreu, ousa dizer que elas querem destruir a agricultura brasileira. Comete um erro vergonhoso para uma parlamentar ao confundir nação com estado. Exibe sua ignorância deixando no chinelo o Tiririca:

     

    "Os financiadores são países que competem com a agricultura brasileira e que cobiçam nossas riquezas minerais e vegetais. São os mesmos que, reiteradamente, defendem que essa parte do território nacional deve ser cedida, e os brasileiros índios, transformados em nações independentes da ONU". 

     

    Tudo nebuloso, deseducativo, desinformativo. A senadora não dá nomes nem aos bois nem às vacas, não diz quais são esses países, não diz quem quer decepar os territórios indígenas do Brasil e omite que as terras indígenas pertencem, constitucionalmente, à União e não aos índios. A "causa" dos ruralistas é, realmente, "inconfessável": cada vez que uma medida prejudica seus lucros, dizem que "é ruim para o Brasil", quando favorece "é bom para o Brasil". O Brasil é a conta bancária deles. Sem confessar a origem dos recursos que financiam os ruralistas, a senadora faz dos índios um tábua de tiro ao alvo:

     

    "É do mais alto interesse nacional – sobretudo do interesse dos próprios índios – saber quando, de onde vêm e como são gastos os milhões de dólares que sustentam a ação deletéria dessas organizações, que fazem dos índios escudos humanos de uma causa inconfessável". 


    Cavaleira da desesperança

     

    "É hora de defender o Brasil" berra o deputado Luis Carlos Heinze no título de seu artigo (3/10), que reproduz o mesmo papo furado, a mesma lenga-lenga, excluindo os índios da comunhão nacional. Ataca a FUNAI – Fundação Nacional do Índio – por identificar "pretensas terras indígenas" contra os ruralistas que ele diz serem "os legítimos detentores de terras". E faz eternas juras de que está defendendo a pátria ameaçada por índios e por ONGs.

     

    Nunca foi tão apropriada a conhecida frase do escritor inglês do século XVIII, Samuel Johnson, aclimatada por Millor Fernandes, no século XX, ao nosso contexto: "O patriotismo é o último refúgio dos canalhas" – escreveu Johnson. "No Brasil, é o primeiro", acrescentou Millor.    

     

    A senadora, que se diz católica, bate na mesma tecla. Escreve que os defensores dos direitos indígenas "exercem notória militância política, de cunho ideológico, sob a inspiração da Teologia da Libertação, de fundo marxista". Está zangada com a Igreja, que ela quer defendendo os interesses dos ruralistas e não dos despossuídos, dos injustiçados, dos espoliados. Esculhamba ainda com a FUNAI "aparelhada por antropólogos que compartilham a mesma ideologia".  

     

    Mas não se limita aí a cavaleira da desesperança. De arma em riste, ataca outros "inimigos". Ela está convencida de que "além das ONGs e das instituições como o CIMI e a CPT, há dois órgãos voltados para a defesa dos índios: a já citada Funai e a FUNASA, incumbida da saúde e da ação sanitária nas tribos". Kátia é do tempo em que ainda se dizia que índios vivem em tribos.

     

    "Seriam as terras destinadas à agricultura a causa do sofrimento dos índios?" – pergunta em seu artigo. E ela mesma responde: "Quem quiser que tire suas conclusões: os índios brasileiros dispõem de extensão de terra de dar inveja a muitos países". Se um país que é um país sente inveja, imaginem os ruralistas. Por isso, a voz dela, que é a mais estridente  no Senado clama:

     

    – Os índios não precisam de terra e sim de assistência social.

     

    Ela chama de "invasão" a resistência dos índios em não permitir que seus territórios sejam apropriados pelo agronegócio e anuncia: "Para reagir ao avanço dessas invasões, apresentei ao Senado projeto de lei que suspende processos demarcatórios de terras indígenas sobre propriedades invadidas pelos dois anos seguintes à sua desocupação".

     

    Foi contra essas medidas do agronegócio e contra esses argumentos preconceituosos e retrógrados que manifestantes se insurgiram em manifestações pacíficas realizadas em Brasília, no Rio, em Belo Horizonte e nas principais cidades brasileiras.  Em São Paulo, a manifestação foi aberta pelos txondaro guarani e contou com a adesão de muitos antropólogos, estudantes, professores.

     

    As imagens da manifestação em São Paulo foram registradas e editadas por Marcos Wesley de Oliveira para o Instituto Socioambiental. Em plena Avenida Paulista, ele entrevistou lideranças indígenas – Megaron Txucarramãe (kayapó), Renato Silva (guarani), Natan Gacán (xokleng), antropólogos – Manuela Carneiro da Cunha e Márcio Silva (USP), Maria Elisa Ladeira (CTI), Lúcia Helena Rangel (PUC/SP), Beto Ricardo (ISA) e os líderes quilombolas do Vale da Ribeira – Nilce Pereira e Ditão.

     

    – Vocês não estão sozinhos – disse a mestranda em Antropologia, Ana Maria Antunes Machado, se dirigindo aos Yanomami, enquanto apontava os manifestantes da Avenida Paulista. Ela falou com bastante fluência em língua Yanomami, pois viveu com eles, com quem trabalhou mais de cinco anos como assessora pedagógica, antes de atuar no Observatório de Educação Indígena coordenado pela pesquisadora Ana Gomes (UFMG). O fato tem forte carga simbólica, por se tratar de alguém tão brasileira quanto a Katia Abreu, mas que, para ouvir os índios e com eles dialogar, aprendeu a língua Yanomami e foi capaz de reverenciá-los.  http://youtu.be/TwCPT17kqO8

     

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  • 06/10/2013

    Respeitem a Constituição

    “Nos respeitem. Respeitem nossos direitos. Não continuem rasgando a Constituição”. Uma semana de intensa mobilização dos povos indígenas que ocuparam Brasília há quase uma semana. O enterro "simbólico" com rituais verdadeiros de proeminentes inimigos como Kátia Abreu, Ronaldo Caiado, Gleisi Hoffmann e Luis Adams, e a ocupação da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), foram demonstrações inequívocas de uma luta sem tréguas na defesa de seus direitos.

     

    O chão tremeu com o pisar forte e ritmado dos cantos de guerra e dos gritos repetidos de fora Kátia Abreu. Após o susto inicial, os poucos funcionários se transformaram em plateia silenciosa e curiosa. Os indígenas permaneceram dentro da sede por mais de uma hora em rituais, demonstração de união, indignação e gritos. Sem vandalismo ou violência deram seu recado radical.

     

    Ficou uma pergunta sem resposta: Por que o presidente do Congresso esvaziou a Casa em plena semana de comemoração das bodas de prata da Carta Magna? Reza o ditado popular: Quem não deve, não teme. Então por que "fugiram" senhores parlamentares deixando o Congresso vazio, desmarcando todas as sessões? A sociedade pôde constatar mais uma vez que os povos indígenas apenas lutam para que se cumpra a Constituição, não são canibais, baderneiros ou cidadãos de segunda categoria. Pelo contrário, talvez sejam os brasileiros de raiz que mais defendem a Constituição.

     

    Na véspera da comemoração dos 25 anos da Constituição, os povos indígenas expressaram sua indignação, exigências e esperanças: “Repudiamos de público os ataques orquestrados pelo governo da presidente Dilma Rousseff e parlamentares majoritariamente ruralistas do Congresso Nacional, contra nossos direitos originários e fundamentais, principalmente os direitos sagrados à terra e bens naturais garantidos pela Constituição Federal de 1988”. Reafirmam: “Diante dessa realidade, de forma unânime, de uma só voz, declaramos e exigimos do Estado brasileiro, inclusive do Poder Judiciário, que respeite os nossos direitos, que valorize a diversidade e pluralidade da sociedade brasileira. Reafirmamos que vamos resistir, inclusive arriscando nossas vidas, contra quaisquer ameaças, medidas e planos que violem nossos direitos e busquem nos extinguir, por meio da invasão, destruição e ocupação de nossos territórios e bens naturais, para fins desenvolvimentistas e de interesse de uns poucos”.  Por fim, exigem o arquivamento imediato e definitivo de todas as iniciativas que afrontam seus direitos e a retomada imediata da demarcação de todas as terras indígenas (Declaração em defesa da Constituição Federal, dos direitos constitucionais indígenas, quilombolas e de outras populações e da mãe natureza).

     

    A volta vitoriosa

     

    Brasília se enfeitou de verde para acolher os povos indígenas, no espaço da Esplanada dos Ministérios, que já se transformou em patrimônio de luta dos povos originários desse país, na luta pelos seus direitos.

     

    Recado dado. É hora de voltar para as aldeias, onde a vida e a luta continuam. Deixaram a capital federal satisfeitos com as mobilizações realizadas numa semana intensa, mas que não tirou o ânimo de quem veio para mais uma batalha por seus direitos ameaçados e desrespeitados. Vieram para defender e exigir respeito à Carta Magna do país, que eles ajudaram a construir há 25 anos e que em grande parte continua sendo desrespeitada por aqueles mesmos que deveriam ser os primeiros a cumpri-la. Mas também voltam preocupados, pois sentem a má vontade e a malvadeza que acontece nos três poderes, ameaçando e violando os direitos indígenas.

     

    Em suas bagagens levam, além das armas que sustentam suas esperanças, arcos, flechas, bordunas, inúmeras lembranças das mobilizações, registros das falas indignadas, dos momentos de tensão e repressão, das centenas de militares postados à sua frente para impedir que pudessem entrar na casa do povo. Levam também a certeza de que voltam às suas terras mais unidos e articulados e com um apoio muito maior da sociedade brasileira, que não apenas viu e vibrou com as manifestações, mas que vai também cobrar o respeito aos direitos e consolidação de um país plurinacional, respeitador de sua gente raiz, originária.

     

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  • 04/10/2013

    Povo Terena retoma fazenda em terra indígena declarada desde 2007

    Ruy Sposati, de Miranda (MS)
    Para o Comitê de Imprensa da Mobilização Nacional

    Um grupo de 30 lideranças Terena ocupou a fazenda São Pedro do Paratudal, em Miranda (MS), região do Pantanal, no final da tarde desta quinta-feira, 3. Arrendada para criadores de gado, a propriedade incide sobre a Terra Indígena Cachoeirinha, declarada pelo Ministério da Justiça em 2007. Não houve conflito. A retomada faz parte da Mobilização Nacional Indígena, convocada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, em defesa dos direitos constitucionais e pela demarcação de terras.

    A intenção dos Terena é pressionar para que proprietários de terras que incidem sobre Cachoeirinha aceitem o pagamento das indenizações, parte do processo de desintrusão, de modo que a comunidade possa finalmente ocupar seu território tradicional.

    Conhecida pelos indígenas como Canta Galo, a fazenda de 600 hectares é propriedade de Pedro Paulo Pedrossian, filho do ex-governador do Mato Grosso do Sul, Pedro Pedrossian. O pai também era proprietário da fazenda Petrópolis, com 1,2 mil hectares incidentes na Terra Indígena Cachoeirinha, mas passou para o nome da filha Maura Regina Pedrossian.

    A fazenda Petrópolis já foi ocupada quatro vezes pelos indígenas. Na primeira tentativa, em 2008, os Terena permaneceram 15 dias na área, sendo expulsos por decisão judicial. Na segunda vez, em 2009, a comunidade permaneceu por sete meses. O caso foi parar no Supremo Tribunal Federal (STF) e o ministro Gilmar Mendes deu decisão favorável ao fazendeiro. Dessa vez, os indígenas foram retirados de forma violenta da área pela Polícia Federal (assista aqui).

    Em 2011, na terceira tentativa, um interdito proibitório os fez sair das terras da Petrópolis. Porém, o interdito também se estendeu a fazenda São Pedro Paratudal, mesmo que os Terena nunca tivessem tentado sequer uma retomada. No mesmo período, um ônibus escolar Terena foi atacado e incendiado, levando à morte uma jovem indígena e deixando diversas crianças queimadas. A investigação sobre o crime nunca foi concluída, mas os indígenas atribuem o ataque aos fazendeiros, numa tentativa de intimidar o povo. 

    Nada, no entanto, parece demover os Terena de retornar para o território tradicional. No ano passado, outra tentativa de recuperar a Petrópolis: dessa vez foram expulsos por jagunços e parentes do fazendeiro fortemente armado com pistolas e metralhadoras.

    Indenizações

    Os cerca de 8 mil indígenas que vivem em Cachoeirinha ocupam apenas 2,6 mil hectares da terra indígena, apesar da Portaria Declaratória determinar 36 mil hectares. O restante da área é tomada por 54 propriedades rurais. A Fundação Nacional do Índio (Funai) realizou o levantamento de benfeitorias em 12 dessas propriedades. Os recursos para os pagamentos estão disponíveis, mas os fazendeiros ainda não pegaram a verba. Ao contrário, as ameaças seguem contra os Terena.

    Em entrevista ao portal G1 (leia aqui) o advogado Newley Amarilla, de pecuaristas da região do Pantanal onde há conflito com indígenas, disse: “A partir de hoje, se houver invasão [indígena], os produtores que estão lá em Dois Irmãos do Buriti e Sidrolândia prometem reagir e ficar, se necessário for, à bala”.

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  • 04/10/2013

    Povos indígenas do sul da Bahia desocupam BR-101 depois de agenda com ministro da Justiça

    Comitê de Imprensa da Mobilização Nacional,

    de Brasília (DF)

    Os cerca de 1.300 indígenas que por dois dias e meio fechavam trecho da BR-101, altura do KM-767, no sul da Bahia, decidiram no fim da tarde desta quinta-feira, 3, desobstruir a via, depois de assembleia entre as lideranças dos povos Pataxó, Tupinambá e Pataxó Hã-hã-hãe. Isso porque o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, agendou reunião com uma comissão de indígenas para a próxima quarta-feira, 9, para tratar da pauta de reivindicações do movimento (abaixo).

    No início da manhã de hoje, a Mobilização Nacional Indígena definiu pela manutenção do fechamento da rodovia por tempo indeterminado. Sem as reivindicações atendidas, a coordenação definiu pela continuidade da ação e de seguir para o terceiro dia de ocupação, nesta sexta, 4.

    Porém, 80 soldados da Tropa de Choque da Polícia Militar chegaram se posicionando a 500 metros do local onde estavam os indígenas. Com o grupo, a Polícia Rodoviária Federal. De acordo com os indígenas, o comandante militar disse a eles que se não saíssem a tropa iria retirá-los à noite e à força.

    “Temos crianças, mulheres e idosos. Não queremos que nada de mal os aconteça. Vamos pedir para o Choque se retirar e depois voltaremos para nossas comunidades”, disse um indígena. Porém, a agenda com o ministro e tudo ficou resolvido.

    O trancamento da rodovia foi uma das dezenas de ações da Mobilização Nacional Indígena. Os protestos são contra as Propostas de Emendas à Constituição (PECs) 215/00, 038/99, PLP 227/12 e Portaria 303/AGU. Todas visam o mesmo objetivo: modificar a Carta Magna conforme os interesses dos latifundiários e ruralistas do agronegócio.

    Leia na íntegra outras reivindicações:

    Portarias Declaratórias das Terras Indígenas Barra Velha, Tupinambá de Olivença e Tumbalalá; Portaria Declaratória do Território Tupinambá de Belmonte; Publicação do Relatório Antropológico do Território Indígena Kay/Pequi; Conclusão dos Estudos Antropológicos de Revisão de Limites das Terras Indígenas Coroa Vermelha e Mata Medonha; Decreto de Desapropriação por Interesse Social da Gleba C, Terra Indígena Pataxó Coroa Vermelha/Juerana e Aroeira; Homologação da Terra Indígena Aldeia Velha; Criação de Grupo de Trabalho – GT, para Identificação dos Territórios Indígenas: Atikum Nova Vida, Kambiwá Reviver, Atikum Bento 1, Xacriabá Cocos, Potyguará Muquém, Neo Pankararé, Pankararé Rodelas, Atikum Nova Esperança, Atikum Curica, Kapinawá Serra do Ramalho, Funiôr Serra do Ramalho, Tapuia Moquém, Truká Kamixá e Pataxó Hã-Hã-Hãe Serra do Ramalho e Tupinambá de Itapebi.

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  • 04/10/2013

    Reportando uma guerra secular

    Em frente ao Congresso centenas de policiais estão a postos e dispostos a reagir a qualquer tentativa de entrada na “casa do povo”. Do outro lado da trincheira verde, centenas de indígenas de todo o país decididos a visitar a sua casa e entregar um documento com suas exigências e reivindicações. Quando os indígenas se aproximam, recebem uma rajada de spray de pimenta nos olhos. Correm com a forte ardência dos olhos. Revoltados pelo ato covarde dos “recepcionistas” com suas armas modernas de uma guerra secular, insistem em sua intenção de entrar no Congresso, covardemente abandonado, com as atividades suspensas. Seguem-se momentos de tensão e expectativa. Os Kayapó e Xavante fazem seus rituais de guerra e com seus arcos, flechas e bordunas avançam em direção aos policiais. Centenas de guerreiros de inúmeros povos se posicionam frente ao Congresso, no qual pretendiam entrar para um ato de protesto, num diálogo impossível, de uma casa donde partem iniciativas mortais contra seus povos e direitos.

    É apenas mais um capítulo de uma guerra secular. Mudam as armas e os atores, mas o processo de invasão, violência, saque e extermínio genocida continuam. Infelizmente, nessas últimas décadas, tenho sido mais uma espécie de repórter, testemunha e indignado relator das violências que o projeto colonizador impetra contra os povos originários dessa terra.

    A guerra se sofisticou. Colocaram-se silenciadores nas armas pesadas, aprovadas na calada da noite, nas formas de projetos de lei, portarias, projetos de emendas constitucionais e todo um arsenal de artilharia acionada contra os direitos constitucionais indígenas

    Simbolicamente, na tarde desse dia 2 de outubro, Brasília se transformou no palco de mais uma batalha contra os direitos dos povos indígenas. Impedidos de entrar no Congresso, os indígenas manifestaram sua indignação fechando os acessos aos Três Poderes e circulando por esses espaços, fortemente ocupados por tropas policiais.

    Mulheres Pataxó, de Coroa Vermelha, revoltadas com a ação dos policiais que atiraram spray de pimenta em seus olhos, chorando, xingavam os responsáveis pela atualização da violência desses 513 anos, desde que Cabral iniciou a invasão de seu território.

    Solidariedade e apoio

    Foi um dia marcante para os mais de mil indígenas de uma centena de povos de todo o país. Foi o momento de deixar as cores da lona de circo e circular nos espaços dos Três Poderes, em lindos e coloridos rituais e indignadas manifestações e exigências.

    Mas foi também um dia em que receberam importante solidariedade da Central Única dos Trabalhadores (CUT): “Declaramos todo apoio à semana de mobilização em defesa dos direitos indígenas, presentes na Constituição Federal…” e do Sindicato dos Servidores Públicos no Distrito Federal (Sindsep-DF):“vem a público apoiar a convocação da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil para as manifestações em defesa dos direitos indígenas presentes na Constituição Federal de 1988… Nós, enquanto representantes dos servidores públicos, não podemos estar ausentes dessa luta, pois o que está em jogo é a soberania nacional”. Também receberam importante apoio da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), onde participaram de um debate e de uma centena de deputados aliados que vieram até o acampamento trazer seu apoio e solidariedade.

    A mobilização e luta dos povos indígenas em todo o Brasil e, particularmente em Brasíli,a a cada dia que passam vem recebendo apoio da sociedade brasileira e internacional, “pois essa é uma luta pela vida dos povos, da natureza e do planeta Terra”.

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  • 03/10/2013

    Nota pública da Aty Guasu sobre a Mobilização Nacional Indígena

    Aty Guasu, assembleia dos povos indígenas Guarani e Kaiowá do Mato Grosso Sul, divulgou uma nota pública (pelo Facebook), para esclarecer as razões de sua participação e dos demais povos indígenas na ampla mobilização que se realiza no país (com repercussão até no exterior) em defesa dos direitos indígenas. Nessa nota, a Aty Guasu destaca que os direitos indígenas, sacramentados na Constituição Federal brasileira de 1988, estão gravemente ameaçados por legislação proposta por parlamentares da bancada ruralista do Congresso,  visando subtraí-los. A retirada desses direitos constitucionais, obtidos através da luta dos movimentos indígenas e sociais democráticos, implica mesmo a volta à situação de genocídio dos povos indígenas existente à época da ditadura militar no país. A Aty Guasu agradece o apoio de toda a sociedade e solicita divulgação desta nota:

     

    Esta nota da Aty Guasu é para explicitar os fundamentos da Mobilização Nacional Indígena frente ao avanço de prática do genocídio moderno do século XXI contra os povos indígenas, no Brasil, originados e amplificados pelos políticos ruralistas anti-indígenas. 

     

    Como já é sabido, após a redemocratização do Brasil, em meados de 1980, graça à mobilização nacional histórica dos povos plurais brasileiros, na Constituição Federal de 1988, foram garantidos os direitos indígenas. São, portanto, resultado de demandas dos povos indígenas, povos tradicionais diversos e, sobretudo, dos movimentos sociais e civis que lutaram intensamente para inaugurar e efetivar a democracia. 

     

    Importa muito destacar que esses direitos indígenas constitucionais, a partir de 1988, evitam a continuidade do genocídio e de violências diversas contra os povos indígenas no Brasil, garantindo: o direito à sobrevivência indígena de forma humana e digna, o direito ao reconhecimento da parcela dos territórios tradicionais indígenas, o direito à educação escolar diferenciada, o direito à saúde, entre outros. 

     

    Sabemos que antes da promulgação dos direitos indígenas, os povos indígenas no Brasil eram considerados como não humanos, sem direito à vida. Os diversos povos nativos eram submetidos a processos de extermínio/genocídio, que resultaram na extinção de diversos povos nativos no país. Vários povos indígenas foram expulsos de suas terras tradicionais pelos atuais políticos ruralistas. Os indígenas foram escravizados, massacrados e violentados pelos atuais políticos ruralistas, apoiados pela ditadura militar. 

     

    Assim, o Brasil, no passado, já foi um país escravista, genocida, sobretudo, já foi um país praticante legal de crimes bárbaros e hediondos contra os povos indígenas, contra os povos negros, etc. Ao longo de 513 anos, a história real do Brasil evidencia que o Estado já cometeu todos os tipos de crimes de etnocídio e genocídio contra os indígenas e contra a humanidade. 

     

    Como já mencionamos, a partir da promulgação da nova Constituição Federal da República, no dia 5 de outubro de 1998, os processos de genocídio formal e as violências legais contra os povos indígenas, em parte, começaram a mudar, iniciando-se uma nova história no Brasil. 

     

    Passados 25 anos, atualmente os direitos indígenas estão em processo inicial de implementações pelo Governo Federal e pela Justiça do país. Diante da tentativa de se efetivarem os direitos indígenas pela justiça brasileira, já existe um forte movimento dos políticos ruralistas, no Legislativo (Câmara dos Deputados e Senado), para alterar os direitos indígenas, através de PECs e outros projetos legislativos. Esse movimento da República Ruralista no Poder Legislativo tenta ignorar os direitos indígenas, humanos e a história da luta dos povos brasileiros democráticos desencadeadas em meados de 1980. 

     

    Claramente, esse movimento ruralista anti-direitos indígenas estimula, por meio da alteração dos direitos indígenas, a volta da ação genocida do passado, violências diversas, crimes bárbaros contra as vidas dos sobreviventes indígenas no Brasil. 

     

    Hoje, nós indígenas, sabemos muito bem que a maioria da população brasileira indignada e injustiçada se manifesta e luta pela justiça no Brasil. De modo igual, nesta Mobilização Nacional indígena, entre os dias 30 de setembro e 5 de outubro de 2013, mais uma vez, nós, indígenas Guarani e Kaiowá, no estado de Mato Grosso do Sul, juntamente com outros povos indígenas violentados e expulsos de nossas terras tradicionais pelos políticos ruralistas, estamos em mobilização permanente para defender os nossos direitos já garantidos na Constitucional Federal que estão ameaçados pelos políticos ruralistas na Câmara dos Deputados. 

     

    Estamos nos manifestando em nossos acampamentos precários, mobilizamo-nos nas rodovias, manifestamo-nos em frente dos órgãos públicos. Em todas as aldeias foi impedido o fornecimento de água potável, por isso lutamos reiteradamente para efetivar os nossos direitos constitucionais, manifestamo-nos pela demarcação e posse de nossas terras tradicionais, pelo direito à saúde indígena de qualidade e direito à educação escolar indígena diferenciada. Estamos lutando contra o genocídio. Pedimos a punição dos fazendeiros assassinos das lideranças indígenas. Por fim, solicitamos o arquivamento da PEC 215.

     

    Agradecemos a toda a sociedade nacional e internacional pelas participações na Mobilização Nacional Indígena.

     

    NÓS TODOS POR NÓS MESMOS, LUTAMOS PARA SOBREVIVERMOS. 

     

    A todos os cidadãos divulgadores de nossa Mobilização Indígena e a todas os jornalistas prestamos os nossos sinceros agradecimentos pela divulgação.


    Contamos sempre com o povo brasileiro que luta para efetivar os direitos humanos.

    Atenciosamente,

    Tekoha Guasu, 1º. de outubro de 2013

    Aty Guasu Guarani e Kaiowá contra o genocídio #PEC215.

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