• 30/01/2014

    Ocupação da Funai é mais um capítulo do abandono aos povos indígenas

    Em cumprimento ao mandado do juiz do Tribunal Regional Federal (TRF), Érico Rodrigo Freitas Pinheiro, da 1ª Vara Federal, que no último dia 21 de janeiro determinou a desocupação do prédio da Fundação Nacional do Índio (Funai), a Polícia Federal retirou os indígenas Kokama, Mura, Munduruku, Miranha, Apurinã e outros que acampavam no pátio do órgão desde o dia 04 de novembro do ano passado. No contexto de outros eventos envolvendo os povos indígenas, o fato se constitui em mais uma evidência do abandono a que o governo federal tem relegado essas populações em todo o país.

     

    Especificamente no caso dos indígenas da cidade de Manaus, o movimento com duração de mais de dois meses foi interrompido por ação da Justiça sem que o poder público tenha aberto o diálogo para ouvir as lideranças. Gestores de órgãos governamentais, em todas as recentes ocupações promovidas pelos indígenas, em vez de ouvi-los ou atender suas reivindicações, têm se limitado a usar a força policial sem adotar alguma solução concreta, sobretudo em relação à falta de moradia das famílias indígenas na cidade.

     

    Nos últimos anos, em vários cenários em todo o país, têm aumentado o número de manifestações preconceituosas contra os indígenas. Isso é conseqüência da estratégia política dos grupos antiindígenas interessados em rever direitos constitucionais, como a garantia às terras tradicionalmente ocupadas e a revisão dos procedimentos demarcatórios, retirando do Poder Executivo a prerrogativa de homologar as demarcações.

     

    Recentemente, os Tenharim e Djahoi, de terras indígenas localizadas entre os municípios de Manicoré e Humaitá, no sul do Amazonas, foram alvo de ataques orquestrados mais por representantes de madeireiros e latifundiários do que pela população em geral – grande parte insuflada por políticos e “comunicadores” de Humaitá.

     

    Os Mura, da região de Autazes, Careiro, Manaquiri, Borba e Nova Olinda, têm sido vítimas de ameaças de fazendeiros da localidade em vista do anúncio da demarcação de suas terras. Em decorrência dos conflitos, pelo menos oito lideranças declararam ao Ministério Público Federal no Amazonas terem sofrido ameaças de morte.

     

    Os indígenas de Manaus e das demais localidades do estado do Amazonas há muito tempo vêm cobrando do governo federal, tanto pela Funai como pela Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) – órgãos encarregados de prestar assistência direta aos povos indígenas -, proteção aos territórios já demarcados e regularização das terras a identificar ou já identificadas, cujos procedimentos demarcatórios encontram-se paralisados, maior atenção nas áreas de educação, saúde e sustentação econômica.

     

    A desassistência e o descaso foram as principais motivações para a ocupação do prédio da Funai. No momento em que a Polícia Federal retira os indígena do local, mais um capítulo do abandono se escreve confirmando, assim, a falta de interesse por parte do Estado brasileiro em criar condições para que os povos indígenas vivam dignamente e da maneira que melhor lhes aprouver. Essa postura do governo federal merece repúdio da sociedade brasileira, pois não se circunscreve somente em torno da questão indígena, mas afeta todos os segmentos que reagiram e reagem à submissão dos governantes e da classe política – majoritariamente -, aos interesses dos latifundiários, do agronegócio e do grande capital em todas as suas formas.

     

     

    Manaus (AM), 29 de janeiro de 2014

     

    Comitê Regional da Verdade

    Conselho Indigenista Missionário

    Foto na chamada: Alberto César Araújo, Amazônia Real

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  • 28/01/2014

    Ao invés da conclusão do processo demarcatório, base policial é montada em terra tradicional dos Tupinambá

    Patrícia Bonilha,

    de Brasília

     

    Após realizar a reintegração de posse de duas fazendas localizadas na Serra do Padeiro, no município de Ilhéus, na Bahia, policiais federais e da Força Nacional montaram hoje (28) uma base policial na sede da fazenda Sempre Viva. Com uma infra estrutura que conta com vários colchões, camas, rádio e alguns veículos, os policiais se instalaram na área reivindicada pelos indígenas e, desde 2009, reconhecida pela Fundação Nacional do Índio (Funai) como território tradicional indígena.

     

    O fato causou indignação no povo Tupinambá, que havia feito a retomada destas fazendas em agosto de 2013. “Nunca pedimos base policial aqui, até mesmo porque não há conflitos na área. O que nós queremos é que devolvam as nossas terras. Há quase cinco anos esperamos que o Ministro da Justiça tire da sua gaveta e assine a portaria declaratória que reconhece os nossos direitos”, afirma Magnólia Tupinambá, diretora da escola indígena.

     

    Segundo informações dos indígenas, os policiais utilizaram a desculpa de realizar a reintegração de posse, para montar esta base policial dentro da terra tradicional. “Desde que foi montada, a base ficou cheia de fazendeiros. Agindo assim, o governo e a polícia explicitam que, ao invés de defenderem direitos constitucionais, eles defendem os interesses dos fazendeiros que invadiram nossas terras. A história nada mudou nestes 500 anos, desde a primeira invasão dos portugueses aqui na Bahia”, declara a diretora.

     

    Os indígenas estavam trabalhando nas roças quando, às 9 horas, 18 veículos da polícia chegaram na sede da fazenda. Segundo informações passadas aos Tupinambá por um funcionário da Funai, todos os pertences dos indígenas seriam colocados em um cômodo da sede.

     

    No caso da fazenda Conjunto São José, por volta das 11 horas, os policiais teriam colocado as bagagens, alimentos, móveis (fogão, geladeira, armário, etc) em um caminhão e deixado na beira da estrada, próximo à fazenda Floresta, há cerca de 10 km. As reintegrações foram feitas nas duas fazendas, onde 18 famílias estavam morando, sem que houvesse qualquer resistência dos indígenas, que seguiram trabalhando e fazendo seus rituais no mato.

     

    Segundo informações do delegado que atua em Buerarema, uma nova reintegração de posse será feita na próxima quinta-feira na fazenda Lembrança.

     

    Governo não investe em solução definitiva

     

    A paralisação dos processos de demarcação de territórios indígenas em todo o Brasil tem causado desde o ano passado um considerável aumento dos conflitos envolvendo a disputa de terras. Os indígenas avaliam que muita violência e até mesmo mortes poderiam ser evitadas se o governo finalizasse os processos de demarcação que precisam ainda de alguma providência por parte do poder Executivo.

     

    Exemplo disso é a própria solicitação de suspensão da reintegração de posse da fazenda Conjunto São José, na qual a Funai afirma que ela “foi proferida sem suficiente amparo jurídico, haja vista a existência de relatório circunstanciado, aprovado pelo Presidente da Funai (Despacho n. 24, DOU de 20/04/2009) e já encaminhado ao Ministério da Justiça para homologação da demarcação, o qual reconhece que a área na qual se situa o imóvel litigioso é terra indígena tradicionalmente ocupada, cuja posse e usufruto são exclusivos da Comunidade Tupinambá”.

     

    Apesar de ter indeferido o pedido da Funai, o Desembargador Federal, Mário César Ribeiro, reconheceu que “essa expectativa — da finalização do processo demarcatório pelo Executivo, que geralmente arrasta-se por anos — além de gerar insegurança à população das áreas envolvidas, suscita violência decorrente da disputa da posse de terras entre índios e não índios.

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  • 28/01/2014

    Polícia Federal retorna à Terra Indígena Marãiwatsédé (MT) para conter invasão de não índios

    Equipes das polícias Federal e Rodoviária Federal retornaram à Terra Indígena (TI) Marãiwatsédé, no nordeste do Mato Grosso, para impedir uma nova invasão de não índios. Ainda não há informação sobre o efetivo deslocado à região (na foto ao lado, crianças Xavante)

     

    A ação atende decisão da Justiça Federal em Cuiabá, por sua vez obtida por um pedido do Ministério Público Federal. A área voltou a ser invadida no último fim de semana de forma organizada, depois que homens da Força Nacional de Segurança (FNS) deixaram-na, na semana passada. 

     

    Há exatamente um ano terminava a operação de desintrusão de Marãiwatsédé, decorrente de decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que determinou a retirada de todos os não índios. Não é possível reverter a determinação do STF, tendo em vista que o caso transitou em julgado, ou seja, não cabe mais nenhum recurso judicial. Muito menos há hoje alguma decisão da Justiça que pretenda contrariar tal determinação.

     

    De acordo com os Xavante, um grupo de pelo menos 50 pessoas invadiu a localidade conhecida como Posto da Mata, no interior da TI, expulsando servidores da Fundação Nacional do Índio (Funai). Na manhã de domingo (26/1), o cacique Damião Paridzané foi perseguido quando tentava se aproximar

     

    “Eu fui cedo para Mo onipá [como os indígenas chamam o Posto da Mata]. Havia quatro funcionários da Funai. Não consegui chegar lá porque os posseiros fecharam a estrada. Todo o mundo correu atrás da gente”, relata Paridzané. “É preciso agir logo. Não podemos circular pelo nosso território com os invasores aí. O que nos falta agora é segurança. O carro da saúde não pode sair. Estamos preocupados.”

     

    Apesar da presença da FNS ao longo de 2013, diversos grupos foram flagrados pelos policiais e pelos Xavante durante o ano em rondas pela TI, fragilizada mesmo após a desintrusão pela existência de estradas que cortam a área e facilitam invasões. A tentativa de reinvasão constitui crime e um atentado contra a decisão da última instância do Poder Judiciário brasileiro.

     

    Ontem, a Operação Amazônia Nativa (OPAN), o Instituto Socioambiental (ISA), o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e o Greenpeace circularam uma nota pública em que pedem e apoiam o retorno da força policial à TI Marãiwatsédé. O texto cobra a presença do Estado e tratamento digno aos pequenos posseiros que eventualmente estejam no local (veja a nota).

     

    O desejo de que os pequenos agricultores da região vivam com qualidade é também compartilhado pelos índios. Durante o processo de desintrusão, Paridzané falou diversas vezes sobre o equívoco de se polarizar o embate como sendo de brancos contra índios.

     

    “Os políticos não estão preocupados em melhorar a vida nem dos índios nem dos não índios. Será que o governador se preocupa com a situação do povo hoje? Em todos os municípios daqui, o povo não tem água, não tem esgoto, não tem desenvolvimento. Ele, como autoridade de Mato Grosso, tem a obrigação de atender as dificuldades do povo, mas ele não quer. Mas os políticos preferem jogar o branco contra o índio, como se isso fosse resolver alguma coisa”, disse Paridzané em dezembro de 2011.

     

    Entenda o caso

     

    Em 1992, em meio aos trabalhos de identificação, um grupo formado por políticos e fazendeiros organizou uma invasão ao território tradicional dos Xavante, iniciando uma longa batalha judicial pela desintrusão, somente finalizada ano passado com apoio policial. Homologada em 1998, a TI Marãiwatsédé tem 165 mil hectares e, por causa da ação dos invasores, tornou-se um dos territórios indígenas mais desmatados do país.

     

    Em outubro de 2013, o STF confirmou decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) no sentido de considerar que a posse de todos os réus sobre a área em litígio era ilícita, de má-fé, porque eles sabiam que se tratava de terra indígena quando de sua entrada.

     

    A tentativa de invadir novamente Marãiwatsédé ocorre em meio a uma série de ataques à legislação indigenista por meio de projetos inconstitucionais defendidos pela bancada ruralista no Congresso. Entre esses projetos, estão a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215, que tira do Executivo e transfere ao Congresso a prerrogativa de aprovar as demarcações de TIs e o Projeto de Lei Complementar (PLP) 227, que abre as terras indígenas à exploração econômica do agronegócio, empresas de energia e mineração.

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  • 27/01/2014

    Comunidade Guarani Kaiowá mais ameaçada enfrenta nova reintegração de posse

    Ruy Sposati, de Campo Grande (MS)


    A comunidade Guarani Kaiowá mais ameaçada do momento, o tekoha Apyka’i, no município de Dourados (MS), poderá enfrentar mais uma reintegração de posse.

    Uma nova manobra judicial garantiu que uma decisão – já cumprida – da Justiça Federal de 2009, em favor do Cássio Guilherme Bonilha Tecchio, proprietário da Fazenda Serrana, fosse, mais uma vez, utilizada contra os indígenas.

    Agora, os Kaiowá tem 30 dias para sair do local, onde estão acampados desde setembro de 2012.  O prazo para o despejo passa a contar a partir desta segunda-feira, 27. A liderança da comunidade, Damiana, reafirma que os indígenas não sairão da terra.

    Até setembro do ano passado, a área era utilizada pela Usina São Fernando para plantio de cana em larga escala. Foi quando Damiana e sua comunidade retomaram o território, depois de 14 anos acampados à beira da rodovia BR-463, a 8 quilômetros do centro de Dourados, e voltaram a incomodar os produtores da usina. A terra reivindicada pelos Kaiowá como tradicional está em processo de identificação e delimitação pela Fundação Nacional do Índio (Funai).

    "Agora não vou deixar mais cortar cana e nem passar veneno", afirma a cacica Damiana. Ela quer dizer que os Kaiowá não pretendem sair da fazenda. "Meu pai morreu aqui no tekoha. Cemitério antigo tá aqui, fazendeiro botou fogo em tudo. Agora só usina usa. Chega. Chega de aproveitar a terra aqui a usina. Usina não vai mais cortar cana".

    Veja entrevista em vídeo com cacica Damiana

    "Deixa assim mesmo. Apodrecer a cana". Ela se refere às plantações que estavam no local no momento da retomada. "Eu não vou sair mais daqui. Pode ser tiro, não vou sair mais não. E não vou deixar colher nem passar veneno".

    A usina

    Instalada em Dourados em 2009, a Usina São Fernando é um empreendimento do Grupo Bertin, um dos maiores frigoríficos produtores e exportadores de itens de origem animal das Américas, e da Agropecuária JB, ligada ao Grupo Bumlai, especializado em melhoramento genético de gado de corte. Um dos territórios utilizados pela usina para produzir cana é reivindicado pelo Kaiowá do Apyka’i.

    Em 2010, sob perigo de perder sua licença de operação em função de diversos descumprimentos legais em questões trabalhalistas, ambientais e indígenas, a usina teve de assinar um termo de cooperação e compromisso de responsabilidades na Justiça.

    Entre as condicionantes estabelecidas pelo Ministério Público Estadual, Ministério Público do Trabalho e MPF, a usina era obrigada a não renovar o contrato de arrendamento da fazenda Serrana, de Cássio Guilherme Bonilha Tecchio, propriedade que incide sobre o território reivindicado como Apyka’i pela família de Damiana, quando o atual findasse.

    O tekoha

    Já a história dos Guarani Kaiowá se perde no tempo – mas, em seu ciclo particular de cana-de-açucar, os anos de beira de estrada, uma série tragédias acometeu a família de Damiana. Cinco pessoas morreram por atropelamento – o último, Gabriel, um dos netos de Damiana, morto em março de 2012, aos 4 anos de idade. Uma idosa faleceu, segundo indígenas, envenenada por agrotóxicos utilizados nas plantações que circundam o acampamento.

    Tentaram retomar o território algumas vezes. A última tentativa havia acontecido em junho de 2008, e duraria até o cumprimento da decisão judicial citada no início do texto. Depois de expulsos, a comunidade voltaria a viver na beira da estrada.

    Em setembro de 2009, um grupo armado atacou o acampamento, atirando em direção aos barracos. Um Kaiowá de 62 anos foi ferido por tiros, outros indígenas agredidos e barracos e objetos foram queimados.

    Também em 2012, em agosto, ainda acampados na beira da estrada, um incêndio que segundo indígenas teria sido iniciado propositalmente no canavial da Usina São Fernando alastrou-se pelo acampamento, destruindo barracas, alimentos e pertences dos indígenas, forçando-os a fugir. A causa do incêndio ainda não foi confirmada.

    Pouco mais de um mês depois, em 16 de setembro, contudo, depois de 14 anos acampados na rodovia, a comunidade mais uma vez moveu seu acampamento para dentro do território reivindicado como tradicional, onde hoje incide a fazenda Serrana, utilizada pela São Fernando para a monocultura em larga escala de cana-de-açucar.

    "Nós nunca mais vamos sair daqui. Se nós matarem, peço que tragam pás para nos enterrar. Mesmo que nos invadem aqui, não vamo sair nunca mais. Vamos resistir aqui. Mesmo que nos ameaçam vamos ficar aqui. A luta sempre vai continuar, mesmo eu morrendo, porque eu tenho vários netos", afirma Damiana.

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  • 27/01/2014

    Organizações demandam retirada de invasores de Marãiwatsédé

    Há exatamente um ano terminava a operação de desintrusão da Terra Indígena Marãiwatsédé, no nordeste de Mato Grosso. Ela resultou de decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), órgão máximo da Justiça brasileira, que determinou a retirada de todos os não índios da área. Lamentavelmente, no aniversário da emblemática retomada do território xavante após 20 anos de batalhas judiciais pelo direito de ocupar suas áreas tradicionais, uma nova invasão, orquestrada localmente, acaba de acontecer. De acordo com os Xavante, um grupo de pelo menos 50 pessoas invadiu a localidade conhecida como Posto da Mata, no interior da terra indígena, expulsando servidores da Fundação Nacional do Índio (Funai) que ali trabalhavam. Na manhã de domingo (26/1), o cacique Damião Paridzané foi perseguido quando tentava se aproximar do local.

     

    Apesar da presença da Força Nacional de Segurança ao longo do ano de 2013, diversos grupos foram flagrados pelos policiais e pelos Xavante em rondas pela Terra Indígena Marãiwatsédé, fragilizada mesmo após a desintrusão em virtude da existência de estradas que cortam a área – fato este que facilita as invasões. Entretanto, o que se viu no episódio que se iniciou neste fim de semana foi uma ação articulada de tentativa de reinvasão, o que constitui um crime e atentado contra a decisão da última instância do Poder Judiciário brasileiro.

     

    Não é possível reverter a determinação do STF de retirar todos os não índios da área tendo em vista que o caso transitou em julgado, ou seja, não cabe mais nenhum recurso judicial. Muito menos há hoje alguma decisão da Justiça que pretenda contrariar tal determinação. Em respeito a ela, a Justiça Federal já decidiu que as forças policiais devem retornar à Terra Indígena para retirar os invasores e manter a ordem.

     

    Essa nova invasão a Marãiwatsédé é mais uma afronta ao direito do usufruto exclusivo das terras indígenas, em meio a ataques à legislação indigenista expressos em projetos inconstitucionais defendidos pela bancada ruralista, como a PEC 215, que tira do Executivo e transfere ao Congresso a prerrogativa de aprovar as demarcações de terras indígenas – o que na prática significará a paralisação das mesmas – e o PLP 227 que abre as terras indígenas à exploração econômica do agronegócio, empresas de energia e mineração.

     

    As entidades abaixo-assinadas apelam pela presença do Estado brasileiro e do comprometimento do governo de Mato Grosso para não acirrar a situação de tensão, cumprindo com seu dever de garantir governança na região e dignidade no assentamento de famílias de pequenos posseiros.

     

    Alertamos sobre a gravidade desse fato e a reincidência de atos de ilegalidade praticados contra as terras indígenas, em total desrespeito aos povos e à Justiça brasileira, solicitando que o Estado brasileiro tome medidas enérgicas para desestimular e punir atitudes criminosas como essa.

     

    Conselho Indigenista Missionário (Cimi)
    Greenpeace
    Instituto Socioambiental (ISA)
    Operação Amazônia Nativa (Opan)

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  • 27/01/2014

    Redução de Terra Indígena não é alternativa para solução de conflitos fundiários

    O Conselho Indigenista Missionário manifesta preocupação diante da possibilidade de haver “redução” dos limites da Terra Indígena Mato Preto, no estado do Rio Grande do Sul.


    Em reunião realizada no dia 23 de janeiro, nas dependências do Ministério Público Federal, no município de Erechim, a comunidade indígena que ocupa uma pequena parcela dos 4.230 hectares declarados tradicionais do povo Guarani Chiripá e Mbya, apresentou pedido para que a referida área seja reduzida. A justificativa apresentada pelos Guarani, foi a de que não suportam mais as condições precárias a que estão expostos no acampamento em que vivem, há cerca de 12 anos, à margem da via férrea sob concessão da América Latina Logística (ALL), próximo à rodovia BR 153.


    Em nenhum momento os Guarani questionaram as provas técnico-científicas contundentes que embasam o procedimento administrativo e justificam a emissão da  portaria declaratória número 2.222, pelo Ministro da Justiça, no dia 21 de setembro de 2012.


    Além da comprovada morosidade do governo federal na condução do procedimento administrativo de demarcação de terras indígenas, deputados ruralistas do Rio Grande do Sul tem feito discursos anti-indígenas agressivos e inflamatórios, não hesitando em criminosamente incentivar a fazendeiros e agricultores a pegarem em armas e declararem guerra contra os indígenas naquele estado.


    O Conselho Indigenista Missionário manifesta compreensão e respeito ao pedido feito pelos Guarani. No entanto, entende que uma solução efetiva não será alcançada com a redução da terra tradicional do povo e sim pelo cumprimento do dispositivo constitucional, com a agilização do procedimento de demarcação em curso, a conseqüente indenização e reassentamento dos não-indígenas e a efetivação da posse da terra por parte dos Guarani.


    O Cimi alerta que uma eventual “redução” a terra já declarada como tradicionalmente indígena, trará conseqüências extremamente negativas não somente para os próprios Guarani, mas também para todos os povos indígenas do Brasil. Num momento em que os direitos territoriais e os povos indígenas são violentamente agredidos em todas as regiões do país, a redução da Terra Indígena Mato Preto seria entendida como um prêmio à morosidade governamental e aos setores político-econômicos responsáveis pelo ataque anti-indígena em curso.


    O Cimi receia que os setores anti-indígenas, especialmente a bancada ruralista, logo mais irão alardear este fato e passar a mensagem de que é vantajoso opor-se às demais demarcações em curso no Rio Grande do Sul e no país, chegando inclusive ao cúmulo de ameaçar e incitar violências físicas contra estes povos.


    A conseqüência disso será o aumento exponencial dos conflitos pela terra e das violências contra os indígenas naquele e noutros estados. Redução de Terra Indígena jamais será uma alternativa para solução de conflitos fundiários!


    Brasília, DF, 27 de janeiro de 2014.


    Conselho Indigenista Missionário – Cimi

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  • 27/01/2014

    Fazendeiros têm até sexta para entregar 640 mil à Justiça; dinheiro será fiscalizado por indígenas

    Ruy Sposati, de Campo Grande (MS)


    Começa a correr nesta segunda-feira, 27, o prazo estabelecido pela Justiça Federal para que fazendeiros entreguem à Justiça o valor total arrecadado em leilão para financiar ações contra indígenas no Mato Grosso do Sul. Segundo a decisão, o montante angariado no chamado Leilão da Resistência deve ser depositado em juízo e só poderá ser utilizado com a aprovação dos indígenas e do Ministério Público Federal (MPF).

    Convocado pela Associação dos Criadores de Mato Grosso do Sul (Acrissul) e Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul (Famasul), com o apoio da bancada ruralista do Congresso Nacional, o leilão foi realizado no dia 7 de dezembro, em Campo Grande, com a presença da senadora e presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Katia Abreu (PMDB-TO) além de parlamentares da Frente Parlamentar Agropecuária (FPA).

    No dia 3 de dezembro, o Conselho do Aty Guasu Guarani e Kaiowá e o Conselho Terena entraram com uma ação na Justiça Federal exigindo a suspensão do leilão, denunciando que ruralistas planejavam realizar a atividade para arrecadar fundos para a "contratação de empresas de segurança em supostas defesas de terra”, conforme apontava a petição inicial dos indígenas.

    Leilão suspenso

    Dois dias depois, a juíza Janete Lima Miguel, da 2a. Vara de Campo Grande da Justiça Federal, determinou que o Leilão da Resistência não fosse realizado. A decisão argumentava que “esse comportamento por parte da parte [fazendeiros] não pode ser considerado lícito, visto que pretendem substituir o Estado na solução do conflito existente entre a classe ruralista e os povos indígenas” e que “tem o poder de incentivar a violência (…) e colide com os princípios constitucionais do direito à vida, à segurança e à integridade física”.

    No entanto, poucas horas antes da data prevista para que o leilão ocorresse, a suspensão foi cancelada. Em uma movimentação judicial considerada anormal pelos advogados dos indígenas, as entidades ruralistas questionaram judicialmente, um dia antes do leilão,  a imparcialidade e independência da juiza Janete, que havia suspendido o leilão. Ela, então, se declarou suspeita perante a Justiça para julgar o caso. O Tribunal Regional Federal da 3a. Região (TRF-3) então nomeou Pedro Pereira dos Santos, da 4a. Vara, para julgar o caso.

    Às 22h30 de sexta-feira, 6, o juiz Pedro Pereira dos Santos, da 4ª Vara da Justiça Federal de Campo Grande reverteu a decisão anterior e liberou a realização do leilão. Estabelecendo condicionantes para que ele fosse realizado: o dinheiro arrecadado com o leilão deveria ser depositado numa conta judicial e controlado pela Justiça; os leiloeiros deveriam discriminar os nomes dos arrematadores e os valores pagos; a utilização dos recursos arrecadados com o leilão só poderá ser feita depois da Justiça ouvir as organizações indígenas Aty Guasu e Conselho Terena, além do Ministério Público Federal (MPF).

    Algumas horas antes do início do evento, os indígenas entraram com mandado de segurança pedindo a suspensão dos efeitos da nova decisão, sem sucesso. O juiz plantonista Leonel Ferreira, do Tribunal Regional Federal da 3a. Região (TRF-3), negou o pedido, argumentando que as condicionantes estabelecidas na decisão eram suficientes para coibir as ilegalidades denunciadas pelos indígenas.

    Até o momento, nos autos do processo principal, foram registrados dois depósitos em juízo realizados em dezembro, nos valores de 49 mil e 131,5 mil reais.

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  • 27/01/2014

    Povo Tapirapé denuncia construção de estrada que afetará aldeias

    Em documento encaminhado no final de 2013 ao Ministério Público Federal em Mato Grosso, indígenas de sete aldeias do povo Tapirapé-Apyãwa denunciaram o processo de construção da estrada MT-100, na região nordeste do estado que afetará todas as suas comunidades.

    Em visível violação dos direitos dos povos indígenas assegurados pela Constituição Federal e pala Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), a estrada já se encontra com as obras adiantadas, sem que a comunidade tenha sido devidamente consultada. O documento ainda apresenta denúncias de tentativas de aliciamento da comunidade, visto que políticos da região, entre eles os prefeitos de Confresa, Santa Terezinha e de Porto Alegre do Norte, acompanhados do deputado estadual Baiano Filho, ofereceram, durante reunião na aldeia Tapi’itãwa, caminhonetes em troca da abertura da estrada. De maneira absurda, direitos fundamentais como posto de saúde, escola e posto de vigilância também foram oferecidos para que a comunidade aceitasse a construção da estrada. Segundo lideranças do povo Tapirapé-Apyãwa: “tentaram negociar de todo jeito. Todas as promessas eram para ser entregues após a conclusão da estrada, mas a comunidade não aceitou”.

     

    Como já haviam avisado na reunião, os Tapirapé-Apyãwa paralisaram as obras no dia 14 de outubro, tendo feito a verificação de que a obra continuava paralisada novamente no dia 22 de outubro.

     

    O que se vê, mais uma vez, é a expressão de interesses de alguns setores buscando se sobrepor aos direitos constituídos. Outra obra, praticamente já concluída nas proximidades, é a pavimentação da BR 158, que também afeta a terra dos Tapirapé Embora os indígenas tenham apresentado suas reivindicações e acordos tenham sido firmados para atendê-las, nada foi efetivado até o momento.

     

    Lideranças também informaram que no dia 22 de novembro o deputado Baiano Filho se reuniria com alguns indígenas em Confresa, a 29 km da aldeia central da Terra Indígena Urubu Branco. No entanto, as lideranças aguardavam a realização desta reunião na aldeia. “O que fica explícito é que aqui também se utiliza a comum estratégia de dividir a comunidade e fazer acordos com um grupo à parte, legitimando possíveis acordos que ferem os interesses da maioria do povo”, afirma Gilberto Vieira, secretário adjunto do Conselho Indigenista Missionário (Cimi).

     

    Reafirmando sua convicção de não ceder aos interesses contrários ao seu projeto de futuro, os Tapirapé-Apyãwa reuniram suas comunidades novamente no último dia 19 de janeiro para discutir a solicitação do deputado Baiano Filho de que se reunissem novamente no dia 22 de janeiro próximo na aldeia. Após debates e reflexões, os indígenas decidiram não receber o deputado e sua comitiva na aldeia Tapi’itãwa. Nas palavras das lideranças: “chega de promessa, não tem negócio nenhum com relação à construção da MT 100”. A reunião proposta para o dia 22 foi, então, cancelada.

     

    Como foi expresso no documento enviado ao Ministério Público Federal (MPF), assinado por todas as lideranças e representações de todas as aldeias da TI Urubu Branco, os Tapirapé-Apyãwa pedem o embargo das obras.

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  • 27/01/2014

    II Encontro dos de Baixo demanda resolução imediata para os territórios indígenas e quilombolas

    O II Encontro dos de Baixo contou com a presença de centenas de militantes populares, com  representações Quilombolas do RS, SC, SP e Maranhão (importante presença da representação da MOQUIBOM – Movimento Quilombola da Baixada Ocidental Maranhense) além de dezenas de lideranças Indígenas do RS e entidades indigenistas. O encontro se consolidou como um espaço de debates e discussões daqueles que estão em luta pela garantia de direitos sociais, políticos e nas lutas pela terra e contra o racismo institucionalizado, bem como possibilitará uma agenda de eventos, mobilizações e ações políticas para o enfrentamento de lutas que se vislumbram para o ano, especialmente contra a PEC 215/2000 e contra as paralisações das demarcações das terras indígenas e quilombolas.

    O ano de 2013, ainda não acabou! Nossas demandas seguem em aberto, pois o racismo e o genocídio recrudescem. Os ataques contra centenas de lideranças quilombolas, indígenas e populares, resultaram em ameaças de morte, espancamentos, prisões arbitrárias e assassinatos de centenas de pessoas. A omissão, negligência e conivência das três esferas de Estado (Judiciário, Legislativo e Executivo) promoveram: a invasão aos Territórios ancestrais; assassinato de milhares de jovens negros; desalojamento de milhares de famílias de suas casas e terras; desrespeito aos Direitos Constitucionais e Tratados Internacionais, revelando que o Estado Democrático de Direito não existe para a maioria da População Brasileira, situação essa agravada com a proximidade dos megaeventos, como COPA DO MUNDO e Olimpíadas, bem como, MEGAPROJETOS numa lógica de "DESENVOLVIMENTO" predatória para a maioria dos seres humanos e para o meio ambiente.

    Os fatos ocorridos no final do ano de 2013 e início de 2014, como o despejo ilegal da Aldeia Maracanã no RJ, a aceleração da tramitação da PEC/215 de 2000, o Despejo da Comunidade Metro-Mangueira e a heroica resistência expressa pelos(as) mulheres, crianças, idosos(as) dessa Comunidade; Quilombolas e indígenas com seus Direitos Vilipendiados e resistindo (enquanto a Presidenta Dilma se banhava nas águas cálidas da Baía de Todos os Santos) as lideranças Quilombolas do Rio dos Macacos eram presas e agredidas pela Marinha Brasileira; em Humaitá no Amazonas, os Povos Indígenas, resistem ao Genocídio imposto pelos Madeireiros e grileiros, bem como, pelo Racismo Institucional do Governo; no Maranhão, enquanto a Governador a da Dinastia Sarney se refestela com duas toneladas de Lagosta,  a barbárie se instala no sistema Carcerário.

    Os ataques aumentam, mas a resistência também aumenta e ante o vazio e silêncio das organizações tradicionais do Movimento Social e Social Negro integrada e cooptada ao Projeto de "Desenvolvimento" o que acaba por aprofundar o ataque aos povos, aos pobres, ao meio ambiente, procurando eternizar o Projeto Neocolonial e de garantia de uma lógica de proteger os lucros de umas poucas famílias em detrimento de milhões.

    Superar a atomização da resistência e o isolamento imposto pelo neocolonizador é tarefa essencial, não só para derrotar a PEC 215/2000, mas o conjunto de ataques que os Povos vêm sofrendo. A oportunidade proporcionada pelo II Encontro dos de Baixo, foi fundamental, não só pela possibilidade de termos uma agenda mínima de coordenação da resistência, mas para aprofundarmos a reflexão sobre a conjuntura que está colocada diante de nós em 2014.

    Somente com o protagonismo de quilombolas, indígenas e populares será possível enfrentar as adversidades da conjuntura política do País que, nos últimos dez anos, sofre um esvaziamento geral no que se refere a expressão política coletiva da classe trabalhadora, submetida a ideologia liberal da política, da economia e através da falsa representação, expressa através de um exercício de "cidadania" do voto individual de dois em dois anos. Ou seja, exercemos a cidadania em um minuto, na urna eletrônica, passando um cheque em branco nos restantes quatro anos para as falsas representações atacarem nossos Direitos.

    O agronegócio, os projetos do capitalismo para o campo, aliança entre os ruralistas, corporações transnacionais, capital financeiro e o Estado representam hoje o principal inimigo dos/as trabalhadores rurais, pequenos agricultores, assentados/as da Reforma Agrária, dos povos originários, comunidades tradicionais e consumidores de alimentos. E nos 11 anos dos governos petista acompanhamos o desenvolvimento extraordinário deste modelo de padronização da agricultura que deixa um rastro de sangue e miséria por onde vai passando, dominando e explorando, expulsando comunidades, envenenando povos que produzem e os que se alimentam, assim como os bens naturais. Essa forma de desenvolvimento se deve a opção de projeto político para a agricultura que o governo adotou e executa, também seu engenhoso mecanismo de cooptação e burocratização dos históricos movimentos de luta pela terra. Está nítido que há uma decisão de subserviência aos governos, pactuando com os crimes impunes e impostos pelo latifúndio, gerando conflitos entre os pequenos, e uma devastação dos direitos mínimos do conjunto das ações que consolidam uma real Reforma Agrária Popular.

    Recuperar e fortalecer as expressões coletivas da verdadeira cidadania é o desafio que está posto, para nós, POVOS que resistimos aos impactos da NEOCOLONIZAÇÃO.

    Foi deliberado pela construção de uma jornada nacional contra a PEC 215/2000, caracterizada, como o principal ataque Institucional aos Povos, que devemos fortalecer o trabalho de base e protagonismo dos Povos Indígenas e Quilombolas, articular a resistência contra os ataques, e mobilizar a sociedade contra o Racismo Institucional, apontar a Jornada de Lutas e interagir com os setores populares e sindicais, para conseguirmos enfrentar os desafios neste ano de 2014.

    – PELA TITULAÇÃO E DEMARCAÇÃO IMEDIATA DOS TERRITÓRIOS QUILOMBOLAS E INDÍGENAS!

    – PELA REFORMA AGRÁRIA!

    – PELA UNIDADE CAMPO, FLORESTA e CIDADE, só a luta traz conquistas!

    – CONTRA AS REMOÇÕES DA COPA

    – PASSE LIVRE PARA ESTUDANTES, TRABALHADORES, QUILOMBOLAS E INDÍGENAS

    – CONTRA O GENOCÍDIO DA JUVENTUDE NEGRA

    – CONTRA A PEC 215/2000 (PROJETO DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO FEDERAL)

    – CONTRA A AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE/3239 PROPOSTA PELO DEM (PARTIDO DOS DEMOCRATAS)

    – REASSENTAMENTO / INDENIZAÇÃO PARA PEQUENOS PROPRIETÁRIOS EM SOBREPOSIÇÃO COM TERRAS INDÍGENAS E QUILOMBOLAS!

    AGRONEGÓCIO MATA!

    NÃO VAI TER COPA

    ISSO AQUI VAI VIRAR PALMARES!

    Porto Alegre, RS, 27 de janeiro de 2014.

    Frente Nacional em Defesa dos Territórios Quilombolas

    Cimi Sul – Equipe Porto Alegre

    Gapin – Grupo de Apoio aos Povos Indígenas

     

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  • 18/01/2014

    “Por que uma vaca vale mais que um índio”

    Não precisamos de um braço armado do Estado, mas da sua mão protetora

    Criado em 1972, o Conselho Indigenista Missionário (CIMI) é um organismo vinculado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil. No ano passado, a Rel-UITA e o CIMI decidiram articular ações de denúncia e de sensibilização internacional sobre a situação dos povos indígenas no Brasil. Dialogamos recentemente em Brasília com Cleber César Buzatto, secretário executivo do Conselho, para entender quais são os principais motivos da violência exercida contra estes povos.

    Qual é a situação dos povos indígenas no Brasil?

    No Brasil vivemos um momento de extrema apreensão e de preocupação com relação aos direitos e à sobrevivência dos povos indígenas, consciência esta gerada graças à mobilização organizada pelos próprios indígenas.

    A violência que os índios sofrem não é recente, sendo fruto de um processo sistemático de ataque aos direitos dos povos e às suas comunidades, dirigido não só contra o indivíduo, mas também contra os direitos garantidos aos povos indígenas, principalmente aqueles relacionados com a questão territorial consagrados na Constituição da República de 1988.

    Você considera que o principal combustível para esta violência é a impunidade?

    Sem dúvida, a questão da impunidade é central porque alimenta e retroalimenta a violência contra os povos.

    O motivo real do ataque aos direitos constitucionais é o modelo de desenvolvimento adotado pelo governo brasileiro, que prioriza a produção e a exportação de commodities, o que potencializa a disputa pelo território, pela terra, pelo espaço para a sua produção.

    – Você está se referindo à expansão das fronteiras agropecuárias que  invadem os pequenos produtores e os próprios povos indígenas?

    Exato. Esse modelo de produção avança por ter ganhado força e por estar focalizado na produção de commodities, na monocultura, destruindo a pequena agricultura camponesa e a produção de alimentos.

    Neste cenário de grandes interesses econômicos, os povos indígenas também sofrem o abuso de um modelo produtivo que se impõe combinando políticas públicas e ações extremadamente violentas.

    O extermínio da floresta. O extermínio de seus habitantes

    Indígenas expulsos de suas florestas…

    Quando os povos indígenas são atacados, também é atacada a floresta, e vice-versa. A bancada ruralista – que representa os interesses dos grandes proprietários de terras – promoveu mudanças dramáticas no Código Florestal, mesmo indo contra 96% da opinião pública do Brasil.

    A partir desse momento, exacerbou-se o ataque aos povos indígenas e aos povos quilombolas, vistos pelos “ruralistas” como obstáculos para o acesso, posse e exploração de novas terras para o desenvolvimento do agronegócio.

    O atual governo foi o criador deste projeto que tem um perfil de ultradireita. Seus representantes chegaram inclusive a dizer que quem se opusesse às mudanças no Código Florestal estaria defendendo os interesses internacionais. E esta estratégia se repete agora com os povos indígenas, acusando-os de serem manipulados por ONGs internacionais.

    Esta situação de perseguição vivida pelos povos indígenas adquiriu uma maior visibilidade em 2013, por meio de múltiplas ações de denúncia e de sensibilização realizadas fundamentalmente em Brasília.

    Observa-se que os povos indígenas conseguiram aumentar a consciência coletiva da sociedade com relação a esta questão, graças às suas mobilizações permanentes na defesa de seus direitos. Também se pronunciaram politicamente contra as posições desenvolvimentistas da bancada ruralista, já instaladas no próprio seio do Poder Executivo.

    A população originária. O colonialismo histórico

    Quantos indígenas existem atualmente no Brasil?

    Segundo o último censo do IBGE, de 2010, são 896 mil indivíduos em 305 povos distintos, espalhados por todas as regiões do país e possuidores de uns 274 idiomas. O Brasil é o país com o maior número de povos indígenas do mundo. A Bolívia possui o maior número de indivíduos indígenas, mas em apenas dez povos.

    Qual é a postura da presidenta Dilma Rousseff?

    A Dilma só recebeu os indígenas em uma ocasião, no momento das enormes mobilizações urbanas, ocorridas em junho e julho do ano passado, quando ela abriu sua agenda para os movimentos sociais, sindicatos, movimentos sem-terra e líderes dos povos indígenas.

    Entretanto, devemos admitir que a nossa frustração é enorme. Sentimos uma insatisfação profunda, devido a uma clara percepção de que o governo optou por favorecer os setores econômicos historicamente inimigos dos povos indígenas.

    Extermínio pela fome. Extermínio pela bala

    Seria simplista resumir que a máquina repressora é o vínculo mais frequente entre o Estado e os povos indígenas?

    Infelizmente é assim. Como casos emblemáticos, temos o povo Munduruku, que sofreu um ataque no dia 7 de novembro de 2012 por parte da Polícia Federal, com poder de fogo muito forte, na Aldeia Teles Pires, Pará, divisa com o Mato Grosso. Nessa ocasião morreu um integrante desse povo.

    Em 2013, durante a luta pela reintegração das terras do povo Terena, novamente a Policia Federal junto com a Polícia local assassinaram o jovem índio Oziel Terena, em Mato Grosso do Sul.

    No primeiro caso as forças policiais atuaram em defesa de uma política desenvolvimentista, e no segundo caso como repressão na recuperação das terras pelo povo indígena. É importante esclarecer que o povo Terena ocupou suas terras tradicionais, por estarem cansados de esperar pela definição do processo de demarcação das terras, que já dura quase 20 anos.

    O que precisamos não é do braço armado do Estado, mas de sua mão protetora. Entretanto, lamentavelmente, o que vemos do Estado é a sua força bruta.

    Por que o ditado “uma vaca vale mais que um índio”?

    Porque uma vaca ocupa mais espaço por hectare que um índio, e são milhões de vacas só no Mato Grosso do Sul. Para os ruralistas, a vaca “deles” vale mais do que a vida dos indígenas.

    Quais são as expectativas do CIMI?

    Temos forte convicção de que os povos indígenas vão intensificar esta luta. Na ditadura militar foi possível desarticular e vencer o “projeto integracionista” segundo o qual em 2000 já não haveria mais povos indígenas no Brasil.

    Agora os povos indígenas estão organizados e lutam. Naqueles anos da ditadura eram 250 mil índios e eles conseguiram acabar com essa política integracionista abolindo-a da Constituição de 1988, conquistando seus direitos e o reconhecimento do Estado aos usos, costumes, línguas, crenças e tradições, bem como o direito às suas terras.

    Apesar da demora em se aplicar as disposições constitucionais e a intensidade dos enfrentamentos com os ruralistas de todo o país, inclusive com mais intensidade que em épocas passadas, acreditamos que os povos indígenas conseguirão enfrentar os seus inimigos e mais uma vez sairão vitoriosos. 

    Rel-UITA

    13 de janeiro de 2014

     

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