• 06/02/2014

    Povo Pataxó retoma área de assentamento do Incra loteada por fazendeiros

    Por Renato Santana,

    de Brasília (DF)

     

    No local onde os portugueses fincaram os marcos iniciais da colonização, em Prado, sul da Bahia, cerca de 400 Pataxó retomaram, no início desta semana, 30 hectares da Terra Indígena de Comexatiba – Cahy Pequi. A área ocupada, nas proximidades do distrito de Cumuruxatiba, é parte dos 62 lotes situados num assentamento do Incra, instalado dentro dos limites identificados como tradicionais pela Fundação Nacional do Índio (Funai).

     

    “Ocupamos seis lotes dessa parte do Cahy Pequi. O que acontece é que de uns anos para cá estão forçando os posseiros (clientes da reforma agrária) a vender o que receberam do Incra. Então chegam aqui e compram dois, quatro lotes e montam fazendas. Acontece que a terra é Pataxó”, explica o coordenador dos caciques e lideranças da região do Prado, José Bete Pataxó. Segundo a liderança, a área retomada já tinha sido vendida para terceiros e não estava mais em propriedade de posseiros.

     

    A região, distante 280 quilômetros de Porto Seguro, conta agora com a quinta retomada Pataxó. Nesta última ação, participaram indígenas das aldeias Dois Irmãos, Pequi e Burita, todas da Cahy Pequi. “Desde pequenos nós ouvíamos as histórias dos velhos sobre como roubaram nossas terras. Nunca saímos daqui”, conta José Bete.

     

    O território reivindicado pelos Pataxó de Cahy Pequi abrange ainda áreas do Parque Nacional do Descobrimento, fato que somado ao assentamento trava o processo demarcatório em desencontros não apenas com o Incra, mas também envolvendo o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), órgão responsável pelo parque.

     

    “Quando pedimos escolas e posto de saúde, o governo diz que não pode atender porque tem o parque e o relatório de identificação não foi publicado, mesmo já finalizado. Então retomamos nossas terras também para reivindicar educação e saúde, porque a terra é Pataxó”, justifica José Bete.

     

    As escolas existentes foram construídas em taipa pelos próprios indígenas. Porém, as estruturas de barro servem também às consultas médicas e odontológicas de profissionais que se deslocam de Itamaraju, município a 72 quilômetros de Prado, para periodicamente atender a comunidade.    

     

    Depois da retomada, integrantes da Funai ainda não apareceram no local. Reflexo de tal ausência é o reclame que os Pataxós fazem por um posto do órgão indigenista em Prado. Todavia, a reivindicação será encaminhada por carta à presidenta interina da Funai, Maria Augusta Assirati.

     

    Prado abriga sete aldeias urbanas, além de outras sete na área rural, organizando uma sociedade de ao menos 6 mil Pataxó.

     

    Ameaças e reintegração de posse  

     

    Depois que os Pataxó começaram a retomar o território tradicional, uma onda de ameaças passou a deixar as lideranças em alerta. Com a ação desta semana, pistoleiros rondam diuturnamente a área recuperada pelos indígenas. “Temos medo, mas não vamos recuar. Claro que tomamos mais cuidados, o que não significa deixar a luta. O que a gente espera é que o governo faça a demarcação, porque aí sim estaremos protegidos”, defende José Bete.

     

    Outra questão discutida pelos Pataxó é uma reintegração de posse, determinada pela Justiça, na fazenda Santa Luz, situada dentro da Cahy Pequi e retomada pelos indígenas da aldeia Burita. “Mantemos uma escola com 62 estudantes. Se a reintegração ocorrer, o que será deles e da comunidade?”, questiona a liderança firme na ideia de resistir.  

     

     

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  • 04/02/2014

    Polícia Federal invade aldeia Tupinambá da Serra do Padeiro e leva criança de dois anos

    Por Renato Santana,

    de Brasília (DF)

     

    Durante invasão da Polícia Federal em aldeia Tupinambá da Serra do Padeiro, neste domingo, 2, no município de Ilhéus (BA), M.S.M, de 2 anos, em fuga para a mata, se desgarrou dos pais e acabou nas mãos dos policiais. O delegado Severino Moreira da Silva, depois da criança ter sido levada para Ilhéus, a encaminhou para o Conselho Tutelar do município que, por sua vez, transferiu o menor para uma creche, onde ele segue longe dos pais e isolado por determinação da Vara da Infância e Juventude.

     

    Representante da Funai solicitou ao delegado a entrega da criança. A intenção era devolvê-la aos pais, mas Silva se negou a entregá-la ao órgão indigenista. De acordo com fonte consultada pela reportagem, o delegado se irritou com a acusação de que os federais teriam sequestrado a criança da comunidade e afirmou publicamente que o menor foi abandonado.

     

    “Isso não é abandono! A PF que entrou atirando e então todos fugiram para o mato como tática de proteção e resistência (…) Quando estamos na mata e um animal foge sem os filhotes, saímos de perto porque sabemos que ele volta para buscar as crias”, diz cacique Rosivaldo Ferreira dos Santos Tupinambá, o Babau. A liderança afirma ainda que o pai voltou para buscar M.S.M, minutos depois de deixar a mulher com os outros dois filhos em segurança na mata, mas o menor já tinha sido levado pelos federais.

     

    No ofício 0193/2014 (DFP/ILS/BA), encaminhado ao Conselho Tutelar, o delegado afirma que equipe formada pelas polícias Federal e Militar, além da Força Nacional, “deslocou-se à Fazenda São José, a fim de proceder a necessária averiguação sobre uma denúncia de que o citado imóvel havia sido invadido mais uma vez por criminosos foragidos da Justiça, os quais estariam utilizando-se daquele empreendimento (…) para fins escusos (sic)”.

     

    O núcleo familiar Tupinambá, alvo da polícia e acusado pelo delegado de criminoso, nunca deixou o local onde foi atacado, resistindo em trabalhos locais, desde os bisavós do menor M.S.M, ou em saídas esporádicas para outros estados nordestinos devido às perseguições. A área já está identificada pelo Ministério da Justiça. Conforme relato dos Tupinambá, os federais chegaram atirando a ponto dos indígenas recolherem dezenas de cápsulas, de arma de grosso calibre (veja foto), espalhadas pela terra tradicional. No último dia 29 de janeiro, a Fazenda São José, localizada dentro de território considerado indígena pelo Estado desde 2009, foi alvo de reintegração de posse. Uma de três bases da Polícia Federal acabou instalada no local.

     

    Leia mais: Ao invés da conclusão do processo demarcatório, base policial é montada em terra tradicional dos Tupinambá

     

    Leia mais: A volta da ditadura: governo Dilma militariza Terra Indígena Tupinambá

     

    “O ministro da Justiça (José Eduardo Cardozo) é dupla-face: para nós ele fala em diálogo, mas não é possível que a Polícia Federal monte uma base militar dentro de uma terra indígena sem ele saber. Não são os fazendeiros nos atacando ou pistoleiros contratados por eles. É a polícia”, declara cacique Babau.  

     

    A liderança, perseguida por pistoleiros e pela Polícia Federal (veja cronologia de violências abaixo), afirma que o episódio é parte de um grande plano para criminalizar a luta dos Tupinambá pelas terras tradicionais do povo. “Já perderam a vergonha de dizer que querem a minha cabeça. Já tentaram me matar várias vezes. No final do ano passado mataram três indígenas. Este ano já foram quatro, na região da praia”, denuncia.

     

    Mentiras e manipulações  

     

    Cacique Babau aponta para uma enraizada rede de mentiras e manipulações que constrói informações inverídicas sobre os Tupinambá e da própria liderança que exerce. “Primeiro que me responsabilizam por tudo que acontece na região entre Ilhéus e Salvador. Eu não sou o único cacique Tupinambá. Sou cacique da Serra do Padeiro que fica na Terra Indígena Tupinambá de Olivença, que tem 21 aldeias e quase o mesmo número de caciques que lideram suas comunidades na luta pela terra do nosso povo”, explica.

     

    No último dia 30 de janeiro, o procurador-geral da República, Rodrgigo Janot, requereu ao Supremo Tribunal Federal (STF) a suspensão de liminares e sentenças em ações de reintegração de posse ajuizadas por donos de fazendas localizadas na Terra Indígena Tupinambá. O requerimento acabou na mesa do ministro Ricardo Lewandowski, que teria recebido a informação de que Babau descumpriu acordo e expulsou da terra indígena pequenos agricultores.

     

    “Os pequenos só saem de lá quando o governo federal reassentá-los. A informação é mentirosa. Temos 300 crianças, filhos e filhas desses agricultores, que estudam nas escolas Tupinambá”, revela Babau. O cacique explica que na região existe uma pressão sobre esses pequenos agricultores para que eles se retirem da Serra do Padeiro e acusem os Tupinambá de os terem expulsado. Alguns foram agredidos nas cidades do entorno da terra indígena, caso de Buerarema, e tiveram seus produtos saqueados.   

     

    Em outubro do ano passado, a Associação dos Juízes para a Democracia (AJD) enviou uma comissão ao território Tupinambá. Uma das conclusões da comissão de juízes, publicada na edição de outubro/dezembro do jornal da AJD, é de que “a grande maioria dos meios de comunicação divulga é que os indígenas são responsáveis pelos atos quando são, na verdade, vítimas. Incitam (tais factóides) a vingança e a violência abertamente, em publicações jornalísticas e até mesmo em outdoors, afirmando que se trata de falsos índios. Essa postura, reiterada pelos latifundiários da região, acaba por ser validada pelo governo federal, já que não foram, até hoje, tomadas as providências necessárias para que as demarcações se efetivassem”.

     

    No último dia 3, colunista baiano divulgou que a Polícia Federal e a Força Nacional caçavam cacique Babau e que ele “conta com apoio de grupos fortes e poderosos. Tem milhões de reais no bolso e lidera um exército de cinco mil homens que – armados e pilotando 150 motos e mais de vinte carros – estão tirando a paz e o sossego dos agricultores de Buerarema, Ilhéus, Una e São José” (leia na íntegra aqui).

     

    Histórico de violências

     

    O histórico recente de violências por parte do Estado contra os Tupinambá é vasto, tanto quanto de fazendeiros e pistoleiros. De prisões arbitrárias, abuso de força policial, torturas, destruição de casas, veículos comunitários, alimentos e equipamento escolar a lista de acusações contra o Estado parece interminável. 

     

    Foi assim que a Polícia Federal impôs sistematicamente, por ordem de decisões judiciais ou outras motivações nem tão claras para os indígenas, pressão aos Tupinambás para que deixassem as áreas retomadas por meio da luta. As ações recaíram principalmente contra o líder, Cacique Babau, e seus familiares.

     

    A seguir, uma lista cronológica e atualizada das violências sofridas pelos Tupinambá nos últimos seis anos – tanto da PF quanto de pistoleiros e fazendeiros:

     

    17 de abril de 2008

     

    Primeira prisão do cacique Babau, acusado de liderar manifestação da comunidade contra o desvio de verbas federais destinadas a saúde. O cacique estava em Salvador no momento dos fatos.

     

    23 de outubro de 2008

    Ataque da PF na aldeia da Serra do Padeiro, com mais de 130 agentes, 2 helicópteros e 30 viaturas – para cumprimento de mandados judiciais suspensos no Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região e contra orientação do Ministério da Justiça, resultando em 22 indígenas feridos a bala de borracha e intoxicação por bombas a gás, destruição de casas, veículos comunitários, alimentos e equipamento escolar.

     

    27 de maio de 2009

     

    Prisão preventiva do irmão do cacique Babau, por dirigir carro da Funasa carregando mantimentos. O Desembargador Cândido Ribeiro, do TRF da 1ª Região, não encontrou justificativa na ordem de prisão, da Justiça Federal de Ilhéus.

     

    2 de junho de 2009

     

    Cinco pessoas foram capturados e torturadas por agentes da PF – spray de pimenta, socos, chutes, tapas, xingamentos e choque elétrico. Os laudos do IML/DF comprovaram a tortura, mas o inquérito concluiu o contrário.

     

    10 de março de 2010

     

    Cacique Babau é preso, durante a madrugada, em invasão da PF em sua casa, embora a versão dos agentes – comprovadamente falsa – informe que a prisão teria acontecido no horário permitido pela lei.

     

    20 de março de 2010

     

    Prisão do irmão do cacique Babau, por agentes da PF em plena via pública, enquanto levava um veículo de uso comunitário da aldeia para reparo.

     

    16 de abril de 2010

     

    Babau e seu irmão são transferidos para a penitenciária de segurança máxima em Mossoró (RN), por receio da PF de ver manifestações diante de sua carceragem em Salvador pela passagem do “Dia do Índio”, em desrespeito ao Estatuto do Índio.

     

    3 de junho de 2010

     

    A irmã de Babau e seu bebê de dois meses são presos na pista do aeroporto de Ilhéus pela PF, ao voltar de audiência com o presidente Lula, na Comissão Nacional de Política Indigenista, por decisão do juiz da comarca de Buerarema. Permanecem presos em Jequié por dois meses, até o próprio juiz resolver revogar a ordem de prisão.

     

    5 de abril de 2011

     

    Estanislau Luiz Cunha e Nerivaldo Nascimento Silva foram presos numa situação de “flagrante preparado” – prática considerada ilegal– num areal explorado por empresas, de dentro da Terra Indígena Tupinambá. Acusados baseados em meros indícios dos crimes de “extorsão” pela PF, Estanislau – que toma remédios controlados – e Nerivaldo – que teve a perna direita amputada, após baleamento por agente da PF – respondem ainda por “tentativa de homicídio” contra policiais federais. Coincidentemente, a ação foi feita na véspera da chegada do Secretario de Justiça do estado da Bahia, à região. Após dois meses e meio presos, o TRF da 1ª Região lhes concedeu a liberdade por 3 x0 em julgamento de habeas corpus, em 20 de junho.

     

    3 de fevereiro de 2011

     

    Prisão da Cacique Maria Valdelice, após depor na Delegacia da Polícia Federal em Ilhéus, em cumprimento ao Mandado de Prisão expedido pelo Juiz Federal Pedro Alberto Calmon Holliday, acusada de “esbulho possessório”, “formação de quadrilha ou bando” e “exercício arbitrário das próprias razões”. A cacique foi libertada no final do mês de junho, após cumprir quatro meses em prisão domiciliar.

     

    14 de abril de 2011

     

    Por volta das 5h da manhã, fortemente armados e com mandado de busca e apreensão, vários agentes da PF vasculham a residência da cacique Valdelice, assustando toda a família – principalmente os muitos netos da cacique. Em Salvador, chegava para reuniões com autoridades locais a “Comissão  Tupinambá” do CDDPH.

     

    15 de abril de 2011

     

    Fortemente armada, a PF acompanha oficiais de justiça em cumprimento de mandado de reintegração de posse. Indígenas e Funai não haviam sido previamente intimados do ato, que foi presenciado pelos membros do CDDPH, que testemunharam o despreparo de agentes e a presença de supostos fazendeiros que incitavam as autoridades contra os indígenas.

     

    28 de abril de 2011

     

    A Polícia Federal instaura o inquérito, intimando o procurador federal da AGU e os servidores da Funai a prestar depoimento sobre denúncia de “coação” contra a empresária Linda Souza, responsável pela exploração de um areal, situado na terra Tupinambá.

     

    29 de abril de 2011

     

    Prisão do cacique Gildo Amaral, Mauricio Souza Borges e Rubenildo Santos Souza, três dias antes da delegação composta por deputados federais da CDHM e membros do CDDPH/SDH visitarem novamente os povos indígenas da região por causa das violências que continuam a ser denunciadas.

     

    5 de julho de 2011

     

    Cinco Tupinambá são presos pela PF sob as acusações de “obstrução da justiça” e “exercício arbitrário das próprias razões”, “formação de quadrilha” e “esbulho possessório”.

     

    18 de outubro de 2012

     

    No Fórum de Itabuna (BA), cinco Tupinambá, vítimas de tortura cometidas por policias federais, prestaram depoimento ao juiz Federal em parte do procedimento da Ação Civil Pública por Dano Moral Coletivo e Individual movida pelo Ministério Público Federal (MPF) da Bahia contra a União. Os procuradores abriram inquérito também para apurar os responsáveis pela tortura, atestada e comprovada por laudos do Instituto Médico Legal (IML). 

     

    14 de agosto de 2013

     

    Estudantes da Escola Estadual Indígena Tupinambá da Serra do Padeiro foram vitimas de emboscada na estrada que liga Buerarema a Vila Brasil. O atentado ocorreu quando o caminhão (foto acima) que transportava os alunos do turno da noite para as suas localidades foi surpreendido por diversos tiros oriundos de um homem que se encontrava em cima de um barranco. Os tiros foram direcionados para a cabine do veículo, numa clara tentativa de atingir o motorista, que com certeza o atirador achava ser Gil, irmão do cacique Babau, pois  o carro é de sua propriedade. Quem conduzia o carro era Luciano Tupinambá.

     

    26 de agosto de 2013

     

    No município de Buerarema, contíguo ao território tradicional Tupinambá, atos violentos promovidos por grupos ligados aos invasores da terra indígena. Indígenas foram roubados enquanto se dirigiam à feira e 28 casas foram queimadas até o início de 2014. O atendimento à saúde indígena foi suspenso e um carro da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) foi queimado.

     

    8 de novembro de 2013

     

    Aurino Santos Calazans, 31 anos, Agenor de Souza Júnior, 30 anos, e Ademilson Vieira dos Santos, 36 anos, foram executados em emboscada quando regressavam da comunidade Cajueiro, por volta das 18 horas, na porção sul do território Tupinambá, quando foram emboscados por seis homens. Disparos de arma de fogo foram feitos contra os indígenas. Na sequência os assassinos praticaram torturas, dilaceraram os corpos com facões e com o que é chamado na região de “chicote de rabo de arraia”. Procuradores federais apontam assassinatos como parte do conflito pela terra.

     

    28 de janeiro de 2014

     

    Após realizar a reintegração de posse de duas fazendas localizadas na Serra do Padeiro, no município de Ilhéus, na Bahia, policiais federais e da Força Nacional montaram uma base policial na sede da fazenda Sempre Viva. Ataques com granadas contra os Tupinambá refugiados na mata.

     

    2 de fevereiro de 2014

     

    Durante invasão da Polícia Federal em aldeia Tupinambá da Serra do Padeiro, M.S.M, de 2 anos, em fuga para a mata, se desgarrou dos pais e acabou nas mãos dos policiais. O delegado Severino Moreira da Silva, depois da criança ter sido levada para Ilhéus pelos federais, a encaminhou para o Conselho Tutelar que, por sua vez, transferiu o menor para uma creche, onde ele segue longe dos pais e isolado por determinação da Vara da Infância e Juventude.

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  • 31/01/2014

    PGR pede suspensão de reintegrações de posse na TI Tupinambá

    O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, requereu ao Supremo Tribunal Federal (STF), nessa quinta-feira, 30 de janeiro, a suspensão de liminares e sentenças em ações de reintegração de posse ajuizadas por donos de fazendas localizadas na Terra Indígena Tupinambá, no sul da Bahia. A controvérsia gira em torno do direito de ocupação das terras objeto do conflito agrário.

    Segundo o chefe do Ministério Público Federal (MPF), o caso demanda a intervenção excepcional do STF para atuar como agente pacificador. Conforme explica o PGR, "aliado ao conflito agrário em si, há enorme instabilidade no exame da questão pelo juízo na origem. São inúmeras as ações possessórias que buscam a retirada dos indígenas das terras na região". O pedido argumenta que se deve priorizar uma solução provisória prudente e cautelosa, a qual poderá evitar a ocorrência de dano maior à ordem e à segurança pública.

    Estudo da Funai – No caso em análise, o MPF relata que existe um estudo específico e conclusivo da Fundação Nacional do Índio (Funai) sobre as terras tradicionalmente ocupadas pelos indígenas Tupinambá. "O fato de não haver sido concluído o procedimento demarcatório não poderia ser óbice, como foi, ao reconhecimento do direito – possessório que seja, no momento – dos Tupinambá sobre as terras que ocupam", ressalta.

    Rodrigo Janot pontua que a proteção possessória dos fazendeiros não poderia ter sido efetivada da forma como ocorreu, na medida em que se prestigiou a comprovação da posse e do esbulho alegadamente sofrido pelos não-índios e se ignorou o estudo pericial da Funai, que atestou, em 2009, o direito dos indígenas sobre a área.

    De acordo com o MPF, "a manutenção das decisões impugnadas mina, novamente, o direito dos Tupinambá e protela o exercício da posse e ocupação de suas terras originárias, com tudo o que isso representa para a comunidade e sua subsistência".

    O pedido ressalta que o deferimento de liminares em ações de reintegração de posse não é solução para o conflito já instalado no sul da Bahia, tampouco o ameniza. "Ao contrário, a retirada dos indígenas das terras à força, nesse momento, contribuirá para o aumento da tensão e do conflito agrário, porque toca em ponto especialmente sensível aos indígenas", observa.

    O MPF conclui que "o ciclo de invasões e retomadas das terras, pelos fazendeiros da região e indígenas, encerrar-se-á, de modo definitivo, apenas com a finalização do procedimento demarcatório."

    Constituição Federal – Para o PGR, o deferimento dos pedidos se justifica pelo iminente abalo à segurança e à ordem pública. Ele destaca que a Constituição da República prevê, de forma expressa, o direito de posse permanente e a extinção de atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das regiões indígenas.

    Rodrigo Janot explica que a resposta à discussão passa, necessariamente, pelo exame da Constituição Federal (CF), a qual determina que "são reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças, tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens".

    A norma constitucional também anota que "são terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por ele habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições". A peça processual pontua, ainda, que toda a legislação infraconstitucional deve ser interpretada de acordo com a Constituição Federal.

    Na visão do MPF, "a demarcação, também constitucionalmente prevista, será uma consequência lógica e necessária, com vistas à concretização dessa proteção constitucional, o que não significa dizer, entretanto, que o direito não possa e deva ser, desde logo, resguardado". A demarcação, conforme destaca Janot, tem natureza declaratória, reconhecendo o direito originário, precedente, dos indígenas.

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  • 30/01/2014

    Desintrusão da TI Awá Guajá: o início da superação de negação dos direitos

    Desde o início do mês de janeiro, acompanhamos as notícias sobre o processo de desintrusão da Terra Indígena (TI) Awá-Guajá, localizada na região Amazônica, mais especificamente no noroeste do Maranhão. Uma espera que, em 2015, completaria 30 anos.

    Este processo na região não é tranquilo porque contraria muitos interesses exploratórios, criminosos e de violação dos direitos humanos e ambientais. Ao mesmo tempo, na Terra Indígena Alto Turiaçu, na fronteira com a TI Awá, os indígenas Ka’apor têm sido violentamente reprimidos e ameaçados desde junho de 2013, quando iniciaram um importante trabalho de fiscalização no seu território, que vinha constantemente sendo invadido e desmatado por fazendeiros e madeireiros. Além deste monitoramento, os Kaa´por também estão fazendo a retirada dos invasores e o reavivamento dos limites demarcatórios de sua terra.

    A retirada dos invasores na TI Awá-Guajá deixa esperançosos todos os aliados (as) dessa causa, pessoas e instituições públicas e organizações da sociedade civil do Brasil e do exterior. Ela nos anima para seguir defendendo os direitos dos povos indígenas frente ao avanço dos modelos de ‘desenvolvimento’ que concebem este país como uma grande fazenda, que deve continuar a ser explorada a todo custo. Trata-se do resultado de um mutirão de compromisso realizado a muitas mãos.

    A conclusão da regularização do território Awá é consequência de uma luta iniciada na década de 1960 com a ocupação da Reserva Florestal do Gurupi, morada de três povos Tupi. Era o início da instalação do Projeto Carajás. Uma pequena minoria se apropriou de muitas terras, na força e na bala. Aos ocupantes tradicionais restou a expulsão e seguidas tentativas de extermínio:

    “Nós existimos! Vou contar a história dos meus pais, dos meus avós. Meus avós não vivem mais. Mas ouvimos a história que eles contaram pra nós. Os brancos começaram a ocupar a terra. Os índios já viveram bem na terra deles, na floresta. Os brancos seguiam os índios. Colocavam grandes roças na nossa terra. Nós não conhecíamos a farinha, só comíamos o babaçu (…). Quando fomos até eles [para se queixarem], os brancos nos mostraram os rastros dos índios. Dissemos: – quem esteve aqui não fomos nós! Viemos apenas para conversar e não para mexer com a mandioca. Dissemos. Mas os brancos começaram a brigar conosco, e nós ficamos pensando como vamos conversar [na tentativa de diálogo] com eles se não entendíamos a fala deles. Então, meus pais voltaram. Mas os brancos os seguiram e começaram a atirar, balearam índio e colocaram cachorros atrás de nós. Os brancos vieram, seguindo com cachorro, atiraram e espalhou todo mundo, nos espalharam. Hoje nós estamos espalhados, sem nos conhecer, espalhados em tantas aldeias, perdidos (…). Disseram meus pais: – nós gostaríamos de criar nossos animais, porcão, jabuti, macacos, assim como os brancos criam o gado. Mas o branco matou e cortou todos os nossos bichos, cortou a cabeça dos macacos e quebrou os jabutis de nossas casas. Isso aconteceu com meus avós e com meus pais. Os que querem tomar a nossa terra dizem que não existem os índios Awá-Guajá, mas é claro que nós existimos! Somos donos da terra! Somos donos da terra e sempre existimos! Nossa terra foi cortada por estradas e pela ferrovia, ficamos separados e perdidos. Nos levaram pra outros lugares e destruíram completamente os nossos lugares, mas não deixaremos que aconteça mais (depoimento de Mana Awá, por ocasião do acampamento “Nós existimos!”. Arquivos do Cimi, agosto de 2010).

    O Conselho Indigenista Missionário (Cimi) sempre atuou na defesa da vida e do território deste povo desde o contato. Entre algumas ações, destacam-se o acompanhamento jurídico; a realização de diversas denúncias de violações de seus direitos, como o próprio extermínio de grupos Awá e a sistemática ocupação de seu território; a promoção e o apoio à produção de documentários e de várias campanhas para visibilizar o drama dos Awá-Guajá para a sociedade brasileira; e o apoio e a promoção do acampamento “Nós existimos!” Junto com a Survival International, entrou com uma Petição de responsabilização do Estado brasileiro pela não desintrusão na Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), órgão autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA).

    Sem dúvida, no entanto, a maior contribuição do Cimi aos Awá foi favorecer e apoiar o protagonismo deste povo na exigência pela conclusão da regularização e proteção de seu território. Por meio de um trabalho de educação e organização popular, iniciado em 1999, a presença e a participação dos Awá foi viabilizada e articulada nos espaços e para as ações necessárias – o povo passou a falar com as suas próprias vozes. Este foi um rico processo que, desde então, vivencia e discute a construção da Escola Awá, pautada na transformação da realidade pelos Awá, que também se transformaram. Assim, puderam expressar ao mundo as constantes violações aos seus direitos, em tribunais, procuradorias, comissões, gabinetes, estúdios de rádio e TV, etc. Enfim, na rua, lugar dos movimentos dos oprimidos.

     

    A não desintrusão era dada como certa e alguns afirmavam que a sua realização era uma ilusão de sonhadores, dentre estes o Cimi. Pressões sobre a delimitação da TI Awá ocorriam desde 1985, quando ela foi identificada com 232 mil hectares, A partir daí, iniciou-se um processo de sucessivas portarias que, em síntese, subtraíram 115 mil hectares do território indígena. Em 2005 ele foi finalmente homologado com 116 mil hectares. Nesta última semana de janeiro, quando ocorre a conclusão do processo de notificação dos ocupantes não indígenas, poderá se constatar o número de famílias que lá se encontravam e, mais importante, por fim a uma guerra de números fictícios plantados por políticos com o objetivo de inviabilizar a regularização desse território.

    É urgente que a União instale bases de fiscalização nos territórios indígenas. E, além disso, discuta e implemente, com a participação indígena, ações eficazes e abrangentes de proteção e recuperação deste mosaico que compreende as terras indígenas Awá-Guajá, Alto Turiaçu, Caru, Alto Guamá e a Rebio Gurupi. O caso da TI Marãiwatsédé evidencia a necessidade destas medidas.

    Caso contrário, os direitos deste povo continuarão a ser violados e as suas vidas estarão ameaçadas. É necessário garantir segurança aos Awá para percorrerem suas terras em todas as suas atividades, principalmente as práticas de caça e coleta. Estas ameaças estendem-se aos grupos de Awá sem contato que vivem na TI Araribóia, localizada em uma outra região do estado, à mercê de constantes ataques de invasores. É necessário que o governo brasileiro responda à sociedade o que está sendo feito para a proteção desses grupos e de seu território.

    Sem dúvida, a grave situação dos Awá contribuiu para dar maior visibilidade às violações cometidas contra os indígenas no Brasil, já que ela foi debatida em importantes espaços sobre direitos humanos, dentre outros, e foi amplamente pautada pela mídia brasileira e internacional. Nesse sentido, o governo brasileiro tem sido cada vez mais questionado por organismos internacionais de Direitos Humanos.

    No entanto, recentemente, tendo a TI Awá como modelo, este mesmo governo tem publicizado programas e políticas para as populações indígenas que não condizem com a realidade. Trata-se apenas de propaganda diante da pressão pública mundial. O ‘desenvolvimento’ predador avança e a tal política, “de modelo exemplar”, ainda está apenas no plano das intenções.

    Em relação à saúde dos Awá-Guajá, é preciso que o governo adote o atendimento, de fato, específico e diferenciado a que os indígenas têm direito. É preciso romper paradigmas e abrir os ouvidos e o coração para ouvir e respeitar a concepção de saúde e de tratamento de doenças dos Awá.

    Abrir os ouvidos e o coração para o Outro é também ser solidário com ele diante das violações que os assaltantes de suas vidas e de seu futuro lhes impõem. Apelo que inúmeros sonhadores (as) aceitaram, tornando a bandeira da causa indígena visível e articulando-a com a luta maior dos pobres e explorados de todo o mundo.

    Cimi Regional Maranhão, 28 de janeiro de 2014

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  • 30/01/2014

    A volta da ditadura: governo Dilma militariza Terra Indígena Tupinambá

    A história de violência vivida pelo povo Tupinambá nas décadas de 1930 e 1940, se repete na Serra do Padeiro, sul da Bahia. Apesar do regime hoje ser democrático e, desde 1988, a Constituição Federal assegurar, de modo claro e assertivo, os direitos dos povos indígenas às suas terras tradicionais, ao invés de finalizar o processo demarcatório e solucionar definitivamente esta questão, a opção do governo Dilma foi a de enviar a Polícia Federal e a Força Nacional para a área indígena. Durante as duas últimas madrugadas (29 e 30 de janeiro), os Tupinambá, que permanecem no mato após a reintegração de posse das fazendas Sempre Viva e Conjunto São José, foram alvos não só de armas de fogo, mas também de granadas, segundo eles mesmos relataram.

    O processo de identificação da Terra Indígena Tupinambá teve início em 2004. Cinco anos depois, em abril de 2009, a Fundação Nacional do Índio (Funai) aprovou o relatório circunstanciado, no qual reconhece que “a área na qual se situa o imóvel litigioso é terra indígena tradicionalmente ocupada, cuja posse e usufruto são exclusivos da Comunidade Tupinambá”. O encaminhamento do relatório foi feito ao Ministério da Justiça, que tinha um prazo de 30 dias, de acordo com o decreto 1775/96, para a expedição da portaria declaratória. O Ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, insiste em desrespeitar a legislação brasileira, de modo especial a Constituição Federal. É inaceitável que, em vez de dar seguimento ao devido procedimento administrativo, o governo instale uma base policial em uma terra reconhecidamente indígena.

    Segundo a diretora da escola indígena, Magnólia Tupinambá, na madrugada de hoje (30/01), mais viaturas policiais chegaram na área. “O tiroteio foi ainda maior que na noite anterior. Parecia que iam derrubar as casas de tanto tiro. Foi muito tiro mesmo, e granada também. Mesmo a 6 km de distância você assustava com tanto tiro. E a gente se pergunta: por que o governo tá atirando nos indígenas? Por que tá agindo do mesmo jeito que na época da ditadura? Por que toda esta violência contra nós? Só queremos o que é nosso de direito”, questiona ela.

    Além do episódio em que a Polícia Federal foi acusada de torturar cinco indígenas Tupinambá em 2009, em uma área retomada (Ação Civil Pública nº 001825-23.2010.4.01.3311 – JF/Itabuna), a diretora Magnólia refere-se à brutal perseguição do cacique Marcellino, que vitimou toda a comunidade Tupinambá na época da intensificação da agricultura cacaueira. Na década de 1930, ao tentar frear a penetração dos não índios,  contratados pelos coronéis, no território Tupinambá, o cacique resistiu a sucessivos confrontos com a polícia. No entanto, em 1937, Marcellino desapareceu. Os índios afirmam que ele foi levado para o Rio de Janeiro. O certo é que nunca mais retornou.

    Este trecho de um artigo publicado, em outubro de 2013, na revista Carta Capital dá a dimensão da violência a que se referem os Tupinambá: “Quando procuravam Marcellino, certa noite, os policiais invadiram um sítio habitado por três indígenas – os irmãos Flaviano, Lourenço e Rufino – e suas famílias. Para que informassem o paradeiro do ‘bando’, os irmãos foram amarrados, açoitados com varas e interrogados. Os filhos menores de Rufino foram poupados, mas os dois mais velhos, Estelina Maria Santana e seu irmão Pedro, levaram uma surra de bainha de facão. Estelina morreu em 1987. A história quem conta é um de seus filhos, que vive em uma área retomada. Em sua perspectiva, o imperativo de recuperar o território tem a ver, junto às questões materiais, com uma obrigação moral, em memória de Estelina. Também participa do processo de retomada a filha de outro indígena torturado na perseguição a Marcellino, Manoel Liberato de Jesus, o Duca, que teve unhas arrancadas a saibro e a orelha esquerda pregada na parede. Ao fazê-lo, os policiais avisaram: se ainda estivesse ali quando voltassem, morreria. ‘Meu pai fez força, rasgou a orelha e saiu’. O lóbulo acabou permanentemente mutilado, como se pode ver no retrato em sua carteira de filiação ao Sindicato Rural de Ilhéus, guardada pela filha”.

    O Conselho Indigenista Missionário (Cimi) entende que a militarização do território Tupinambá somente agrava a situação vivida pelos Tupinambá e ocupantes não índios.  A solução do caso depende, necessariamente, da imediata publicação da portaria declaratória da Terra Indígena Tupinambá, bem como, o pagamento das indenizações devidas aos ocupantes não indígenas e o reassentamento daqueles que têm perfil para a reforma agrária. É inteira responsabilidade do governo Dilma evitar ou causar uma tragédia na Serra do Padeiro, terra do povo Tupinambá.

     

    Conselho Indigenista Missionário (Cimi), 30 de janeiro de 2014

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  • 30/01/2014

    Ocupação da Funai é mais um capítulo do abandono aos povos indígenas

    Em cumprimento ao mandado do juiz do Tribunal Regional Federal (TRF), Érico Rodrigo Freitas Pinheiro, da 1ª Vara Federal, que no último dia 21 de janeiro determinou a desocupação do prédio da Fundação Nacional do Índio (Funai), a Polícia Federal retirou os indígenas Kokama, Mura, Munduruku, Miranha, Apurinã e outros que acampavam no pátio do órgão desde o dia 04 de novembro do ano passado. No contexto de outros eventos envolvendo os povos indígenas, o fato se constitui em mais uma evidência do abandono a que o governo federal tem relegado essas populações em todo o país.

     

    Especificamente no caso dos indígenas da cidade de Manaus, o movimento com duração de mais de dois meses foi interrompido por ação da Justiça sem que o poder público tenha aberto o diálogo para ouvir as lideranças. Gestores de órgãos governamentais, em todas as recentes ocupações promovidas pelos indígenas, em vez de ouvi-los ou atender suas reivindicações, têm se limitado a usar a força policial sem adotar alguma solução concreta, sobretudo em relação à falta de moradia das famílias indígenas na cidade.

     

    Nos últimos anos, em vários cenários em todo o país, têm aumentado o número de manifestações preconceituosas contra os indígenas. Isso é conseqüência da estratégia política dos grupos antiindígenas interessados em rever direitos constitucionais, como a garantia às terras tradicionalmente ocupadas e a revisão dos procedimentos demarcatórios, retirando do Poder Executivo a prerrogativa de homologar as demarcações.

     

    Recentemente, os Tenharim e Djahoi, de terras indígenas localizadas entre os municípios de Manicoré e Humaitá, no sul do Amazonas, foram alvo de ataques orquestrados mais por representantes de madeireiros e latifundiários do que pela população em geral – grande parte insuflada por políticos e “comunicadores” de Humaitá.

     

    Os Mura, da região de Autazes, Careiro, Manaquiri, Borba e Nova Olinda, têm sido vítimas de ameaças de fazendeiros da localidade em vista do anúncio da demarcação de suas terras. Em decorrência dos conflitos, pelo menos oito lideranças declararam ao Ministério Público Federal no Amazonas terem sofrido ameaças de morte.

     

    Os indígenas de Manaus e das demais localidades do estado do Amazonas há muito tempo vêm cobrando do governo federal, tanto pela Funai como pela Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) – órgãos encarregados de prestar assistência direta aos povos indígenas -, proteção aos territórios já demarcados e regularização das terras a identificar ou já identificadas, cujos procedimentos demarcatórios encontram-se paralisados, maior atenção nas áreas de educação, saúde e sustentação econômica.

     

    A desassistência e o descaso foram as principais motivações para a ocupação do prédio da Funai. No momento em que a Polícia Federal retira os indígena do local, mais um capítulo do abandono se escreve confirmando, assim, a falta de interesse por parte do Estado brasileiro em criar condições para que os povos indígenas vivam dignamente e da maneira que melhor lhes aprouver. Essa postura do governo federal merece repúdio da sociedade brasileira, pois não se circunscreve somente em torno da questão indígena, mas afeta todos os segmentos que reagiram e reagem à submissão dos governantes e da classe política – majoritariamente -, aos interesses dos latifundiários, do agronegócio e do grande capital em todas as suas formas.

     

     

    Manaus (AM), 29 de janeiro de 2014

     

    Comitê Regional da Verdade

    Conselho Indigenista Missionário

    Foto na chamada: Alberto César Araújo, Amazônia Real

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  • 28/01/2014

    Ao invés da conclusão do processo demarcatório, base policial é montada em terra tradicional dos Tupinambá

    Patrícia Bonilha,

    de Brasília

     

    Após realizar a reintegração de posse de duas fazendas localizadas na Serra do Padeiro, no município de Ilhéus, na Bahia, policiais federais e da Força Nacional montaram hoje (28) uma base policial na sede da fazenda Sempre Viva. Com uma infra estrutura que conta com vários colchões, camas, rádio e alguns veículos, os policiais se instalaram na área reivindicada pelos indígenas e, desde 2009, reconhecida pela Fundação Nacional do Índio (Funai) como território tradicional indígena.

     

    O fato causou indignação no povo Tupinambá, que havia feito a retomada destas fazendas em agosto de 2013. “Nunca pedimos base policial aqui, até mesmo porque não há conflitos na área. O que nós queremos é que devolvam as nossas terras. Há quase cinco anos esperamos que o Ministro da Justiça tire da sua gaveta e assine a portaria declaratória que reconhece os nossos direitos”, afirma Magnólia Tupinambá, diretora da escola indígena.

     

    Segundo informações dos indígenas, os policiais utilizaram a desculpa de realizar a reintegração de posse, para montar esta base policial dentro da terra tradicional. “Desde que foi montada, a base ficou cheia de fazendeiros. Agindo assim, o governo e a polícia explicitam que, ao invés de defenderem direitos constitucionais, eles defendem os interesses dos fazendeiros que invadiram nossas terras. A história nada mudou nestes 500 anos, desde a primeira invasão dos portugueses aqui na Bahia”, declara a diretora.

     

    Os indígenas estavam trabalhando nas roças quando, às 9 horas, 18 veículos da polícia chegaram na sede da fazenda. Segundo informações passadas aos Tupinambá por um funcionário da Funai, todos os pertences dos indígenas seriam colocados em um cômodo da sede.

     

    No caso da fazenda Conjunto São José, por volta das 11 horas, os policiais teriam colocado as bagagens, alimentos, móveis (fogão, geladeira, armário, etc) em um caminhão e deixado na beira da estrada, próximo à fazenda Floresta, há cerca de 10 km. As reintegrações foram feitas nas duas fazendas, onde 18 famílias estavam morando, sem que houvesse qualquer resistência dos indígenas, que seguiram trabalhando e fazendo seus rituais no mato.

     

    Segundo informações do delegado que atua em Buerarema, uma nova reintegração de posse será feita na próxima quinta-feira na fazenda Lembrança.

     

    Governo não investe em solução definitiva

     

    A paralisação dos processos de demarcação de territórios indígenas em todo o Brasil tem causado desde o ano passado um considerável aumento dos conflitos envolvendo a disputa de terras. Os indígenas avaliam que muita violência e até mesmo mortes poderiam ser evitadas se o governo finalizasse os processos de demarcação que precisam ainda de alguma providência por parte do poder Executivo.

     

    Exemplo disso é a própria solicitação de suspensão da reintegração de posse da fazenda Conjunto São José, na qual a Funai afirma que ela “foi proferida sem suficiente amparo jurídico, haja vista a existência de relatório circunstanciado, aprovado pelo Presidente da Funai (Despacho n. 24, DOU de 20/04/2009) e já encaminhado ao Ministério da Justiça para homologação da demarcação, o qual reconhece que a área na qual se situa o imóvel litigioso é terra indígena tradicionalmente ocupada, cuja posse e usufruto são exclusivos da Comunidade Tupinambá”.

     

    Apesar de ter indeferido o pedido da Funai, o Desembargador Federal, Mário César Ribeiro, reconheceu que “essa expectativa — da finalização do processo demarcatório pelo Executivo, que geralmente arrasta-se por anos — além de gerar insegurança à população das áreas envolvidas, suscita violência decorrente da disputa da posse de terras entre índios e não índios.

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  • 28/01/2014

    Polícia Federal retorna à Terra Indígena Marãiwatsédé (MT) para conter invasão de não índios

    Equipes das polícias Federal e Rodoviária Federal retornaram à Terra Indígena (TI) Marãiwatsédé, no nordeste do Mato Grosso, para impedir uma nova invasão de não índios. Ainda não há informação sobre o efetivo deslocado à região (na foto ao lado, crianças Xavante)

     

    A ação atende decisão da Justiça Federal em Cuiabá, por sua vez obtida por um pedido do Ministério Público Federal. A área voltou a ser invadida no último fim de semana de forma organizada, depois que homens da Força Nacional de Segurança (FNS) deixaram-na, na semana passada. 

     

    Há exatamente um ano terminava a operação de desintrusão de Marãiwatsédé, decorrente de decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que determinou a retirada de todos os não índios. Não é possível reverter a determinação do STF, tendo em vista que o caso transitou em julgado, ou seja, não cabe mais nenhum recurso judicial. Muito menos há hoje alguma decisão da Justiça que pretenda contrariar tal determinação.

     

    De acordo com os Xavante, um grupo de pelo menos 50 pessoas invadiu a localidade conhecida como Posto da Mata, no interior da TI, expulsando servidores da Fundação Nacional do Índio (Funai). Na manhã de domingo (26/1), o cacique Damião Paridzané foi perseguido quando tentava se aproximar

     

    “Eu fui cedo para Mo onipá [como os indígenas chamam o Posto da Mata]. Havia quatro funcionários da Funai. Não consegui chegar lá porque os posseiros fecharam a estrada. Todo o mundo correu atrás da gente”, relata Paridzané. “É preciso agir logo. Não podemos circular pelo nosso território com os invasores aí. O que nos falta agora é segurança. O carro da saúde não pode sair. Estamos preocupados.”

     

    Apesar da presença da FNS ao longo de 2013, diversos grupos foram flagrados pelos policiais e pelos Xavante durante o ano em rondas pela TI, fragilizada mesmo após a desintrusão pela existência de estradas que cortam a área e facilitam invasões. A tentativa de reinvasão constitui crime e um atentado contra a decisão da última instância do Poder Judiciário brasileiro.

     

    Ontem, a Operação Amazônia Nativa (OPAN), o Instituto Socioambiental (ISA), o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e o Greenpeace circularam uma nota pública em que pedem e apoiam o retorno da força policial à TI Marãiwatsédé. O texto cobra a presença do Estado e tratamento digno aos pequenos posseiros que eventualmente estejam no local (veja a nota).

     

    O desejo de que os pequenos agricultores da região vivam com qualidade é também compartilhado pelos índios. Durante o processo de desintrusão, Paridzané falou diversas vezes sobre o equívoco de se polarizar o embate como sendo de brancos contra índios.

     

    “Os políticos não estão preocupados em melhorar a vida nem dos índios nem dos não índios. Será que o governador se preocupa com a situação do povo hoje? Em todos os municípios daqui, o povo não tem água, não tem esgoto, não tem desenvolvimento. Ele, como autoridade de Mato Grosso, tem a obrigação de atender as dificuldades do povo, mas ele não quer. Mas os políticos preferem jogar o branco contra o índio, como se isso fosse resolver alguma coisa”, disse Paridzané em dezembro de 2011.

     

    Entenda o caso

     

    Em 1992, em meio aos trabalhos de identificação, um grupo formado por políticos e fazendeiros organizou uma invasão ao território tradicional dos Xavante, iniciando uma longa batalha judicial pela desintrusão, somente finalizada ano passado com apoio policial. Homologada em 1998, a TI Marãiwatsédé tem 165 mil hectares e, por causa da ação dos invasores, tornou-se um dos territórios indígenas mais desmatados do país.

     

    Em outubro de 2013, o STF confirmou decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) no sentido de considerar que a posse de todos os réus sobre a área em litígio era ilícita, de má-fé, porque eles sabiam que se tratava de terra indígena quando de sua entrada.

     

    A tentativa de invadir novamente Marãiwatsédé ocorre em meio a uma série de ataques à legislação indigenista por meio de projetos inconstitucionais defendidos pela bancada ruralista no Congresso. Entre esses projetos, estão a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215, que tira do Executivo e transfere ao Congresso a prerrogativa de aprovar as demarcações de TIs e o Projeto de Lei Complementar (PLP) 227, que abre as terras indígenas à exploração econômica do agronegócio, empresas de energia e mineração.

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  • 27/01/2014

    Comunidade Guarani Kaiowá mais ameaçada enfrenta nova reintegração de posse

    Ruy Sposati, de Campo Grande (MS)


    A comunidade Guarani Kaiowá mais ameaçada do momento, o tekoha Apyka’i, no município de Dourados (MS), poderá enfrentar mais uma reintegração de posse.

    Uma nova manobra judicial garantiu que uma decisão – já cumprida – da Justiça Federal de 2009, em favor do Cássio Guilherme Bonilha Tecchio, proprietário da Fazenda Serrana, fosse, mais uma vez, utilizada contra os indígenas.

    Agora, os Kaiowá tem 30 dias para sair do local, onde estão acampados desde setembro de 2012.  O prazo para o despejo passa a contar a partir desta segunda-feira, 27. A liderança da comunidade, Damiana, reafirma que os indígenas não sairão da terra.

    Até setembro do ano passado, a área era utilizada pela Usina São Fernando para plantio de cana em larga escala. Foi quando Damiana e sua comunidade retomaram o território, depois de 14 anos acampados à beira da rodovia BR-463, a 8 quilômetros do centro de Dourados, e voltaram a incomodar os produtores da usina. A terra reivindicada pelos Kaiowá como tradicional está em processo de identificação e delimitação pela Fundação Nacional do Índio (Funai).

    "Agora não vou deixar mais cortar cana e nem passar veneno", afirma a cacica Damiana. Ela quer dizer que os Kaiowá não pretendem sair da fazenda. "Meu pai morreu aqui no tekoha. Cemitério antigo tá aqui, fazendeiro botou fogo em tudo. Agora só usina usa. Chega. Chega de aproveitar a terra aqui a usina. Usina não vai mais cortar cana".

    Veja entrevista em vídeo com cacica Damiana

    "Deixa assim mesmo. Apodrecer a cana". Ela se refere às plantações que estavam no local no momento da retomada. "Eu não vou sair mais daqui. Pode ser tiro, não vou sair mais não. E não vou deixar colher nem passar veneno".

    A usina

    Instalada em Dourados em 2009, a Usina São Fernando é um empreendimento do Grupo Bertin, um dos maiores frigoríficos produtores e exportadores de itens de origem animal das Américas, e da Agropecuária JB, ligada ao Grupo Bumlai, especializado em melhoramento genético de gado de corte. Um dos territórios utilizados pela usina para produzir cana é reivindicado pelo Kaiowá do Apyka’i.

    Em 2010, sob perigo de perder sua licença de operação em função de diversos descumprimentos legais em questões trabalhalistas, ambientais e indígenas, a usina teve de assinar um termo de cooperação e compromisso de responsabilidades na Justiça.

    Entre as condicionantes estabelecidas pelo Ministério Público Estadual, Ministério Público do Trabalho e MPF, a usina era obrigada a não renovar o contrato de arrendamento da fazenda Serrana, de Cássio Guilherme Bonilha Tecchio, propriedade que incide sobre o território reivindicado como Apyka’i pela família de Damiana, quando o atual findasse.

    O tekoha

    Já a história dos Guarani Kaiowá se perde no tempo – mas, em seu ciclo particular de cana-de-açucar, os anos de beira de estrada, uma série tragédias acometeu a família de Damiana. Cinco pessoas morreram por atropelamento – o último, Gabriel, um dos netos de Damiana, morto em março de 2012, aos 4 anos de idade. Uma idosa faleceu, segundo indígenas, envenenada por agrotóxicos utilizados nas plantações que circundam o acampamento.

    Tentaram retomar o território algumas vezes. A última tentativa havia acontecido em junho de 2008, e duraria até o cumprimento da decisão judicial citada no início do texto. Depois de expulsos, a comunidade voltaria a viver na beira da estrada.

    Em setembro de 2009, um grupo armado atacou o acampamento, atirando em direção aos barracos. Um Kaiowá de 62 anos foi ferido por tiros, outros indígenas agredidos e barracos e objetos foram queimados.

    Também em 2012, em agosto, ainda acampados na beira da estrada, um incêndio que segundo indígenas teria sido iniciado propositalmente no canavial da Usina São Fernando alastrou-se pelo acampamento, destruindo barracas, alimentos e pertences dos indígenas, forçando-os a fugir. A causa do incêndio ainda não foi confirmada.

    Pouco mais de um mês depois, em 16 de setembro, contudo, depois de 14 anos acampados na rodovia, a comunidade mais uma vez moveu seu acampamento para dentro do território reivindicado como tradicional, onde hoje incide a fazenda Serrana, utilizada pela São Fernando para a monocultura em larga escala de cana-de-açucar.

    "Nós nunca mais vamos sair daqui. Se nós matarem, peço que tragam pás para nos enterrar. Mesmo que nos invadem aqui, não vamo sair nunca mais. Vamos resistir aqui. Mesmo que nos ameaçam vamos ficar aqui. A luta sempre vai continuar, mesmo eu morrendo, porque eu tenho vários netos", afirma Damiana.

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  • 27/01/2014

    Organizações demandam retirada de invasores de Marãiwatsédé

    Há exatamente um ano terminava a operação de desintrusão da Terra Indígena Marãiwatsédé, no nordeste de Mato Grosso. Ela resultou de decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), órgão máximo da Justiça brasileira, que determinou a retirada de todos os não índios da área. Lamentavelmente, no aniversário da emblemática retomada do território xavante após 20 anos de batalhas judiciais pelo direito de ocupar suas áreas tradicionais, uma nova invasão, orquestrada localmente, acaba de acontecer. De acordo com os Xavante, um grupo de pelo menos 50 pessoas invadiu a localidade conhecida como Posto da Mata, no interior da terra indígena, expulsando servidores da Fundação Nacional do Índio (Funai) que ali trabalhavam. Na manhã de domingo (26/1), o cacique Damião Paridzané foi perseguido quando tentava se aproximar do local.

     

    Apesar da presença da Força Nacional de Segurança ao longo do ano de 2013, diversos grupos foram flagrados pelos policiais e pelos Xavante em rondas pela Terra Indígena Marãiwatsédé, fragilizada mesmo após a desintrusão em virtude da existência de estradas que cortam a área – fato este que facilita as invasões. Entretanto, o que se viu no episódio que se iniciou neste fim de semana foi uma ação articulada de tentativa de reinvasão, o que constitui um crime e atentado contra a decisão da última instância do Poder Judiciário brasileiro.

     

    Não é possível reverter a determinação do STF de retirar todos os não índios da área tendo em vista que o caso transitou em julgado, ou seja, não cabe mais nenhum recurso judicial. Muito menos há hoje alguma decisão da Justiça que pretenda contrariar tal determinação. Em respeito a ela, a Justiça Federal já decidiu que as forças policiais devem retornar à Terra Indígena para retirar os invasores e manter a ordem.

     

    Essa nova invasão a Marãiwatsédé é mais uma afronta ao direito do usufruto exclusivo das terras indígenas, em meio a ataques à legislação indigenista expressos em projetos inconstitucionais defendidos pela bancada ruralista, como a PEC 215, que tira do Executivo e transfere ao Congresso a prerrogativa de aprovar as demarcações de terras indígenas – o que na prática significará a paralisação das mesmas – e o PLP 227 que abre as terras indígenas à exploração econômica do agronegócio, empresas de energia e mineração.

     

    As entidades abaixo-assinadas apelam pela presença do Estado brasileiro e do comprometimento do governo de Mato Grosso para não acirrar a situação de tensão, cumprindo com seu dever de garantir governança na região e dignidade no assentamento de famílias de pequenos posseiros.

     

    Alertamos sobre a gravidade desse fato e a reincidência de atos de ilegalidade praticados contra as terras indígenas, em total desrespeito aos povos e à Justiça brasileira, solicitando que o Estado brasileiro tome medidas enérgicas para desestimular e punir atitudes criminosas como essa.

     

    Conselho Indigenista Missionário (Cimi)
    Greenpeace
    Instituto Socioambiental (ISA)
    Operação Amazônia Nativa (Opan)

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