• 27/01/2014

    Comunidade Guarani Kaiowá mais ameaçada enfrenta nova reintegração de posse

    Ruy Sposati, de Campo Grande (MS)


    A comunidade Guarani Kaiowá mais ameaçada do momento, o tekoha Apyka’i, no município de Dourados (MS), poderá enfrentar mais uma reintegração de posse.

    Uma nova manobra judicial garantiu que uma decisão – já cumprida – da Justiça Federal de 2009, em favor do Cássio Guilherme Bonilha Tecchio, proprietário da Fazenda Serrana, fosse, mais uma vez, utilizada contra os indígenas.

    Agora, os Kaiowá tem 30 dias para sair do local, onde estão acampados desde setembro de 2012.  O prazo para o despejo passa a contar a partir desta segunda-feira, 27. A liderança da comunidade, Damiana, reafirma que os indígenas não sairão da terra.

    Até setembro do ano passado, a área era utilizada pela Usina São Fernando para plantio de cana em larga escala. Foi quando Damiana e sua comunidade retomaram o território, depois de 14 anos acampados à beira da rodovia BR-463, a 8 quilômetros do centro de Dourados, e voltaram a incomodar os produtores da usina. A terra reivindicada pelos Kaiowá como tradicional está em processo de identificação e delimitação pela Fundação Nacional do Índio (Funai).

    "Agora não vou deixar mais cortar cana e nem passar veneno", afirma a cacica Damiana. Ela quer dizer que os Kaiowá não pretendem sair da fazenda. "Meu pai morreu aqui no tekoha. Cemitério antigo tá aqui, fazendeiro botou fogo em tudo. Agora só usina usa. Chega. Chega de aproveitar a terra aqui a usina. Usina não vai mais cortar cana".

    Veja entrevista em vídeo com cacica Damiana

    "Deixa assim mesmo. Apodrecer a cana". Ela se refere às plantações que estavam no local no momento da retomada. "Eu não vou sair mais daqui. Pode ser tiro, não vou sair mais não. E não vou deixar colher nem passar veneno".

    A usina

    Instalada em Dourados em 2009, a Usina São Fernando é um empreendimento do Grupo Bertin, um dos maiores frigoríficos produtores e exportadores de itens de origem animal das Américas, e da Agropecuária JB, ligada ao Grupo Bumlai, especializado em melhoramento genético de gado de corte. Um dos territórios utilizados pela usina para produzir cana é reivindicado pelo Kaiowá do Apyka’i.

    Em 2010, sob perigo de perder sua licença de operação em função de diversos descumprimentos legais em questões trabalhalistas, ambientais e indígenas, a usina teve de assinar um termo de cooperação e compromisso de responsabilidades na Justiça.

    Entre as condicionantes estabelecidas pelo Ministério Público Estadual, Ministério Público do Trabalho e MPF, a usina era obrigada a não renovar o contrato de arrendamento da fazenda Serrana, de Cássio Guilherme Bonilha Tecchio, propriedade que incide sobre o território reivindicado como Apyka’i pela família de Damiana, quando o atual findasse.

    O tekoha

    Já a história dos Guarani Kaiowá se perde no tempo – mas, em seu ciclo particular de cana-de-açucar, os anos de beira de estrada, uma série tragédias acometeu a família de Damiana. Cinco pessoas morreram por atropelamento – o último, Gabriel, um dos netos de Damiana, morto em março de 2012, aos 4 anos de idade. Uma idosa faleceu, segundo indígenas, envenenada por agrotóxicos utilizados nas plantações que circundam o acampamento.

    Tentaram retomar o território algumas vezes. A última tentativa havia acontecido em junho de 2008, e duraria até o cumprimento da decisão judicial citada no início do texto. Depois de expulsos, a comunidade voltaria a viver na beira da estrada.

    Em setembro de 2009, um grupo armado atacou o acampamento, atirando em direção aos barracos. Um Kaiowá de 62 anos foi ferido por tiros, outros indígenas agredidos e barracos e objetos foram queimados.

    Também em 2012, em agosto, ainda acampados na beira da estrada, um incêndio que segundo indígenas teria sido iniciado propositalmente no canavial da Usina São Fernando alastrou-se pelo acampamento, destruindo barracas, alimentos e pertences dos indígenas, forçando-os a fugir. A causa do incêndio ainda não foi confirmada.

    Pouco mais de um mês depois, em 16 de setembro, contudo, depois de 14 anos acampados na rodovia, a comunidade mais uma vez moveu seu acampamento para dentro do território reivindicado como tradicional, onde hoje incide a fazenda Serrana, utilizada pela São Fernando para a monocultura em larga escala de cana-de-açucar.

    "Nós nunca mais vamos sair daqui. Se nós matarem, peço que tragam pás para nos enterrar. Mesmo que nos invadem aqui, não vamo sair nunca mais. Vamos resistir aqui. Mesmo que nos ameaçam vamos ficar aqui. A luta sempre vai continuar, mesmo eu morrendo, porque eu tenho vários netos", afirma Damiana.

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  • 27/01/2014

    Organizações demandam retirada de invasores de Marãiwatsédé

    Há exatamente um ano terminava a operação de desintrusão da Terra Indígena Marãiwatsédé, no nordeste de Mato Grosso. Ela resultou de decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), órgão máximo da Justiça brasileira, que determinou a retirada de todos os não índios da área. Lamentavelmente, no aniversário da emblemática retomada do território xavante após 20 anos de batalhas judiciais pelo direito de ocupar suas áreas tradicionais, uma nova invasão, orquestrada localmente, acaba de acontecer. De acordo com os Xavante, um grupo de pelo menos 50 pessoas invadiu a localidade conhecida como Posto da Mata, no interior da terra indígena, expulsando servidores da Fundação Nacional do Índio (Funai) que ali trabalhavam. Na manhã de domingo (26/1), o cacique Damião Paridzané foi perseguido quando tentava se aproximar do local.

     

    Apesar da presença da Força Nacional de Segurança ao longo do ano de 2013, diversos grupos foram flagrados pelos policiais e pelos Xavante em rondas pela Terra Indígena Marãiwatsédé, fragilizada mesmo após a desintrusão em virtude da existência de estradas que cortam a área – fato este que facilita as invasões. Entretanto, o que se viu no episódio que se iniciou neste fim de semana foi uma ação articulada de tentativa de reinvasão, o que constitui um crime e atentado contra a decisão da última instância do Poder Judiciário brasileiro.

     

    Não é possível reverter a determinação do STF de retirar todos os não índios da área tendo em vista que o caso transitou em julgado, ou seja, não cabe mais nenhum recurso judicial. Muito menos há hoje alguma decisão da Justiça que pretenda contrariar tal determinação. Em respeito a ela, a Justiça Federal já decidiu que as forças policiais devem retornar à Terra Indígena para retirar os invasores e manter a ordem.

     

    Essa nova invasão a Marãiwatsédé é mais uma afronta ao direito do usufruto exclusivo das terras indígenas, em meio a ataques à legislação indigenista expressos em projetos inconstitucionais defendidos pela bancada ruralista, como a PEC 215, que tira do Executivo e transfere ao Congresso a prerrogativa de aprovar as demarcações de terras indígenas – o que na prática significará a paralisação das mesmas – e o PLP 227 que abre as terras indígenas à exploração econômica do agronegócio, empresas de energia e mineração.

     

    As entidades abaixo-assinadas apelam pela presença do Estado brasileiro e do comprometimento do governo de Mato Grosso para não acirrar a situação de tensão, cumprindo com seu dever de garantir governança na região e dignidade no assentamento de famílias de pequenos posseiros.

     

    Alertamos sobre a gravidade desse fato e a reincidência de atos de ilegalidade praticados contra as terras indígenas, em total desrespeito aos povos e à Justiça brasileira, solicitando que o Estado brasileiro tome medidas enérgicas para desestimular e punir atitudes criminosas como essa.

     

    Conselho Indigenista Missionário (Cimi)
    Greenpeace
    Instituto Socioambiental (ISA)
    Operação Amazônia Nativa (Opan)

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  • 27/01/2014

    Redução de Terra Indígena não é alternativa para solução de conflitos fundiários

    O Conselho Indigenista Missionário manifesta preocupação diante da possibilidade de haver “redução” dos limites da Terra Indígena Mato Preto, no estado do Rio Grande do Sul.


    Em reunião realizada no dia 23 de janeiro, nas dependências do Ministério Público Federal, no município de Erechim, a comunidade indígena que ocupa uma pequena parcela dos 4.230 hectares declarados tradicionais do povo Guarani Chiripá e Mbya, apresentou pedido para que a referida área seja reduzida. A justificativa apresentada pelos Guarani, foi a de que não suportam mais as condições precárias a que estão expostos no acampamento em que vivem, há cerca de 12 anos, à margem da via férrea sob concessão da América Latina Logística (ALL), próximo à rodovia BR 153.


    Em nenhum momento os Guarani questionaram as provas técnico-científicas contundentes que embasam o procedimento administrativo e justificam a emissão da  portaria declaratória número 2.222, pelo Ministro da Justiça, no dia 21 de setembro de 2012.


    Além da comprovada morosidade do governo federal na condução do procedimento administrativo de demarcação de terras indígenas, deputados ruralistas do Rio Grande do Sul tem feito discursos anti-indígenas agressivos e inflamatórios, não hesitando em criminosamente incentivar a fazendeiros e agricultores a pegarem em armas e declararem guerra contra os indígenas naquele estado.


    O Conselho Indigenista Missionário manifesta compreensão e respeito ao pedido feito pelos Guarani. No entanto, entende que uma solução efetiva não será alcançada com a redução da terra tradicional do povo e sim pelo cumprimento do dispositivo constitucional, com a agilização do procedimento de demarcação em curso, a conseqüente indenização e reassentamento dos não-indígenas e a efetivação da posse da terra por parte dos Guarani.


    O Cimi alerta que uma eventual “redução” a terra já declarada como tradicionalmente indígena, trará conseqüências extremamente negativas não somente para os próprios Guarani, mas também para todos os povos indígenas do Brasil. Num momento em que os direitos territoriais e os povos indígenas são violentamente agredidos em todas as regiões do país, a redução da Terra Indígena Mato Preto seria entendida como um prêmio à morosidade governamental e aos setores político-econômicos responsáveis pelo ataque anti-indígena em curso.


    O Cimi receia que os setores anti-indígenas, especialmente a bancada ruralista, logo mais irão alardear este fato e passar a mensagem de que é vantajoso opor-se às demais demarcações em curso no Rio Grande do Sul e no país, chegando inclusive ao cúmulo de ameaçar e incitar violências físicas contra estes povos.


    A conseqüência disso será o aumento exponencial dos conflitos pela terra e das violências contra os indígenas naquele e noutros estados. Redução de Terra Indígena jamais será uma alternativa para solução de conflitos fundiários!


    Brasília, DF, 27 de janeiro de 2014.


    Conselho Indigenista Missionário – Cimi

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  • 27/01/2014

    Fazendeiros têm até sexta para entregar 640 mil à Justiça; dinheiro será fiscalizado por indígenas

    Ruy Sposati, de Campo Grande (MS)


    Começa a correr nesta segunda-feira, 27, o prazo estabelecido pela Justiça Federal para que fazendeiros entreguem à Justiça o valor total arrecadado em leilão para financiar ações contra indígenas no Mato Grosso do Sul. Segundo a decisão, o montante angariado no chamado Leilão da Resistência deve ser depositado em juízo e só poderá ser utilizado com a aprovação dos indígenas e do Ministério Público Federal (MPF).

    Convocado pela Associação dos Criadores de Mato Grosso do Sul (Acrissul) e Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul (Famasul), com o apoio da bancada ruralista do Congresso Nacional, o leilão foi realizado no dia 7 de dezembro, em Campo Grande, com a presença da senadora e presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Katia Abreu (PMDB-TO) além de parlamentares da Frente Parlamentar Agropecuária (FPA).

    No dia 3 de dezembro, o Conselho do Aty Guasu Guarani e Kaiowá e o Conselho Terena entraram com uma ação na Justiça Federal exigindo a suspensão do leilão, denunciando que ruralistas planejavam realizar a atividade para arrecadar fundos para a "contratação de empresas de segurança em supostas defesas de terra”, conforme apontava a petição inicial dos indígenas.

    Leilão suspenso

    Dois dias depois, a juíza Janete Lima Miguel, da 2a. Vara de Campo Grande da Justiça Federal, determinou que o Leilão da Resistência não fosse realizado. A decisão argumentava que “esse comportamento por parte da parte [fazendeiros] não pode ser considerado lícito, visto que pretendem substituir o Estado na solução do conflito existente entre a classe ruralista e os povos indígenas” e que “tem o poder de incentivar a violência (…) e colide com os princípios constitucionais do direito à vida, à segurança e à integridade física”.

    No entanto, poucas horas antes da data prevista para que o leilão ocorresse, a suspensão foi cancelada. Em uma movimentação judicial considerada anormal pelos advogados dos indígenas, as entidades ruralistas questionaram judicialmente, um dia antes do leilão,  a imparcialidade e independência da juiza Janete, que havia suspendido o leilão. Ela, então, se declarou suspeita perante a Justiça para julgar o caso. O Tribunal Regional Federal da 3a. Região (TRF-3) então nomeou Pedro Pereira dos Santos, da 4a. Vara, para julgar o caso.

    Às 22h30 de sexta-feira, 6, o juiz Pedro Pereira dos Santos, da 4ª Vara da Justiça Federal de Campo Grande reverteu a decisão anterior e liberou a realização do leilão. Estabelecendo condicionantes para que ele fosse realizado: o dinheiro arrecadado com o leilão deveria ser depositado numa conta judicial e controlado pela Justiça; os leiloeiros deveriam discriminar os nomes dos arrematadores e os valores pagos; a utilização dos recursos arrecadados com o leilão só poderá ser feita depois da Justiça ouvir as organizações indígenas Aty Guasu e Conselho Terena, além do Ministério Público Federal (MPF).

    Algumas horas antes do início do evento, os indígenas entraram com mandado de segurança pedindo a suspensão dos efeitos da nova decisão, sem sucesso. O juiz plantonista Leonel Ferreira, do Tribunal Regional Federal da 3a. Região (TRF-3), negou o pedido, argumentando que as condicionantes estabelecidas na decisão eram suficientes para coibir as ilegalidades denunciadas pelos indígenas.

    Até o momento, nos autos do processo principal, foram registrados dois depósitos em juízo realizados em dezembro, nos valores de 49 mil e 131,5 mil reais.

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  • 27/01/2014

    Povo Tapirapé denuncia construção de estrada que afetará aldeias

    Em documento encaminhado no final de 2013 ao Ministério Público Federal em Mato Grosso, indígenas de sete aldeias do povo Tapirapé-Apyãwa denunciaram o processo de construção da estrada MT-100, na região nordeste do estado que afetará todas as suas comunidades.

    Em visível violação dos direitos dos povos indígenas assegurados pela Constituição Federal e pala Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), a estrada já se encontra com as obras adiantadas, sem que a comunidade tenha sido devidamente consultada. O documento ainda apresenta denúncias de tentativas de aliciamento da comunidade, visto que políticos da região, entre eles os prefeitos de Confresa, Santa Terezinha e de Porto Alegre do Norte, acompanhados do deputado estadual Baiano Filho, ofereceram, durante reunião na aldeia Tapi’itãwa, caminhonetes em troca da abertura da estrada. De maneira absurda, direitos fundamentais como posto de saúde, escola e posto de vigilância também foram oferecidos para que a comunidade aceitasse a construção da estrada. Segundo lideranças do povo Tapirapé-Apyãwa: “tentaram negociar de todo jeito. Todas as promessas eram para ser entregues após a conclusão da estrada, mas a comunidade não aceitou”.

     

    Como já haviam avisado na reunião, os Tapirapé-Apyãwa paralisaram as obras no dia 14 de outubro, tendo feito a verificação de que a obra continuava paralisada novamente no dia 22 de outubro.

     

    O que se vê, mais uma vez, é a expressão de interesses de alguns setores buscando se sobrepor aos direitos constituídos. Outra obra, praticamente já concluída nas proximidades, é a pavimentação da BR 158, que também afeta a terra dos Tapirapé Embora os indígenas tenham apresentado suas reivindicações e acordos tenham sido firmados para atendê-las, nada foi efetivado até o momento.

     

    Lideranças também informaram que no dia 22 de novembro o deputado Baiano Filho se reuniria com alguns indígenas em Confresa, a 29 km da aldeia central da Terra Indígena Urubu Branco. No entanto, as lideranças aguardavam a realização desta reunião na aldeia. “O que fica explícito é que aqui também se utiliza a comum estratégia de dividir a comunidade e fazer acordos com um grupo à parte, legitimando possíveis acordos que ferem os interesses da maioria do povo”, afirma Gilberto Vieira, secretário adjunto do Conselho Indigenista Missionário (Cimi).

     

    Reafirmando sua convicção de não ceder aos interesses contrários ao seu projeto de futuro, os Tapirapé-Apyãwa reuniram suas comunidades novamente no último dia 19 de janeiro para discutir a solicitação do deputado Baiano Filho de que se reunissem novamente no dia 22 de janeiro próximo na aldeia. Após debates e reflexões, os indígenas decidiram não receber o deputado e sua comitiva na aldeia Tapi’itãwa. Nas palavras das lideranças: “chega de promessa, não tem negócio nenhum com relação à construção da MT 100”. A reunião proposta para o dia 22 foi, então, cancelada.

     

    Como foi expresso no documento enviado ao Ministério Público Federal (MPF), assinado por todas as lideranças e representações de todas as aldeias da TI Urubu Branco, os Tapirapé-Apyãwa pedem o embargo das obras.

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  • 27/01/2014

    II Encontro dos de Baixo demanda resolução imediata para os territórios indígenas e quilombolas

    O II Encontro dos de Baixo contou com a presença de centenas de militantes populares, com  representações Quilombolas do RS, SC, SP e Maranhão (importante presença da representação da MOQUIBOM – Movimento Quilombola da Baixada Ocidental Maranhense) além de dezenas de lideranças Indígenas do RS e entidades indigenistas. O encontro se consolidou como um espaço de debates e discussões daqueles que estão em luta pela garantia de direitos sociais, políticos e nas lutas pela terra e contra o racismo institucionalizado, bem como possibilitará uma agenda de eventos, mobilizações e ações políticas para o enfrentamento de lutas que se vislumbram para o ano, especialmente contra a PEC 215/2000 e contra as paralisações das demarcações das terras indígenas e quilombolas.

    O ano de 2013, ainda não acabou! Nossas demandas seguem em aberto, pois o racismo e o genocídio recrudescem. Os ataques contra centenas de lideranças quilombolas, indígenas e populares, resultaram em ameaças de morte, espancamentos, prisões arbitrárias e assassinatos de centenas de pessoas. A omissão, negligência e conivência das três esferas de Estado (Judiciário, Legislativo e Executivo) promoveram: a invasão aos Territórios ancestrais; assassinato de milhares de jovens negros; desalojamento de milhares de famílias de suas casas e terras; desrespeito aos Direitos Constitucionais e Tratados Internacionais, revelando que o Estado Democrático de Direito não existe para a maioria da População Brasileira, situação essa agravada com a proximidade dos megaeventos, como COPA DO MUNDO e Olimpíadas, bem como, MEGAPROJETOS numa lógica de "DESENVOLVIMENTO" predatória para a maioria dos seres humanos e para o meio ambiente.

    Os fatos ocorridos no final do ano de 2013 e início de 2014, como o despejo ilegal da Aldeia Maracanã no RJ, a aceleração da tramitação da PEC/215 de 2000, o Despejo da Comunidade Metro-Mangueira e a heroica resistência expressa pelos(as) mulheres, crianças, idosos(as) dessa Comunidade; Quilombolas e indígenas com seus Direitos Vilipendiados e resistindo (enquanto a Presidenta Dilma se banhava nas águas cálidas da Baía de Todos os Santos) as lideranças Quilombolas do Rio dos Macacos eram presas e agredidas pela Marinha Brasileira; em Humaitá no Amazonas, os Povos Indígenas, resistem ao Genocídio imposto pelos Madeireiros e grileiros, bem como, pelo Racismo Institucional do Governo; no Maranhão, enquanto a Governador a da Dinastia Sarney se refestela com duas toneladas de Lagosta,  a barbárie se instala no sistema Carcerário.

    Os ataques aumentam, mas a resistência também aumenta e ante o vazio e silêncio das organizações tradicionais do Movimento Social e Social Negro integrada e cooptada ao Projeto de "Desenvolvimento" o que acaba por aprofundar o ataque aos povos, aos pobres, ao meio ambiente, procurando eternizar o Projeto Neocolonial e de garantia de uma lógica de proteger os lucros de umas poucas famílias em detrimento de milhões.

    Superar a atomização da resistência e o isolamento imposto pelo neocolonizador é tarefa essencial, não só para derrotar a PEC 215/2000, mas o conjunto de ataques que os Povos vêm sofrendo. A oportunidade proporcionada pelo II Encontro dos de Baixo, foi fundamental, não só pela possibilidade de termos uma agenda mínima de coordenação da resistência, mas para aprofundarmos a reflexão sobre a conjuntura que está colocada diante de nós em 2014.

    Somente com o protagonismo de quilombolas, indígenas e populares será possível enfrentar as adversidades da conjuntura política do País que, nos últimos dez anos, sofre um esvaziamento geral no que se refere a expressão política coletiva da classe trabalhadora, submetida a ideologia liberal da política, da economia e através da falsa representação, expressa através de um exercício de "cidadania" do voto individual de dois em dois anos. Ou seja, exercemos a cidadania em um minuto, na urna eletrônica, passando um cheque em branco nos restantes quatro anos para as falsas representações atacarem nossos Direitos.

    O agronegócio, os projetos do capitalismo para o campo, aliança entre os ruralistas, corporações transnacionais, capital financeiro e o Estado representam hoje o principal inimigo dos/as trabalhadores rurais, pequenos agricultores, assentados/as da Reforma Agrária, dos povos originários, comunidades tradicionais e consumidores de alimentos. E nos 11 anos dos governos petista acompanhamos o desenvolvimento extraordinário deste modelo de padronização da agricultura que deixa um rastro de sangue e miséria por onde vai passando, dominando e explorando, expulsando comunidades, envenenando povos que produzem e os que se alimentam, assim como os bens naturais. Essa forma de desenvolvimento se deve a opção de projeto político para a agricultura que o governo adotou e executa, também seu engenhoso mecanismo de cooptação e burocratização dos históricos movimentos de luta pela terra. Está nítido que há uma decisão de subserviência aos governos, pactuando com os crimes impunes e impostos pelo latifúndio, gerando conflitos entre os pequenos, e uma devastação dos direitos mínimos do conjunto das ações que consolidam uma real Reforma Agrária Popular.

    Recuperar e fortalecer as expressões coletivas da verdadeira cidadania é o desafio que está posto, para nós, POVOS que resistimos aos impactos da NEOCOLONIZAÇÃO.

    Foi deliberado pela construção de uma jornada nacional contra a PEC 215/2000, caracterizada, como o principal ataque Institucional aos Povos, que devemos fortalecer o trabalho de base e protagonismo dos Povos Indígenas e Quilombolas, articular a resistência contra os ataques, e mobilizar a sociedade contra o Racismo Institucional, apontar a Jornada de Lutas e interagir com os setores populares e sindicais, para conseguirmos enfrentar os desafios neste ano de 2014.

    – PELA TITULAÇÃO E DEMARCAÇÃO IMEDIATA DOS TERRITÓRIOS QUILOMBOLAS E INDÍGENAS!

    – PELA REFORMA AGRÁRIA!

    – PELA UNIDADE CAMPO, FLORESTA e CIDADE, só a luta traz conquistas!

    – CONTRA AS REMOÇÕES DA COPA

    – PASSE LIVRE PARA ESTUDANTES, TRABALHADORES, QUILOMBOLAS E INDÍGENAS

    – CONTRA O GENOCÍDIO DA JUVENTUDE NEGRA

    – CONTRA A PEC 215/2000 (PROJETO DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO FEDERAL)

    – CONTRA A AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE/3239 PROPOSTA PELO DEM (PARTIDO DOS DEMOCRATAS)

    – REASSENTAMENTO / INDENIZAÇÃO PARA PEQUENOS PROPRIETÁRIOS EM SOBREPOSIÇÃO COM TERRAS INDÍGENAS E QUILOMBOLAS!

    AGRONEGÓCIO MATA!

    NÃO VAI TER COPA

    ISSO AQUI VAI VIRAR PALMARES!

    Porto Alegre, RS, 27 de janeiro de 2014.

    Frente Nacional em Defesa dos Territórios Quilombolas

    Cimi Sul – Equipe Porto Alegre

    Gapin – Grupo de Apoio aos Povos Indígenas

     

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  • 18/01/2014

    “Por que uma vaca vale mais que um índio”

    Não precisamos de um braço armado do Estado, mas da sua mão protetora

    Criado em 1972, o Conselho Indigenista Missionário (CIMI) é um organismo vinculado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil. No ano passado, a Rel-UITA e o CIMI decidiram articular ações de denúncia e de sensibilização internacional sobre a situação dos povos indígenas no Brasil. Dialogamos recentemente em Brasília com Cleber César Buzatto, secretário executivo do Conselho, para entender quais são os principais motivos da violência exercida contra estes povos.

    Qual é a situação dos povos indígenas no Brasil?

    No Brasil vivemos um momento de extrema apreensão e de preocupação com relação aos direitos e à sobrevivência dos povos indígenas, consciência esta gerada graças à mobilização organizada pelos próprios indígenas.

    A violência que os índios sofrem não é recente, sendo fruto de um processo sistemático de ataque aos direitos dos povos e às suas comunidades, dirigido não só contra o indivíduo, mas também contra os direitos garantidos aos povos indígenas, principalmente aqueles relacionados com a questão territorial consagrados na Constituição da República de 1988.

    Você considera que o principal combustível para esta violência é a impunidade?

    Sem dúvida, a questão da impunidade é central porque alimenta e retroalimenta a violência contra os povos.

    O motivo real do ataque aos direitos constitucionais é o modelo de desenvolvimento adotado pelo governo brasileiro, que prioriza a produção e a exportação de commodities, o que potencializa a disputa pelo território, pela terra, pelo espaço para a sua produção.

    – Você está se referindo à expansão das fronteiras agropecuárias que  invadem os pequenos produtores e os próprios povos indígenas?

    Exato. Esse modelo de produção avança por ter ganhado força e por estar focalizado na produção de commodities, na monocultura, destruindo a pequena agricultura camponesa e a produção de alimentos.

    Neste cenário de grandes interesses econômicos, os povos indígenas também sofrem o abuso de um modelo produtivo que se impõe combinando políticas públicas e ações extremadamente violentas.

    O extermínio da floresta. O extermínio de seus habitantes

    Indígenas expulsos de suas florestas…

    Quando os povos indígenas são atacados, também é atacada a floresta, e vice-versa. A bancada ruralista – que representa os interesses dos grandes proprietários de terras – promoveu mudanças dramáticas no Código Florestal, mesmo indo contra 96% da opinião pública do Brasil.

    A partir desse momento, exacerbou-se o ataque aos povos indígenas e aos povos quilombolas, vistos pelos “ruralistas” como obstáculos para o acesso, posse e exploração de novas terras para o desenvolvimento do agronegócio.

    O atual governo foi o criador deste projeto que tem um perfil de ultradireita. Seus representantes chegaram inclusive a dizer que quem se opusesse às mudanças no Código Florestal estaria defendendo os interesses internacionais. E esta estratégia se repete agora com os povos indígenas, acusando-os de serem manipulados por ONGs internacionais.

    Esta situação de perseguição vivida pelos povos indígenas adquiriu uma maior visibilidade em 2013, por meio de múltiplas ações de denúncia e de sensibilização realizadas fundamentalmente em Brasília.

    Observa-se que os povos indígenas conseguiram aumentar a consciência coletiva da sociedade com relação a esta questão, graças às suas mobilizações permanentes na defesa de seus direitos. Também se pronunciaram politicamente contra as posições desenvolvimentistas da bancada ruralista, já instaladas no próprio seio do Poder Executivo.

    A população originária. O colonialismo histórico

    Quantos indígenas existem atualmente no Brasil?

    Segundo o último censo do IBGE, de 2010, são 896 mil indivíduos em 305 povos distintos, espalhados por todas as regiões do país e possuidores de uns 274 idiomas. O Brasil é o país com o maior número de povos indígenas do mundo. A Bolívia possui o maior número de indivíduos indígenas, mas em apenas dez povos.

    Qual é a postura da presidenta Dilma Rousseff?

    A Dilma só recebeu os indígenas em uma ocasião, no momento das enormes mobilizações urbanas, ocorridas em junho e julho do ano passado, quando ela abriu sua agenda para os movimentos sociais, sindicatos, movimentos sem-terra e líderes dos povos indígenas.

    Entretanto, devemos admitir que a nossa frustração é enorme. Sentimos uma insatisfação profunda, devido a uma clara percepção de que o governo optou por favorecer os setores econômicos historicamente inimigos dos povos indígenas.

    Extermínio pela fome. Extermínio pela bala

    Seria simplista resumir que a máquina repressora é o vínculo mais frequente entre o Estado e os povos indígenas?

    Infelizmente é assim. Como casos emblemáticos, temos o povo Munduruku, que sofreu um ataque no dia 7 de novembro de 2012 por parte da Polícia Federal, com poder de fogo muito forte, na Aldeia Teles Pires, Pará, divisa com o Mato Grosso. Nessa ocasião morreu um integrante desse povo.

    Em 2013, durante a luta pela reintegração das terras do povo Terena, novamente a Policia Federal junto com a Polícia local assassinaram o jovem índio Oziel Terena, em Mato Grosso do Sul.

    No primeiro caso as forças policiais atuaram em defesa de uma política desenvolvimentista, e no segundo caso como repressão na recuperação das terras pelo povo indígena. É importante esclarecer que o povo Terena ocupou suas terras tradicionais, por estarem cansados de esperar pela definição do processo de demarcação das terras, que já dura quase 20 anos.

    O que precisamos não é do braço armado do Estado, mas de sua mão protetora. Entretanto, lamentavelmente, o que vemos do Estado é a sua força bruta.

    Por que o ditado “uma vaca vale mais que um índio”?

    Porque uma vaca ocupa mais espaço por hectare que um índio, e são milhões de vacas só no Mato Grosso do Sul. Para os ruralistas, a vaca “deles” vale mais do que a vida dos indígenas.

    Quais são as expectativas do CIMI?

    Temos forte convicção de que os povos indígenas vão intensificar esta luta. Na ditadura militar foi possível desarticular e vencer o “projeto integracionista” segundo o qual em 2000 já não haveria mais povos indígenas no Brasil.

    Agora os povos indígenas estão organizados e lutam. Naqueles anos da ditadura eram 250 mil índios e eles conseguiram acabar com essa política integracionista abolindo-a da Constituição de 1988, conquistando seus direitos e o reconhecimento do Estado aos usos, costumes, línguas, crenças e tradições, bem como o direito às suas terras.

    Apesar da demora em se aplicar as disposições constitucionais e a intensidade dos enfrentamentos com os ruralistas de todo o país, inclusive com mais intensidade que em épocas passadas, acreditamos que os povos indígenas conseguirão enfrentar os seus inimigos e mais uma vez sairão vitoriosos. 

    Rel-UITA

    13 de janeiro de 2014

     

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  • 16/01/2014

    Os Tenharim, a ditadura e seus interesses na região

    Diante das novas agressões que o povo Tenharim vem sofrendo no seu habitat ao sul do Amazonas, trago a público trechos de documentos que guardo na Casa da Cultura do Urubuí, ou seja, cartas de agentes do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) de 1981, onde estes já denunciavam os interesses que comandam as agressões contra esse povo. Interesses não muito diferentes dos de hoje.

     

    Veja este relato de 1981, de Exequias Heringer, vulgo Xará, e Ana Lange, ambos então agentes do Cimi atuantes naquela região do Rio Madeira: “O grupo Paranapanema tem duas minerações de cassiterita na região: Igarapé Preto e São Francisco. Estivemos na primeira, onde obtivemos informações com a equipe de engenheiros local. Lá, a mineração se estabeleceu em cima da aldeia indígena (Tenharim), que teve de se transferir para uma área anexa. Não recebem qualquer tipo de assistência e se encontravam num triste quadro de catapora. Outros Tenharim estão dentro da reserva a ser demarcada, mas estes declaram que não irão para dentro da reserva apesar dos insistentes convites da Funai. Em represália, os funcionários da Funai transferem a responsabilidade de assistência para a mineração, que declara que os assiste, mas nada faz neste sentido. Hoje são apenas 22 índios. Daqui a dois anos acabará o minério e a Paranapanema implantará um projeto agro-pecuário, aproveitando a infra-estrutura instalada. Enquanto isso os índios são aproveitados para serviços de limpeza, de carregamento, de caça. Nenhum dos engenheiros conhece a aldeia atual dos índios, e um deles chegou mesmo a declarar que trata-se de um grupo Karitiana, mostrando muito bem o que é o estilo Paranapanema em relação aos índios.”

     

    Relato de agosto do mesmo ano de 1981, assinado pelo Coordenador do Cimi Norte I, Ricardo Parente, confirma as informações acima: “…dados que pudemos recolher durante a nossa viagem na rodovia Transamazônica, trecho de Humaitá até a mineração de estanho pertencente à famosa Paranapanema, empresa nacional que conta com forte apoio dos meios militares. Quando chegamos na mineração, localizada no igarapé Preto, área usurpada dos Tenharim, o pessoal da firma nos disse que dias antes o supremo patrão da Paranapanema estivera no local com alguns generais especialmente convidados e amigos do maioral da empresa. O objetivo de tão inesperada visita era o seguinte: o chefão queria mostrar aos generais como funciona a mineração a fim de conseguir a aprovação militar para a exploração das ricas jazidas de estanho que estão em Ipitinga (Pitinga). A maior parte dessa jazida está em território dos Waimiri-Atroari. Informaram-nos que a empresa também está em contato com o Cel. Nobre da Veiga, presidente da Funai, a respeito do assunto. Sabe-se que em Ipitinga há uma das maiores concentrações de estanho que, segundo os cálculos dos engenheiros, durará cerca de 15 anos para ser esgotado. Eles pretendem construir uma pequena hidrelétrica própria para abastecer de energia o projeto e construir casas de alvenaria. Esses dados são muito preocupantes… se prenunciam muito desfavoráveis aos povos indígenas Waimiri-Atroari.”

     

    E o relatório de Xará e Ana Lange nos fornece ainda outros dados preocupantes sobre os interesses da Paranapanema: “Atualmente tem as seguintes minerações: Novo Planeta, no norte de Mato Grosso; Bacajás, no Pará; Maçanã (Massangana?), em Rondônia, além das duas citadas. No ano que vem implantará mais duas, sendo uma a chamada Ipitinga, que estará em sua maior parte dentro do território Waimiri-Atroari. Os engenheiros de minas que trabalharão em Ipitinga estão sendo treinados no Igarapé Preto e eles conhecem as dificuldades que a Paranapanema está encontrando para invadir a área indígena. Recentemente o dono da Paranapanema, Otávio Lacombe, recepcionou um grupo de generais no Igarapé Preto, para convencê-los dos bons serviços que Ipitinga poderá prestar ao Brasil. Os engenheiros estavam exultantes com a impressão que os generais tiveram.”

    E o relatório conclui: “A Paranapanema utiliza tecnologia importada dos EE.UU. e consultores americanos, canadenses e malasianos.”

     

    Como se pode ver, é preciso que se faça uma investigação da ação nefasta da Ditadura Militar sobre mais esse povo indígena do Amazonas, com a construção da Rodovia Transamazônica e a instalação de seus projetos de interesse saqueador. Num momento em que mais um crime de morte foi cometido contra um líder indígena, o cacique Tenharim e com mais ameaças em curso, se investigue e se punam os mandantes e as empresas que participaram e continuam participando desses crimes de ontem e de hoje.

     

    A questão Tenharim é uma questão de lesa humanidade que deve merecer providências do Ministério Público Federal, da Comissão Nacional da Verdade e da Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA. É uma questão de justiça.

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  • 16/01/2014

    MPF pede que União e Funai paguem indenização de R$ 20 milhões aos Tenharim e Jiahui

    O Ministério Público Federal no Amazonas (MPF/AM) ingressou com ação civil pública, com pedido de liminar, na Justiça Federal para declarar a responsabilidade da União e da Fundação Nacional do Índio (Funai) por violações de direitos humanos dos povos indígenas Tenharim e Jiahui, em decorrência de danos permanentes da construção da rodovia Transamazônica (BR-230) em seus territórios. Na ação, o MPF pede a condenação da União e da Funai à reparação dos danos com várias medidas, entre elas, o pagamento de indenização por dano moral coletivo no valor de R$ 20 milhões.

     

    O procurador da República Julio José Araujo Junior, titular do ofício que trata de povos indígenas e comunidades tradicionais no MPF/AM, afirmou que a construção da estrada causou danos ambientais, danos socioculturais e dano moral coletivo, gerando prejuízo permanente aos povos indígenas que habitam a região.

     

    A falta de preocupação quanto à sustentabilidade gerou prejuízos quanto ao uso do solo para atividades agrícolas, poluição atmosférica, acúmulo de lixo, redução da fauna – implicando novas readaptações nas atividades de caça –, desmatamento e alteração dos cursos d’água.

    No âmbito sociocultural, o período da construção da rodovia gerou um impacto de grandes dimensões, quando houve forte contato interétnico, causando mortes em decorrência de doenças levadas pelos operários. Além disso, o MPF aponta que a ‘pacificação’ promovida pela Funai e o recrutamento para o trabalho nas obras causou forte desestruturação no grupo indígena, que, acuado por conta das atividades de tratores e aviões no local, deixou de promover maiores deslocamentos para não abandonar os seus territórios sagrados.

     

    Os Tenharim não abandonaram a região, tendo se deslocado do rio Marmelos para as margens da rodovia justamente para estarem próximos de seus territórios sagrados. Ainda assim, a promoção do desmatamento e elaboração do traçado da rodovia sobre locais sagrados para os indígenas representou nova violação de seus direitos. Já o povo Jiahui sofreu grande diminuição, chegando a contar, às vésperas da demarcação da terra indígena, com apenas 17 pessoas.

     

    A terra indígena Tenharim Marmelos teve o seu processo de demarcação concluído em 1996 e a Terra Indígena Jiahui teve a demarcação homologada em 2004. Em termos populacionais, os Tenharim abrangem, atualmente, 962 indígenas (737 na TI Tenharim Marmelos, 137 na TI Tenharim do Igarapé Preto e 88 na TI Sepoti). Os Jiahui totalizam 98 indígenas.

     

    Dano moral coletivo – O procurador da República Julio José Araujo Junior destacou que os fatos ocorridos por ocasião da construção da estrada representaram ofensa aos direitos fundamentais dos povos Tenharim e Jiahui, ensejando a reparação por dano moral coletivo. “O MPF sustenta que houve violação grave aos direitos fundamentais destes povos indígenas por conta da construção e dos danos permanentes que ocorrem até hoje, sobretudo em razão da omissão da União e da Funai”, declarou o procurador.

     

    Em razão disso, o MPF pede, na ação, a condenação da União e da Funai ao pagamento de indenização no valor de R$ 10 milhões cada, totalizando R$ 20 milhões, em conta específica em favor dos povos Tenharim e Jiahui, a serem aplicados em políticas públicas em favor deles, sob a coordenação da Funai, a partir de definição pelas próprias comunidades.

     

    O MPF pede também que União e Funai sejam obrigadas a adotar medidas permanentes de proteção a locais sagrados e espaços imprescindíveis ao sentimento de pertencimento dos povos Tenharim e Jiahui, conforme indicação dos indígenas; reformar escolas nas aldeias Coiari, Taboca e Mafuí, além de construir novas escolas com professores contratados e desenvolvimento de processos próprios de aprendizagem; instalar polo-base da saúde indígena específico para as terras indígenas dos Tenharim e dos Jiahui; e criar um centro de memória e publicar material didático sobre os impactos da construção da rodovia sobre os povos Tenharim e Jiahui, ressaltando as características desses povos e os direitos sobre suas terras, com ampla distribuição, principalmente nos municípios de Humaitá, Manicoré e Apuí.

     

    Como pedidos liminares, o MPF requer que a Justiça determine a adoção das medidas de preservação dos locais sagrados em até 60 dias; a garantia de segurança para os índios frequentarem escolas e faculdades, evitando assim prejuízos ao ano letivo; a instalação do polo-base de saúde indígena no prazo máximo de seis meses; e a realização de campanha de conscientização quanto aos direitos indígenas em Humaitá, Manicoré e Apuí, com início em até 30 dias.

     

    A ação tramita sob o nº 0000243-88.2014.4.01.3200, na 3ª Vara Federal no Amazonas, onde será analisada.

     

    Apuração iniciada no ano passado – Em abril de 2013, após reunião com lideranças das etnias Tenharim e Jiahui, o MPF instaurou inquérito civil público para apurar a responsabilidade do Estado Brasileiro por possíveis violações de direitos humanos cometidas contra os povos indígenas durante a construção da Transamazônica, no período da ditadura militar.

     

    Durante a segunda edição do projeto MPF na Comunidade, em junho do ano passado, representantes do MPF estiveram na terra indígena Tenharim Marmelos, quando constataram “in loco” os prejuízos e danos sofridos pelos povos Tenharim e Jiahui em decorrência da existência da rodovia em seus territórios e colheram relatos dos índios sobre o caso. Na ocasião, foi elaborado um laudo antropológico com o fim de subsidiar as ações a serem tomadas pela instituição.

     

    Conflitos na região – Desde o último dia 25 de dezembro do ano passado, a cidade de Humaitá vive dias de instabilidade por conta de protestos violentos que já resultaram na depredação de prédios e bens públicos de órgãos e autarquias federais relacionados a políticas públicas voltadas aos povos indígenas, além de ameaças a um grupo de indígenas que estava na cidade para tratamento de saúde. Os manifestos estariam relacionados ao suposto desaparecimento de três pessoas na área da terra indígena Tenharim Marmelos, cortada pela rodovia Transamazônica (BR-230).

     

    Ainda em dezembro, o MPF/AM expediu recomendação para cessar incitação à violência e discurso de preconceito contra indígenas, indicando a retirada de conteúdos de portais, blogs e redes sociais na internet que continham informações com caráter discriminatório, preconceituoso ou que incitassem a violência, o ódio e o racismo contra os povos indígenas da região.

     

    O MPF/AM também entrou com uma ação judicial para garantir a segurança dos indígenas da região diante da ameaça de invasões à terra indígena Tenharim Marmelos por não indígenas. O pedido foi atendido pela Justiça Federal, por meio de decisão liminar.

     

    Em janeiro deste ano, diante da situação de calamidade que os índios enfrentavam em razão dos conflitos, o MPF/AM recomendou aos órgãos públicos e autoridades locais e nacionais que adotassem medidas para garantir assistência material, com envio de alimentos e medicamentos e a garantia de assistência médica.

     

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  • 14/01/2014

    TI Alto Turiaçu, do povo Ka’apor, é invadida por madeireiros, no Maranhão

    As cenas de violência continuam fazendo parte da vida do povo Ka’apor e sendo um pesadelo constante, fato agravado a partir do ano de 2013. Mesmo a despeito de dificuldades, este ano foi marcado pela união das várias aldeias do território em defesa da floresta, da identidade e da vida. Em decorrência dessa tomada de consciência e atitude por parte dos Ka’apor, houve uma série de ameaças, agressões e mortes impetradas por forças contrárias à autogestão dos indígenas.

    Ainda no primeiro semestre aconteceram duas operações com participação do Exército, Ibama e Funai que expuseram ainda mais os indígenas à insegurança e à violência, pois, após a saída da área do efetivo dessas instituições, em julho de 2013, o povo indígena assistiu, no final de agosto, à invasão violenta da antiga aldeia Gurupiúna, com a entrada de 50 pessoas armadas e incitadas por grandes madeireiros e donos de serrarias dos municípios de Centro Novo do Maranhão, Centro do Guilherme e Maranhãozinho.

    A ação violenta foi marcada por agressão, espancamento de idosos e crianças, roubo de criações, roupas e documentos dos indígenas, o que ocasionou um clima de insegurança e medo nas aldeias vizinhas, com perseguições e ameaças de morte às lideranças. Em setembro, os indígenas da aldeia Ximborenda detiveram seis invasores durante três dias, flagrados derrubando árvores seculares no interior do território, nas proximidades da aldeia, posteriormente liberados por servidores da Funai.

    No início de outubro de 2013, depois de iniciadas as atividades de vigilância e monitoramento territorial com a identificação e reavivamento dos limites, lideranças indígenas foram surpreendidas por um grupo de madeireiros armados dentro do território, à margem direita do Rio Gurupiúna. Os indígenas tiveram que se refugiar na mata após ameaças de tiros e agressões. Com a chegada de indígenas de outras regiões, os madeireiros foram desarmados e expulsos da área. Com isso, intensificaram a fiscalização em seu território no mês de novembro, o que culminou na apreensão de armas e motocicletas, na apreensão de tratores e caminhões utilizados na destruição da floresta e na expulsão de madeireiros que realizavam corte de árvores, transporte e comercialização de madeira em serrarias da região noroeste do Maranhão.

    Antes do Natal, um grupo de indígenas que realizava a identificação e reavivamento dos limites, prendeu por três dias um madeireiro influente da região que realizava corte ilegal de madeira que, posteriormente, foi solto pelo delegado e pelos servidores da Funai no município de Santa Luzia do Paruá. Também apreenderam armas, tratores e caminhões no limite noroeste de seu território próximo ao Rio Gurupi, perto da divisa com o Pará. Essas sucessivas agressões têm interferido diretamente na dinâmica cultural do povo.

    Em 2014, o ano se inicia com a desintrusão da TI Awá do povo indígena Awá-Guajá, em região limítrofe à TI Alto Turiaçu. A boa notícia para o povo indígena parente não teve a mesma correspondência para os Ka’apor. No dia 7 de janeiro, um grupo de 10 Ka’apor, que realizava abertura de trilhas nos limites de seu território, para a autovigilância, foi surpreendido com tiros que atingiram as costas e pernas de dois jovens Ka’apor e a cabeça do cacique da aldeia. Os jovens foram hospitalizados às pressas no município de Zé Doca (MA) e o cacique permaneceu na aldeia. Por sorte, não correram risco de morte, pois receberam a devida atenção de profissionais de saúde que atuam junto aos indígenas.

    O madeireiro “Maradona”, que comandou a ação violenta, encontra-se foragido. Diante das ameaças de fazendeiros e madeireiros, e o envolvimento de policiais militares com a “segurança privada” ligada aos agressores, os indígenas ficam receosos de registrar boletins de ocorrência em delegacias da região, além de ficarem temerosos de circular em vilas, povoados e cidades da região em razão das contínuas agressões à sua integridade física e à sua identidade, pois são povos da floresta. Lideranças são permanentemente seguidas e monitoradas por madeireiros na região. A conivência e envolvimento de prefeitos, vereadores, servidores e demais agentes públicos com a exploração madeireira tornam esses agressores reincidentes, imperando o descaso e a impunidade, o que somente confirma a falta de lei e rei no território maranhense, fato lamentável em razão da sofrida luta dos povos indígenas e das populações empobrecidas desse Estado.

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