• 15/04/2014

    Bang, Bang, Pow, Pow – Faroeste e futebol em terra Guarani Kaiowá

    Bruno Morais

    Assessor Jurídico do Cimi

    Era a tarde do domingo de carnaval e do outro lado da linha estava Lide Solano Lopes, cacique do acampamento Pyelito Kue. No dia 12 de fevereiro, cerca de 250 indígenas Kaiowá e Guarani haviam retomado a Fazenda Cambará, propriedade de Osmar Bonamigo, e levantaram barracos ao redor da casa que servia sede. Ao fundo da ligação, se escutava o tiroteio.

    Entre a cerca e a estrada

    Para se chegar ao Pyelito Kue vindo do município de Amambai é preciso entrar a esquerda em um acesso de terra na rodovia MS-386, logo antes da cidade de Iguatemi. Vinte quilômetros adiante se avista um amontoado de barracos de lona e estacas de madeira, espremidos entre uma cerca e uma estrada vicinal – ao final do ano de 2012, Polícia Federal e Funai acompanharam os funcionários da fazenda que assentaram os postes e passaram os arames, cumprindo a ordem judicial que reservava um hectare de terra para permanência dos indígenas enquanto se concluía o processo de demarcação. Até a retomada da Fazenda Cambará, era esta a sina das famílias do Pyelito: sempre entre a cerca e a estrada.

    No criolo entre português, castelhano e guarani falada na região, Pyelito Kue significa algo como “lugar onde ficava o pequeno povoado” e faz referência a uma área reivindicada como de ocupação tradicional Guarani-Kaiowá às margens do rio Hovy, no município de Iguatemi (MS), quase fronteira com o Paraguai. Expulsos pelos colonos entre as décadas de 1940 e 60, os indígenas desse “pequeno povoado” foram levadas forçosamente para as reservas indígenas de Sassoró, Limão Verde, Amambai e Taquapiry, criadas pelo Serviço de Proteção ao Índio para receber os que iam sendo despejados no processo de “liberação de terras” para a ocupação da região.

    Sem área para plantar, espremidos entre 3 mil pessoas em menos de 2 mil hectares em Sassoró, e compondo as maiores estatísticas de homicídio e suicídio por habitante do país, as famílias do Pyelito decidiram encarar o êxodo em busca da demarcação de suas terras. De 2003 a 2009, as retomadas da área – hoje sobreposta por 46 fazendas, quase todas dedicadas à criação de gado – tiveram um desfecho trágico. Uma e outra vez os guarani foram expulsos por ataques de pistoleiros, a mando dos fazendeiros da região.

    Escutar o testemunho desses ataques é um pouco reviver as investidas das tropas brasileiras sobre os povoados paraguaios daquela mesma fronteira, na guerra do século XIX. Homens bêbados invadindo o acampamento de madrugada sob uma saraivada de tiros, derrubando os barracos, violentando as mulheres, sequestrando crianças, incendiando roupas, cobertas, tudo. Sobrevive quem foge para o mato. Só dali uma semana é possível voltar à área e contabilizar os prejuízos – entre mortos e desaparecidos, nunca se tem certeza de quanta gente foi assassinada assim.

    Adelio Rodrigues, um senhor de 48 anos que liderava um grupo de famílias que reivindicam uma área contígua ao Pyelito Kue chamada Mbarakay, foi espancado em um desses ataques em julho de 2011. Àquele tempo, a comunidade havia deixado as fazendas para acampar às margens da rodovia estadual justamente na esperança de que a facilidade de acesso da Funai e da Polícia Federal os poupasse de novos episódios de violência. Após esse atentado é que Adelio Rodrigues e Lide Solano Lopes resolveram reocupar novamente o território do Pyelito Kue e Mbarakay, por uma última e definitiva vez.

    Logo depois da nova ocupação, Adelio faleceu em decorrência das sequelas do ataque.

    Eu também sou Guarani-Kaiowá

    Em nove de agosto de 2011, os indígenas do Pyelito Kue e Mbarakay levantam acampamento em uma área de reserva legal entre as Fazendas Cambará e Santa Rita. Mesmo a atenção do Ministério Público Federal (MPF) e da Funai não poupou três investidas de pistoleiros por sobre o acampamento. Os indígenas se mudaram de local, a comunidade ficou escondida e isolada no meio do mato. Com o cerco na estrada vicinal, o único acesso ao acampamento era cruzando o rio a nado a partir da Aldeia de Sassoró, e dali cortar a pé e no escuro as fazendas até o local dos barracos.

    Em novembro, os fazendeiros chegaram a bloquear o acesso de uma comitiva com representantes da Secretaria Geral da Presidência da República e Secretaria Especial de Direitos Humanos. Sem nenhuma timidez frente aos soldados da Força Nacional, e munidos eles mesmos de câmeras, diziam em alto e bom som: “Vamos queimar esses ônibus com índios! Índios vagabundos! Ficam invadindo fazendas!” – um dos homens era o Presidente do Sindicato Rural de Iguatemi, Marcio Morgatto. A pedido dele, o então prefeito da cidade, José Roberto Arcoverde (PSDB), apareceu no local. Sua família é proprietária da Fazenda Santa Rita.

    Os desdobramentos jurídicos do episódio? Para além da denúncia feita pelo Conselho Indigenista Missionário, nada. Nenhuma investigação policial apurou o crime de ameaça. Nenhuma medida foi tomada por parte do Governo Federal para a segurança dos indígenas na região. Nenhuma medida para garantir a permanência da comunidade no território reivindicado. Dali a um ano, em novembro de 2012, a Justiça Federal de Naviraí expediria liminar ordenando a saída imediata dos indígenas das terras da fazenda Cambará.

    A ordem foi respondida com uma carta da comunidade em que se anunciava, em desespero, a decisão de resistir. Pinçando inteligentemente uma frase que captava o drama da situação, a jornalista Eliane Brum publicou na Revista Época uma coluna intitulada “’Decretem nossa extinção e nos enterrem aqui”1, em que se conjugavam estatísticas de suicídio com a expressão ‘morte coletiva’.

    ‘Morte coletiva’ foi repetida cinco vezes no artigo, e infinitamente nas redes sociais. O resultado foi uma certa histeria.

    Rapidamente ‘morte coletiva’ virou ‘suicídio coletivo’. Em homenagem aos Guarani-Kaiowá, pessoas trocaram seu sobrenome no facebook e compartilharam fotos de indígenas enforcados – estranha maneira de demonstrar solidariedade. Mais de 50 manifestações foram organizadas em diversas cidades do Brasil e do mundo, e surgiram “comitês” e “brigadas” de apoio à resistência indígena. “Eu também sou Guarani-Kaiowá”, dizia a consígnia de inspiração neo-zapatista, que chegou ao gosto de militantes socioambientalistas e de partidos de esquerda das capitais. Em São Paulo, uma marcha na av. Paulista reuniu cerca de mil pessoas.

    “Suicídio coletivo? Não!”, Lide Solano Lopes aparece em um vídeo desmentindo os boatos em torno de sua comunidade, “Não nos entregaremos assim tão fácil!”. Os Guarani e Kaiowá de Pyelito vieram a público explicar o mal entendido em cima das suas declarações, mas a esse ponto a própria Ministra Maria do Rosário já havia se manifestado pela necessidade de intervenção na reintegração do Pyelito Kue. A reintegração foi suspensa pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região, que autorizou aos indígenas a permanência em um hectare da Fazenda Cambará até a conclusão dos processos demarcatórios. O “devir Guarani-Kaiowá” parece ter tido um efeito positivo: parafraseando o antropólogo Eduardo Viveiros de Castro, éramos todos índios, exceto quem não era.

    Mas em um país onde todo mundo é índio de direito, ninguém pode ser índio de fato.

    Um hectare para o Pyelito

    Lide me mostrou o estado dos barracos, as lonas estavam furadas e rasgadas. Janeiro é período de chuva no Mato Grosso do Sul, e eu só pude imaginar como seria dormir debaixo daquele teto em uma noite de tempestade de verão. Quase um ano e meio depois da histeria em torno da carta da comunidade, a vida não havia mudado muito para as 20 famílias indígenas do Pyelito Kue. Sob as árvores de uma capoeira baixa, o Pyelito seguia a sina entre a estrada vicinal e a cerca assentada pelo proprietário da Fazenda Cambará, sob os auspícios da justiça. A maior reclamação era a falta de escola para as crianças, o que é só uma derivada da reclamação por falta de terra: como ter uma escola onde não há espaço pra se levantar nem mais um barraco?

    Pelo atraso nas demarcações, que deveriam ter sido concluídas até 1993, o Ministério Público Federal firmou em 2007 um Compromisso de Ajustamento de Conduta com a Funai concedendo prazo até janeiro de 2011 para a conclusão dos estudos de identificação e delimitação das terras indígenas guarani no Estado.

    Ambos, Pyelito Kue e Mbarakay, fariam parte do Grupo de Trabalho (GT) do Iguatemipegua I, sob responsabilidade da antropóloga Alexandra Barbosa da Silva. O GT foi instaurado em 2008, mas os trabalhos só foram encaminhados em 2010. Dentre todos os relatórios técnicos de identificação de terras indígenas no Mato Grosso do Sul, apenas o de Pyelito Kue e Mbarakay foram publicados até agora. O prazo para contestação já se esgotou, e o encaminhamento da demarcação depende unicamente da assinatura do Ministro da Justiça e da homologação pela Presidência da República.

    Na portaria publicada em janeiro de 2013, a área identificada como Pyelito Kue e Mbarakay soma 41.571 hectares – desses, um único hectare estava efetivamente ocupado pelos índios à época da publicação, conforme autorizava a Justiça e garantia a cerca fincada pelo fazendeiro. Um hectare corresponde a 10 mil metros quadrados, o que é mais ou menos a área de um campo de futebol.

    Em novembro do ano passado, uma nova carta já predizia um novo conflito: “Nós queremos que eles [governo brasileiro] cumpram a sua palavra. Eles falam que vão fazer. Nós já ficamos esperando”, dizia a carta, “E eles não estão cumprindo, não estão chegando e não vem para demarcar a nossa terra". Quando visitei o Pyelito em janeiro de 2014, as crianças brincavam sob os galhos dos arbustos em que estava metida a comunidade. Uma pequena estrutura de ogapysy – a casa de reza tradicional em que os guarani realizam seus ritos – estava sendo construída em uma área aberta, mas faltavam o sapé e a madeira necessária para finalizá-la. As mulheres reclamavam que não era possível plantar naquela terra, que não havia água suficiente. O funcionário da Coordenação Técnica Local da Funai confessou que lhe faltavam recursos para garantir a segurança dos índios, e os jornais locais circulavam a informação de que empresas de segurança privada haviam sido contratadas pelas fazendas da região.

    Lide me chamou de lado, pediu que eu visitasse uma família cuja criança estava doente. O menino tinha cerca de dois anos e estava prostrado, com a barriga inchada. A cena me impressionou bastante. Dali a dois dias, recebi a notícia de que a criança havia morrido.

    Um hectare é mais ou menos um campo de futebol

    Na segunda semana de fevereiro de 2014, a comunidade retomou a totalidade da fazenda Cambará. Os cerca de mil hectares da propriedade estão todos sobrepostos à área identificada pela Funai como de ocupação tradicional indígena. O funcionário que residia na sede não foi agredido, nos dias que se seguiram os próprios índios auxiliaram a retirada de todo o gado criado na fazenda. Apesar do clima de tensão e de episódios de ameaça, a situação estava relativamente sob controle: Osmar Bonamigo, o proprietário, chegou a declarar aos índios e à Funai que abandonaria a área.

    As fazendas vizinhas, no entanto, reforçaram a segurança. A imprensa local noticiou que o Sindicato Rural de Iguatemi estava investindo 15 mil reais ao mês em segurança privada na região a fim de evitar “novas invasões”. Os indígenas, de sua parte, declararam que aguardariam nos um mil hectares da fazenda Cambará novo posicionamento do Governo e da Justiça, mas dão notícia que homens armados e de moto circundam a área da retomada duas vezes ao dia.

    Por volta das 15h do dia dois de março, três desses homens e uma mulher posicionados na estrada em frente à porteira da fazenda abriram fogo contra os indígenas. As crianças, que brincavam no pátio da casa que servia de sede à fazenda, se esconderam atrás das árvores e de uma mureta de concreto. Um tiro acertou a porta, poucos centímetros de onde estava sentada uma senhora de idade. Uma bala ricocheteou no assoalho de madeira da casa e feriu uma árvore. Quem estava dentro dos barracos protegeu-se no chão. Alguns homens, armados com arco-e-flecha e facões, se aproximaram agachados da cerca, e as pessoas que estavam fazendo os disparos fugiram.

    “Nossa comunidade é pouca gente, mas é corajosa!”, me disse Marcio Solano Lopes, filho do cacique Lide, “Se acertarem nossa família, a gente vai ter com eles na fazenda”. Ao todo, o tiroteio deixou nove marcas de bala nas paredes, árvores e barracos da comunidade. Lide fez questão que eu fotografasse uma a uma – “Como a gente vai reagir, sem arma?”, perguntou.

    Essa é uma pergunta sem resposta. Como o Pyelito reagiu até hoje, sem arma?

    No domingo de carnaval, quando escutei o tiroteio pelo telefone, notifiquei pessoalmente a Polícia Federal. Sem resposta. Tentei notificar o Ministério Público Federal, mas os Procuradores não estavam na cidade. Tentei notificar a Funai, mas o que eles poderiam fazer? Notificar, novamente, a Polícia Federal?

    A Funai na região não está em uma situação melhor do que as dos índios. A sede da Coordenação Técnica Local de Iguatemi foi invadida poucos dias antes do tiroteio. Destruíram computadores, roubaram documentos, e tentaram levar a caminhonete da entidade – o que só não foi possível porque um caminhão parado na porta impediu a passagem do veículo. O coordenador local solicitou ao MPF sua inserção no Programa de Proteção da Secretaria de Direitos Humanos Presidência da República (SDH), em que já estão inscritas mais de 20 lideranças indígenas no Mato Grosso do Sul.

    Apesar disso, não creio que tenha sido designada alguma escolta. No domingo de carnaval, quando escutei o tiroteio pelo telefone, chamei o plantão da SDH e pedi que eles acionassem o efetivo da Força Nacional. Fui informado, prestativamente, de que “infelizmente a SDH não tem comando da Força, que obedece diretamente o Ministério da Justiça”. No mais, a portaria que autoriza o efetivo a atuar nos conflitos fundiários envolvendo indígenas no

    Estado está vencida desde o ano passado, e o Ministro José Eduardo Cardozo ainda não promoveu sua renovação.

    Caminhando pelos limites da retomada, a pergunta de Lide me ecoava: como o Pyelito reagiu até hoje, sem arma?

    A poucos centímetros do chão, em meio ao capim do pasto, notei que brotavam ramas de mandioca recém-plantadas. Imaginei o quão difícil deve ser roçar uma terra assim, coberta há tantos anos com pasto. Mais adiante, dez garotos jogavam bola em um campo improvisado.

    Não havia espaço pra futebol, quando eles ocupavam um só hectare.

    1. “Decretem nossa extinção e nos enterrem aqui”, coluna de Eliane Brum. Revista Época, 22 de outubro de 2012, disponível em: http://revistaepoca.globo.com/Sociedade/eliane-brum/noticia/2012/10/decretem-nossa-extincao-e-nos-enterrem-aqui.html, último acesso em 11 de abril de 2013.

     

    Read More
  • 14/04/2014

    Índios guarani pedem demarcação de suas terras na cidade de São Paulo

    No próximo dia 17, os mais dois mil índios guarani que vivem na cidade de São Paulo darão mais um passo na luta pelo reconhecimento de suas terras tradicionais. Os Guarani lançam nessa quinta-feira, às 16h, em frente ao Pátio do Colégio, a Campanha Resistência Guarani São Paulo.

     

    Com o apoio de movimentos sociais, coletivos, ONGs e apoiadores da causa indígena, essa mobilização é capitaneada pela Comissão Guarani Yvyrupa (CGY) – organização política autônoma que congrega as aldeias do povo guarani localizadas no Sul e Sudeste do Brasil – e visa pressionar o Ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, a declarar as terras indígenas Jaraguá, na Zona Norte, e Tenondé Porã, no extremo sul da cidade. Já reconhecidas pela Funai, essas terras somam juntas cerca de 16.500 ha

     

    Sem o término do processo de demarcação, os índios vivem confinados em áreas minúsculas e ainda sofrem ameaças de despejo – como é o caso da aldeia Tekoa Pyau, no Pico do Jaraguá, onde foi decidida em primeira instância uma reintegração de posse contra os índios, 

     

    Além da mobilização nas ruas, a CGY lançou também uma plataforma multimídia com vídeos, mapas, textos e fotos onde é possível conhecer detalhes das reivindicações feitas pelas comunidades: http://campanhaguaranisp.yvyrupa.org.br

     

    Na internet, também é possível manifestar seu apoio à causa assinando a petição que exige do Ministério da Justiça a demarcação das Terras Indígenas Guarani na Grande São Paulo: http://goo.gl/3NQwPh

     

    Assista também o vídeo da campanha: http://www.youtube.com/watch?v=btfb2eY7tSo

     

    Outro ato foi chamado para o dia 24/4, com a concentração no Vão Livre do MASP, às 17h, e contará com a a presença de várias comitivas de guaranis das diferentes aldeias deste povo na região. Acompanhe: https://www.facebook.com/events/294085780746244/

     

    Serviço:

     

    CAMPANHA PELA DEMARCAÇÃO DAS TERRAS GUARANI EM SÃO PAULO

     

    LANÇAMENTO

    Dia 17 de abril, quinta feira, às 16h em frente ao Pátio do Colégio.

    https://www.facebook.com/events/1422297861354711/

    Mais informações

    resistenciaguaranisp@yvyrupa.org.br

     

    11 951691747/ 972040234/ 976005699/ 948572816

     

    Read More
  • 11/04/2014

    TV Câmara vai exibir documentário “Índio Cidadão?” no Abril Indígena 2014

    O documentário "Índio Cidadão?", sobre a  luta das Nações Indígenas brasileiras pela conquista e manutenção dos Direitos Constitucionais, estreia na TV Câmara no dia 19 de abril às 14h. O filme resgata dois momentos-chave nesse processo: a campanha popular realizada pelos povos indígenas na Constituinte e o período de manifestações em Brasília contra os ataques legislativos do Congresso Nacional, com a ocupação da Câmara dos Deputados no “Abril Índigena” de 2013 e a mobilização nacional em outubro do mesmo ano.

    Ancorado em depoimentos e falas públicas de importantes lideranças indígenas, como o cacique Raoni Metuktire, Ailton Krenak, Sonia Guajajara, Davi Yanomami, Álvaro Tukano, entre outros, o filme traz episódios históricos e contemporâneos da luta indígena no debate político do Congresso Nacional, contando com elementos inéditos, fruto de intensa pesquisa de acervos públicos e privados.

    O título “Índio Cidadão?”, em tom de pergunta, é uma provocação que convida o espectador a refletir e compreender a perspectiva dos povos originários acerca dos enfrentamentos políticos pela garantia dos direitos originários à terra e pelo respeito ao modo de vida tradicional. Por isso o filme, ao longo dos seus 52 minutos, é todo apresentado e narrado pelos índios, em especial pelo depoimento da liderança Valdelice Veron, que conduz o documentário. Sob constantes ameaças de morte e despojo da terra tradicional, ela expõe o drama pelo genocídio que a sua Nação, os Kaiowá Guarani, vivencia há décadas no estado do Mato Grosso do Sul. Valdelice testemunhou o assassinato do pai, cacique Marcos Veron, durante o processo de retomada de sua terra Tekoha Takuara em 2003.

    "Índio Cidadão?" é uma realização de 7G Documenta, Machado Filmes, Argonautas, 400 Filmes, BASE Coletivo Audiovisual, e conta com patrocínio                                   do FAC – Fundo de Apoio À Cultura da Secretaria de Cultura do Distrito Federal. Foto: Rodrigo Siqueira

    Serviço

     

    Indío Cidadão? – O Filme

    – Pré-estreia no dia 14 de abril, às 16h30, 

    com exibição do filme seguida de debate com o diretor Rodrigo Siqueira e as lideranças indígenas Álvaro Tukano e Ailton Krenak Krenak. 

    Local: Memorial do Ministério Público – Procuradoria Geral da República
    Endereço: SAF Sul Quadra 4, Conjunto C, Bloco B, Cobertura.


     Estreia Nacional no Abril Indígena 2014

    Dia 19/04, às 14h, na TV Câmara 

    Informações: BASE Coletivo Audiovisual 61 3034-6218 8424-0824

    Assessoria de Imprensa: Padê Produções

    Julia Tolentino: 61 3034.1900 8254.5405

    Read More
  • 10/04/2014

    Apib recolhe adesões a parecer contra minuta do MJ que altera procedimento demarcatório

    Um parecer analisando a Minuta de Proposta do Ministério da Justiça para promover alterações no procedimento de demarcação de terras indígenas foi tornado público, nesta última terça-feira, 8, pelas bancadas indígena e indigenista da Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI).

     

    Leia aqui a íntegra do parecer

     

    A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) convoca toda a sociedade envolvente aos povos indígenas para assinar e divulgar o parecer, contraposição à minuta e formulado durante quatro meses de diálogo entre as organizações indígenas e indigenistas.

     

    Para assiná-lo é necessário enviar uma mensagem de adesão ao endereço eletrônico apib.nacional@gmail.com. As assinaturas serão anexadas ao parecer e enviadas às autoridades.    

     

    O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, com a minuta, tenta reavivar, 50 anos depois, mecanismos da ditadura militar para a demarcação de terras indígenas. Isso significa legalizar o que o governo federal não vem cumprindo: a regularização dos territórios tradicionais.    

     

    O documento, com 16 páginas, tem início com a contextualização histórica da consolidação da legislação indigenista seguindo até a principal jurisprudência a respeito dos procedimentos de demarcação de terras indígenas. Traz à tona a como a proposta do Ministério da Justiça contraria decisões recentes, inclusive tomadas pela Corte Suprema do país, o STF, caso do julgamento da Petição 3388 sobre a Terra Indígena Raposa Serra do Sol, entre outros.

     

    Em seguida, são comentados os equívocos dos principais artigos apresentados na minuta, que passaria a permitir a interferência de grupos contrários à demarcação desde os primeiros momentos do procedimento de identificação e delimitação das terras indígenas, inviabilizando até mesmo o trabalho de campo dos profissionais e estudiosos. 

      

    Ao final do documento, as organizações indígenas e indigenistas que subscrevem o parecer sintetizam nove principais conclusões, sendo a última delas um recado claro para o governo federal:

     

    “Uma eventual publicação da Portaria em questão reforçará compreensão, por parte dos povos indígenas, organizações de apoio aos povos e da sociedade em geral de que o Governo Dilma é claramente anti-indígena, aliado de primeira hora dos ruralistas, alinhado aos interesses do poder econômico nacional e transnacional, notoriamente do agronegócio, e obstinado por um modelo de desenvolvimento neocolonizador, usurpador de territórios, etnocida e ecocida”.

     

     

    Read More
  • 10/04/2014

    Boletim Mundo: Grupo Bandeirantes é processado por incitar ódio contra povo Tupinambá


    Por Carolina Fasolo,

    de Brasília


    O Grupo Bandeirantes de Comunicação vai responder a uma ação judicial por ter veiculado, em rede nacional, duas reportagens com conteúdo discriminatório e informações distorcidas sobre os conflitos fundiários no sul da Bahia, responsabilizando caciques do povo Tupinambá de Olivença por toda a sorte de crimes, inclusive a morte de um agricultor, e acusando os indígenas de invadir fazendas, ameaçar e expulsar moradores.

    O processo, de autoria da comunidade indígena Serra do Padeiro e do cacique Rosivaldo Ferreira da Silva, pede liminarmente o direito de resposta da comunidade Tupinambá às reportagens caluniosas, transmitidas pelo Jornal da Band e pelo sistema de radiodifusão do Grupo Bandeirantes com o intuito de incitar o ódio e a violência da sociedade contra o povo Tupinambá de Olivença, e para deslegitimar a luta dos indígenas pela demarcação de seu território, já reconhecido pela Fundação Nacional do Índio (Funai) como de ocupação tradicional.

    A Funai publicou em 2009 o relatório circunstanciado, que delimitou a Terra Indígena (TI) Tupinambá de Olivença em cerca de 47 mil hectares, abrangendo partes dos municípios de Buerarema, Una e Ilhéus, sul da Bahia. Porém, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, desobedecendo aos prazos estabelecidos na legislação, ainda não assinou a portaria declaratória, que encaminha o processo demarcatório da TI para as etapas finais.   

    As reportagens difamatórias foram ao ar nos dias 25 e 26 de fevereiro, logo após a decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa, de suspender as reintegrações de posse em sete áreas localizadas na terra Tupinambá. Sem tratar do contexto da demarcação da terra, o repórter Valteno de Oliveira declara: “Desde que a Funai resolveu criar a área para os índios a violência impera aqui na região. Um bando de caciques armados, liderados por Babau, o mais temido deles, faz o diabo”. A reportagem, levianamente e com informações inventadas, pinta o cacique Babau, da aldeia Serra do Padeiro, como um criminoso foragido da Justiça.  “O paradeiro de Rosivaldo Ferreira da Silva, o Babau, é desconhecido. Ele responde a oito processos, por estupro, ameaça e destruição do patrimônio público e agora é suspeito, junto com o cacique Cleildo, de ordenar a execução de Juraci (agricultor assassinado)”.

    “O Grupo Bandeirantes parece desconhecer ou evitar conhecer o massacre dos Tupinambá ao longo da história, para difundir histórias inventadas: escondendo o verdadeiro conflito e massacre na região, inclusive os mais recentes. Ademais, sem nenhuma prova associa indígenas e, em especial, os caciques, aos crimes mais esdrúxulos, e até mesmo ao crime de estupro, com vistas a incentivar o ódio social por este povo”, consta na ação contra a emissora.

    O povo Tupinambá de Olivença tem sofrido com um processo de violência e opressão desde os tempos de colonização. Histórico que as reportagens ignoraram sumariamente. Apenas nos últimos meses, além do agricultor, cinco indígenas foram assassinados dentro de sua terra. Três deles mortos em uma emboscada armada por pistoleiros. Em agosto de 2013, um ônibus que carregava estudantes indígenas foi atacado a tiros quando voltava para a aldeia. De agosto até janeiro de 2014, 28 casas no município de Buerarema – todas de moradores indígenas – foram incendiadas por grupos ligados aos invasores da terra Tupinambá.

    Tropas da Força Nacional de Segurança e da Polícia Federal fixaram em 2013 uma base na área indígena, sendo substituídas pelo Exército Brasileiro em março de 2014. Os policiais perseguem, agridem moradores e ameaçam de morte o cacique Babau e seus familiares. Uma carta denúncia relatando as ações violentas da polícia  foi encaminhada à 6ª Câmara do Ministério Público Federal e ao Ministério da Justiça.

    Nenhum desses fatos foi noticiado. “Após todos esses anos, ao arrepio da história, o mesmo povo, que vem lutando para não ser dizimado, sofre perseguição midiática, sendo taxado de terrorista, criminoso, assassino e estuprador, como se nota das reportagens aqui questionadas. O judiciário não pode quedar-se inerte ante esse atentado aos direitos dos povos indígenas, muito menos ante as falsas informações injuriosas, caluniosas e de má fé do canal de televisão réu, numa tentativa de jogar a sociedade contra aqueles que foram acossados, perseguidos e mortos em função da gana de não-indígenas pela terra naquela região, historicamente habitada pelo Povo Tupinambá”, reitera a ação.

    O Ministério Público Federal também deve intervir nas fases do processo judicial, protocolado na última sexta-feira (4) na Justiça Federal em São Paulo.

    Esta notícia compõe o boletim semanal O Mundo Que Nos Rodeia. Para recebê-lo ou enviar sugestões de pauta escreva para mundo@cimi.org.br

  • 10/04/2014

    Jornalista é condenado por postagens racistas a indígenas na internet

    A Justiça Federal condenou o jornalista amapaense Igor Reale Alves por publicações de conteúdo racista em site de rede social. A sentença é resultado de ação ajuizada pelo Ministério Público Federal no Amapá (MPF/AP) em julho de 2013. De acordo com a decisão, Igor Reale Alves vai prestar serviços comunitários na Casa de Apoio à Saúde Indígena do Amapá (Casai) e pagar seis salários mínimos ao Conselho de Caciques de Oiapoque e à Associação dos Indígenas de Wajãpi.

    No ano passado, o jornalista postou cinco mensagens racistas contra os índios Guarani-Kaiowá. Igor Reale se referiu à etnia com expressões de desprezo e incentivou suicídio coletivo. “O acusado proferiu várias mensagens (e não apenas uma) em rede social, praticando, induzindo e incitando a discriminação ou o preconceito de raça e etnia”, destaca trecho da decisão.

    Para o MPF, a obrigação de prestar serviço na Casai é pedagógica. “Talvez, nesse sentido, o réu possa ter contato com o diferente. E, quem sabe (…) a Justiça nesse caso possa fazer um grande bem à humanidade, um grande bem ao réu, que é ter contato com o diferente, ter contato com o indígena e ver o quanto sofre uma minoria nesse país”, argumentou o procurador da República Camões Boaventura, durante audiência na Justiça Federal.

    Para a Justiça Federal, “qualquer cidadão tem o direito de emitir opinião e formular críticas, desde que não atinja o campo delimitado do direito de outrem. O réu, homem adulto e jornalista formado, não pode alegar desconhecer o alcance que teriam suas palavras”.

    O procurador da República Felipe Moura Palha, que assina a ação, orienta: “É preciso pensar duas vezes antes de publicar alguma mensagem na rede social. Uma boa sugestão é imaginar se você diria aquilo em um palco diante de muitas pessoas. Se a resposta for negativa, desista da postagem”.

    Racismo – Conforme a Constituição Federal, o crime de racismo é inafiançável e imprescritível. Para não propagar as ofensas à dignidade da etnia, as mensagens racistas não serão reproduzidas pelo MPF/AP.

    A sentença se deu com base na Lei nº 7.716/89. Nela consta que serão punidos os crimes de discriminação ou preconceito contra raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Para a decisão, cabe recurso.

    Read More
  • 09/04/2014

    Centro de Trabalho Indigenista divulga relatório sobre violências contra os índios Guarani do oeste do Paraná

    Foi divulgado hoje publicação online que contém o relatório “Violações aos direitos humanos e territoriais dos Guarani no oeste do Paraná: subsídios para a Comissão Nacional da Verdade”, produzido pelo Centro de Trabalho Indigenista (CTI).

    A publicação ocorre logo após a visita oficial da Comissão Nacional da Verdade à região. A psicanalista Maria Rita Kehl, coordenadora do GT “Graves violações de Direitos Humanos no campo ou contra indígenas”, esteve por quatro dias na região, período em que pode ouvir, in loco, os testemunhos dos índios Guarani que vivenciaram ou presenciaram diversas formas de violências, atos de tortura e assassinatos impetrados contra seu povo. (Ver matéria sobre a visita publicada na Rede Brasil Atual).

    Sua visita marca um momento importante, dando início a um processo de reparação e de reconhecimento da memória e do sofrimento Guarani que, no entanto, só será plenamente concluído quando seus direitos territoriais forem efetivados e os Guarani puderem, enfim, viver em paz em sua própria terra.

    O contexto de divulgação do relatório é bastante oportuno, uma vez que o Governo Federal, através do Ministério da Justiça, se esforça neste momento, para aprovar uma minuta de Portaria de “Regulamentação [sic] do Decreto nº1775” que, segundo parecer das principais organizações indígenas e indigenistas do país, trata-se de uma proposta velada de paralisar todos os procedimentos de demarcação de terra, por meio de subterfúgios formais. Segundo a proposta do Ministério a Justiça, cujo conteúdo foi tornado público no ano passado, passariam a participar dos estudos de identificação e delimitação de terras vários órgãos do Governo ligados aos setores da sociedade que se opõem às demarcações, como o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), órgão historicamente vinculado ao agronegócio.

    O relatório ora apresentado pelo CTI revela por meio da análise do estudo deste caso específico que a proposta do Governo nada mais faz do que ressuscitar o formato de demarcação instaurado durante o Regime Militar, modelo que foi justamente o responsável por consolidar o esbulho de diversos territórios tradicionalmente ocupados pelos povos indígenas no país, inclusive no Oeste do Paraná. A esse respeito, é nítido como a proposta do Governo Federal ecoa a declaração do Coronel Nobre da Veiga, que esteve à frente da FUNAI (1979 -1981):

    “toda vez que é eleita uma área indígena, antes de ela ser decretada, de ser oficializada, procuramos encaminhar, como temos feito, aos Governos dos Estados, aos órgãos federais e estaduais que se interessam pela terra, tais como IBDF, CEMA, INCRA, o DNER, o DNPM, todos os institutos de terra do Estado, de maneira que não passamos à eleição da área sem que esses órgãos nos digam quais serão os problemas criados por essa eleição, para evitar os conflitos que hoje existem em quase todas as 250 reservas indígenas…” (Coronel Nobre da Veiga, Comissão da Câmara, 17/9/1980).

    O interesse atual do documento se reforça ainda pelo fato de que a gênese do processo político que culminou na apresentação da proposta de minuta de Portaria pelo MJ foi uma audiência no Senado na qual a então Ministra da Casa Civil apresentou laudo da Embrapa, que justamente tratava da presença indígena no Oeste do Paraná. Por esse meio, justificava a inclusão de diversos outros órgãos no processo de regularização fundiária supostamente “comprovando”, com fotos aéreas que a ocupação guarani no oeste do Paraná seria recente. Essa posição foi reforçada por factoide veiculado também pela Rede Globo, em matéria no Jornal Nacional.

    O relatório “Violações aos direitos humanos e territoriais dos Guarani no oeste do Paraná: subsídios para a Comissão Nacional da Verdade (1946-1988)” refuta por meio de vasta análise documental as alegações preconceituosas da ex-Ministra Gleisi sobre o Oeste do Paraná, demonstrando o claro processo histórico de esbulho sofrido pelos Guarani na região, acirrado durante a Ditadura Militar.

    Mais informações: comunicacao@trabalhoindigenista.org.br

     

    Baixe aqui o Relatório!

     

    VEJA O RESUMO DO RELATÓRIO:

    Violações dos direitos humanos e territoriais dos Guarani no oeste do Paraná (1946-1988): subsídios para a Comissão Nacional da Verdade. CTI, 2013.

    Violências cometidas contra os índios Guarani do oeste do Paraná se perpetuam

    O relatório “Violações dos direitos humanos e territoriais dos Guarani no oeste do Paraná: subsídios para a Comissão Nacional da Verdade (1946-1988)”, produzido pelo Centro de Trabalho Indigenista já está online. Ao longo de mais de cem páginas, o relatório traz uma série de depoimentos dos xamoĩ kuery (anciãos) e xaryi kuery (anciãs) que vivem ainda hoje no oeste do Paraná (municípios de Foz do Iguaçu, Diamante d’Oeste, Santa Helena, Guaíra e Terra Roxa). As tristes histórias de vida dos Guarani na região são cotejadas com uma vasta base documental, reunida em 13 anexos, que comprova com clareza a forma como eles e suas famílias foram ilegal e violentamente expulsos de seus locais tradicionais de ocupação, perdendo suas terras, matas e meios de subsistência e sendo relegados à situação de extrema penúria em que se encontram até os dias de hoje.

    Abordando um período que engloba o investigado pela Comissão Nacional da Verdade (1946-1988), o relatório mostra como, desde a criação do Parque Nacional do Iguaçu (1939) até a construção da usina hidroelétrica de Itaipu (1975-1982), passando pela avassaladora expansão da frente agropecuária no oeste do Paraná à partir dos anos 40, ocorreu um gradativo tensionamento da estrutura fundiária da região. O Estado brasileiro, ao patrocinar a ocupação da região por ervateiros, colonos, madeireiras e os grandes empreendimentos, promoveu a expulsão, a escravização e assassinatos dos Guarani, ao mesmo tempo que os privou dos meios legais de fazer valer seus direitos civis e territoriais. A partir desse estudo, constata-se assim que o Estado brasileiro, ao instalar um sério conflito social e se furtando a resolvê-lo, relegou os índios ao esquecimento deixando-os à sua própria sorte. Com a força de seus rezadores, homens, mulheres e crianças, eles continuam a resistir.

    Ao contextualizar a situação em que vivem as comunidades guarani na região, o relatório deixa claro que os mecanismos de violação dos direitos humanos, intensificados durante o governo militar, continuam vigentes ainda hoje com a não demarcação das terras e a negação do acesso aos direitos sociais mais elementares. Ao final, o relatório propõe medidas de reparação para reverter a condição de precariedade e insegurança, com o reconhecimento dos legítimos direitos das comunidades Guarani na região oeste do Paraná, que lhes foram seguidamente usurpados, de modo a restituir a sua merecida dignidade.

    Read More
  • 09/04/2014

    Justiça condena Dnit e Fatma a pagamento de indenização a indígenas do Morro dos Cavalos-SC

    Ação promovida pela Procuradoria da República em Santa Catarina (MPF/SC), a Justiça Federal condenou o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) e a Fundação do Meio Ambiente de Santa Catarina (Fatma) ao pagamento de R$ 100 mil por danos morais à comunidade da Terra Indígena Morro dos Cavalos, localizada no município de Palhoça.

    É uma importante vitória do ponto de vista judicial, muito expressiva. Não pelo valor da multa, mas o fato da condenação ter sido aplicada, fundamental neste momento que a Terra Indígena Morro dos Cavalos está sendo questionada. A ação representa a garantia de que esse território é de uso exclusivo da comunidade e importante para a própria preservação do meio ambiente”, garante Clovis Antonio Brighenti, membro do Cimi Regional Sul.

    A Fatma foi responsabilizada por ter expedido a licença, assim permitindo a intervenção ilegal. Já o Dnit foi condenado por permitir que a empresa retirasse minério da área sabidamente de usufruto exclusivo dos Indígenas.

    A Terra Indígena Morro dos Cavalos é reconhecida legalmente como bem da União de posse e usufruto exclusivos e permanentes da comunidade Indígena Guarani. Em 2002, foi assinado um convênio entre a Funai e o Dnit para implementar o programa de apoio às comunidades Indígenas Guarani residentes na área de influência da BR-101. O acordo foi uma forma de mitigação e compensação pelos impactos socioambientais decorrentes das obras de duplicação da rodovia.

    Fatma vai recorrer e Dnit aguarda notificação

    A Fatma recorrerá a decisão. Em nota, a entidade alegou que não expediu licença em área indígena, pois quando o documento foi despachado, ainda não havia sido demarcada a área. "A licença emitida está datada do ano de 2007, já a área indígena só veio a ser demarcada em 2008", informa o texto.

    “Isso é uma falácia da Fatma, ela sabia que havia sim área indígena na região, pois a comunidade foi reconhecida como ocupação tradicional em 1993”, critica Clovis.

    Uma audiência foi solicitada com a presidenta Dilma Rousseff para que a mesma assine portaria regularizando a área indígena, mas a comunidade até o momento não obteve resposta. No ano passado os indígenas da comunidade se reuniram com o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo para debater os impasses nas demarcações das terras indígenas do estado. “À época da reunião, o ministro alegou que os astros não estavam facilitando o reconhecimento das terras e que era para comunidade ter mais paciência”, aponta Clovis Antonio Brighenti.

    Histórico

    A TI Morro dos Cavalos tem 1.988 hectares e foi reconhecida como de ocupação tradicional da Comunidade Indígena Guarani em 1993. Submetida ao Decreto 1775/96 passou por novos estudos e em 2008 o Ministro da Justiça assinou a Portaria Declaratória.  Em 2011 a Fundação Nacional do Índio (Funai) procedeu a demarcação física e desde então aguarda a assinatura da Presidenta Dilma, que tem se recusado a assinar a portaria por conta da relação política com empresários e políticos catarinenses contrários aos direitos indígenas.

    Sobre a TI foi criado o Parque Estadual da Serra do Tabuleiro, ainda na década de 1970, porém não é o Parque o principal empecilho ao processo demarcatório. Opõe-se a ele empresários do ramo de turismo e exploração de água que estão de olho no rico manancial que nasce no interior da TI.

    Atualmente a comunidade conta com 138 pessoas e vive em menos de dois hectares, confiada entre o morro e a rodovia BR-101, que corta a TI.

    A Homologação é o último passo para que Funai proceda o pagamento das benfeitorias das 74 famílias de posseiros que vivem sobre a área e para que a comunidade possa ocupar toda a terra.

  • 08/04/2014

    Organizações divulgam parecer rechaçando proposta do MJ de alterar demarcações de terras

    As principais organizações indígenas e indigenistas do país tornaram público nesta terça-feira, 08, durante sessão da 9º reunião extraordinária da Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI), em Brasília (DF), um parecer jurídico a respeito de Minuta de Portaria para a “regulamentação” do Decreto nº1775/96, apresentada pelo Ministério da Justiça, José Eduardo Cardozo.

    Leia na íntegra o parecer aqui.

    No final de novembro do ano passado, a minuta com as intenções do governo para o futuro do procedimento demarcatório foi encaminhado a Bancada Indígena da CNPI e revoltou as organizações e povos indígenas. “Contrariamente às alegações do governo, a dita portaria eterniza a não demarcação de terras indígenas, fragiliza a Funai, e desenha um quadro assustador de acirramento de conflitos”, disse em nota a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) à época.

    Diante da minuta, 1.700 indígenas realizaram uma manifestação, no dia 4 de dezembro, que culminou com a ocupação da parte externa do Palácio do Planalto. No conflito com seguranças, quatro indígenas acabaram feridos. Com a pressão, o ministro da Justiça recuou e sinalizou o engavetamento da minuta. Na manhã desta terça, porém, durante a abertura da reunião da CNPI, Cardozo a impôs à pauta sem encaminhar nada quanto às decisões do último encontro do plenário da comissão.  

    Além de divulgar uma carta (leia aqui) rechaçando a postura de Cardozo de transformar a pauta da CNPI em cabide de discussões de interesse exclusivo do governo, as organizações indígenas e indigenistas apresentaram, ainda na manhã desta terça, o parecer jurídico sobre a minuta do ministro da Justiça.

    O parecer

    O documento, com 16 páginas, tem início com a contextualização histórica da consolidação da legislação indigenista seguindo até a principal jurisprudência a respeito dos procedimentos de demarcação de terras indígenas. Traz à tona a como a proposta do Ministério da Justiça contraria decisões recentes, inclusive tomadas pela Corte Suprema do país, o STF, caso do julgamento da Petição 3388 sobre a Terra Indígena Raposa Serra do Sol, entre outros.

    Em seguida, são comentados, à luz da legislação e da jurisprudência, os equívocos dos principais artigos apresentados na minuta, que passaria a permitir a interferência de grupos contrários à demarcação desde os primeiros momentos do procedimento de identificação e delimitação das terras indígenas, inviabilizando até mesmo o trabalho de campo dos profissionais e estudiosos.   

    Ao final do documento, as organizações indígenas e indigenistas que subscrevem o parecer sintetizam nove principais conclusões, sendo a última delas um recado claro para o governo federal:

    “9.       Uma eventual publicação da Portaria em questão reforçará compreensão, por parte dos povos indígenas, organizações de apoio aos povos e da sociedade em geral de que o Governo Dilma é claramente anti-indígena, aliado de primeira hora dos ruralistas, alinhado aos interesses do poder econômico nacional e transnacional, notoriamente do agronegócio, e obstinado por um modelo de desenvolvimento neocolonizador, usurpador de territórios, etnocida e ecocida.”

    Ministro reage a parecer

    As lideranças da bancada da CNPI entregaram o documento diretamente ao ministro da Justiça, juntamente com uma carta manifesto. Cardozo e seus assessores ficaram desconcertados e tentaram se justificar a todo custo. O ministro, porém, foi ao ataque e acusou os indígenas de se negarem ouvi-lo sobre a minuta. “Não podemos nunca nos furtar ao diálogo”, defendeu.

    Sem ter lido o parecer, Cardozo pinçou de improviso alguns pontos isolados do documento e sustentou que já conseguia ver que os pontos de crítica não teriam procedência. Desconsiderou que o parecer foi elaborado de forma minuciosa pelas organizações indígenas e indigenistas, depois de mais de quatro meses da divulgação da minuta.

    “Por exemplo, no comentário ao Artigo 18, vocês estão criticando algo que já é prática da Funai. A presidente da Funai hoje já tem o poder de devolver os relatórios e prescrever diligências”. O que o ministro não diz, entretanto, é que se aprovada a minuta, o procedimento de demarcação de terras passaria a conter não apenas uma possibilidade de pedido reavaliação das conclusões do Grupo Técnico, de poder da Presidência da Funai, mas abre a possibilidade de que o processo volte a estaca zero três vezes: duas delas a critério da Funai e outra a critério do próprio Ministério da Justiça.

    Sobre a crítica a respeito da abertura dos trabalhos de identificação de terras a diversos órgãos vinculados aos setores tradicionalmente anti-indígenas, ele tirou da manga de seu paletó uma resposta pronta: “A Lei de Acesso à Informação já garante que todos interessados possam participar do processo”. Entretanto, de acordo com a minuta do governo, não apenas esses setores não indígenas poderiam ter acesso aos processos, como poderiam indicar membros para o trabalho de campo, e, pior ainda, tais membros poderiam apresentar relatórios em separado, contrariando as conclusões do próprio coordenador do Grupo Técnico.

    O desconforto do ministro Cardozo com a resposta das lideranças, porém, deve-se ao fato de que a posição do Ministério da Justiça a respeito das intenções da minuta não se sustenta diante da mínima análise jurídica, como demonstra claramente o parecer. Alegando construir um mecanismo que permitiria afastar a judicialização dos processos de demarcação de terras, o Ministério da Justiça, na verdade, propõe uma Portaria que dá instrumentos necessários para que os setores contrários às demarcações derrubem na Justiça as conclusões dos grupos técnicos, ao fomentar o dissenso no seio desses grupos.

    Leia na íntegra o parecer aqui.

    Read More
  • 08/04/2014

    Assembleias Indígenas: 40 anos depois segue a luta e articulação

    Egon Heck

    Cimi – Secretariado

    Em abril de 1974, em pleno "milagre brasileiro", anos de chumbo da ditadura militar, duas dezenas de indígenas se reuniram embaixo de algumas mangueiras, em Diamantino (MT).

    Era abril. Uma comemoração diferente. Fato que viria marcar profundamente a luta dos povos indígenas no Brasil. Se lançavam as sementes de um novo movimento indígena no país. Nos dez anos seguintes, foram mais 50 Assembleias Indígenas em todo o país. A segunda foi em Cururu, território Munduruku, e a terceira se realizou em Meruri, território Bororo. Foi no bojo desses momentos de encontros regionais e nacionais que em 1980 surge a União das Nações Indígenas (UNI). Apesar das dificuldades e fragilidade de uma organização indígena de abrangência nacional, foi um passo importante na consolidação das lutas dos povos indígenas por seus direitos.

    Há 40 anos se dava um passo decisivo para conquistas fundamentais, particularmente na questão da posse dos territórios tradicionais, na perspectiva da autonomia, como consta do registro do encontro: "Os índios redescobriram que eles devem ser os sujeitos de seus destinos, não é a Funai e nem as missões os que resolverão os problemas deles, mas nós mesmos", como afirmaram insistentemente. Apesar do apoio inicial do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), em muitos momentos eles ficaram sem a presença de brancos, para traçar suas estratégias de luta. Essa primeira Assembleia Indígena teve o registro silencioso do padre Iasi, conforme consta no Boletim do Cimi nº10, de maio de 1974. Iasi se encontra em Belo Horizonte, tendo completado 95 anos no último dia 5 deste mês de abril.

    “Quarenta anos depois, uma delegação dos povos indígenas do Mato Grosso está em Brasília para dizer: "Nós existimos!”. Apesar do genocídio continuar, também se fortalece nossa luta, principalmente pelo reconhecimento e garantia de nossos territórios", afirma Faustinho Tucumã Kayabi.

    Lembram que nessas quatro décadas muita luta aconteceu, muitos morreram lutando pelos direitos, mas mais guerreiros nasceram, povos se ergueram e línguas se reconheceram. "Estamos sofrendo com a expansão do agronegócio, com a construção de hidrelétricas e hidrovias. Muitas das nossas terras estão invadidas e outras não demarcadas, como a dos Chiquitanos", declara Faustino.

    Terão uma semana de encontros em diversos ministérios, na Câmara e Senado, além de órgãos ligados a questão indígena. A comitiva irá entregar documentos exigindo a demarcação das terras, o direito dos povos isolados. Também manifestaram preocupação com o sofrimento e agressões de diversos povos indígenas em todo o Brasil, especialmente os Guarani Kaiowá no Mato Grosso do Sul, os Tupinambá do sul da Bahia, os Kaingang no Rio Grande do Sul, dentre outros.

    Para o Cimi, tais lutas têm um significado todo especial, pois na região destes povos do Mato Grosso que se concretizaram atitudes corajosas de ruptura, como no caso dos jesuítas em Utiairiti e os salesianos em seu compromisso de vida com os Bororo e Xavante. Foi em consequência dessa nova e radical atitude de defesa da vida e cultura desses povos que foram assassinados Simão Bororo e padre Rodolfo, em meados de 1976, e o padre João Bosco, no mesmo ano. Dez anos depois era assassinado Irmão Vicente Cañas, que trabalhava com os Enawenê-Nawê. Sementes de sonhos e de martírio, acreditando que um mundo novo será possível.

    Os direitos ameaçados

    Em contato com os diversos espaços de poder, os indígenas pretendem dar visibilidade na demonstração de preocupações com relação à paralisação da demarcação dos territórios tradicionais. Também vão dizer não à intenção do Ministro da Justiça em mudar, a toque de caixa, a dinâmica do procedimento demarcatório das terras indígenas, a imposição do decreto de morte, a Portaria 303 da Advocacia Geral da União (AGU), além de várias portarias, como as 215 e 227, que pretendem suprimir direitos constitucionais.

    A delegação de indígenas do Mato Grosso vem dar continuidade às lutas históricas destes povos para ampliar e consolidar alianças, exigindo seus direitos e denunciando todas as formas de violações. “No Mato Grosso, o agronegócio se impõe sem nos respeitar. Onde tem cerrado querem soja. Onde tem mata querem tirar madeira, onde tem rio querem fazer usina e nosso ar e água estão sendo envenenados por agrotóxicos", afirmam os representantes Kayabi, Xavante, Bororo, Myky, Chiquitanos, Munduruku e Manoki.

    Read More
Page 520 of 1205