• 29/04/2015

    Depois de denúncias, relatora da ONU pretende visitar comunidades indígenas no Brasil

    A Relatora Especial sobre Direitos Indígenas da Organização das Nações Unidas (ONU), Victoria Tauli-Corpuz, disse, durante encontro com lideranças indígenas brasileiras na tarde desta quarta-feira (29), que pretende visitar as comunidades do país tão logo receba um convite oficial do governo. Victoria ressaltou a importância das denúncias feitas pela comitiva do Brasil ao longo do Fórum Permanente para Questões Indígenas, que teve início no dia 22 de abril e segue até esta sexta-feira (1) em Nova York (EUA).

     

    “Esperamos que ela possa visitar as aldeias onde não cabe mais gente, as retomadas, os acampamentos, para ver nossos barracos de lona, a falta de água, comida e educação… pro mundo todo entender como a gente vive”, explicou Elizeu Lopes, do povo Guarani-Kaiowá, que entregou, juntamente com lideranças dos povos Terena (MS), Tapeba (CE), Umutina e Kamaiurá (MT), uma Carta Unificada (leia aqui) que reforça as denúncias sobre a violação dos direitos indígenas no Brasil. Ao receber o documento, Victoria comprometeu-se a retomar as recomendações feitas ao governo brasileiro pelo relator anterior, James Anaya.

     

    As lideranças evidenciaram na carta as tentativas da bancada ruralista de alterar a Constituição, suprimindo os direitos dos povos. São ao menos seis proposições, entre Projetos de Lei e Propostas de Emenda à Constituição (PECs), que tramitam no Congresso Nacional. Uma das mais graves, a PEC 215/2000, aguarda apreciação da Comissão Especial (formada principalmente por ruralistas) na Câmara dos Deputados. A PEC 215 pretende transferir do Poder Executivo para o Legislativo o reconhecimento das terras indígenas, unidades de conservação e territórios quilombolas.

     

    Foi demonstrada a preocupação dos povos em relação às decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) que anularam portarias declaratórias de terras tradicionalmente ocupadas pelos povos Guarani Kaiowá e Terena, no Mato Grosso do Sul, e Canela-Apãnjekra, no Maranhão, tão ameaçadoras aos direitos indígenas quanto as PECs e projetos de lei do Legislativo.

     

    A criminalização e perseguição de comunidades e lideranças indígenas que lutam pela garantia de seus territórios também foi relatada à Victoria Tauli-Corpuz. “É importante trazermos a verdadeira realidade que os povos indígenas no Brasil estão passando. A imagem vendida do Brasil aqui fora é de que todos estão bem, e que o Estado vive em plena harmonia com os povos indígenas. E nós, que sofremos essa situação toda no dia a dia, na pele, estamos mostrando aqui, pra várias entidades e países, que o Brasil tem uma dívida histórica para com os povos indígenas e precisa honrá-la. Tudo o que queremos é que o Brasil cumpra a própria Constituição, que respeite e reconheça  o nosso território”, enfatizou Lindomar Terena.

     

    A carta elenca sete solicitações ao Fórum, entre elas a realização de um Seminário Internacional sobre a criminalização dos povos indígenas e suas organizações; que o Fórum manifeste-se pela proteção e recuperação de todas as nascentes de rio e matas ciliares da Faixa de Amortecimento do Parque do Xingu, assim como o fim do desmatamento na região; e  redução e da aplicação de agrotóxicos em geral e a proibição de sua aplicação por via aérea, método do qual muitos proprietários de fazendas utilizam-se para contaminar comunidades inteiras.

     

    Leia aqui o documento na íntegra.

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  • 29/04/2015

    Na ONU, secretário do Cimi denuncia assassinato de indígena Ka´apor no Maranhão

    O secretário executivo do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Cleber César Buzatto, fez um pronunciamento no Fórum Permanente para Questões Indígenas da Organização das Nações Unidas (ONU) na tarde desta quinta-feira (30), em Nova York (EUA), anunciando o assassinato do indígena Eusébio Ka’apor, que morreu por lutar pela preservação da Terra Indígena (TI) Alto Turiaçu, no Maranhão (leia mais).

    Buzatto ressaltou a ausência e omissão do Estado brasileiro, especialmente do Ministério da Justiça, em relação à exploração ilegal de madeira dentro do território dos Ka’apor, que sofrem constantes ameaças de morte por expulsarem madeireiros da TI, e pediu que o governo brasileiro promova uma “ampla e irrestrita investigação” a fim de que os assassinos de Eusébio sejam responsabilizados pelo crime.

    A necessidade de promover, no Brasil, a demarcação e proteção das terras indígenas também foi ressaltada por Cleber Buzatto, que pediu ao Fórum que pressione o governo brasileiro a cumprir suas responsabilidades constitucionais com a questão indígena. “Esperamos que a repercussão da realidade vivida pelos povos indígenas no Brasil, aqui no Fórum Permanente da ONU, ressoe para dentro das instâncias do governo brasileiro, que certamente se sentirá envergonhado e esperamos que com isso tome providências imediatas para mudar a sua posição política de paralisar os procedimentos de demarcação, principalmente aqueles das regiões Sul, Sudeste, Centro-Oeste e Nordeste”, disse Buzatto depois do pronunciamento.

    Foi solicitado que o Fórum recomende à presidente Dilma Rousseff o veto integral à lei sobre Biodiversidade e Conhecimentos Tradicionais – aprovada nessa terça-feira (28) pelo Congresso Nacional, com uma série de retrocessos aos povos indígenas e comunidades tradicionais -, e também a necessidade de abertura, pelo governo brasileiro, de um processo de ampla consulta “aos povos indígenas e demais sujeitos de direitos, com vistas a construção uma legislação verdadeiramente inclusiva e respeitosa no que diz respeito aos conhecimentos tradicionais e à biodiversidade no Brasil”.

    Leia na íntegra o pronunciamento de Cleber Buzatto à ONU.

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  • 28/04/2015

    Ka’apor denunciam madeireiros por assassinato de indígena da TI Alto Turiaçu, no MA

    O agente indígena de saneamento Eusébio Ka’apor, 42 anos, da aldeia Xiborendá, da Terra Indígena Alto Turiaçu, no Maranhão, foi assassinado no domingo (26) com um tiro nas costas. Ele voltava da aldeia Jumu’e Ha Renda Keruhu, na garupa de uma motocicleta conduzida pelo indígena K.K., quando, por volta das 18h30, dois homens encapuzados os abordaram pedindo que parassem e em seguida acertaram um tiro nas costas de Eusébio.

    De acordo com indígenas que pediram pra não serem identificados, os responsáveis pelo crime são madeireiros do município de Centro do Guilherme, que mataram Eusébio devido às ações de autofiscalização e vigilância territorial iniciadas em 2013 pelos Ka’apor, que culminaram, em março deste ano, no fechamento de todos os ramais de invasão madeireira da Terra Indígena Alto Turiaçu.  Eusébio era um importante guerreiro no combate à exploração ilegal de madeira na TI e membro do Conselho de Gestão Ka’apor.

    O crime aconteceu na entrada do povoado Areal, entre os municípios de Centro do Guilherme e Santa Luzia do Paruá, a 3 km da aldeia Xiborendá. “Ele tinha ido visitar o filho na aldeia Jumu’e Ha Renda Keruhu e estávamos voltando pra casa. Aí, nesse trecho, os dois estavam de tocaia e mandaram a gente parar a moto. Eu vi que eles estavam de capuz e não parei. Foi quando acertaram nas costas dele” conta K.K., que conseguiu levar Eusébio até o povoado para procurar socorro. “Ele morreu por volta de 20h30, quando a gente estava na saída de Nova Olinda, levando ele pro hospital”, explica.

    O filho de Eusébio, depois de deixar o corpo do pai na cidade de Zé Doca, voltava para sua aldeia quando, no município de Santa Luzia do Patuá, foi abordado por um madeireiro identificado como Marcílio, que afirmou que outros indígenas e apoiadores dos Ka’apor também poderiam ter morrido. Perguntou ainda quando eles ‘liberariam a madeira’.

    A violência contra os indígenas tem se intensificado nos últimos meses, depois do fechamento do último ramal madeireiro. “Fechamos todos os ramais e criamos oito aldeias nas entradas, pra impedir que voltem. Mas de lá pra cá aconteceram três roubos de motos seguidos de agressão, e sempre cometidos por duas ou três pessoas encapuzadas e com espingardas”, conta uma liderança do Conselho Ka’apor. “As ameaças de morte são constantes há muito tempo. Agora eles mataram mesmo pra intimidar… Estão dizendo que é melhor liberarmos a madeira do que morrer mais gente. Não sabemos o que fazer, porque não temos proteção nenhuma. O Estado não faz nada”.

    Os indígenas contam que têm medo até de prestar queixa na delegacia, por conta de terem flagrado, no ano passado, um homem que alegou estar a mando do delegado de Centro do Guilherme para entregar uma peça de trator a um madeireiro que desmatava o território dos Ka’apor. “Ninguém tem coragem de ir até a delegacia… No início do ano os secretários de Direitos Humanos e de Igualdade Racial estiveram com a gente e prometeram que uma equipe da Secretaria de Segurança Pública receberia e acompanharia nossas denúncias, e até agora nada”, lembra uma das lideranças Ka’apor.

    O Programa de Proteção aos Defensores dos Direitos Humanos, do governo federal, entrou em contato com os indígenas em novembro de 2014, mas até agora os Ka’apor não receberam resposta. “Contamos toda a situação de ameaças e violências que vivemos aqui por proteger a nossa floresta. O que eles disseram é que ‘analisariam se estamos dentro dos critérios’ para sermos protegidos e até agora nada foi feito”, explica a liderança.

    Madalena Borges, do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) Regional Maranhão, alerta para a ausência e omissão do poder público, que tem ignorado as reiteradas denúncias dos crimes ambientais praticados por invasores dentro do território indígena. O trabalho realizado pelos Ka’apor conseguiu proteger a maior parte da área, freando as ações criminosas da exploração ilegal de madeira na Terra Indígena. “No entanto, essas ações vêm despertando a ira dos madeireiros exploradores do território Ka’apor, que ameaçam e intimidam os indígenas. Várias aldeias já foram invadidas em represália às ações de fiscalização”, explica Madalena. “Ainda assim, nenhum órgão se manifesta em defesa dos Ka’apor, que continuam suscetíveis a esse tipo de crime”.

    Neste momento, indígenas da região estão se reunindo em massa na aldeia Xiborendá e exigem manifestação da polícia e Fundação Nacional do Índio (Funai).

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  • 27/04/2015

    Eliseu Lopes leva realidade do povo Guarani-Kaiowá ao Fórum Permanente da ONU

    Eliseu Lopes Guarani-Kaiowá, que participa, junto com outras lideranças da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), do Fórum Permanente para Questões Indígenas da Organização das Nações Unidas (ONU), discursou, na tarde desta segunda-feira (27), em Nova York (EUA), à Relatora Especial da ONU sobre direitos indígenas, Victoria Tauli-Corpuz.

    A dura realidade que seu povo enfrenta no Mato Grosso do Sul, principalmente devido à desigualdade territorial, foi um dos principais eixos de sua fala, que também evidenciou a responsabilidade do governo federal diante da violência praticada contra os povos originários do Brasil. “Na região em que vivo, de 2003 a 2013 houve pelo menos 150 conflitos entre meu povo e fazendeiros da região. Neste período tivemos pelo menos 15 grandes lideranças assassinadas, a maior quantidade do país, cujos inquéritos policiais não resultaram em nada”.

    Mato Grosso do Sul concentra 53% dos assassinatos de indígenas do Brasil. Nos últimos 12 anos, foram 380 mortes. O número de suicídios, principalmente entre os mais jovens, também espanta: 660 casos no mesmo período, o equivalente a um caso por semana. Destes, 70% eram jovens do povo Guarani-Kaiowá. “Não estão inclusos neste levantamento os casos de 2014, porém já sabemos que houve 36 homicídios e 47 suicídios. Ou seja, nos últimos 14 anos houve mais de 709 suicídios de indígenas no Mato Grosso do Sul”, disse Eliseu, que é liderança de Kurusu Ambá.

    Lindomar Terena, que acompanha os debates na ONU, disse que os indígenas sentiram um “espanto”, por parte do Fórum, em relação às questões colocadas na última sexta-feira (24), quando Lindomar leu uma carta da Apib dirigida à mesa diretora. “Isso porque o governo brasileiro estava sempre divulgando uma realidade de outro país, não do Brasil. Por isso é tão importante incidir nestes espaços e construir novos mecanismos e instrumentos para reforçar a nossa luta em defesa de nossas vidas, de nossas terras”, enfatizou. “Viemos para dizer neste espaço da ONU que apesar de toda a repressão para que não consigamos reconquistar nossos territórios, nós, povos indígenas, continuamos firmes e lutando. Se não permitirem que sonhamos, também não os deixaremos dormir”, reforçou Lindomar, liderança do povo Terena em Mato Grosso do Sul.

    O estado, que abriga a segunda maior população indígena do país, com 75 mil pessoas, é o que tem menor número de terras demarcadas. “Nossas reivindicações são de apenas 2,3% do território de Mato Grosso do Sul e não estão em faixa contínua. Enquanto o gado pode ter 70%, nós não podemos ter 2,2% ou 10% do que foi nosso num passado bem recente”, disse Eliseu em seu discurso.

    As tentativas da bancada ruralista de usurpar os direitos conquistados pelos povos na Constituição de 1988 foram evidenciadas na fala de Eliseu. “Nós indígenas não aceitamos isso e nem o marco temporal que o Poder Judiciário tem decretado em suas decisões. As duas coisas, além de inconstitucionais, violam a Convenção 169”.  

    Eliseu fez ainda um convite em nome do povo Guarani-Kaiowá para que Victoria Tauli-Corpuz faça uma visita às comunidades indígenas do estado, “para sentir de perto e na pele a realidade que estamos vivenciando e denunciando, o dia-a-dia de fome e tensão do povo Guarani-Kaiowá do Mato Grosso do Sul e não na ocasião dos tais jogos indígenas mundiais promovido pelo governo brasileiro, onde a verdadeira situação dos povos indígenas estará obscura, fora de foco ou muito bem escondida”.

    Lindomar Terena disse que a expectativa da delegação de lideranças indígenas é de que o governo brasileiro “tire da gaveta” e assine os decretos de homologação e as portarias declaratórias e destrave também os procedimentos de identificação e delimitação das terras indígenas no Brasil. “Essa seria uma sinalização de grande valia. Esperamos ainda que os governos de outros países deixem de comprar produtos que são explorados em terras indígenas que continuam invadidas por latifundiários no Brasil. Dissemos aqui na ONU que esses produtos são manchados com o sangue dos nossos povos e lideranças indígenas. Esperamos ainda que o Congresso Nacional não mude o texto constitucional e que o Supremo Tribunal Federal respeite o sentido do artigo 231 da Constituição Federal estabelecido pelos deputados constituintes”. O Fórum segue até a próxima sexta-feira (31).

    Leia na íntegra o discurso de Eliseu Lopes