• 10/07/2015

    Egydio Schwade, uma homenagem merecida

    Egydio Schwade, um dos fundadores do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e da Operação Anchieta (Opan), foi homenageado no dia 07 de julho último pela Assembleia Legislativa do Estado do Amazonas, que lhe outorgou o título de cidadão amazonense. A iniciativa da homenagem partiu do deputado José Ricardo Wendling, do PT.

    O gesto fortalece uma perspectiva de Amazônia construída a partir dos povos e comunidades que nela vivem historicamente e que fizeram dela o seu lar, cuidando para que ela pudesse prover sua segurança e a segurança das gerações futuras.

    Egydio começou a interagir com a Amazônia e com os seus povos num momento em que ambos estavam sendo dizimados, tendo seus territórios rasgados por estradas, invadidos e saqueados e sendo sistematicamente desqualificados e discriminados nas suas formas de ser e agir. Estava convencido que na experiência milenar destes povos encontravam-se princípios a serem seguidos para assegurar o futuro.

    Como Secretário Nacional do Cimi, na década de 1970, andou por diversas regiões da Amazônia, levantando informações e denunciando as  violências praticadas contra os povos indígenas, no contexto do Plano de Integração Nacional da ditadura militar.

    A presença de Egydio na Amazônia e o seu olhar sobre a região é marcado pela convicção de que a causa dos povos que aqui vivem vale a pena. Muito diferente do olhar de muitos que chegam na Amazônia e a veem como se ela fosse um estoque de riquezas a ser saqueado ou então uma oportunidade de grandes negócios, perspectiva esta que infelizmente orienta, ainda hoje, muitas políticas governamentais.

    Quando em 1980 resolveu fixar residência na Amazônia, escolheu juntamente com sua esposa Doroty, já falecida, (outra bonita história de compromisso com a vida) a região do território histórico do povo indígena Waimiri Atroari, primeiro em Itacoatiara e posteriormente em Presidente Figueiredo, no Amazonas. Era uma região que havia sido tomada de assalto por forasteiros, apoiados pela ditadura militar, que massacraram o povo Waimiri Atroari, destinaram suas terras para a Mineração Paranapanema, para a construção da hidrelétrica de Balbina e distribuíram uma parte das mesmas para “empresários paulistas”. Para facilitar o esbulho, atravessaram-nas com a rodovia BR 174. Chamaram isso de desenvolvimento.

    Pode-se por isso dizer que Egydio veio para o Amazonas para lutar contra o desenvolvimento calcado na destruição das experiências milenares de convivência humana harmônica com a natureza. Todas as suas iniciativas foram tomadas para reforçar outra perspectiva de futuro para a Amazônia, na qual necessariamente os povos indígenas teriam um papel fundamental.

    Daí se explica o seu empenho, ainda como secretário executivo do Cimi, para a realização das primeiras Assembleias Indígenas interpovos, que possibilitaram a articulação política desses povos na defesa de seus direitos; a convivência dele e da sua família com o povo Waimiri Atroari e o processo de alfabetização ali iniciado, enquanto estratégias de fortalecimento do protagonismo daquele povo na reação ao processo violento de ocupação de suas terras; a criação do Marewa (Movimento de Apoio a Resistência Waimiri Atroari) juntando forças, no apoio aos Waimiri Atroari, e na luta de resistência ao modelo de exploração e depredação; a construção da Casa da Cultura do Urubui e o envolvimento no Comitê pela Verdade e Justiça do Amazonas, para fazer a memória permanente de uma história incômoda para a elite econômica e política que ainda hoje teima em seguir por este caminho.

    A prática em favor da vida de Egydio e de sua família, no entanto, não param nessas contribuições. Uma perspectiva de Amazônia diferente da lógica do desenvolvimento, que certamente tem muito a ver com o aprendizado com os povos indígenas, é facilmente percebida por aqueles/as que tiveram oportunidade de visitá-los em Presidente Figueiredo. Os sinais são visíveis em toda parte, nas relações humanas, na acolhida, na agricultura tropical que praticam, enriquecendo a biodiversidade em vez de destruí-la, na abundância e variedade de alimentos, na solidariedade e compromisso com as causas populares.

    Egydio, nascido em Feliz/RS, completou 80 anos de vida no dia em que o recebeu o título de Cidadão do Amazonas. Muito mais do que um cidadão do Amazonas, é uma personalidade dos povos do mundo.

  • 10/07/2015

    Mulheres e crianças Mura são vítimas de violência policial em Autazes (AM)

    Três mulheres e crianças Mura foram vítimas de uma desastrosa ação policial na Terra Indígena Murutinga/Tracajá, no município de Autazes (AM), distante da capital cerca de 113 quilômetros. O fato aconteceu no dia 28 de junho passado, por volta das 17 horas.

    A ação da polícia foi motivada por intervenção de moradores da localidade de Novo Céu, vila localizada a cerca de 20 quilômetros da sede do município de Autazes. O local fica dentro da Terra Indígena Murutinga/Tracajá, disputada por pecuaristas e posseiros. Um dos moradores acionou a polícia porque um indígena do povo Mura estava construindo uma casa em área supostamente pertencente a Cooperativa de Produtores de Leite de Autaz Mirim (Cooplam).

    Natalina Pinheiro da Conceição, grávida de dois meses, sua irmã Natália Pinheiro da Conceição e Nelcir Gomes Moura foram espancadas e presas por várias horas. Nelcir, que tem uma filha ainda bebê, foi impedida por uma policial de nome Renata de amamentar a criança.

    “Um policial de nome João me deu tapas, chutes, bateu em minhas costas com o joelho e me arrastou para um carro particular onde me deixaram e foram buscar as outras duas”, relatou Nelcir Gomes. Além das mulheres, quatro crianças, dois idosos e outras pessoas teriam sofrido agressão. 

    Nelcir disse ainda que a policial Renata teria ameaçado de morte seu esposo, conhecido como Luciclaudio Duarte, conhecido como Cacá. “Você vai ficar viúva cedo. Quero pegar o Cacá na penitenciária de Autazes”, disse Renata a Nelcir.   

    No tumulto provocado pela ação da polícia, os moradores apreenderam um revólver e devolveram posteriormente ao comandante da polícia local na presença de servidores da Fundação Nacional do Índio (Funai). 

    “O tiro disparado pelo policial passou entre as pernas de uma moradora e por pouco não atingiu uma criança“, relata Nelcir Gomes Moura. Os fatos acontecidos em Murutinga foram levados também ao conhecimento da Corregedoria da Polícia Militar em Manaus.

     Murutinga é uma terra indígena identificada pela Funai e em processo de demarcação. Ali vivem cerca de três mil indígenas Mura. A terra é cercada por fazendas cujos proprietários, com apoio de políticos de Autazes, tentam por várias maneiras inviabilizar a demarcação e regularização territorial.

    Foto: Natalina, grávida de dois meses, Nelcir e Natália denunciam agressão policial na Terra Indígena Murutinga/Tracajá

  • 08/07/2015

    Povos da Bahia pedem que PGR combata violações aos direitos indígenas no estado

    Mais de 100 indígenas dos povos Pataxó, Pataxó Hã Hã Hãe, Tupinambá e Tumbalalá, da Bahia, estão em Brasília desde segunda-feira (6) para uma série de reivindicações junto aos Três Poderes. Nessa terça-feira (7), estiveram na Fundação Nacional do Índio (Funai) e na Procuradoria Geral da República (PGR), onde expuseram a vulnerabilidade a que estão submetidos os povos indígenas naquele estado.

     

    Atendidos por Luciano Maia, Subprocurador-Geral da República e membro da 6ª Câmara de Coordenação e Revisão, os indígenas reiteraram à PGR denúncias contra a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), que não fornece transporte às aldeias há três meses, além da carência de profissionais e medicamentos.

     

    Os indígenas destacaram que as denúncias vêm sendo encaminhadas ao Ministério Público Federal (MPF) na Bahia, que adota uma postura omissa em relação às dificuldades dos povos. “A função do MPF é zelar pelo nosso direito, o que não vem acontecendo. É crime o que estão fazendo com a gente, os órgãos públicos de modo geral. Temos pessoas morrendo nas aldeias. São quase quatro meses sem nenhuma assistência à saúde”, disse a liderança Agnaldo Pataxó Hã Hã Hãe. Os indígenas protocolaram na PGR documentos com as denúncias, pedindo que o órgão não permita omissões quanto às violações dos direitos indígenas.

     

    Fraude no Transporte

     

    O já dramático quadro da saúde indígena no estado intensificou-se nos últimos meses, depois de descoberto, pela Polícia Federal e a Controladoria-Geral da União (CGU), um esquema fraudulento de licitações envolvendo o Distrito Sanitário Especial Indígena na Bahia (Dsei/BA) para a contratação da empresa San Marino Ltda., que realizava o transporte de indígenas desde 2013. A CGU descobriu que a empresa foi beneficiada com um sobrepreço de R$ 12,8 milhões, além de um superfaturamento avaliado em R$ 6,4 milhões, em razão de serviços não executados.

     

    Depois de denúncia do MPF, a Justiça Federal suspendeu os efeitos do pregão e determinou, em 21 de julho de 2014, que uma nova licitação deveria ocorrer em no máximo 30 dias, e que, enquanto isso, os serviços prestados pela San Marino deveriam ser mantidos. No entanto, de acordo com Maria da Ajuda,  presidente do Conselho Local de Saúde Indígena do Sul da Bahia, a empresa parou de prestar o serviço, alegando falta de verba, e não foi realizada nova licitação. “Desde então já passaram quase quatro meses. A situação está caótica, tivemos óbitos decorrentes da falta de transporte, porque muitas aldeias ficam há quilômetros de qualquer atendimento de saúde. Viemos pedir socorro ao MPF, que ele entre em ação e nos ajude”, disse Maria.

     

    Os indígenas apontam problemas estruturais além da falta de transporte, como a carência de medicamentos e profissionais para os atendimentos, o abastecimento de água deficiente e ainda o preconceito que sofrem alguns indígenas ao serem atendidos, tanto dentro como fora das aldeias. “O que estão fazendo com os povos indígenas em relação a saúde é violência, porque nosso povo tá morrendo por falta de assistência. Queremos que o MPF nos ajude, porque a situação é precária, difícil pra todos. Na minha comunidade falta construção de banheiros, falta medicamentos… Falta tudo em todas as aldeias, queremos assistência adequada. Quando se fala que a saúde do povo indígena é diferenciada, será que a diferença é essa aí?”, comoveu-se a liderança Xarru.

     

    O cacique Imburana manifestou indignação com o Ministério da Saúde e Sesai, que haviam recusado proposta de reunião com a delegação. “Fazemos essa viagem, dois dias pra chegar em Brasília e o secretário não quer atender a gente, isso é um total desrespeito, uma violência”, declarou.  O procurador Luciano Maia comprometeu-se a acertar uma agenda no Ministério da Saúde, que confirmou uma reunião com a presença do secretário Especial de Saúde Indígena, Antônio Alves, para esta sexta-feira (10).

     

    Na PGR, a delegação tratou ainda da paralisação dos processos de demarcação das terras indígenas na Bahia, que tem causado violência contra os povos no estado. Caromi Oseas, assessora jurídica do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), explicou ao procurador que o ministro da Justiça, ao paralisar as demarcações e optar por ‘mesas de diálogo’, acaba por incitar o ódio da população não-indígena contra os povos, cada vez mais vulneráveis à ação da pistolagem. Em maio, pistoleiros atacaram a aldeia Patiburi, da Terra Indígena (TI) Tupinambá de Belmonte, queimando casas e parte da plantação da comunidade. “Só na Bahia são ao menos 12 terras indígenas sem nenhum impedimento jurídico, dependendo apenas de vontade política da Funai e/ou do Ministério da Justiça  (MJ) para terem seus processos demarcatórios finalizados. A TI Barra Velha, por exemplo, está na mesa do ministro há 8 anos”, explicou Caromi. A delegação tratará dos procedimentos demarcatórios diretamente com o MJ na tarde desta quinta-feira (9).

     

    Protesto na Esplanada

     

    Na manhã dessa quarta-feira (8), o grupo com cerca de 100 pessoas fechou durante duas horas três pistas do Eixo Monumental, desde a Catedral até a Praça dos Três Poderes. A Polícia acompanhou a delegação, que fez ainda um ato em frente ao Ministério da Saúde. Durante a tarde os indígenas estiveram no Congresso Nacional, em visita aos gabinetes, e em reuniões nos Ministérios da Educação e da Defesa. O grupo permanece em Brasília até sexta-feira (10).

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  • 08/07/2015

    Encontro Mundial de Movimentos Populares começa na Bolívia

    “Quando vejo essas pessoas, as caras das pessoas, dá uma esperança. A gente sente que o povo tem capacidade de transformar, de construir um mundo mais humano, mais fraterno, de igualdade”, diz Marina dos Santos, do MST, uma das 250 brasileiras que participa do Encontro Mundial de Movimentos Populares em Santa Cruz de La Sierra, na Bolívia.

    Leia mais: Na América Latina, Papa se reunirá com movimentos sociais

    O Encontro começou na manhã de terça (7), com a presença de 1500 pessoas de 40 países do mundo. A programação prevê painéis de discussão sobre os eixos “Terra”, “Trabalho”, “Teto”, além de oficinas para aprofundamento das discussões e trocas.

    Esses eixos foram inspirados na exposição do Papa Francisco no primeiro encontro, que destacou que é preciso lutar para que não haja mais “nenhum camponês sem terra, nenhum trabalhador sem trabalho digno e nenhuma família sem moradia digna”.

    Na tarde de hoje, o presidente do Estado Plurinacional da Bolívia, Evo Morales, faz a abertura oficial do encontro. Na quinta (9), às 17h30, o Papa Francisco também se reúne com os participantes.

    “A luta pela Mãe Terra”

    O primeiro painel “A luta pela Mãe Terra e a contribuição de Laudato Si” contou com a exposição de quatro representantes da resistência camponesa. Atrás de uma mesa ornamentada com alimentos produzidos pelos povos da América, João Pedro Stedile, da coordenação da Via Campesina, lembrou como a organização do agronegócio compromete a soberania alimentar e a saúde de todos. “Nós temos que ter nosso plano, o plano do povo. Já não basta apenas ‘terra para quem nela trabalha’, como clamava Zapata. Mudou o paradigma. É preciso pensar uma mudança no campo que interessa a todos, que garanta a produção de alimentos sadios e sem venenos. Que respeite a biodiversidade, que resgate a agroecologia. Esse plano de agricultura interessa a todo o povo”, destacou.

    Silvia Ribeiro, do ETC Group, do México, criticou a concentração das empresas que atuam no campo, em todo o mundo. Ela citou o caso das sementes, no qual apenas dez empresas controlam 80% do mercado. Além disso, as mesmas que produzem os venenos produzem os transgênicos que dependem deles. “Os transgênicos produzem muito menos, não podem ser replantados, usam muito veneno, causam diversos malefícios à saúde, como o aumento dos casos de câncer, além de custar mais caro”, sublinhou.

    Rodolgo Machaca, da Confederação Sindical Única de Trabalhadores Campesinos da Bolívia, destacou o método que será usado durante o encontro: denunciar, levantar demandas e assumir compromissos. “Os governos neoliberais têm culpa porque permitiram saquear nossas terras. Por isso a unidade internacional é fundamental, porque precisamos nos unir para expulsar as multinacionais”, exortou.

    O bispo da Diocese de Aysén, no Chile, Luis Infanti della Moura, também criticou o imperialismo, lembrando que estamos todos chamados a lutar por um mundo melhor. “O Papa nos chama a tomar consciência para romper e derrubar as estruturas que nos escravizam cada vez mais”.

    Solidariedade internacional    

    Melike Yarar representa o movimento de mulheres curdas. Ela deu seu depoimento das mulheres que lutam contra o Estado Islâmico que oprime os povos de seu país. “A América Latina para nós é um exemplo. Estamos aqui para compartilhar nossa resistência e para criar comunicação entre nós. Precisamos de um plano de intervenção global. Precisamos unir nossas forças. Viver é resistir, resistir é viver”, disse.

    Primeiro encontro

    Entre 27 e 29 de outubro de 2014, o Papa recebeu no Vaticano dirigentes sociais dos cinco continentes, que representaram organizações de base principalmente de três setores –  trabalhadores precarizados, camponeses sem terra e pessoas que vivem em moradias precárias – mas também sindicalistas, ativistas de direitos humanos e de pastorais sociais.

     

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  • 07/07/2015

    Cimi divulga nota sobre realidade indígena no Brasil

    Nota da XXXIX Assembleia do Cimi Regional Sul sobre a realidade indígena no Brasil

    O Conselho Indigenista Missionário, regionais Sul e Mato Grosso do Sul, reunido em Assembleia Regional de 03 a 05 de julho, em Laranjeiras do Sul-PR, refletiu sobre as graves e profundas violências praticadas contra os Povos Indígenas no Brasil, em especial nas regiões Sul, Sudeste e Centro Oeste. São constantes as denúncias de violações contra a vida, contra a terra, o meio ambiente, contra os direitos constitucionais em seus aspectos fundamentais, como o acesso às políticas públicas, as diferenças étnicas e culturais e a demarcação das terras.

    Preocupa, sobretudo, o fato de os poderes públicos – Executivo, Judiciário e Legislativo – agirem com o intuito de limitar o alcance dos direitos constitucionais dos Povos Indígenas por meio de decisões judiciais, ações políticas e administrativas que violam a Carta Magna do país em seu capítulo VIII, Artigos 231 e 232.

    São inaceitáveis algumas decisões oriundas no Supremo Tribunal Federal (STF) – por meio de sua segunda Turma – contra as terras Guyraroká, Limão Verde e Canela-Apãniekra, pois apenas visam, no entender do Cimi, restringir os direitos indígenas. O que se percebe, no horizonte destas decisões, é a intenção de descaracterizar os procedimentos de demarcações a partir da tese de que os direitos dos povos se iniciam ou se encerram com a promulgação da Constituição Federal (CF), através do que vem sendo denominado de marco temporal de 1988. É absurdo pensar que uma Corte Superior possa adotar interpretação restritiva a direitos, tendo como foco não o respeito à lei, mas às pautas e os interesses de setores da política e da economia.  

    Ao impor (ao procedimento demarcatório) o marco temporal, a Segunda Turma do STF pune os povos indígenas pelo fato de terem sido expulsos de suas terras. A partir desse entendimento, as comunidades ou povos que não estavam em guerra ou não ingressaram em juízo contra os invasores antes de 1988 perderiam o direito a terra, que a própria Constituição Federal afirma ser, para os indígenas, imprescritível, inalienável e indisponível. Portanto, este argumento falacioso, além de negar o direito originário que os povos indígenas têm sobre as terras, transfere a culpa que é do Estado – por permitido a retirada de comunidades e a ocupação indevida de suas terras – para as vítimas.

    Lamentavelmente, as falaciosas interpretações acerca dos direitos indígenas, oriundas do STF, têm desencadeado no âmbito dos tribunais, em especial no TRF 4, uma onda de revisões nas demarcações de terras já consolidadas – como nos casos da TI Araça´i e TI Toldo Pinhal, em Santa Catarina. A Segunda Turma do STF, ao tentar restringir direitos valendo-se do marco temporal, compromete a segurança e a vida dos Povos Indígenas.

    São igualmente inaceitáveis as decisões da presidência da República que impôs, em sua política indigenista, que Fundação Nacional do Índio (Funai) e o Ministério da Justiça paralisassem as demarcações de terras. Tudo indica que o parâmetro adotado pelo governo é o mesmo do Judiciário, ou seja, a defesa de setores da economia que têm a ambição de explorar os recursos existentes nas áreas indígenas e/ou que já as vem explorando ao longo de muitas décadas. É igualmente condenável o fato de o governo federal, em articulação com governos estaduais, colocar as suas forças públicas de segurança e proteção – polícias Federal e Militar – a serviço daqueles que violam os direitos humanos dos povos indígenas. Exemplo disso foi o que aconteceu em Mato Grosso do Sul, onde fazendeiros se armaram e atacaram os Guarani-Kaiowá da terra indígena de Kurusu Ambá, episódio que a Polícia de Fronteira de Mato Grosso do Sul acompanhou e que a Polícia Federal alegou não ter contingente para se deslocar ao local do conflito.

    No âmbito do Poder Legislativo têm sido insistentemente criados projetos de leis e de Emendas à Constituição Federal que visam não o aprimoramento das normas jurídicas, mas a descaracterização dos direitos já assegurados constitucionalmente aos povos indígenas. Tais iniciativas estimulam, na sociedade, um clima de intolerância contra os povos indígenas e geram insegurança jurídica por depreciar direitos resguardados no texto constitucional, tratando-os como se fossem clandestinos.

    No entender do Cimi, a intolerância, a ganância e o preconceito, combinados com a omissão e negligência do governo federal, continuam motivando e acentuando as agressões contra os povos indígenas, condenando-os a uma violência cotidiana. Nega-se, neste contexto, a vida. Negam-se os direitos e estimula-se uma falaciosa ideia de que os Povos Indígenas não têm lugar nos espaços geográficos, políticos, econômicos, culturais e sociais do país. 

    O Cimi – regionais Sul e Mato Grosso do Sul – expressa, uma vez mais, seu compromisso com a defesa dos direitos dos Povos Indígenas, com seus projetos de vida e se coloca a serviço das lutas atuais por eles travadas, em especial contra a PEC 215/2000 contra o Projeto de Lei 1216/2015, contra o Projeto de Lei Complementar 227/2012, bem como, contra as ações que tramitam nos tribunais e que pretendem impedir o acesso dos povos às suas terras.

    Por fim, o Cimi manifesta sua crença na força e resistência de todos aqueles que lutam pela vida, pela justiça e pela construção do Bem Viver.

     

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  • 07/07/2015

    Povo Ka’apor divulga nota em solidariedade aos Guarani Kaiowá e Munduruku

    Em solidariedade aos Guarani e Kaiowá, que nas últimas semanas foram atacados por fazendeiros de forma covarde em retomadas legítimas de territórios tradicionais, e aos Munduruku, em luta contra o governo federal que pretende erguer um complexo hidrelétrico no rio Tapajós inundando as terras do povo, os Ka’apor, do Maranhão, divulgaram nesta terça-feira, 7, uma nota de apoio às lutas destes povos no Mato Grosso do Sul e no Pará, respectivamente.

    Os Ka’apor fazem duras críticas ao governo federal pela paralisação das demarcações de terras e por não tomar atitudes mais enfáticas diante da violência sofrida pelos povos indígenas no Brasil. Há dois meses, Eusébio Ka’apor foi assassinado por madeireiros invasores da terra indígena do povo e as autoridades policiais insistem em não investigar e prender os responsáveis. Enquanto isso, a atividade madeireira dentro da terra indígena prossegue.

    Leia na íntegra:

    Carta do Povo Ka’apor aos Guerreiros Guarani Kaiowá e Guerreiros Munduruku

    Nós, povo Ka’apor da Terra Indígena Alto Turiaçu, Maranhão, queremos manifestar nossa solidariedade e sentimento de revolta diante da situação de violência contra o povo Guarani e Kaiowá, contra o povo Munduruku e a todos os povos indígenas do Brasil, nossos irmãos que lutam contra os projetos de morte. Denunciamos o governo brasileiro, fazendeiros, madeireiros, empreiteiras e barrageiros que estão determinados a nos destruir.

    Soubemos do horror que atingiu recentemente o povo Guarani e Kaiowá, trazendo mais dor e sofrimento a nossos parentes que querem voltar para as suas terras no Mato Grosso do Sul.

    Sabemos da luta de todo dia do povo Munduruku para autodemarcação de suas terras e de sua luta contra as barragens no Pará.

    E vemos como o governo anda de mãos dadas com criminosos que queimam crianças, casas e barracos; matam rios e retiram parentes de seus territórios para dar lugar a hidrelétricas; assassinam lideranças, pais de famílias, como nosso parente EUSEBIO KA’APOR. Faz 2 meses que foi assassinado pela ação dos madeireiros em nossa região. O governo não fez nada para prender os assassinos e mandantes.

    Esse governo, o Congresso Nacional e os partidos que dão apoio para esse governo e para os ruralistas só têm criado leis que retiram nossos direitos, ameaçam nossas vidas.         

    Convocamos todos os nossos parentes do Brasil que estão sofrendo com os ataques do governo e de seus aliados a continuar lutando em defesa de seus direitos e territórios. Não aceitamos as mentiras do governo e de seus ministros.

    Aos nossos parentes de outros territórios, contem com nossos arcos e flechas nessa luta.

    Tupán, Karosaikabu e Ñanderu estão conosco!

    Aldeia Zé Gurupi, 05 de julho de 2015.

    Conselho de Gestão do Povo Ka’apor

    Conselho das Aldeias da TI Alto Turiaçu

    Ka’a Usak ha ta (Guerreiros Ka’apor em Defesa da Floresta)

    Educandos da 5ª Alternância dos Estudos Ka’apor – Aldeia Zé Gurupi

               

               

     

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  • 07/07/2015

    Indígenas Tupinambá ocupam Secretaria de Educação, em Salvador, por estrutura e escola diferenciada

    Cerca de 100 indígenas do povo Tupinambá de Olivença, do sul da Bahia, ocuparam a Secretaria de Educação da Bahia, em Salvador, reivindicando soluções para os graves problemas que encontram nas comunidades. Falta de transportes adequados para o deslocamento dos estudantes, falta de pagamentos aos funcionários e professores das escolas, a não regularização dos prestadores de serviços temporários, desrespeito na garantia de uma educação diferenciada para os povos indígenas e empresas terceiras que não cumprem os acordos firmados. Estes são alguns dos problemas relacionados pelas lideranças que fazem a ocupação.

    No último dia 23 de abril, os Tupinambá ocuparam o Núcleo Regional de Educação 05, em Itabuna, e uma comissão de lideranças se reuniu com representantes da Secretaria de Educação. Naquela oportunidade, na pauta das reivindicações, além do transporte escolar, se exigia respostas para a contratação de funcionários às estruturas escolares. Além disso, o aumento dos recursos para garantir o transporte dos alunos de forma segura e dentro das demandas que as comunidades exigem. O valor por cada criança que é pago hoje está bem abaixo do valor de outras contratações do mesmo porte.

    Os encaminhamentos propostos e assumidos pelo governo do Estado e pela empresa de transporte não foram cumpridos, e a comunidade Tupinambá de Olivença continua sofrendo os mesmos impactos negativos, causados pela irresponsabilidade do governo do estado.  Diante dessa situação, as lideranças Tupinambá definiram mais uma vez por tomar uma atitude de ocupação para cobrar direitos garantidos por lei.

    “Esta parece ser a única linguagem que o governo do estado e seus representantes entendem: a pressão. Não dá mais para acreditar em quem faz promessas e não as cumpre, já passamos do meio do ano e até agora não conseguimos resolver este problema da nossa educação. Isto é uma completa falta de respeito para as comunidades indígenas do estado”, afirma cacique Valdenilson Tupinambá.

    Segundo as lideranças, eles só voltarão às comunidades quando tiverem resolvido o problema de forma definitiva; não aceitarão promessas. “As coisas têm que ser resolvidas. Se o governo não tem palavra, não honra compromissos, vamos ficar aqui até que honre, que cumpra com os acordos”, afirma Valdenilson. Os Tupinambá contam com o apoio da Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (Apoinme) e do Colegiado de Caciques Tupinambá.

  • 06/07/2015

    A caneta e a borduna

    Representantes indígenas de vários estados juntaram-se a uma delegação de professores e caciques das etnias Guarani, Kaiowá e Terena do Mato Grosso do Sul e partiram para Brasília, onde, durante dois dias, visitaram alguns órgãos do governo federal: CAPES, FUNAI, STF, AGU, MEC e Congresso Nacional. Uma pergunta que se fizeram várias vezes foi: o que nos trouxe aqui? Durante dois dias acompanhei, como observador, esse grupo e procurei ler-escutar os seus textos-falas para encontrar uma resposta. 

    Ouvi muitas explicações. Uma delas foi escrita pelo cacique Jorge Gomes, da aldeia Pirakuá, em frente à Advocacia Geral da União: “nossos direitos não têm partido”, conclamou os aliados do alto de sua sabedoria. Outra resposta foi verbalizada pelo índio Cretã Kaigang, do estado do Paraná, “meu pai foi morto, lutando pelas terras usurpadas, sem nenhuma providência, por mais de sessenta anos. Quando isso aconteceu, eu era apenas um garoto de oito anos de idade”. 

    Já a professora Teodora de Souza, explicou ao prof. Paulo Gabriel Nacif (SECADI) e ao representante da Secretaria Geral da Presidência da República o que entendia por pátria educadora: “uma nação que todos, independentes de sua etnia, tenham acesso justo, gratuito, aos bens culturais. Uma nação em que os saberes não sejam privilégios de uma pequena elite”. 

    De todas as respostas, a mais contundente foi escrita em uma fotografia, em cuja legenda eu escreveria: a caneta e a borduna. 

    O professor, flagrado pelo fotógrafo, coordena uma licenciatura indígena na cidade de Aquidauana – MS e a borduna, à sua frente, pertence ao cacique Jorge Gomes, da etnia Kaiowá. Intrigou-me como os dois objetos foram se encontrar no sexto andar do Ministério Educação, em Brasília – DF. 

    Fui entrevistar os objetos em segredo. A borduna, um pouco ríspida no início da conversa, contou-me muitas aventuras contra inimigos ferozes de outras tribos, abatidos nas guerras imemoriais. Falou sobre sua participação na vingança dos parentes devorados por felinos-homens, predadores de índios, chamados pelos Guarani de ava poro’ú. Os cronistas coloniais Hans Staden, Jean de Léry e o sociólogo Florestan Fernandes ajudaram-me na investigação. 

    Entrevistar a caneta foi bem mais fácil, pois ela foi bastante eloquente. Contou-me que tem andado em muitas companhias e gabinetes de Brasília. Em alguns mais ausentes. Portas fechadas. Nas aldeias, disse-me, tem aprendido, nos últimos anos a escrever palavras nas línguas maternas dos povos indígenas.

    Falou-me que ajudou muitos professores-pesquisadores a registrar histórias de anciãos que não conseguem esquecer traumas pelas remoções de aldeias inteiras, quando eram também garotos, contra a própria vontade, em caminhões de transportar gado, sob a mira cuidadosa de “seguranças” armados e impedidos por anos de retornar ao local onde foi enterrado seu ponchito kuê, o cordão umbilical. Já no final da entrevista, o sábio objeto, bem mais à vontade, confidenciou-me que sua maior frustração na vida foi não conseguir colaborar, não por falta de vontade, mas por omissão de algumas autoridades, a rabiscar seu maior sonho: a assinatura da homologação das terras indígenas, que, segunda ela, está escondida numa gaveta do Ministro da Justiça, em Brasília. 

    Diante de tantos relatos, compreendi o que trouxe estes professores e líderes indígenas à Brasília. Vieram ensinar ao governo que a pátria educadora é a irmã gêmea da pátria de direitos. Uma não vive sem a outra.

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  • 06/07/2015

    Blocos exploratórios da 13ª Rodada impactam terras indígenas

    A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) divulgou, no último dia 12, o pré-edital da 13ª Rodada de Licitações de blocos para exploração e produção de petróleo e gás natural, prevista para acontecer no dia 07 de outubro deste ano. Ao todo, estão sendo ofertados 266 blocos exploratórios, distribuídos em 10 bacias sedimentares: Amazonas, Parnaíba, Potiguar, Recôncavo, Sergipe-Alagoas, Jacuípe, Camamu-Almada, Espírito Santo, Campos e Pelotas. Em terra, é oferecido um total de 182 blocos. Destes, sete estão localizados na bacia do Amazonas e 22 na bacia do Parnaíba, alguns bastante próximos aos limites de Terras Indígenas (TI) e Unidades de Conservação (UC).

    Na bacia do Amazonas, os sete blocos oferecidos circundam as áreas de pelo menos 15 TIs, sendo as mais afetadas as TIs Rio Jumas (a 375m de distância do bloco AM-T-131), Trincheira (a 363m do AM-T-132), Gavião (a 364m do AM-T-107 e 2,4km do AM-T-131), Sissaíma (a 174m do AM-T-107), São Pedro (a 616m do AM-T-132) e Miguel/Josefa (a 72m do AM-T-132), todas do povo Mura.

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    Já na bacia do Parnaíba, os blocos estão no entorno de 12 TIs. Dos 22 blocos ali ofertados, seis estão localizados em áreas mais críticas, impactando as TIs Krikati (a 516m de distância do bloco PN-T-113), Governador (a 5,3km do PN-T-98) – que se encontra em processo de reestudo de limites –, Geralda Toco Preto (a 974m do PN-T-65) e Kanela Memortumré (a 185m do PN-T-100 e 640m do PN-T-101), todas dos povos Timbira; as TIs Araribóia (a 552m do PN-T-65), Morro Branco (a 575m do PN-T-98), Cana Brava/Guajajara (a 372m do PN-T-100 e 2,3km do PN-T-84), Rodeador (a 874m do PN-T-100), Bacurizinho (a 1km do PN-T-98) e Lagoa Comprida (a 18,8km do PN-T-84), todas do povo Guajajara; e a TI Caru (a 7,2km do PN-T-46), compartilhada pelos povos Guajajara e Awá-Guajá.

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    Com o início do processo exploratório, serão sentidas fortes mudanças nas dinâmicas de ocupação e uso do solo nessas regiões, como instalação de infraestrutura, construção de vias de acesso e a intensa movimentação de trabalhadores, veículos e maquinário para realização das atividades de prospecção sísmica. Além disso, essas áreas de extrema importância socioambiental e suas populações sofrerão com a derrubada de mata para abertura de picadas e clareiras, e o consequente afugentamento de animais de caça.

    Outros possíveis impactos podem surgir também na fase de produção, como o comprometimento dos recursos hídricos superficiais e subterrâneos, alto índice de emissão de metano e outros gases que provocam o efeito estufa, e a contaminação dos solos por metais pesados e elementos radioativos, com impacto direto na fauna e flora da região.

    Histórico de conflitos

    Nos últimos anos, a ANP tem direcionado investimentos para o avanço de fronteiras terrestres de exploração de petróleo e gás. Esta agenda tem se somado ao quadro de ameaças aos povos indígenas e à integridade de seus territórios, em alguns casos reavivando experiências prévias de conflito.

    Na bacia do Acre-Madre de Dios, recentes prospecções promovidas pela ANP e a oferta de blocos a poucos metros de terras indígenas na 12ª Rodada de Licitações provocaram intensa reação por parte dos povos indígenas do Vale do Javari, que viveram experiências trágicas de conflito durante a atuação da Petrobrás em seus territórios, nas décadas de 1970-80.     

    “Não queremos repetir a história que a Petrobras cometeu nos anos 70 a 80 na região do Vale do Javari, que destruíram nossas malocas, roças, dinamitaram nossos lagos e igarapés envenenando mananciais, causando morte de vários indígenas, contaminaram nossas aldeias com sarampos e DSTs, acúmulo de lixos na selva do nosso território, danificando a fauna e flora, trouxeram malária para a região”, diz a Carta Aberta dos Povos do Vale do Javari Sobre a Ameaça de Projetos Petroleiros no Brasil e no Peru.

    Na bacia do Amazonas, o povo Sateré-Mawé também foi impactado pela exploração de petróleo e gás promovida no âmbito de um convênio entre as empresas Petrobrás e Elf-Aquitaine na TI Andirá-Marau, no início década de 1980. Desta vez, dois dos blocos ofertados pela ANP na 13ª Rodada de Licitações (os blocos AM-T-111 e AM-T-87) estão a 2km desta mesma terra indígena.

    “Entraram como ladrão pela janela, sem bater na porta e perguntar do dono se podiam entrar. (…) Nós, ninguém quer que tire esse petróleo. A terra é como tudo que tem vida. Se tira o sangue, ela morre”, afirmou em 1982 o tuxaua Emílio, liderança do rio Marau, quando do primeiro levantamento sismográfico que visava descobrir lençóis petrolíferos naquela região (depoimento extraído do livro “Sateré-Mawé: os filhos do guaraná”). Essa mesma fragilidade nos processos de consulta de que falava ele persiste ainda hoje.

    Ambos casos citados acima constam no capítulo do relatório da Comissão Nacional da Verdade sobre violações de direitos humanos dos povos indígenas. Apesar deste reconhecimento por parte do Estado brasileiro, e dos direitos assegurados aos povos indígenas do país na Constituição Federal de 1988, a agenda de petróleo e gás imposta pelo governo tem sido pautada pela falta de transparência no que diz respeito à sua interface com os povos indígenas.

    A delimitação dos blocos pela ANP não é acompanhada de processos de consulta àqueles que serão os principais afetados pelas atividades a serem posteriormente desenvolvidas, indo de encontro a preceitos e normas internacionais das quais o Brasil é signatário, como a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas, que versam sobre a necessidade do consentimento livre, prévio e informado antes que sejam adotadas quaisquer medidas que os afetem.

    Nesse contexto, o processo licitatório segue correndo. Segundo o cronograma preliminar disponibilizado pela ANP em sua página, será realizada uma audiência pública no Rio de Janeiro no dia 9 de julho, com objetivo de socializar informações sobre o pré-edital e a minuta do contrato de concessão, cujas versões finais serão publicadas no dia 06 de agosto. O leilão está marcado para o dia 7 de outubro e a assinatura dos contratos está prevista para 23 de dezembro. Segundo o ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga, o governo prevê arrecadar entre 1,5 bilhão e 2 bilhões de reais com a 13ª rodada.

     

     

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  • 06/07/2015

    Durante Assembleia do Cimi/MS, organizações divulgam nota em apoio aos Guarani e Kaiowá

    Nos dias 29 e 30 de junho de 2015, no Centro de Pastoral Indigenista, em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, realizou-se a XXII Assembleia Anual do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) – Regional MS.  A Assembleia, que celebrou “37 anos em defesa da vida dos povos e do direito da Mãe Terra no MS”, contou com a presença de diversas entidades parceiras: representantes de Congregações Religiosas (Franciscanas de Nossa Senhora Aparecida, Catequistas Franciscanas, Irmãzinhas da Imaculada Conceição, Irmãs Lauritas e Freis Franciscanos da OFM), e dos seguintes organismos: CPT (Comissão de Pastoral da Terra), MST (Movimento Sem Terra), CEBI (Centro de Estudos Bíblicos), CDDH (Comissão dos Direitos Humanos – MS), Pastoral Carcerária e representantes indígenas do Conselho Aty Guasu, do Conselho Terena e do Conselho Kinikinau.

    Cleber Buzatto, secretário executivo do Cimi, assessor da assembleia, recordou a missão do Cimi como organismo da Igreja Católica na defesa da vida dos povos indígenas no Brasil. Falou também das dificuldades na conjuntura da política indigenista no país. Dom Dimas Lara Barbosa, arcebispo de Campo Grande, falou da conjuntura eclesial, destacando a necessidade de aprofundarmos nosso conhecimento acerca da Doutrina Social da Igreja, que legitima a missão das pastorais sociais como agentes de transformação da sociedade.

    Os conselhos indígenas de MS denunciaram que a situação na qual vivem os povos indígenas em Mato Grosso do Sul se configura um verdadeiro cenário de ódio e guerra contra suas vidas e seus direitos.

    Durante toda a Assembleia, houve momentos fortes de celebração e recordação da vida dos povos indígenas, de modo especial as comunidades mais vulneráveis. Destacou-se a situação das comunidades Kurusu Ambá e  Guaivyry, ambas do povo Kaiowá e Guarani. Tais grupos vêm sofrendo constantes e violentos ataques dos setores anti-indígenas. Em função de ação violenta dos latifundiários, duas crianças permaneceram desaparecidas por vários dias no final de junho.

    A noite cultural do dia 29 foi o momento de descontração e afirmação de compromisso com os povos tradicionais.  A assembleia foi agraciada e pode participar das apresentações culturais do povo terena, representado pela comunidade Tumone Kalivono com as danças da ema e do bate pau.

    A assembleia foi encerrada com a celebração eucarística presidida por Pe. George Lachnitt, diretor do Núcleo de Estudos e Pesquisas das Populações Indígenas da Universidade Católica Dom Bosco (NEPPI/UCDB). Na celebração, foi acolhido mais um missionário para os trabalhos do Cimi. Na oportunidade, a equipe missionária reafirmou seu compromisso com a causa indígena na defesa da Vida desses povos, contra todos os tipos de ameaças que existe em suas rotinas. “Para que todos tenham vida e a tenha em abundância …”

     

    Os organismos presentes firmaram o documento abaixo:

     

    Nota de repudio aos ataques e violações cometidos pelo Ruralismo Organizado, pelos órgãos de segurança e pelo Estado contra o povo Guarani e Kaiowá no Mato Grosso do Sul

    Presentes na XXII Assembleia do Conselho Indigenista Missionário – Regional MS, nós, representantes do CIMI, MST, CEBI, CPT, TPT, Pastoral Carcerária, CDDH, Congregações Religiosas e organizações, que atuam em nome da vida e pela garantia dos Direitos Humanos:

    DENUNCIAMOS E REPUDIAMOS: O ataque armado e covarde de caráter paramilitar, orquestrado e levado a cabo pelo ruralismo no dia 24 de junho de 2015. Através dos Sindicatos Rurais, FAMASUL e com apoio do D.O.F – Departamento de Operação de Fronteira, mais de 100 fazendeiros participaram do ataque, ocasião em que queimaram o acampamento dos Guarani e Kaiowá e dispararam contra os indígenas desarmados. A comunidade de Kurusu Ambá retomou parte do território reivindicado como tradicional e ancestral, ilegalmente ocupado pela fazenda denominada “Madama”. Nos últimos dez anos, pelo menos sete lideranças do povo Guarani e Kaiowá foram assassinadas por jagunços da região, entre elas a rezadora Xurite Lopes, de 74 anos. O ataque do dia 24 culminou com o desaparecimento de duas crianças indígenas, encontradas cinco dias depois em estado de saúde debilitado.

    DENUNCIAMOS E REPUDIAMOS: A atitude de omissão da Polícia Federal que, mesmo após determinação do Ministério Público Federal (MPF), negou-se, por dois dias consecutivos (23 e 24 de junho de 2015), a montar efetivo para acompanhar a retirada dos bens dos arrendatários da sede da fazenda Madama. A postura da Polícia foi determinante para que os ruralistas obtivessem condições objetivas de praticar a ofensiva criminosa contra as famílias indígenas. Denunciamos e repudiamos ainda as ações de caráter protecionista que a Polícia Federal continua tendo para com o ruralismo organizado, negando-se, no caso do ataque da fazenda Madama, a registrar Boletim de Ocorrência dos fatos, em especial do desaparecimento de duas crianças, e dificultando até mesmo o órgão indigenista oficial, a Funai, a tarefa de propiciar às famílias indígenas o direito do registro, apuração e acompanhamento do ocorrido.

    DENUNCIAMOS E REPUDIAMOS: A forma oportunista e lamentável como deputados, políticos e lideranças ruralistas se organizam abertamente – através dos sindicatos rurais e da ASSOMASUL – para promover discursos de ódio e terror contra os povos indígenas, incitando produtores a “fazer justiça com as próprias mãos”, como registrado publicamente na fala do latifundiário e deputado Zé Teixeira. Denunciamos e repudiamos a forma com que estas elites ruralistas tentam impedir ou prejudicar a atuação de órgãos federais na garantia dos Direitos Humanos e na igual garantia da segurança das comunidades indígenas. Em mobilização de similar caráter, os ruralistas tentaram realizar o que chamaram de “Leilão da Resistência”. Com a venda de gado, pretendiam arregimentar milícias com a intenção de atacar os povos indígenas.

    DENUNCIAMOS E REPUDIAMOS: O visível e notório aparelhamento da estrutura do Estado de Mato Grosso do Sul a favor do ruralismo criminoso. É sabido que o próprio governador em exercício coloca à disposição dos produtores rurais o uso da policia estadual (D.O.F) e da máquina jurídica estatal para garantir a continuidade da colheita das lavouras de soja e milho plantadas em áreas tradicionais e originárias identificadas, reclamadas e retomadas pelos povos indígenas.

    DENUNCIAMOS E REPUDIAMOS AINDA: A política anti-indígena implementada pelo governo federal impondo que todos os procedimentos de demarcação de terras fossem paralisados, raiz causadora dos conflitos agrários e do constante estágio de genocídio vivenciado pelos povos indígenas no Mato Grosso do Sul. Com a medida, o Poder Executivo brasileiro age inconstitucionalmente abraçando a determinação do Poder Legislativo (lê-se, em especial, bancada ruralista) no ataque aos direitos indígenas expressas sobretudo nas tentativas de aprovação da PEC 215, PL 227, PL 1216 entre tantas outras manobras. Kurusu Ambá tem seu processo de estudo e demarcação paralisado politicamente pelo governo federal, enquanto isso as famílias ficam sujeitas aos ataques criminosos dos ruralistas em seu próprio território. 

    Denunciamos, de forma acentuada, o empenho do ministro da Justiça José Eduardo Cardozo em mais uma vez garantir a total falta de segurança dos indígenas e seus territórios ao tentar impedir, ou ao menos dificultar, a ação da Força Nacional no que diz respeito a prevenção de novos ataques contra as comunidades de Kurusu Ambá e Guaivyry. Vale o registro que a atuação da Força Nacional foi requisitada diretamente pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados.   

    FRENTE A ESTA SITUAÇÃO, DECIDIMOS:

    Manter e intensificar nosso total e irrestrito apoio na defesa da vida e do direito dos povos originários, sobretudo o direito à demarcação de seus territórios e anunciamos que continuaremos vigilantes e organizados para denunciar e levar ao conhecimento das cortes nacionais e internacionais qualquer forma de violência que venha a ser praticada contra os povos originários, tanto na forma de ataques paramilitares, quanto de omissão institucional.

    Conselho Indigenista Missionário – CIMI-MS

    Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais Sem Terra – MST

    Centro de Estudo Bíblicos – CEBI

    Comissão da Pastoral da Terra – CPT

    Tribunal Popular da Terra – TPT

    Pastoral Carcerária

    CDDH – Centro de Defesa da Cidadania e dos Direitos Humanos Marçal de Souza Tupã-i – MS

    Congregações Religiosas: Franciscanas de Nossa Senhora Aparecida – Regional MS; Catequistas Franciscanas, Irmãzinhas da Imaculada Conceição

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