• 13/08/2015

    Indígenas ocupam Ministério da Justiça e exigem presença de ministros

    Cerca de 100 indígenas Guarani dos povos Kaiowá, Mbyá e Nhandeva; Terena, Kaingang, Kinikinau, Atikum e Kadiwéu ocupam o auditório Tancredo Neves, no Ministério da Justiça e afirmam que não sairão até serem recebidos pelo ministro da Justiça José Eduardo Cardozo, por Miguel Rosseto, da Secretaria-Geral da Presidência, pelo presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), João Pedro Gonçalves e por Antonio Alves, o secretário da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai). As autoridades haviam confirmado a reunião com os indígenas nesta quinta-feira (13) às 10h30, mas não compareceram alegando que foram chamados pela presidente Dilma Rousseff. Na agenda da presidente, no entanto, constam apenas uma reunião às 11h30 com o presidente Mundial da Unilever, Paul Polman, e às 15h encontro classificado como “Diálogo com Movimentos Sociais Brasileiros”.

    O deputado Paulo Pimenta (PT-RS), presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados (CDHM), acompanha a manifestação. O grupo afirma que permanecerá no Ministério até serem recebidos para entregar a pauta de reivindicações. “Tínhamos confirmado a audiência e quando chegamos fomos informados que não iriam mais nos receber. A delegação decidiu que, enquanto não cumprirem o que eles prometeram, vamos permanecer no Ministério da Justiça. Vamos tratar principalmente da questão territorial, queremos uma resposta concreta do Executivo, porque só cabe ao Poder Executivo resolver isso. O Executivo tem que fazer o que a Constituição manda fazer, e não tentar adivinhar as coisas, alegando que se fazer o que a Constituição manda os fatores políticos vão acabar por anular ou judicializar os processos”, explica Lindomar Terena.

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  • 12/08/2015

    Juiz estadual determina reintegração de posse em terra indígena do povo Mura

    1. Lideranças indígenas do povo Mura da comunidade de Murutinga, localizada no município de Autazes (AM), a 107 quilômetros de Manaus, estão recorrendo ao Ministério Público Federal (MPF) para que interponha recurso contra decisão judicial que reintegração de posse em favor de uma cooperativa. No último dia 7, um dos moradores, Lucicláudio Santos Duarte, recebeu de um oficial de justiça o mandado de reintegração de posse com prazo de 15 dias para a saída de apenas três moradores indígenas numa localidade com moradores de mais de 50 famílias.

    O mandado foi expedido pelo juiz estadual Glen Hudson Paulain Machado, da Comarca de Autazes, em favor da Cooperativa de Produtores Leite de Autaz Mirim (Cooplam), que se diz proprietária de uma área de aproximadamente 1,75 hectares dentro da terra indígena Murutinga.

    Há pouco mais de um mês, o local foi palco de uma ação da Polícia Militar e Guarda Municipal de Autazes que resultou na agressão contra vários indígenas, na prisão de três mulheres e que por pouco não teve desfecho trágico depois que um dos policiais disparou a esmo dois tiros de revólver.

    Com o pedido ao MPF, os indígenas pretendem transferir a competência da ação para a esfera federal, uma vez que a terra indígena é patrimônio da União. Murutinga tem 13.276 hectares e uma população de aproximadamente 1.700 pessoas. O resumo do relatório circunstanciado de identificação e delimitação da Terra Indígena Murutinga foi publicado no Diário Oficial da União, em 01 de agosto de 2012, por meio do Despacho nº 422. Em 2013, por força de ação civil pública do MPF, a juíza da Primeira Vara Federal, Jaíza Maria Pinto Fraxe, determinou ao governo federal a imediata demarcação de Murutinga sob pena de pagamento de multa diária. A Funai recorreu da decisão, e desde aquela data o processo demarcatório estancou. 

    Segundo Lucicláudio Santos Duarte, um dos citados no mandato de reintegração de posse, “nesses últimos tempos os moradores de Muturinga vêm sofrendo muitas perseguições por parte de fazendeiros, de “mestiços" e até de madeireiros”. A ocupação por parte de não indígenas tem sido seguida de desmatamento e utilização das terras para pastagem de búfalos. De acordo com denúncias feitas pelos indígenas, os animais causam destruição às plantações, poluição dos rios e igarapés e a destruição dos berçários de peixes.  “A comunidade não tem de onde retirar recursos para se alimentar e trabalhar”, reclama o vice cacique de Murutinga, Martinho Gomes da Silva.

     

     

     

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  • 11/08/2015

    MPF ajuíza ação para que Ministério da Justiça decida demarcação da Terra Indígena Taunay-Ipegue

    O Ministério Público Federal (MPF) em Mato Grosso do Sul pediu à Justiça que obrigue o ministro José Eduardo Cardozo a se posicionar, em 30 dias, sobre o processo de demarcação da Terra Indígena (TI) Taunay-Ipegue, localizada no município de Aquidauana. Segundo a legislação, os estudos demarcatórios realizados pela Funai devem ser analisados pelo Ministério da Justiça (MJ) no prazo de 30 dias, mas o procedimento está parado no órgão há mais de 6 anos.

    A ausência de decisão do MJ tem acirrado o conflito fundiário na área e em todo o estado, com violências e ameaças por parte de índios e não índios. Nos últimos dois anos, ao menos um homicídio e duas tentativas de homicídio de índios terena ocorreram em MS e cinco propriedades de terras foram retomadas pela etnia.

    Para o Ministério Público Federal, a inércia da administração prejudica todos os envolvidos no conflito. “Os produtores rurais não-índios ficam privados das indenizações devidas e dos reassentamentos de direito, que dependem dessa manifestação do Ministro da Justiça. Permanecem sujeitos a constantes ocupações e conflitos, sem uma definição formal acerca da questão. Os índios, por sua vez, continuam sem o pronunciamento conclusivo sobre os limites das terras, em reiterados embates com os agricultores e disputas internas em razão do espaço exíguo”.

    Na visão do procurador da República Emerson Kalif Siqueira, a situação é grave e necessita de resposta imediata da Administração Federal. “Um embate armado de grandes proporções é iminente e a tomada de posição pelo Ministério da Justiça, em cumprimento ao prazo legal para decidir, é indispensável e urgente.”

    TI Taunay-Ipegue

    O pedido de revisão dos limites territoriais da Terra Indígena Taunay-Ipegue iniciou em 1985, há mais de 30 anos. Em 1999, os estudo demarcatórios começaram a ser realizados na região pela Funai e foram concluídos em 2004. O Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação da área concluiu pela existência de uma terra tradicional de 33.900 hectares e perímetro de 78.500 m².

    O relatório foi objeto de manifestação dos interessados e a Funai se posicionou sobre todas as contestações, encaminhando o Procedimento nº 08620.000289/85 ao Ministério da Justiça em 2009, com proposta de expedição de portaria declaratória. O prazo para manifestação ministerial era de 30 dias, mas há 6 anos nenhuma posição foi tomada.

    Liminar chegou a suspender a demarcação por mais de 3 anos. Contudo, após a revogação da medida, o processo ficou à disposição do ministro por 2 anos e 10 meses para decisão – prazo 34 vezes maior que o previsto no Decreto 1.775/96 – e novamente o MJ permaneceu inerte.

    A situação é agrava ainda pelo considerável crescimento da população da Terra Indígena Taunay-Ipegue. Em 2004, eram 3.880 índios, hoje já somam mais de 5.500 pessoas em uma área de apenas 6.461 hectares. Em média, são 6,8 hectares por família, quantidade de terra insuficiente, se ponderada a qualidade do solo da região, já localizada no Pantanal.

    “A omissão da Administração Federal é ilegal e abusiva e faz com que índios e não-índios recorram ao uso da força para defender seus interesses, colocando em risco a vida de todos”, destaca o MPF na ação.

    A demanda judicial, com pedido de liminar, tramita na 2ª Vara da Justiça Federal em Campo Grande. Referência Processual na Justiça Federal de Campo Grande: Autos nº 0008916-21.2015.4.03.6000

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  • 11/08/2015

    Especialista da ONU exorta o Brasil a não despejar povos indígenas Guarani e Kaiowá de suas terras

    A especialista independente das Nações Unidas, Victoria Tauli-Corpuz, exortou o governo do Brasil “a garantir que os direitos humanos dos povos indígenas Guarani e Kaiowá sejam plenamente respeitados, em estrita conformidade com as normas internacionais que protegem os direitos dos povos indígenas”.

    A relatora especial sobre os Direitos dos Povos Indígenas manifestou profunda preocupação com os relatos de que a polícia está preparada para despejar à força os povos indígenas Guarani e Kaiowá de suas Tekohas (terras tradicionais), no estado do Mato Groso do Sul, na região oeste do Brasil. Cerca de 6 mil indígenas se recusam a deixar suas Tekohas, e advertiram que pretendem resistir ao despejo “até a morte”.

    Policiais civis supostamente se deslocaram a diversas comunidades indígenas no sábado, 8 de agosto. Apesar de não ter ocorrido nenhum despejo, as comunidades temem que a presença da polícia indique uma intenção de executar as ordens de despejo emitidas em julho de 2015 pela Justiça Federal.

    “Os povos indígenas não devem ser removidos à força de suas terras ou territórios”, afirmou a Tauli-Corpuz, lembrando a Declaração da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas (*). “Nenhuma realocação deve ocorrer sem o consentimento livre, prévio e informado dos povos indígenas interessados ​​e sem um acordo prévio sobre uma indenização justa e equitativa e, sempre que possível, com a opção do regresso.”

    “Dada a situação contínua de insegurança e desconfiança no estado do Mato Groso do Sul, incluindo questões de longa data não resolvidas sobre a posse de terras tradicionais e padrões contínuos de violência, temo pela segurança e proteção dos povos indígenas afetados, caso aconteça este despejo”, salientou a relatora especial da ONU.

    Os Guarani e Kaiowá estão envolvidos em uma luta de décadas para recuperar os seus direitos sobre terras ancestrais que estão agora em grande parte sob o controle de ocupantes não indígenas. Isto levou a ataques violentos contra as comunidades indígenas por milícias supostamente pagas por agricultores e proprietários de terras não indígenas, os quais têm interesses comerciais muito significativos na região, em grande parte relacionados com o agronegócio em escala industrial.

    Existem informações de que milícias estão sendo utilizadas para atacar e intimidar as comunidades, numa campanha para espalhar terror psicológico e garantir que as comunidades cumpram com a ordem de despejo. Isto é supostamente parte de um padrão de conflito e violência de longa data entre comunidades indígenas e proprietários de terras, o que levou à morte de mais de 290 indivíduos Guarani e Kaiowá, incluindo líderes, desde 2003.

    Durante séculos, os povos indígenas Guarani e Kaiowá vivem no estado do Mato Groso do Sul. No entanto, a capacidade de viver em suas terras tradicionais foi reduzida no último século. Na década de 1920, muitas comunidades indígenas foram removidas à força pelo estado para as chamadas “reservas indígenas”. Na década de 1940, outras foram ainda realocados de suas terras tradicionais para dar lugar a ocupantes não indígenas que vieram para a região engajar-se em atividades de agronegócio em larga escala.

    Hoje, muitos Guarani e Kaiowá continuam lutando pelo reconhecimento oficial de suas terras tradicionais e pelo direito de  viver nelas, apesar de enfrentarem crises humanitárias relativas ao acesso a alimentos, água potável e serviços de saúde.

    (*) Ver a Declaração da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas: www.ohchr.org/EN/Issues/IPeoples/Pages/Declaration.aspx

    A relatora especial sobre os Direitos dos Povos Indígenas, Sra. Victoria Tauli-Corpuz (Filipinas), é uma ativista de direitos humanos que trabalha com os direitos dos povos indígenas. Há mais de três décadas seu trabalho foca na criação de alianças entre os povos indígenas e também entre as mulheres. Tauli-Corpuz trabalhou como instrutora em educação em direitos humanos, desenvolvimento e povos indígenas em vários contextos. Ela é membro do povo indígena Kankana-ey, Igorot na região Cordillera, nas Filipinas. Como relatora especial, é independente de qualquer governo ou organização e exerce seu trabalho em caráter individual. Para mais informações, consulte: www.ohchr.org/EN/Issues/IPeoples/SRIndigenousPeoples/Pages/SRIPeoplesIndex.aspx

    Os relatores especiais fazem parte do que se conhece como procedimentos especiais do Conselho de Direitos Humanos. Os Procedimentos Especiais formam o maior corpo de especialistas independentes no sistema de direitos humanos das Nações Unidas, e é o nome atribuído aos mecanismos de inquérito e monitoramento independentes do Conselho, que trabalha sobre situações específicas de cada país ou questões temáticas em todas as partes do mundo. Os especialistas em Procedimentos Especiais trabalham a título voluntário; eles não são funcionários da ONU e não recebem salário pelo seu trabalho. São independentes de qualquer governo ou organização e prestam serviços em caráter individual.

    Foto: Crianças Guarani e Kaiowá do Mato Grosso do Sul | ABr/Wilson Dias

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  • 11/08/2015

    Povos indígenas de Roraima realizam marcha e denunciam invasões a territórios homologados

    Na ocasião do Dia Internacional dos Povos indígenas, comemorado no último dia 9, o movimento indígena e suas organizações políticas realizaram a IV Marcha dos Povos Indígenas de Roraima. Sobretudo por celebrar a data como marco de resistência ao projeto estatal colonizador, em sua face desenvolvimentista, a marcha foi em protesto por direitos, como o território, a educação e a saúde, além de denunciar as sucessivas tentativas das oligarquias, em conluio com o governo federal, de usurpar territórios já homologados.

    “Pacaraima e Uiramutã foram municípios criados para desestabilizar a demarcação das TI São Marcos e Raposa Serra do Sol. A sede de Pacaraima tem crescido e se alastrado para dentro das comunidades indígenas, provocando impactos negativos socioculturais, ambientais, econômicos. Queremos providências para sanar tal ilegalidade e a reintegração de posse para as comunidades indígenas”, diz trecho da carta da marcha divulgada pelo movimento indígena.

    O documento denuncia ainda projetos no Legislativo e no Executivo que visam desconstruir o direto à posse dos povos indígenas de suas terras tradicionais, caso da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215, e pede que o Ministério Público Federal (MPF) investigue a utilização dos recursos do Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei) Yanomami, alvo de denúncias, com provas em áudio e vídeo, de desvio de verbas para camarilhas políticas de não-indígenas.

    Leia na íntegra a carta:

     

    MANIFESTO DA IV MARCHA DOS POVOS INDÍGENAS DE RORAIMA

    PELO DIA INTERNACIONAL DOS POVOS INDÍGENAS

    Nós, povos indígenas de Roraima e suas organizações indígenas, com apoio e solidariedade do Movimento Social em Roraima, em reafirmação dos direitos dos Povos Indígenas e considerando a situação de vulnerabilidade e instabilidade dos direitos humanos dos povos indígenas, considerando o dia 09/08 o Dia Internacional dos Povos Indígenas, vimos expressar nossa indignação e cobrar a atenção e medidas necessárias das autoridades públicas para as seguintes situações:

    O Direito a Educação Escolar Indígena é um direito fundamental estabelecido pela Constituição Federal de 1988. A situação da Educação escolar indígena é precária, apesar de receber verbas públicas federais não tem construções de escolas e nem reformas, ou melhorias. A maioria das escolas indígenas são estruturas construídas pelas próprias comunidades e com recursos delas próprias. Agravado a isso, a Secretária Estadual de Educação excluiu toda Modalidade de Educação Indígena do Plano Estadual de Educação e enviou para Assembleia Legislativa para que fosse aprovado sem considerar os direitos indígenas e políticas especificas para a educação escolar indígena, excluindo o que já havia sido discutido previamente em 2013 com as lideranças indígenas; Assim reivindicamos: – Que Governo cumpra as recomendações dada pelo Ministério Público (P.P.Nº 1.32.000.000480/2015-34); – Que a Assembleia Legislativa inclua no Plano Estadual de Educação a proposta discutida em 2013 que garante a Modalidade relativa a Educação Escolar Indígena; – Que se apure se a Secretaria de Estadual de Educação age com discriminação institucional no atendimento as comunidades indígenas pela negação dos direitos constitucionais; – Que a Secretária Estadual de Educação seja substituída por uma Secretária que possa atender a todos com respeitos e sem discriminação por ser indígena.

    Os Projetos de Emendas Constitucionais 215, 227 e 071 colocam em risco a vida dos Povos Indígenas. São inconstitucionais e visam o interesse individual, econômico e politiqueiro. O Estado de Roraima deve aprender a trabalhar com a realidade local e adequar o plano de desenvolvimento a partir dos direitos indígenas. Por isso, pedimos a rejeição da PEC 215, 227 e 071;

    As terras indígenas infelizmente são vistas somente com olhar de cobiça e da exploração devastadora. O exemplo disso são as invasões constantes às terras indígenas, e outras que ainda insistem em permanecer em nossas terras, como caso na TI Anaro, na região Amajari, TI Raposa Serra do Sol e TI Yanomami. Queremos que haja celeridade para a retira das invasões existentes nas terras indígenas;

    Pacaraima e Uiramutã foram municípios criados para desestabilizar a demarcação das TI São Marcos e Raposa Serra do Sol. A sede de Pacaraima tem crescido e se alastrado para dentro das comunidades indígenas, provocando impactos negativos socioculturais, ambientais, econômicos. Queremos providências para sanar tal ilegalidade e a reintegração de posse para as comunidades indígenas.

    Recentemente, políticos de Roraima investem em mais disputa sobre as terras indígenas propondo a criação de um Parque Nacional do Lavrado sobreposto a TI São Marcos, TI Santa Inês, TI Yanomami e TI Raposa Serra do Sol. Somos contra a criação de Unidade de Conservação dentro das terras indígenas porque temos o usufruto exclusivo permanente e cuidamos da biodiversidade e da terra a partir da relação de proteção ao meio ambiente que vivemos;

    Queremos maior atenção à saúde indígena porque esta vive em crise permanente, ameaçando a organização social e a cultura indígena. O governo deve garantir uma saúde de qualidade, com equipamentos, postos, medicamentos e profissionais devidamente capacitados, com prioridade para os profissionais indígenas das próprias comunidades, como agentes de saúde, microscopistas, técnicos de enfermagem, laboratório, e profissionais de nível superior. Que a CGU e Ministério Público Federal analisem os recursos destinados ao DSEI-Leste e DSEI-Yanomami e recomendem medidas para melhoria.

    Que a Presidenta da República Dilma não negocie os direitos indígenas por acordos políticos e favorecidas ao agronegócio. As demarcações das terras indígenas devem ser priorizadas e concluídas para garantir a vida dos povos indígenas.

    Abaixo assinamos

    Boa Vista-RR, 10 de agosto de 2015.

     

    Conselho Indígena de Roraima – CIR

    Organização dos Professores Indígenas de Roraima – OPIR

    Sociedade para Desenvolvimento Comunitário e Qualidade Ambiental – TWM

    Associação do Povo Yekuana do Brasil – APYB

    Organização das Mulheres Indígenas de Roraima – OMIR

    Associação dos Povos Indígenas da TI São Marcos – APITSM

    KAPOI

    Hutukara Associação Yanomami – HAY

    Conselho Indigenista Missionário – CIMI-Norte

    Diocese de Roraima

    Instituto Socioambiental – ISA

    Insikiran

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  • 11/08/2015

    Justiça multa Funai por não cumprir ordem para seguir demarcação de terra indígena Munduruku

    Atendendo a pedido do Ministério Público Federal, a Justiça Federal de Itaituba intimou a Fundação Nacional do Índio sobre o descumprimento de uma sentença judicial que ordenava o prosseguimento da demarcação da Terra Indígena Sawré Muybu, dos índios Munduruku. Com a intimação, a Funai passa a pagar multa de R$ 3 mil por dia de descumprimento da decisão, a contar pelo dia 6 de agosto, quando a sentença deveria ser cumprida.

    “Intime-se a Funai, com advertência de que deverá se pronunciar imediatamente acerca da aprovação ou não do Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação (RCID) da Terra Indígena Sawré Muybu realizado pelo Grupo Técnico, sob pena de responsabilizações pessoais dos gestores da Fundação”, diz a intimação enviada à Funai. Essa é a terceira manifestação de um juiz federal no processo confirmando o entendimento do MPF de que a demarcação deve prosseguir.

    Na mesma decisão, o juiz Pedro Maradei Neto recebeu a apelação da Funai contra a sentença, mas apenas com efeito devolutivo. Isso significa que o recurso da Fundação contra a demarcação da terra indígena vai ser apreciado pela Justiça, mas enquanto isso a sentença tem que ser obedecida com a publicação do RCID.

    A publicação do Relatório vem sendo adiada desde 2013. Nos argumentos oficialmente apresentados à Justiça, a Funai alega que a prioridade nas demarcações atualmente é dada aos territórios indígenas nas regiões sul e sudeste do país e que não há disponibilidade orçamentária para a região amazônica.

    Para o MPF, o argumento não se sustenta porque não há necessidade de orçamento para publicar um relatório, a verba pública nesse caso já foi aplicada, na confecção do estudo. “Desperdício de dinheiro público seria continuar com o relatório engavetado, depois de todo o investimento e diante da violação de um direito constitucional dos indígenas”, diz o procurador da República Camões Boaventura, responsável pelo processo.

    Em uma reunião com os índios Munduruku, gravada por eles e incluída no processo, a então presidente da Funai, Maria Augusta Assirati, admitiu abertamente que a demarcação só estava paralisada por pressão do setor elétrico do governo federal, que pretende construir a usina São Luiz do Tapajós alagando a terra indígena.

    O processo tramita na Vara Federal de Itaituba com o número 1258-05.2014.4.01.3908

    Foto: Ruy Sposati

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  • 10/08/2015

    Indígenas do MS e RS protestam em frente ao Palácio do Planalto por direitos territoriais

    Uma centena de indígenas de sete povos do Sul do país e Mato Grosso do Sul fecharam hoje a avenida em frente ao Palácio do Planalto. Os Guarani dos povos Kaiowá, Mbyá e Nhandeva, os Terena, os Kaingang, os Kinikinawa, os Kadiwéu e os Aticum estão não apenas em Brasília para dizer aos representantes dos três poderes que estão vivos, exigindo seus direitos, mas estão principalmente para desmentir as estatísticas e desejos de que não mais existissem. Foi assim no passado autoritário e ditatorial, continua assim hoje.

    Na década de 1970 os militares no poder quiseram acabar com os povos indígenas através de um canetaço, da “emancipação”. Hoje pretendem eliminar os direitos indígenas através de projetos de lei (PEC 215/00, PL 1610/96 entre outros), portarias e decretos (303/12, 7957/13), interpretações restritivas dos direitos indígenas da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal, dentre inúmeras outras iniciativas anti-indígenas.

    Resistência e lutas indígenas

    Os povos indígenas fecharam a avenida  em frente ao Planalto para dizer em alto e bom tom que o país não está cumprindo sua obrigação de garantir os direitos indígenas que estão na Constituição. Não exigem o Brasil de volta, como desaforadamente alguns tentam fazer crer. Os índios no Sul do país e Mato Grosso do Sul estão apenas exigindo o reconhecimento de um pouco mais de 1% de seus territórios tradicionais.

    Quando na década de 1970 se dizia que a solução final era decretar a não mais existência de índios “na região mais rica do país”, eis que surge o grito de insurreição e recuperação das terras Kaingang, Guarani, Terena, num processo que propaga como flecha incendiária, e tem hoje suas reinvindicações e lutas em Brasília. Os poderosos encastelados em seus entapetados palácios, pouco se importam se os indígenas nas regiões mais ricas do país, sejam jogados à beira da estrada e padeçam todo tipo de sofrimento, sem seus direitos de viver em paz e conforme seus valores e projetos de vida.

    É escandalosa essa incompreensão dos setores dominantes do país. Os povos originários exigem que se cumpram as leis. Nada mais do que isso. Os parcos recursos e a total apatia em resolver o problema das terras dos povos indígenas desta região nos dão conta do quanto esse país é injusto quando destina gordas verbas para setores privilegiados e sovina as migalhas  para os povos originários e os oprimidos de um país de grandes riquezas e enormes misérias. É para dizer um basta a essa história que eles estão em Brasília.

    Enquanto uma expressiva delegação de indígenas Guarani, Kaiowá e Nhandeva do  Mato Grosso do Sul estão aqui se manifestando, cinco acampamentos em seus tekohá correm o risco de serem despejados de um momento para outro.  São eles:Tey Juçu, Ita Gua, Kurusu Ambá, Guaiviry e Apikay.  Qualquer ação armada contra essas comunidades, seja com pistoleiros, seja com as forças policiais do estado, não passarão impunes. Denunciarão as violências às cortes internacionais.

    A escola é aqui

    Vale destacar que dos participantes desse momento de mobilização pelos seus direitos, estão mais de 30 professores indígenas. No entender dessa delegação, a luta pelos seus direitos e de seus alunos passa pela luta pela terra, em primeiro lugar. Aqui estão juntamente com seus líderes religiosos e políticos, com os guerreiros e guerreiras. Como dizia um professor Xukuru de Pernambuco, “a escola deve ser uma formadora de guerreiros”.  Como dizia um professor indígena no início da mobilização,  “precisamos desconstruir a visão colonial que nos impuseram”.

    Fotos: Carolina Fasolo

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  • 10/08/2015

    Presidente da Funai na fronteira com o Paraguai

    Não é por acaso ou fortuitamente que o novo presidente da Funai, João Pedro, do PT do Amazonas, vem ao Mato Grosso do Sul, logo no início de sua gestão. Com dois meses no cargo teve seu primeiro embate com uma delegação indígena.  Os Pataxó, em cujo território iniciou a invasão do até então desconhecido continente, Ameríndia. Depois de mais de 500 anos de resistência, não mais acreditam em promessas ou falas enganosas feitas pelos neocolonizadores e exterminadores dos povos originários.

    Mas seus representantes continuam insistindo e jurando que estão bem intencionados, mesmo repetindo as velhas mazelas de tutores com ares de superioridade.

    Por que vem correndo até o Mato Grosso do Sul? Para resolver o gravíssimo problema da demarcação das terras indígenas ou para socorrer a Biafra brasileira como é conhecida a região de pior violência e negação dos direitos indígenas? Se nos governos Lula e Dilma tivessem demonstrado vontade política em resolver o problema, que sabidamente não é fácil, mas absolutamente factível, certamente os povos indígenas da região, especialmente os Kaiowá Guarani e os Terena, não continuariam vendo suas lideranças diariamente ameaçadas e assassinadas.

    Mas por que então João Pedro vem à região?  Será por que as Olimpíadas vêm aí e a imagem do país mão pode estar manchada ou conspurcada por ações ao arrepio da lei e dos direitos, violando a Constituição?

    Uma coisa é certa. Não é por falta de conhecimento da realidade que se está deixando de agir em favor da vida dos povos indígenas da região e do país. Pilhas de relatórios e documentos devem estar entulhando as gavetas dos senhores dos três poderes. É obstinação em não cumprir a lei em favor dos historicamente oprimidos e rejeitados povos originários.

    A boa vontade ao avesso

    Existe boa vontade e disposição para resolver essa situação que envergonha a todos nós cidadãos desse país? Que falem os fatos. A instalação de uma mesa de diálogo foi a única forma encontrada pelo ministro da Justiça para tentar resolver a demarcação da terra indígena Buriti. Depois de dois anos, os fazendeiros deram uma banana ao ministro e um adeus à solução por negociação e diálogo. Quando, no governo Lula, houve um tímido passo para começar a resolver o problema fundiário, sinalizando para a indenização e compra de terras, a Famasul se dispôs a fazer o levantamento das terras que estariam à disposição para serem compradas. Um número ínfimo de proprietários se dispôs a vender as terras. E assim poderíamos levantar inúmeros fatos que sinalizam claramente que o que não se quer é que a Constituição seja cumprida e as terras indígenas sejam demarcadas. Salta à vista que o que prevalece é uma boa vontade às avessas.

    CPI contra o Cimi

    Diante do quadro desolador e vergonhoso, da violência genocida, da discriminação e racismo, é preciso achar um bode expiatório.  Repete-se a mágica de quase meio século. Realiza-se uma Comissão Parlamentar de Inquérito. Forjam-se acusações falaciosas, mentiras são plantadas como verdades.

    “Em outra vertente, a Assembleia Legislativa deve averiguar denúncias contra o Cimi (Conselho Indigenista Missionário) que, além de incitar invasões, tem orquestrado o confronto armado, colocando em risco a vida de índios e não índios” (Afirmações da deputada estadual Mara Caseiro, Ponta Porã Digital 7/08/15).

    João Pedro em Guaivyri e Ypoi

    O presidente da Funai visita duas aldeias onde foram utilizadas as mesmas estratégias de assassinar e ocultar o cadáver como forma de dificultar a elucidação dos crimes. Até hoje o corpo do professor Rolindo Vera, do Ypoí e do cacique Nizio Gomes, do Guayviri, não foram encontrados.

    Ao passar pelos acampamentos certamente será impactado pela extrema pobreza e dificuldades em que sobrevivem essas populações. Trata-se de um quadro estarrecedor, radicalmente diferente da maioria dos povos indígenas da Amazônia que pelo menos tem seus territórios demarcados.

    É possível que o presidente da Funai saia sensibilizado com a situação daquelas comunidades. Mas é preciso mais do que isto. Este deve enfrentar a burocracia e os interesses políticos e econômicos e empenhar-se para minorar a gravidade da situação.

    Aos povos indígenas resta a resistência ativa, no caminho para seus tekohá, suas terras tradicionais. Para isso contam com a solidariedade nacional e internacional, com a força dos Nhanderu e de seus guerreiros.

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  • 10/08/2015

    Na Bahia, rebeldia e memória dos povos do campo reafirmam luta por ruptura sistêmica

    Em um contexto de crise sistêmica, aqueles que sempre protagonizaram os maiores atos de resistência contra a força do poder hegemônico tomam a vez e a palavra em espaço acadêmico. Representantes de povos e comunidades tradicionais e de movimentos de luta pela terra adentram uma universidade em greve para falar de suas lutas, de seus sofrimentos e, acima de tudo, de suas conquistas: ensinamentos indispensáveis aos setores da sociedade que hoje se mobilizam contra os desmandos dos poderes estatais.

    Na tarde do último dia 7, representantes de diversas comunidades e povos tradicionais, movimentos, organizações e entidades sociais, além de pesquisadores, militantes, juristas e acadêmicos, unidos na luta pela terra, estiveram presentes no Instituto de Geociências da Universidade Federal da Bahia (IGEO/UFBA) para debater as diversas experiências de conflito no campo nos últimos anos. Este evento, o “GEOGRAFANDO NAS SEXTAS: O Campo Baiano em Debate”, com o tema “30 anos de memória e rebeldia dos povos do campo”, foi realizado pelos Programas de Pós-graduação em Geografia e em Economia da UFBA através do Projeto GeografAR, CPT, AATR, CEAS e EXPOGEO. Nesta ocasião foram também lançados o “Caderno de Conflitos no Campo, Brasil – 2014” organizado pela Comissão Pastoral da Terra (CPT); e o “Relatório: Violência contra os povos indígenas no Brasil – Dados de 2014”, do Conselho Indigenista Missionário (Cimi).

    Após a introdução e agradecimentos feitos pela professora Guiomar I. Germani do Projeto GeografAR, da UFBA, o Frei Luciano Bernardi, da CPT, fez uma apresentação sucinta e intensa dos conteúdos do “Caderno de Conflitos no Campo, Brasil, 2014”. Seguiu-se a ele o relato sensível de Maria Aparecida, do Assentamento Puxim/Sarampo, sobre sua trajetória, desde a infância, como assentada, marcada pelo conflito, ameaças e mortes. Mesmo tendo perdido o pai, assassinado, e tendo sido levada por sua mãe a morar na cidade por algum período, Maria Aparecida regressou ao assentamento e lá continua. Junto a seus companheiros, resiste.

    O próximo a se pronunciar foi Cláudio, do município de Andorinha, semiárido baiano. Ali, a população local enfrenta atualmente um grande conflito por água que não se deve à “seca”. O jovem estudante de pedagogia afirmou que a mineradora FERBASA tem bombeado água indevidamente do único açude da cidade, prejudicando a população local e sua produção agropastoril. Os conflitos tiveram início em abril do ano passado. Desde então, a população tem se mobilizado para denunciar e impedir que tais ações da mineradora se perpetuem.

    Em seguida, Joselito, representante da “Associação Vila Sapiranga dos Quilombos do Castelo da Torre e Adjacências”, contou um pouco de sua história e a dos 11 povoados remanescente de quilombo, cujo território fora desestruturado pela criação da Reserva Particular Sapiranga da Fundação Garcia D’Ávilla, na Praia do Forte. Natural daquela área, Joselito hoje se mobiliza junto a população local para que o INCRA retome o processo de identificação dos remanescentes de quilombo que fora interrompido, de modo que reconquistem seus direitos territoriais sobre aquele espaço de uso tradicional.

    Haroldo Heleno, do Cimi, apresentou então de forma geral o “Relatório: Violência contra os povos indígenas no Brasil”, organizado pela entidade. Ele afirma que a violência contra os povos indígenas tem sido institucionalizada pelos poderes públicos, como por exemplo através dos atos inconstitucionais de não homologação de terras indígenas já identificadas. Para ele, vivemos um período de grandes retrocessos dos direitos dos povos indígenas no Brasil.

    O missionário destacou que as decisões tomadas no âmbito da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) descaracterizam o Artigo 231 da Constituição Federal (CF) através de uma reinterpretação radicalmente restritiva quanto ao conceito de terra tradicionalmente ocupada pelos povos. Essa reinterpretação do Artigo 231 da CF legitima e legaliza as expulsões e as demais violações e violências cometidas contra os povos indígenas no Brasil, inclusive no passado recente. As decisões consistem, ainda, numa perigosa sinalização, para os invasores de terras indígenas, de que os mecanismos de violência dos assassinatos seletivos de lideranças e do uso de aparatos paramilitares para expulsar os povos das suas terras seriam legítimos, convenientes e vantajosos para os seus intentos de se apossarem e explorarem essas terras. Contra isso se faz necessária uma mobilização e enfretamento constante por parte destas populações em articulação com outros setores da sociedade, pois “essa luta é de todos nós”, afirmou Heleno.

    Foi então concedida a fala ao cacique Babau Tupinambá, da Aldeia Serra do Padeiro. Segundo ele, antigamente povos indígenas guerreavam entre si e hoje o que ocorre é o inverso, os povos indígenas se aliam para enfrentar seus maiores inimigos: agentes econômicos internacionais e o Estado nacional. O cacique falou dos diversos enfrentamentos diretos contra pistoleiros, policiais e até mesmo contra a Força Nacional, dos quais os Tupinambá nunca fugiram, pelo contrário, lutaram. Babau destaca que “o índio tem que ter tudo de bom também: escola, faculdade, carro, moto, tudo”, de modo a conquistar sua real autonomia através do autofinanciamento de suas lutas. É desta forma que acredita podermos “transformar nosso território, em território de cidadania, desenvolvimento e esperança. E não de violência. Vamos contra o ponto deles”. Assim Babau finalizou seu discurso e emocionou todos aqueles que o ouviram.

    Abriu-se o espaço para a “Fila do Povo”, onde outras lideranças e representantes de comunidades tradicionais e movimentos sociais puderam se expressar e contribuir com suas experiências de luta e resistência pelo território e pela vida. E, como ficou evidente para todos nós presentes, estes esforços não devem se limitar à busca da mera inclusão neste sistema hegemônico perverso e apodrecido. A resistência dos povos e comunidades tradicionais apontam sim para a radical transformação da sociedade. Uma ruptura com o sistema estabelecido.

     

  • 10/08/2015

    Jaguaretê Ava, o mito do homem-onça

    Quando era estudante de filosofia na Universidade Católica Dom Bosco, aluno das classes de filosofia moderna do professor Josemar de Campos Maciel, jamais imaginava que, após formado, chegaria tão perto da metáfora de Thomas Hobbes, o homem-lobo, aquele que devora o próprio homem.

    Thomas Hobbes foi um filósofo político da modernidade arcaica que teorizou a respeito do estado de natureza, sem o Estado, no qual a índole negativa do gênero humano seria responsável pela violência generalizada resumida na expressão latina: homo homini lupus, o homem é o lobo do próprio homem. O remédio contra a violência autodestrutiva seria a abdicação de parte das liberdades individuais em nome de uma entidade que reprimiria o impulso autodestrutivo: o Estado, apelidado de leviatã. Uma metáfora retirada da Bíblia.

    Acontece que a cruz e a espada nas mãos do leviatã não têm sido eficazes contra outra variante do homem que devora homens, traduzido pelos índios Guarani e Kaiowá como Jaguaretê Avá, homem-onça.

    O mito do Jaguaretê Avá está sendo compilado pelo pesquisador Kaiowá João Machado, morador da aldeia Bororó em Dourados, Mato Grosso do Sul. Ele é formado em letras e mestre em linguística pela Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD).

    Segundo o pesquisador, este ser humano-bicho tinha o hábito de aparecer nas carreteiras à noite, por onde trafegavam viajantes e carreteiros. De acordo com seus informantes indígenas, era um índio de má índole que vivia junto à sua família, mas o demônio aña instigou-lhe a matar sua mãe, pai e os irmãos.  Sem nenhum parente, passou a viver solitário nas florestas e morrarias, amaldiçoado e condenado a comer carne humana.

    Os mitos, segundo Ovídio e José Ribamar Bessa Freire, são narrativas de cunho pedagógico e histórico que guardam, nas sociedades de tradição oral, memórias sociais históricas.

    Para fundamentar empiricamente a afirmação acima, citarei alguns exemplos.

    Na noite passada os Guarani da aldeia Potrero Gasu, em Paranhos, denunciaram homens fera, de apelido pistoleiro, que invadiram casas de velhos, aterrorizando-os, queimaram casas de famílias na aldeia, materiais didáticos de crianças, e que, amaldiçoados, vivem escondidos nas matas da região de fronteira entre Paranhos e Ypehun. Por que fazem isto? É difícil responder, mas suponho que a razão é aterrorizar os Guarani e Kaiowá que querem retornar aos seus antigos territórios, de onde foram removidos por décadas e já foram identificados como terra de ocupação tradicional.

    Outro lugar onde o Jaguarete Avá modernizado foi visto nas duas últimas noites foi em Te’yijusu, na cidade de Caarapó. A versão local do homem-onça são os tratoristas durante o dia, metamorfoseados de "seguranças" armados durante à noite, quando rondam e ameaçam moradores e familiares da dona Marcelina, uma anciã que foi removida da aldeia Pirati’y para a reserva Te’yikue e que começaram a fazer a viagem de volta.

    Depois destes relatos, recebidos dos índios, convenci-me que o Jaguaretê Avá não é um mito, mas uma realidade histórica que abate violentamente os Guarani e Kaiowá desde 1637, quando começaram os ataques bandeirantes nesta região, na aldeia Araquay, onde residiam índios Guarani-Itatim.

    Interrogado sobre o assunto, Thomas Hobbes respondeu dizendo: "Onde o estado não está presente, garantindo direitos, ele é substituído pelo Jaguaretê Avá, que ao fim devorará a todos, pois seu apetite por carne humana e insaciável", advertiu o filósofo.

    * Neimar Machado de Sousa é doutor em educação e professor de geo-história colonial na Faculdade Intercultural Indígena da UFGD. E-mail: neimarsousa@ufgd.edu.br

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