• 24/09/2015

    Invasores destroem mata nativa de território reivindicado pelo povo Gamela

    Babaçu, juçara, marmorana, guarimã, bacuri… Vários hectares de vegetação nativa destas importantes espécies vegetais estão sendo desmatados e incendiados por invasores de um território reivindicado pelo povo Gamela, nos municípios de Viana, Matinha e Penalva, há mais de 200 km de São Luís, no Maranhão.  Estas espécies são utilizadas secularmente pelos indígenas, tanto para alimentação como na confecção de artesanato. Além dos severos impactos se estenderem sobre os animais da região, os igarapés também estão sendo aterrados e os rios assoreados.

     

    “O propósito dos invasores é transformar a área em pasto para a criação de gado”, esclarece Inaldo Gamela, liderança de seu povo. Mais grave ainda é o fato de que esta destruição ambiental está sendo realizada sob a guarida de homens armados, segundo informa carta-denúncia assinada pelo Conselho de Gestão do Território Indígena Gamela, pelo Movimento Interestadual de Quebradeiras de Coco Babaçu, Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e pela Comissão Pastoral da Terra (CPT). Isso “agrava a situação e coloca em risco a vida do nosso povo, sobretudo de nossas lideranças”, afirma o documento.

     

    Com o objetivo de denunciar estes fatos, uma comissão de indígenas do povo Gamela esteve nos dias 21 e 22 desta semana na capital maranhense para denunciar a situação para diversos órgãos públicos, de modo que: a destruição ambiental seja imediatamente cessada; os responsáveis por ela sejam punidos; e também que seja garantida a integridade física do povo que vive no território reivindicado. Eles informaram ainda que a retirada de barro das margens do Rio Piraí, para a produção de tijolos, também tem causado o desvio do seu leito e diminuído a quantidade de água, além de estar causando a morte de muitos peixes.

     

    Além das ameaças à existência física do povo Gamela, com cerca de 400 famílias, e de outras comunidades tradicionais, a destruição dessas áreas ameaça a reprodução cultural e religiosa do povo. “Pois essas áreas são também moradas de Seres Encantados cultuados pelo Povo Indígena Gamela, tais como, o ‘Capitão’, morador dos juçarais, e o Encantado João Piraí”, relatam.

     

    A carta-denúncia foi entregue na Defensoria Pública da União (DPU), no Ministério Público Federal (MPF), na Secretaria de Estado de Direitos Humanos e Participação Popular (SEDIHPOP) e na Fundação Nacional do Índio (Funai).

     

    No órgão indigenista, no entanto, eles tiveram uma desagradável surpresa. “Apesar de já termos solicitado, desde 2014, a abertura do procedimento administrativo para a demarcação do nosso território, tanto aqui no Maranhão, como em Brasília, fomos informados que todos os documentos que enviamos não são suficientes e que nenhuma iniciativa administrativa foi tomada no sentido de devolverem nossa terra tradicional. Diante disso, ficamos muito preocupados. Parece que estão jogando com a gente”, lamenta Inaldo.

     

    Invasões e ameaças

     

    Na carta-denúncia, os Gamela afirmam que devido à luta para defender os seus direitos e os direitos da terra, nos últimos dias os invasores têm intensificado as ameaças contra o povo e a destruição da natureza.

     

    Segundo Inaldo Gamela, na última terça-feira (22) pela manhã, um casal de invasores foi até a casa de uma liderança do povo. Como não encontraram ninguém, foram até a casa onde os Gamela costumam se reunir e, por último, foram até a roça. Ao encontrar alguns indígenas, eles afirmaram que a terra é deles e que não teria comprado “terra de índio”. “Eles estavam acompanhados de um homem desconhecido, que não mora na região. Por isso, a gente desconfia que pode ser algum jagunço contratado por eles”, conta Inaldo.

     

    “Diferentes invasores do nosso território têm apresentado certidões cartoriais de uma mesma área, gerando uma situação de ‘vários andares de terra’, como se isso fosse possível. Isso, além de provocar uma situação de permanente conflito e ameaça contra nosso povo, configura-se numa clara violação de nossos Direitos garantidos em nossa Constituição Federal”, asseguram, na nota.

     

    Leia a carta-denúncia do povo Gamela na íntegra

                      

    Fotos: Núcleo de Estudos e Pesquisas em Questões Agrárias (Nera)/Universidade Federal do Maranhão (UFMa)

     

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  • 24/09/2015

    Indígenas e movimentos populares lançam campanha Eu quero: CPI do Genocídio em ato público na Assembleia Legislativa do MS

    Cerca de 200 pessoas, entre indígenas do povo Terena e movimentos populares do campo e da cidade, ocuparam na manhã desta quinta-feira, 24, o plenário da Assembleia Legislativa do Mato Grosso do Sul, em ato público, para lançar a campanha Eu Quero: CPI do Genocídio!, que pretende mobilizar a sociedade sul-mato-grossense e nacional, além de organismos internacionais de direitos humanos, contra a matança orquestrada de indígenas, a falta de demarcação e a criminalização dos movimentos sociais no estado. A sessão chegou a ser suspensa por conta dos protestos dos manifestantes.

    O objetivo da campanha é fazer a contraposição à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) contra o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), aberta por pressão da bancada ruralista. Mesmo sem fato determinado, e sem demonstrar nenhum indício de ilegalidade por parte do Cimi, a deputada estadual Mara Caseiro (PTdoB), inventora e animadora da CPI, acusa a organização de incitar as retomadas realizadas pelos indígenas.

    A campanha pede ainda a moratória do agronegócio no estado até que as terras indígenas estejam demarcadas. No Mato Grosso do Sul, conforme dados de organizações do setor pecuário, existem 23 milhões de cabeças de gado, sendo que cada animal ocupa, em média, um hectare de terra. A comunidade de Ñanderú Marangatú, composta por 1.500 Guarani e Kaiowá, ocupava, antes das retomadas do último mês de agosto, 100 hectares.  

    Para os povos indígenas e movimentos populares, a intenção da chamada ‘CPI do Cimi’ é desviar o foco dos 10 ataques sofridos pelo povo Guarani e Kaiowá de Ñanderú Marangatú, Guyra Kamby’i, Pyelito Kue e Potrero Guasu desde o assassinato de Semião Vilhalva, no último dia 29 de agosto.

    Semião estava em Ñanderú Marangatú, terra indígena homologada em 2005, quando a presidente do Sindicato Rural de Antônio João, Roseli Maria Ruiz, liderou um bando de fazendeiros, em um comboio com cerca de 100 camionetes, que atacaram a comunidade a tiros de arma de fogo e borracha.

    A ‘CPI do Cimi’, conforme os participantes do ato público, pretende também enfraquecer a luta dos povos indígenas pelos territórios tradicionais. A verdadeira CPI, dizem os indígenas, deve ser aquela que investigue as milícias e os assassinatos de lideranças no estado, que nos últimos 12 anos atinge a marca de 390 indígenas. Vídeos, relatos da imprensa sul-mato-grossense e até a presença comprovada de parlamentares em ataques contra as comunidades percorrem as redes sociais.

    Tais números são fatos determinados. Por conta disso, a campanha pela CPI do Genocídio pretende denunciar a matança de indígenas e demonstrar como a cadeia do agronegócio se alimenta “desse sangue” para exportar carnes e grãos produzidos em terras tradicionalmente ocupadas. Além disso, a campanha visa demonstrar a omissão do Estado brasileiro e o não cumprimento, por parte do governo federal, das demarcações determinadas pela Constituição Federal.  

    Para acompanhar as ações da campanha, clique aqui. A reprodução dos materiais visuais, vídeos, fotos e textos é livre: use e abuse.

     

    Outras informações – Assessoria de Imprensa

    Karina Vilas Boas: (67) 91426.522 / MST

    Renato Santana: (61) 9979.6912 / Cimi

      

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  • 24/09/2015

    Somos todos indígenas e estamos na luta pela CPI do Genocídio

    Os movimentos sociais e sindicais de Mato Grosso do Sul, reunidos no dia 22 de setembro de 2015, reafirmam seu total apoio a luta dos povos indígenas por seus direitos, como os de retomar os seus territórios e terem a possibilidade de construir uma vida mais justa e digna.

    Denunciamos, mais uma vez, indignados, que em nosso Estado, Mato Grosso do Sul, uma parte dos fazendeiros e seus jagunços tem atuado, através de milícias armadas, que, em menos de um mês, desferiu doze ataques paramilitares contra o povo Guarani Kaiowá dos Tekohá Ñanderú Maragantú, Potrero Guasu, Guyra Kamby’i, Pyelito Kue e Kurupi. Como resultado desta verdadeira guerra, o líder Guarani Kaiowá, Semião Vilhalva, foi assassinato, três indígenas foram baleados por arma de fogo, vários foram feridos por balas de borracha, dezenas de indígenas foram espancados. São fortes também os indícios de que indígenas sofreram tortura e há denúncias da ocorrência de um estupro coletivo contra uma Guarani Kaiowá.

    Vale ressaltar que Ñanderú Marangatú, local onde Semião foi assassinado, é uma Terra Indígena homologada há uma década. Ele, como tantos outros indígenas, foram assassinados, não só pelo coronelismo de MS, como pela morosidade do Estado em garantir a Constituição Federal.

    Nos últimos 12 anos, ao menos 585 indígenas cometeram suicídio e outros 390 foram assassinados em MS. O estado tem 23 milhões de bovinos que ocupam aproximadamente, coincidentemente, também, 23 milhões de hectares de terra, isso quer dizer 1 hectare por animal. Enquanto isso, com a morosidade e a paralisação dos processos de demarcação, os cerca de 45 mil Guarani Kaiowá, continuam espremidos em apenas 30 mil hectares de suas terras tradicionais.

    E para nossa surpresa, totalmente na contramão de se resolver os problemas dos conflitos de terra em Mato Grosso do Sul, no dia 18 de setembro, em Diário Oficial do Estado, foi publicada a homologação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), proposição da deputada estadual, Mara Caseiro (PTdoB),  subscrita por outros deputados fazendeiros, criada, por despacho assinado pelo presidente da Assembleia Legislativa, Junior Mochi (PMDB), com o intuito de investigar as ações do Conselho Indigenista Missionário (CIMI).

    O CIMI é um organismo que merece total respeito pela seriedade dos trabalhos que realiza, é vinculado à CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) que, em sua atuação missionária, conferiu um novo sentido ao trabalho da igreja católica junto aos povos indígenas.

    Esta importante organização acredita que os povos indígenas são fontes de inspiração para a revisão dos sentidos, da história, das orientações e práticas sociais, políticas e econômicas construídas até hoje e é justamente isso que incomoda a elite ruralista sul-mato-grossense e porque não a brasileira. A existência de uma entidade, respaldada pela igreja católica, que visa defender os nossos irmãos indígenas e os seus direitos é inconcebível para os reacionários que só visam o lucro e nunca a construção de um Brasil mais justo, respaldado na igualdade e na solidariedade.

    Temos certeza que a CPI em questão faz parte da estratégia de ataques ruralistas aos povos indígenas e seus aliados. Neste sentido, unidos, cobramos que a Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul também instaure uma Comissão Parlamentar para investigar o genocídio dos povos indígenas, como dissemos acima, nos últimos 12 anos, foram 390 assassinatos em MS, com praticamente nenhuma punição, de fato, aos culpados.

    Não aguentamos mais a inércia dos poderes constituídos e muito menos os desmandos dos coronéis. Iremos as ruas, ocuparemos as praças, gritaremos em alto e bom som para que todos e todas escutem a nossa voz, pois não vamos assistir de braços cruzados o solo do nosso querido Mato Grosso do Sul ser manchado pelo sangue inocente dos nossos irmãos e irmãs indígenas.

    Assinam:

    Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST

    Central Única dos Trabalhadores – CUT

    Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação – CNTE

    Federação dos Trabalhadores em Educação de Mato Grosso do Sul – FETEMS

    Coletivo Terra Vermelha

    Movimento de Luta Camponesa pela Reforma Agrária – MCLRA

    Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de MS – Fetagri

    Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos  – CEBI

    Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares  – RENAP

    Centro de Documentação e Apoio aos Movimentos Populares – CEDAMPO

    Tribunal Popular da Terra – TPT

    Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado – PSTU

    União da Juventude Comunista – UJC

    Partido Comunista do Brasil – PCdoB

    Conselho Terena

    Movimento das Mulheres Camponesas – MMC

    Centro de Defesa dos Direitos Humanos Marçal de Souza Tupã y – CDDH

    Irmãs Catequistas Franciscanas

    Sindicato dos Bancários de Campo Grande e Região

    Sindicato dos Trabalhadores Públicos Federais em Saúde, Trabalho e Previdência Social – SINTSPREV/MS

     

     

     

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  • 23/09/2015

    Para denunciar destruição ambiental, Pataxó ocupam fazenda e apreendem equipamentos da Suzano

    Com o objetivo de chamar atenção da sociedade e, principalmente, dos órgãos públicos estaduais e federais para a severa destruição ambiental em curso na região, cerca de 300 indígenas do povo Pataxó ocuparam na manhã desta segunda-feira (21) uma monocultura de eucalipto na fazenda Nedila, no município de Prado, na Bahia. Eles também apreenderam dez equipamentos agrícolas de propriedade da empresa de papel e celulose Suzano, segunda maior produtora mundial de celulose de eucalipto, de acordo com informações da própria empresa.

     

    Em nota pública, os Pataxó afirmam que já é possível perceber os efeitos nocivos da plantação para os seres humanos, na fauna, flora e, mais gravemente, nos rios e nascentes. Também afirmam que grandes áreas da Mata Atlântica, um dos biomas mais ameaçados do mundo, estão sendo desmatadas diuturnamente.

     

    “Nós acusamos os órgãos responsáveis pela liberação e fiscalização, como a Secretaria do Meio Ambiente de Prado e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), por conivência ou, no mínimo, negligência nessa situação”, declaram na nota. Eles pedem a presença de representantes de órgãos, como a Funai, a Secretaria do Meio Ambiente do município do Prado e do ICMBio, dos responsáveis pela empresa Suzano, e solicitam a presença da imprensa para denunciar as violações cometidas contra os povos indígenas da região.

    Leia na íntegra a nota Órgãos públicos autorizam a destruição da vida na Terra Indígena Pataxó

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  • 23/09/2015

    Indígenas Ka’apor denunciam novas invasões ao território tradicional e omissão do governo federal

    “A nossa luta continua, Ka’apor! Não foram caminhões, nem tratores e nem motosserras. Não serão cercas de arame e nem pistoleiros que vão nos impedir de proteger e viver em nosso território, em nossa floresta”

    Entre 2013 e o último mês de março, fechamos todos os ramais de entrada de madeireiros que invadiam e destruíram nossa floresta, nossa casa. Nesse período, criamos oito Ka’a usak ha, ou Áreas de Proteção para recuperar, proteger, viver de forma sustentável em nosso território. Depois de iniciar muito forte a fiscalização, limpeza de nossos limites, encontramos madeireiros, fazendeiros, estaqueiros, caçadores e posseiros que usavam nosso território sem autorização da gente.

    Esses agressores usavam e usam os limites ou áreas dentro de nosso território com permissão de funcionários da Funai, de prefeituras, do INCRA e de sindicatos para tirar madeira, colocar pastos, colocar roças grandes, tirar estacas para fazendas, para movelarias, para cerâmicas, para panificadoras nas cidades. Entravam principalmente para derrubar árvores, tirar a madeira e capturar animais. Nunca as fiscalizações do governo (IBAMA, Policia Federal, Funai, Exército) conseguiram resolver e acabar com esses tipos de destruição.

    Por isso que nós, por conta própria, resolvemos nos organizar, defender e proteger nosso território. Começamos fiscalizando e limpando nossos limites, quando identificamos as áreas de maior destruição. A partir daí iniciamos o nosso etnomapeamento que ajudou a gente identificar todos os limites do nosso território, fazer vários mapas de nossa área. Esse trabalho ajudou a gente identificar tanto as áreas destruídas quanto os grupos e pessoas que entravam, entram e destroem.

    Vimos que a melhor maneira para evitar o aumento dessa destruição foi morar nessas áreas destruídas para recuperar, plantando espécies de árvores que tinham antes, para os animais voltarem a viver ali e a gente ter caças para o nosso alimento, os pássaros voltem a viver nessas áreas para a gente criar e tirar suas penas para fazer nossas roupas tradicionais (cocares, braçadeiras, pulseiras, colares), proteger da entrada desses invasores e plantar pequenas roças com diversas culturas produtivas para a gente ter bastante e diversos alimentos para  gente ter um bem viver. Mas, depois que a gente criou essas áreas de proteção, agora, depois de dois meses, a gente vem sendo impedido, perseguido e até ameaçado de entrar nessas áreas por fazendeiros, pistoleiros, posseiros (incentivados por madeireiros e fazendeiros), alguns assentados do INCRA que, pressionados por madeireiros e fazendeiros, têm vendido seus lotes para fazendeiros e madeireiros, permitido a destruição de suas reservas para retirada de madeira, para grandes extensões de pastos.

    Isso está acontecendo principalmente nos municípios de Centro do Guilherme, Maranhãozinho, Santa Luzia do Paruá, Nova Olinda do Maranhão, Araguanã e Zé Doca. Todos esses municípios fazem limites com nosso território. A gente está preocupado porque eles estão impedindo e ameaçando nossas famílias de proteger essas áreas, sair para outras aldeias, ir para cidade quando precisam. Prova de tudo isso, a gente continua vendo madeira e estacas saindo de um ramal que foi reaberto por madeireiros no município de Nova Olinda do Maranhão.

    A gente vê serrarias em Zé Doca, Araguanã, Santa Luzia do Paruá, Centro do Guilherme e Governado Nunes Freire (Encruzo) funcionando com muita madeira em seus pátios que sai dessas áreas, nesses municípios. As serrarias do município de Encruzo nunca pararam de funcionar. A gente não vê nenhuma fiscalização dos governos nestes locais. Desde a semana passada, nossos parentes viram pessoas (pistoleiros) com armas tipo pistola perto de nosso cemitério na entrada da Aldeia Ximborenda, aldeia que nosso parente Eusébio Ka’apor morava.

    Na última segunda-feira, dia 21 de setembro, seis homens em três motos foram vistos armados na estrada de entrada da aldeia Ximborenda. Um estava visivelmente armado. A polícia nunca prendeu o assassino que matou Eusébio e mais parentes estão correndo perigo na entrada de nossas áreas de proteção e das aldeias. A gente não aceita que a violência desses agressores continue impedindo a gente viver com dignidade em nosso território. Por isso que nosso povo está vigilante, atento e unido para defender nosso território, nossa verdadeira casa que é a floresta.

     

     

     

     

  • 23/09/2015

    Povo Terena pede a ministro da Justiça medidas concretas para indígenas irem ao diálogo

    HÁNAITI HO’ÚNEVO TÊRENOE (GRANDE ASSEMBLEIA DO POVO TERENA) CONSELHO DO POVO TERENA

    Resolução Referente: Mesa de diálogo proposta pelo Ministério da Justiça

    O Conselho do Povo Terena, em reunião extraordinária, ocorrida no dia 21 de setembro de 2015 na Terra Indígena Buriti, município de Dois Irmãos do Buriti, Mato Grosso do Sul, após ampla deliberação:

    Considerando o princípio do “Bem Viver” dos povos indígenas que preconiza a constante busca do viver bem em nossas comunidades a partir de nossos territórios tradicionais; bem como a incansável luta pela reconquista de nossa terra ancestral, haja vista que o nosso modo de ser tradicional só é possível em nossa terra; Considerando o princípio da autonomia dos povos e das comunidades indígenas que reconhece o direito de nós lideranças indígenas falar em nome de nossas comunidades e nosso povo, bem como reconhece nossa organização tradicional, costume, língua, crença e tradição; Considerando o princípio da livre determinação dos povos indígenas esculpido tanto na Carta Republicana, como também nos tratados internacionais, que nos garante o direito de escolher a forma de desenvolvimento e o modo de vida para a presente e futura geração, tendo como base o bem viver de nossa comunidade; Considerando a legitimidade do Conselho do Povo Terena em representar e defender o Povo Terena de Mato Grosso do Sul, com personalidade jurídica irradiada diretamente do texto constitucional – Art. 232, caput;

    Decide:

    I. Diante dos inúmeros ataques aos direitos dos povos indígenas, a exemplo da PEC 215; e das constantes violações aos direitos humanos fundamentais dos povos indígenas em Mato Grosso do Sul, seja por parte dos ruralistas que matam covardemente nossas lideranças, seja pela omissão do poder executivo em não cumprir a Constituição Federal e demarcar nossos territórios; nós lideranças não vislumbramos qualquer possibilidade em constituir uma mesa de diálogo enquanto não houver por parte do governo federal ações concretas, ainda que iniciais, que demonstre interesse em solucionar a questão;

    II. Tais ações concretas iniciais se traduzem: a) baixar imediatamente a portaria declaratória da Terra Indígena Taunay-Ipegue, visto que não há nenhum empecilho jurídico; b) constituição de Grupo de Trabalho para iniciar a identificação e delimitação da terra indígena Nioaque; c) a imediata conclusão dos estudos antropológicos das terras indígenas Pilad Rebuá e Lalima; d) imediata demarcação física e homologação da Terra Indígena Cachoeirinha; e) a incidência direta da Advocacia Geral da União no processo da Terra Indígena Limão Verde que tramita no Supremo Tribunal Federal com o fito de desconstituir a decisão da segunda turma daquele tribunal que aplicou a inconstitucional tese do marco temporal; f) por fim, em relação a Terra Indígena Buriti, diante da não aceitação por parte dos fazendeiros do acordo estipulado pelo Ministério da Justiça, exigimos a imediata desapropriação da área em litígio;

    III. Por fim, o Conselho do Povo Terena reafirma o seu compromisso de continuar lutando pelos seus direitos e sua disposição em continuar buscando, juntamente com o governo federal e demais órgãos competentes, soluções às demandas indígenas, desde que o governo federal demonstre de fato e de verdade seu interesse na resolução através da adoção das medidas concretas estipuladas por estas lideranças.

    Terra Indígena Buriti, 21 de setembro de 2015.

    Assinam Caciques e lideranças indígenas: Terra Indígena Buriti, Terra Indígena Cachoeirinha, Terra Indígena Lalima, Terra Indígena Pilad Rebuá, Terra Indígena Nioaque, Terra Indígena Taunay-Ipegue, Terra Indígena Cachoeirinha, representante da juventude Terena, representante das mulheres Terena, representante dos acadêmicos indígenas, representante dos professores indígenas, representante dos rezadores indígenas, representante das aldeias urbanas indígenas.

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  • 23/09/2015

    “Os Estados não nos querem”, afirmam Guarani de quatro países

    O sentimento expresso pelos Guarani no segundo dia do IV Encontro Continental é uma constatação de que não há espaço para esse povo nos Estados Nacionais. Os Estados os tratam como estrangeiros, desconsiderando sua territorialidade que é anterior às existências dos respectivos Estados, reconhecida nas leis nacionais e internacionais, mas não aplicada nas políticas públicas. O evento, que acontece no tekoha Ka’akupe, município de Ruiz de Montoya, província de Missiones, na Argentina, reúne centenas de Guarani da Bolívia, Brasil, Paraguai e Argentina.

     

    Essa constatação do não lugar para os Guarani nos Estados Nacionais se expressa nos inúmeros casos de assassinatos que estão ocorrendo, especialmente no Mato Grosso do Sul; no não reconhecimento das terras e na invasão de seus territórios por petroleiras, hidrelétricas, estradas e inúmeros outros projetos do chamado desenvolvimento.

     

    O representante Guarani que vive na Bolívia, Celso Padilha, observou que a luta do povo Guarani é por terra, “porque sem a terra não há liberdade, sem a terra não há autonomia, sem a terra não há educação e sem a terra vamos morrer de fome”. Para esse representante, os governos dos diferentes Estados estão submissos aos fazendeiros, ao agronegócio, aos interesses das grandes corporações de petróleo e energia, não admitindo os direitos territoriais Guarani, as formas próprias do povo, considerando-os “rebeldes” por não se submeterem a esses setores, não se deixando converter em peões. Afirmou que “somos rebeldes porque somos livres, queremos garantir nossa Yvy Mara´ey, nossa Terra Sem Males, que é nosso território onde temos espaços para nossas atividades, onde sobrevivemos em sintonia com o meio ambiente, onde buscamos remédio para nossas doenças”.

     

    Maurício Gonçalves, falou em nome dos Mbya que vivem no Brasil. Reforçou as palavras de Padilha ao observar que para o povo Guarani “não existe fronteira, não queremos nem cerca de fazendas nem cercas dos Estados, queremos a garantia de nossas terras e o livre trânsito por nosso território”.

     

    O território Guarani, que se estende nas terras baixas do Cone Sul da América, desde Bolívia até o litoral brasileiro, foi dividido em pelo menos cinco Estados: Argentina, Bolívia, Brasil, Paraguai e Uruguai. As fronteiras foram criadas e recriadas por diferentes interesses dos impérios coloniais e posteriormente pelos estados independentes sem nunca ter sido considerada a presença e os direitos dos Guarani.

     

    Breve histórico

     

    O primeiro Encontro Continental foi organizado em 2006, em São Gabriel (RS), em memória da luta e resistência dos Guarani missioneiros que defenderam seu território enfrentando os exércitos de Espanha e Portugal, em meados do século XVIII.

     

    Em 2007, focado na dimensão territorial, ocorreu o segundo encontro na cidade de Porto Alegre (RS).

     

    Em 2010, ocorreu o terceiro encontro, na cidade de Assunção, capital do Paraguai, sob o tema da superação das fronteiras e organização política. Nesse encontro foi criado o Conselho Continental da Nação Guarani (CCNAgua), organização que pretende ser um elo de força e união desse povo nas diferentes regiões.

     

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  • 22/09/2015

    Nota Pública do Povo Apinajé, sobre os Jogos Mundiais Indígenas

    Nós caciques e lideranças Apinajé reunidos na VI Assembleia Ordinária da Associação União das Aldeias Apinajé – Pempxà, realizada nos dias 17 a 21 de setembro do corrente, na aldeia Irepxi, no município de Tocantinópolis – TO, vimos à público manifestar nosso integral apoio ao Povo Krahô e a decisão desta etnia de não participar dos JMI que serão realizados em Palmas (TO) no próximo mês de outubro de 2015 com a participação de povos do Brasil e do exterior.

    Durante nossa assembleia anual onde estiveram presentes mais de 70 caciques e lideranças decidimos também debater e tomar decisões sobre esse assunto. Na ocasião avaliamos que diante da atual crise econômica, da instabilidade política e das incertezas e dúvidas que pairam sobre as cabeças dos povos indígenas não se justifica a realização de eventos como os Jogos Mundiais Indígenas, onde serão investidos R$ 160.000.000,00 (cento e sessenta milhões de reais) num momento em que os povos indígenas passam por situações de dificuldades e violências nunca antes verificadas na história de nosso País. 

    Citamos os casos de violências institucionalizadas praticadas pelo Estado brasileiro, seja por participação direta dos agentes do Estado, seja por omissão deste. É inaceitável que nesse momento também esteja se repetindo assassinatos, despejos, espancamentos, prisões e a criminalização das lideranças indígenas com a participação e conivência dos poderes Executivo, Legislativo e judiciário. 

    Dessa forma não podemos aceitar e participar de um evento de caráter midiático e sensacionalista que tem por finalidade usar a imagem dos povos indígenas para distorcer os fatos e mentir no exterior; ocultando a verdadeira realidade e o sofrimento dos povos indígenas do Brasil. Citamos a situação da falta de demarcação e regularização dos territórios tradicionais reivindicados pelos povos Avá Canoeiro, Guarani-Kaiowá, Tupinambá, Pataxó, Canela e outros.

    Verificamos também o abandono e o sucateamento das estruturas de atendimento à saúde indígena. Lembramos que nesse momento difícil de incertezas e insegurança centenas de terras demarcadas e regularizadas também estão sendo invadidas e ameaçadas por madeireiros, mineradoras, fazendeiros, arrendatários, extrativistas e pescadores.

    É lamentável que mesmo diante dessa situação vergonhosa de violações de direitos indígenas até agora não vimos nenhuma atitude do Governo e seu Ministério da Justiça no sentido de cumprir à Constituição Federal vigente e ao menos dar condições para Funai monitorar, fiscalizar e proteger as terras indígenas já demarcadas. 

    Declaramos que também não aceitamos o uso indevido de nossa imagem e questionamos o apoio e a atenção que outras etnias estão oferecendo a um evento patrocinado pelos governos federal, estadual e municipal, com apoio da ministra Katia Abreu, uma inimiga declarada dos povos indígenas. 

    Na contramão do respeito, do bom senso e da autodeterminação das populações indígenas, os idealizadores dos JMI também não consultaram e nem convidaram ao menos os povos anfitriões do Estado do Tocantins para participar da organização do JMI. Dessa maneira declaramos que não vamos participar dos JMI que serão realizados em outubro na cidade de Palmas (TO) e ao mesmo tempo convidamos outros povos a fazerem o mesmo. 

    No entanto, respeitamos a decisão e a vontade daqueles que decidiram participar. E independente de participar ou não, nesse momento é importante fazermos uma profunda reflexão e uma análise crítica da história e dos fatos recentes que envolvem a questão e as lutas indígenas no Brasil.

    Aldeia Irepxi, 21 de setembro de 2015.

    Associação União das Aldeias Apinajé-Pempxà

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  • 22/09/2015

    Liderança Guarani-Kaiowá vai à ONU novamente para denunciar acirramento da violência contra seu povo

    Mais uma vez uma liderança indígena apelou aos organismos internacionais para denunciar a situação de extrema barbárie e crise humanitária que o povo indígena Guarani-Kaiowá enfrenta no Mato Grosso do Sul. Eliseu Lopes apresentou hoje (22), por volta das 12h (horário de Brasília), na 30ª Sessão do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, em Genebra, na Suíça, o recente acirramento dos conflitos em uma realidade que há décadas tem sido bastante trágica.

     

    Apenas cinco meses após ter ido à Nova Iorque relatar ao Fórum Permanente para Questões Indígenas, da Organização das Nações Unidas (ONU), a violência cotidiana praticada contra os povos no Mato Grosso do Sul (MS), o estado mais violento do Brasil contra os indígenas, a liderança do tekoha Kurusu Ambá denunciou que esta realidade se agravou ainda mais nos últimos meses. No dia 29 de agosto, Semião Vilhalva, de apenas 24 anos, foi assassinado durante um ataque de fazendeiros ao tekoha Ñanderú Marangatú, localizado no município de Antônio João (MS). Marçal de Souza e Durvalino Rocha são outras importantes lideranças que foram assassinadas na mesma área.

     

    Apesar desse território tradicional ter sido reconhecido e homologado pelo governo federal em 2005, há 10 anos mais de 1.200 pessoas vivem em apenas 30 hectares. “Isto porque, há uma década, o ministro da Suprema Corte, Gilmar Mendes, que é ligado aos setores do agronegócio brasileiro, protela o julgamento de uma ação que suspendeu violentamente os efeitos da homologação presidencial. Na ocasião, fomos barbaramente despejados pelas forças de segurança”, declarou Eliseu.

     

    Diversos movimentos indígenas e organizações da sociedade civil brasileira e internacional, além de organismos internacionais têm expressado solidariedade aos povos indígenas do Mato Grosso do Sul, especialmente aos Guarani-Kaiowá. Em sua fala na abertura desta 30ª Sessão, na semana passada, o Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Zeid Ra´ad Al Hussein, declarou “antigas disputas sobre terras indígenas continuam a causar sofrimento e perda de vidas no Brasil. Faço notar, em particular, o assassinato de um líder do povo Guarani-Kaiowá no mês passado, e exorto as autoridades a investigar não somente esta morte, mas também a tomar medidas de grande alcance para travar novos despejos e demarcar corretamente todos os terrenos”.

     

    No entanto, o governo brasileiro não avançou no sentido de botar um fim à violência e às graves violações de direitos. Pelo contrário, após a morte de Semião, milícias armadas realizaram mais de dez ataques paramilitares contra o povo Guarani-Kaiowá dos tekoha Guyra Kamby´i, Pyelito Kue e Potreiro Guasu, todos no cone sul do estado. Como consequência, além da morte de Semião, três indígenas foram baleados por arma de fogo, vários foram feridos por balas de borracha, inclusive uma criança de colo, e dezenas de indígenas foram espancados. São fortes os indícios de que indígenas sofreram tortura e há denúncias da ocorrência de um estupro coletivo de uma Guarani-Kaiowá.

     

    Diante dessa situação, Eliseu desabafou “meu povo, cansado de esperar e vendo a dor de nossas crianças chorando de fome, declara que já não consegue mais acreditar na vontade e na capacidade do Estado Brasileiro, em seus Três Poderes, para resolver efetiva e definitivamente esta situação”.

     

    Entre os anos de 2003 e 2014, 390 indígenas foram assassinados no Mato Grosso do Sul, um total que representa 52% dos casos registrados em todo o país. O número de suicídios registrados também é extremamente preocupante e totaliza 707 casos entre 2000 e 2014. Com 45 mil pessoas, os Guarani-Kaiowá são a 2ª maior população indígena do Brasil e ocupam apenas 30 mil hectares de suas terras tradicionais. De acordo com dados do governo federal, se todas as áreas reivindicadas por eles como territórios indígenas forem demarcadas elas representam cerca de apenas 2% da área total do estado. Por outro lado, o Mato Grosso do Sul tem 23 milhões de bovinos, que ocupam 23 milhões de hectares de terra.

     

    Ao finalizar seu discurso, Eliseu apresentou demandas bastante objetivas ao Conselho de Direitos Humanos da ONU: “tomar todas as medidas possíveis para assegurar que todos os acordos comerciais de empresas multinacionais e bancos de investimentos com o Mato Grosso do Sul sejam condicionados à demarcação e devolução de nossos territórios; e promover uma investigação independente sobre o ataque sistemático contra os povos indígenas no Brasil, incluindo a responsabilidade do Estado Brasileiro, tanto por ação como por omissão”.

     

    Organismos internacionais recebem Relatório de Violência

     

    Aproveitando sua participação na 30ª Sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU, Eliseu Lopes entregou a edição em inglês do Relatório Violência Contra os Povos Indígenas no Brasil – dados de 2014, publicado pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi), para representantes da Santa Sé, da União Européia, do Alto Comissariado e da Relatoria Especial da ONU sobre Direitos Indígenas.

     

    Além dos dados de suicídios e assassinatos mencionados acima, o Relatório apresenta 19 categorias de violências e violações de direitos cometidos contra os povos indígenas em todo o Brasil. Em 2014 houve aumento dos índices em 17 destas categorias. Um dos dados mais chocantes do Relatório refere-se à mortalidade na infância de alguns povos indígenas. Os Xavante, por exemplo, apresentam um índice mais de 800% superior ao da média nacional de mortalidade das crianças não indígenas.

     

    Segundo Eliseu Lopes, o Relatório é, em si, mais uma forma de mostrar ao mundo a realidade com que os povos indígenas são tratados no Brasil. “Meu povo está morrendo, está sofrendo, todos os dias, ataques e massacres… mas o governo brasileiro não apresenta nenhuma solução. É porque a demarcação das nossas terras foi paralisada que a violência, o estupro e a tortura feita por capangas e pistoleiros da região aumentam. O governo defende o interesse das grandes empresas e dos grandes fazendeiros da cana, eucalipto, soja, milho e do gado. Eles lucram muito, enquanto nós estamos morrendo. E a verdade é que ninguém é punido por matar nossas lideranças. Até mulheres grávidas foram torturadas na semana passada. O governo envia a força nacional, o exército, mas é pra defender as fazendas do agronegócio. Pra gente é claro que só a demarcação, definitivamente, pode acabar com toda esta tragédia que sofremos há mais de 500 anos. Só assim, vamos poder viver com dignidade”, declarou Eliseu após a sua intervenção durante a reunião na ONU.  

     

      

    Leia na íntegra o discurso de Eliseu Lopes.

     

    Acesse aqui o Relatório Violência Contra os Povos Indígenas do Brasil – dados 2014

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  • 22/09/2015

    Para compreender os conflitos entre fazendeiros e indígenas em MS

    Há muito os problemas que atingem os povos indígenas em Mato Grosso do Sul ganharam manchete na imprensa regional, nacional e internacional. Todos os anos índios são mortos e nada é feito de objetivo para mudar a realidade. Autoridades eleitas pelo povo, como vereadores, deputados estaduais, deputados federais, senadores, prefeitos e governador, mandato após mandato e salvo honrosas exceções, simplificam o problema. Ao fazerem isso, rechaçam o enfrentamento da questão fundiária, causa maior dos conflitos entre fazendeiros e comunidades indígenas. Na foto, os Guarani e Kaiowá comem a terra, em ato religioso, às portas do Supremo Tribunal Federal (STF), em Brasília.  

    Além disso, não raramente recorrem ao argumento de culpar instituições alhures pelo etnocídio ou genocídio cultural em andamento no estado: Supremo Tribunal Federal, Governo Federal, Ministério da Justiça, ONGs, Presidência da República, Conselho Indigenista Missionário, Ministério Público Federal, forças alienígenas que desejariam se apoderar do Aquífero Guarani etc. Repetidas vezes, de maneira costumeira, utilizam de sofismas dos mais variados para distorcer a realidade e formar opinião pública contrária à regularização das terras indígenas no país.

    Ao fazerem isso, essas autoridades se isentam de quaisquer responsabilidades, terceirizam o problema e lavam as mãos. Afirmam que é a União, e basicamente ela, que pode e deve solucionar os conflitos pela posse da terra, desde que assim o faça a favor dos fazendeiros, aqueles que possuem títulos de propriedade privada da terra e por vezes financiam campanhas eleitorais e projetos de poder.

    A questão fundiária, por sua vez, é um problema muito antigo e suas origens remontam aos séculos 18, 19 e 20, quando se deu a origem da propriedade privada da terra na região. Com o final da chamada Guerra do Paraguai (1864-1870), o antigo sul de Mato Grosso, atual Mato Grosso do Sul, passou a ser mais rapidamente colonizado por migrantes oriundos de outras partes do Brasil, além de imigrantes vindos de além-mar e paízes vizinhos. Desde então o espaço regional se configurou como palco de muitos conflitos pela posse da terra, especialmente quando comunidades indígenas tiveram seus territórios invadidos por fazendeiros e militares desmobilizados do exército imperial. A documentação oficial da época, como os relatórios da Diretória dos Índios da Província de Mato Grosso, comprova a situação. Contudo, sem os povos originários esta parte da bacia platina não estaria incorporada ao território nacional.

    Foi graças às alianças com os indígenas, feitas desde o século 18, que Portugal estabeleceu sua hegemonia na porção central da América do Sul. Posteriormente, quando o Brasil tornou-se Estado-nação, as alianças permaneceram durante o período imperial. Exemplo disso foi o protagonismo que os indígenas tiveram na defesa do território nacional durante a Guerra do Paraguai. Autores renomados como o Visconde de Taunay, apenas para citar um exemplo, se estenderam sobre o assunto e teceram elogios à participação dos Terena, Kinikinao, Kadiwéu, Guató e outros povos que, sozinhos ou ao lado do exército imperial, combateram as tropas invasoras do Paraguai na década de 1860.

    Com o fim do conflito bélico platino houve a expansão da fronteira pastoril e, consequentemente, o aumento da titulação dolosa de territórios indígenas a favor de terceiros. A partir de então os povos originários passaram a ter suas terras usurpadas e via de regra não tinham a quem recorrer. Esta é uma das marcas colonialistas da formação do Estado Brasileiro e da propriedade privada da terra em Mato Grosso do Sul.

    Neste contexto foi ainda imposto aos Guarani, Kaiowá, Terena e outros indígenas uma forma perversa de exploração da força de trabalho, análoga à escravidão moderna, baseada no conhecido sistema do barracão. Durante a primeira metade do século 20, muitos fazendeiros tinham transformado milhares de indígenas na principal mão-de-obra a ser explorada nas propriedades rurais que eram organizadas no antigo sul de Mato Grosso. Esta situação é verificada na fronteira com o Paraguai e a Bolívia, na Serra de Maracaju e em praticamente todo o estado.

    Milhares de indígenas passaram a trabalhar na condição de vaqueiros e em outras atividades econômicas, tais como: lavoura, colheita e preparo da erva-mate, exploração de ipecacuanha, transporte fluvial etc. Muitas mulheres foram ainda “pegas a laço”, violentadas e forçadas a se casar com não-índios, história presente na memória de muitos dos antigos (sul) mato-grossenses. Apesar disso tudo, os índios pouco usufruíram das riquezas que produziram e passaram a viver em situações cada vez mais difíceis, sobremaneira quando suas roças foram invadidas pelo gado e os fazendeiros mandaram derrubar as matas existentes em seus territórios. Depois de formadas as propriedades rurais, especialmente entre os anos de 1950 a 1970, a mão-de-obra indígena foi dispensada de muitas fazendas.

    Neste contexto histórico, marcado pela expansão do agronegócio no Centro-Oeste, dezenas de comunidades indígenas, as quais ainda conseguiam viver no fundo das fazendas, foram expulsas das terras de ocupação tradicional. Este processo de esbulho foi concluído na década de 1980.

    No começo do século 20, Cândido Mariano da Silva Rondon, posteriormente conhecido como Marechal Rondon, à frente da Comissão de Linhas Telegráficas do Estado de Mato Grosso, deixou registrado os ataques que fazendeiros desfechavam contra os indígenas, como ocorria na bacia do rio Taboco. Em suas palavras: “[…] eivados da falsa noção de que o índio deve ser tratado e exterminado como uma fera contra o qual devem fazer convergir todas as suas armas de guerra, os fazendeiros ao invés de reconciliarem-se com os silvícolas trucidavam homens, mulheres e crianças e aprisionando os que não havia logrado fugir”.

    Segundo Rondon, não contentes com os assassinatos, alguns fazendeiros “abriam os ventres de índias que se achavam em adiantado estado de gravidez”. Ações desta natureza são definidas como etnocídio e persistem, com outras roupagens, até o tempo presente. Por isso em Mato Grosso do Sul os indígenas são percebidos por muitos como não-humanos, chamados pejorativamente de “bugres”.

    Dessa forma, no âmbito da constituição do Estado Brasileiro e da formação da sociedade nacional, foram registradas sucessivas tentativas de exploração, dominação e até extermínio contra os povos indígenas. À medida que se estabeleceram na região, fazendeiros incorporaram territórios indígenas ao seu patrimônio. Muitos conseguiram isso requerendo junto às autoridades estaduais, sem muitas dificuldades e por meio pouco ortodoxos, títulos de propriedade privada da terra. Muitas áreas atingiam um tamanho tal que era demarcada vagamente em função da particularidade geográfica de cada região: córregos, rios, morros etc. Embora tivessem logrado a titularidade de vastas extensões, frequentemente não tomaram posse imediata das terras, onde comunidades indígenas conseguiram permanecer, de maneira mansa e pacífica, por décadas sem grandes infortúnios.

    À frente desses fazendeiros emergiu um grupo de proprietários de terra que se enriqueceu ao longo dos anos e, aproveitando-se da influência que tinham nos governos municipais, estadual e federal, ganhou poderes sobre pessoas e coisas. Mais ainda, promoveu todo tipo de violação dos direitos elementares dos povos indígenas. Constituiu-se, assim, uma elite ruralista com muita influência nos poderes constituídos na República, isto é, no próprio Estado Brasileiro. Seus feitos são enaltecidos por uma historiografia colonialista, geralmente financiada com dinheiro público, ligada à construção de uma história oficial e de uma identidade sul-mato-grossense, geralmente em oposição à de Mato Grosso, particularmente de Cuiabá.

    Assim, no tempo presente observamos mais uma situação de conflitos entre ruralistas e comunidades Guarani, Kaiowá e Terena. O resultado disso foi mais um indígena assassinado durante a retomada de uma área oficialmente declarada como terra indígena, chamada Ñande Ru Marangatu, localizada no município de Antônio João, na fronteira com o Paraguai. Sobre o assunto, até o momento nenhuma autoridade esclareceu de onde veio o tiro que no dia 29 de agosto de 2015 ceifou a vida do Kaiowá Simeão Fernandes Vilhalba, 24 anos. A julgar pelo histórico do assassinato de indígenas no estado, como aconteceu com Nelson Franco (1952) e Marçal de Souza (1983), este será mais um caso em que os criminosos permanecerão impunes.

    As autoridades máximas estaduais, com destaque para o governador do estado, em tese teriam a obrigação de contribuir positivamente para a elucidação dos fatos e repressão a todo tipo de violência armada contra povos originários. Trata-se de uma responsabilidade inerente ao cargo para o qual foram eleitos e em defesa do Estado Democrático de Direito, cujo conceito não se limita à defesa da propriedade privada da terra e da classe social à qual pertencem. Todavia, uma conduta desse tipo é incompatível com o protagonismo que certas autoridades tiveram no chamado Leilão da Resistência, ação planejada e executada por ruralistas para arrecadar fundos e financiar ações contra a retomada de terras indígenas, com a contratação de milícias armadas, tal qual noticiado pela imprensa desde 2013.

    Por isso em Mato Grosso do Sul há uma situação peculiar da qual parte da população do estado não sente orgulho: quem não é fazendeiro, será tratado como boi bagual e, portanto, como não-humano ou animal selvagem, sobretudo os povos originários, comunidades tradicionais e segmentos de classes sociais em situação de vulnerabilidade social.

    (*) Jorge Eremites de Oliveira é doutor em História (Arqueologia) pela PUCRS e docente da Universidade Federal de Pelotas e Paulo Marcos Esselin é doutor em História (História Ibero-Americana) pela PUCRS e docente da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.

     

     

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