• 09/10/2015

    Índios protestam em Brasília exigindo ação do governo para combater incêndio de grandes proporções na Terra Indígena Arariboia (MA)

    Um grupo de índios Guajajara protesta em frente ao Ministério do Meio Ambiente (MMA), em Brasília, nesta sexta (9/10), às 14h30, para exigir do governo federal uma ação coordenada e efetiva para acabar com o incêndio que já consumiu mais de 100 mil hectares de floresta na Terra Indígena (TI) Arariboia, no sul do Maranhão. O incêndio dura quase um mês e consumiu o equivalente a 20% da área, que tem 413 mil hectares. A linha de fogo chega quase a 100 quilômetros.

    Os indígenas exigem ser recebidos pela ministra Izabella Teixeira. Os órgãos envolvidos no combate ao fogo não conseguem coordenar ações e alegam não ter recursos para atuar. Não haveria dinheiro para custear nem mesmo a alimentação dos brigadistas. Exército, Corpo de Bombeiros, Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama) e Fundação Nacional do Índio (Funai) participam do trabalho.

    “É preciso ter uma decisão de governo para uma solução efetiva para o incêndio”, afirma Sônia Guajajara, coordenadora da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e uma das lideranças da TI Arariboia. A Apib apoia o protesto em Brasília.

    O fogo já queimou casas dos índios Guajajara e agora ameaça um grupo de índios “isolados” Awá Guajá. “Há um risco total de vida para eles”, conta Sônia Guajajara.

    Mais de 5,3 mil índios vivem na TI Arariboia, localizada entre os municípios de Amarante do Maranhão, Arame, Bom Jesus das Selvas, Buriticupu, Grajaú e Santa Luzia. A área á alvo constante de desmatamentos ilegais e roubo de madeira.

    Mais informações

    Sônia Guajajara – (61) 8263-8032

    Paulino Montejo – (61) 9952-4583

     

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  • 08/10/2015

    Dom Roque Paloschi: “Os inimigos dos Guarani Kaiowá os atacam na calada da noite. À luz do dia, atacam seus aliados”

    Dom Roque Paloschi, presidente do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e bispo de Roraima, esteve durante essa semana no Mato Grosso do Sul para contribuir com a missão ecumênica que prestou solidariedade aos povos indígenas e ao Cimi, alvo de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) movida pela bancada ruralista da Assembleia Legislativa, e para pedir outra CPI: a do genocídio, contra os povos indígenas do estado.

    “Pela inconveniência de atacar os Guarani Kaiowá à luz do dia, seus inimigos os atacam na calada da noite. À luz do dia, atacam seus aliados, em concreto, o Cimi, através de uma CPI que em vez de Comissão Parlamentar de Inquérito melhor seria chamada de CDF, Comissão de Despistamento dos Fatos”, disse Dom Roque aos religiosos, leigos, indígenas e movimentos sociais.

    Leia na íntegra o pronunciamento do bispo de Roraima e presidente do Cimi:  

     

    Pronunciamento de Dom Roque

    (Ato Ecumênico, Campo Grande, 07.10.2015)

    Agradeço essa convocação oportuna para a participação desse Ato Ecumênico ou melhor, desse Ato Macro Ecumênico em defesa do povo Guarani Kaiowá aqui no Mato Grosso do Sul e, um pouco também, em defesa do Cimi que foi “agraciado” com uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI). Eu digo “agraciado” porque essa CPI nos abrirá oportunidades para a repercussão, nacional e internacional, dos crimes cometidos contra os Guarani Kaiowá e demais povos originários do MS e do Brasil.

    A CPI do Cimi me lembra de uma novela do grande escritor austríaco, Franz Werfel, perseguido pelos nazistas e expulso de sua terra por causa de sua origem étnica. O título dessa novela, que poderia servir também para os cenários, nos quais se encontram os povos indígenas, aqui no MS, é: “Não o assassino, os assassinados são culpados”.

    Os culpados não são os paramilitares e não os fazendeiros organizados em milícias armadas que, segundo Elizeu Lopes, liderança Guarani Kaiowá, entre agosto e setembro deste ano provocaram mais de dez ataques contra as Terras Indígenas Ñanderú Marangatú, Guyra Kamby´i (TI Panambi-Lagoa Rica), Pyelito Kue (TI Iguatemipegua I) e Potreiro Guasu.

    Os culpados são os Guarani Kaiowá.

    – Os culpados do assassinato do líder Guarani Kaiowá Semião Vilhalva não são os fazendeiros organizados em milícias armadas;

                = nem são eles os culpados nos ferimentos causados por tiros com armas de fogo contra três indígenas;

                = nem são eles os culpados pelas feridas por balas de borracha;

                = nem são eles os culpados pelo espancamento de dezenas de indígenas;

                = nem são eles os culpados pelo estupro coletivo contra uma mulher Guarani Kaiowá, segundo denúncias que nos chegaram da respectiva região.

    Os culpados são os Guarani Kaiowá.

    Os culpados dos mais de 580 indígenas que cometeram suicídio e nos 390 assassinatos de Guarani Kaiowá no Mato Grosso do Sul, nos últimos 12 anos, não são os paramilitares nem os fazendeiros organizados em milícias armadas, nem a ala ruralista que lucra com as terras indígenas incorporadas nos seus latifúndios.

    Os culpados são os próprios Guarani Kaiowá.

    Mas por vários motivos não convém aos inimigos dos povos indígenas atacar, diretamente, os Guarani Kaiowá, porque gozam certo prestígio na opinião pública mundial. O próprio Elizeu Lopes está chegando neste momento de viagem do exterior onde encontrou mais apoio do que em sua própria terra. Se encontrou com organismos internacionais em defesa dos direitos humanos e denunciou a omissão do próprio estado brasileiro, do poder Legislativo, Judiciário e Executivo face aos povos indígenas.

    Pela inconveniência de atacar os Guarani Kaiowá à luz do dia, seus inimigos os atacam na calada da noite. À luz do dia atacam seus aliados, em concreto, o Cimi, através de uma CPI que em vez de Comissão Parlamentar de Inquérito melhor seria chamada de CDF, Comissão de Despistamento dos Fatos. Essa CPI/CDF se dirige contra os Guarani Kaiowá e todos os seus aliados, contra os movimentos populares do campo, Comunidades Eclesiais de Base ecumenicamente organizados e contra as Pastorais Sociais. Agradeço como presidente do Cimi a solidariedade que recebemos por defender a causa dos povos indígenas. Nos 3.800 km (via BR-174) desta longa viagem que fiz de Boa Vista/RR para Campo Grande/MS, pensei: “Qual poderá ser, além do horizonte simbólico, o significado e a contribuição concreta dessa viagem”?

    Provavelmente todos, que estamos aqui, pensamos algo semelhante sobre o alcance concreto da nossa presença nesse ato ecumênico e, amanhã, da visita às comunidades indígenas. O que podemos fazer para transformar a lei do mais forte em “justiça mínima” nos territórios guarani kaiowá? Os diferentes credos não impedem de unir-nos, de somar gritos, denúncias e forças. Mas falta, talvez, algo mais decisivo nesta situação em que “o sistema, sustentado pelos poderes Legislativo, Judiciário, Executivo e os canhões do grande capital e do agronegócio, procura encaminhar os povos indígenas para a solução final de extermínio” (XXI Assembleia do Cimi). Em todo Brasil, os povos indígenas estão rodeados pelo latifúndio e pelas Propostas de Emenda à Constituição (PEC). Uma das mais perigosas é a PEC 215, que transfere do Executivo para o Legislativo a prerrogativa de demarcar terras tradicionais indígenas, titular terras quilombolas e criar unidades de conservação ambiental. Esta PEC atende explicitamente aos interesses da bancada ruralista e do agronegócio. As PECs são subterfúgios para desmontar as conquistas da Constituição Federal de 1988.

    Um desses subterfúgios é também o chamado “marco temporal”, pelo qual só poderiam ser atendidos reivindicações territoriais dos índios, que até a data da Constituição de 1988 foram disputadas por eles. Mas, até essa data, os índios foram tutelados e não podiam entrar em juízo para reivindicar suas terras. Por isso os Guarani Kaiowá retomaram a partir do 22 de agosto de 2015, quase a totalidade de áreas invadidas por fazendeiros e localizadas dentro dos limites da terra indígena, já homologada. O governo federal não pagou as indenizações para os ocupantes e os efeitos do decreto de homologação foram suspensos pela Justiça em setembro de 2005. Logo depois dessa retomada vieram os policiais do Departamento de Operações de Fronteira (DOF) e dispararam tiros para assustar os índios. Mas os índios decidiram não recuar.

    Os fatos são conhecidos, os assassinatos contabilizados, os cenários localizados, os gritos ouvidos, as imagens sobre as extremas crueldades são divulgadas, os mandantes dos assassinatos são soltos, um ou outro dos seus capangas está preso, os culpados são apontados. Talvez não pela grande imprensa, mas por vias alternativas, os fatos romperam as fronteiras da clandestinidade e chegaram em algumas das nossas comunidades. Precisamos sacudir essas nossas comunidades e socorrer aos índios com mais eficácia!

    Amanhã, por exemplo, quando estaremos nas comunidades indígenas Apykai e Guayra Kamby´i – o que vamos dizer aos sobreviventes da família do cacique Nísio Gomes, que no acampamento Guaviry (MS), em 2011, foi assassinado à queima-roupa, jogado numa caçamba de caminhonete e nunca se soube para onde foi levado seu corpo?

    Nosso ex-secretário do Cimi, Antônio Brand, em sua tese de doutorado, descreveu com profundidade como os Guarani Kaiowá, por causa da qualidade de suas terras e de sua mão de obra foram permanentemente submetidos a ondas de colonização e confinamento em territórios cada vez menores. Os estrangulamentos dos suicídios não seriam uma consequência dos confinamentos territoriais?

    Se não se tratasse nessas CPIs de um jogo com cartas marcadas, poderíamos nos empenhar na realização de CPIs sérias, verdadeiras, sem fins eleitorais. Por exemplo, uma CPI sobre o confinamento histórico dos Guarani Kaiowá em condomínios que não garantem seu sustento e que daria razão a suas reivindicações. Poderíamos também solicitar uma CPI sobre o financiamento da última campanha eleitoral da dentista e deputada estadual do Partido Trabalhista do Brasil (PT do B), Mara Caseiro, proponente da CPI do Cimi e, no dia 30 de setembro, eleita presidente dessa CPI que lhe muito convém. No dia 2 de outubro, Mara Caseiro aproveitou o último dia do prazo permitido para trocar de domicílio eleitoral para mudar seu título para Campo Grande, onde vai concorrer à prefeitura da Capital nas eleições do ano que vem.

    É óbvio que a CPI do Cimi não tem por objetivo, como o documento de convocação reza, de investigar, se a entidade “incitou ou financiou invasões de propriedades particulares em Mato Grosso do Sul”. O verdadeiro objetivo da deputada é de se servir da CPI de trampolim para criar visibilidade para sua “pré-candidatura” à prefeitura de Campo Grande.

    Este é o contexto em que somos convocados para exercer nossa vocação profética. Se nós nos calamos, “as pedras gritarão” (Lc 19,40)!

    Os Guarani Kaiowá foram caçados e escravizados:

    – pelos Bandeirantes,

    – colonizados pela Cia. Matte Laranjeiras que se apropriou de suas terras para o plantio da erva de Matte,

    – pelo Serviço de Proteção aos Índios,

    – pelos governos militares e, finalmente,

    – pelos governos democráticos de hoje, estes, por sua vez, colonizados pelo grande capital.

    Os Guarani Kaiowá são sobreviventes “que vêm da grande aflição” (Apc 7,14). Resistem com bordunas, maracás e com a inspiração da Palavra de Ñanderú.

    Bordunas, arcos e flechas, hoje, não tem muita serventia para enfrentar os jagunços do agronegócio. Mas a Palavra de Ñanderú, ela fez da sobrevivência desses índios não uma probabilidade, mas uma certeza.

    Uma dessas sobreviventes Guarani, marcada por rugas de luto, luta e fome, perguntada porque justo agora estão retomando as suas terras, num momento em que as forças são tão desiguais, respondeu: “Ñanderú mandou dizer: está na hora”.

     

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  • 08/10/2015

    Violações de direitos cometidas pelo presidente da Câmara dos Deputados são denunciadas à ONU e OEA

    As medidas tomadas pelo presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, no último dia 5 de outubro serão denunciadas à Organização das Nações Unidas (ONU) e à Organização dos Estados Americanos (OEA). Protocolado nesta quinta-feira (8), o documento assinado por cerca de 50 organizações da sociedade civil evidencia que Cunha feriu ao menos cinco tratados internacionais – como a Convenção Americana de Direitos Humanos – ao trancar povos indígenas e comunidades tradicionais no plenário da Câmara e ao impedir que advogados entrassem para prestar assistência aos manifestantes e às suas lideranças.

    Em protesto contra a crescente violência contra os povos e as comunidades tradicionais que vivem do campo, constatada diariamente; diante da omissão da Câmara dos Deputados e do Estado brasileiro no sentido de resolver estes conflitos, de demarcar as terras indígenas e titular as terras quilombolas;  diante da explícita opção do Estado brasileiro de defender os interesses do agronegócio e das grandes corporações; diante das diversas proposições legislativas que retiram direitos constitucionais dos povos e das comunidades tradicionais, especialmente a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215, que está na iminência de ser votada na Câmara dos Deputados; e diante do grande número de lideranças e membros das populações tradicionais assassinados por agentes do latifúndio, sem que estes crimes tenham sido investigados seriamente e seus autores punidos, os representantes dos povos indígenas e das comunidades tradicionais resolveram fazer uma vigília no plenário onde acontecia a audiência pública que debatia justamente a violência no campo contra essas populações. Em resposta a legítima decisão, Eduardo Cunha ordenou o fechamento das portas, o desligamento de luzes e ar-condicionados em uma sala sem janelas e acionou a  a Tropa de Choque.

    Os manifestantes pacificamente reivindicavam a demarcação de terras indígenas, a titulação dos territórios quilombolas e propostas de alteração ou rejeição de propostas legislativas que violam seus direitos constitucionais à terra, ao território e à biodiversidade. Mesmo assim foram tratados de modo arbitrário e autoritário pelo presidente da “Casa do Povo”.

    “Ao impedir o acesso das advogadas e advogados aos povos indígenas, quilombolas, pescadores, geraizeiros e das outras comunidades tradicionais, o presidente da Câmara dos Deputados violou um dos preceitos fundamentais da Constituição do Brasil  e de normas e tratados internacionais, a garantia do direito de acesso à justiça”, indica o documento.

    O texto também evidencia que violações das prerrogativas de advogadas e advogados comprometidos com a defesa de direitos humanos têm ocorrido de forma constante no país.

    Tal constatação está presente em dossiê elaborado pela Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares, entregue à Presidência da OAB. 

    Leia as denúncias entregues:

    >> Denúncia encaminhada ao Relator dos Direitos Indígenas e ao Relator para Defensores de Direitos Humanos (OEA): aqui

    >> Denúncia encaminhada à Relatora Especial sobre Independência dos Juízes e Advogados das Nações Unidas, ao Relator Especial de Defensores de Direitos Humanos das Nações Unidas, ao Relator Especial sobre a Proteção e Promoção do Direito à Livre Opinião e Expressão, e ao Relator sobre a Liberdade de Assembleia e de Associação: aqui

     

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  • 08/10/2015

    Cimi denuncia invasão de garimpeiros em área do grupo isolado Moxi Hatëtëa, em Roraima

    O Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e a Diocese de Roraima vêm a público manifestar sua preocupação diante da invasão de garimpeiros na região ocupada pelo grupo indígena isolado Moxi Hatëtëa, no interior da terra Yanomami e com a ausência de medidas de proteção por parte do governo. A denúncia foi apresentada por lideranças Yanomami da Associação Indígena Hutukara ao MPF/RR no último dia 25/09/2015, informando que a estrutura da base de proteção etnoambiental da Funai, inclusive a sua pista de pouso, está sendo utilizada por garimpeiros.

    A denúncia é particularmente grave, porque se trata de uma região habitada por indígenas isolados, em situação de extrema vulnerabilidade, sozinhos, indefesos e desprotegidos diante da invasão de seu território. É de conhecimento da Fundação Nacional do Índio – Funai, órgão indigenista governamental, que garimpeiros tomaram posse da sua base de fiscalização localizada na Serra da Estrutura, próximo ao Alto Catrimani, desativada desde março passado sob alegação de falta de condições para manter servidores na área.  

    Esta invasão é o prenúncio de novo genocídio indígena. Neste momento existe uma grande interrogação sobre os Moxi Hatëtëa, se sobreviveram à invasão garimpeira, fugindo do local em que estavam localizados (por que já se sabe que não estão mais lá) ou se foram massacrados, fazendo parte da triste lista dos povos indígenas exterminados.

    A possibilidade de ter ocorrido mais um genocídio não é mera especulação se olharmos para a história recente da invasão garimpeira na terra indígena Yanomami. Em 1993 ganhou grande destaque na imprensa do mundo inteiro o “massacre do Haximu” em que 16 indígenas foram mortos, entre eles velhos, mulheres e crianças. Estima-se que o garimpo ilegal nesta terra indígena, no final da década e 80 e início da década de 90, tenha provocado a morte de aproximadamente dois mil Yanomami.

    Por isso, é incompreensível que o governo federal, que tem na Funai uma Coordenadoria especialmente criada para a proteção dos povos indígenas isolados, sabendo do alto risco de extinção dos Moxi Hatëtëa, não tenha adotado, até o momento, as providências necessárias para manter a integridade do referido grupo Yanomami

    A gravidade da situação exige uma operação imediata de retirada dos garimpeiros da região habitada pelos Moxi Hatëtëa, a urgente reativação da base de proteção da Funai, assim como uma investigação rigorosa sobre os promotores da invasão da terra indígena Yanomami e a punição dos responsáveis. Cabe ao governo federal também informar à sociedade o que aconteceu ao grupo indígena isolado.

    Manaus (AM), 07 de outubro de 2015. 

    Conselho Indigenista Missionário – CIMI e Diocese de Roraima

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  • 08/10/2015

    Audiência Pública debate aumento da violência contra os povos indígenas, na Câmara, hoje (8), às 10h

    Brasília – 8 de outubro de 2015 – Houve um severo aumento da violência e das violações praticadas contra os povos indígenas no Brasil em 2014, especialmente em relação aos casos de assassinatos, suicídios, mortes por desassistência à saúde, mortalidade na infância, invasões possessórias e exploração ilegal de recursos naturais e de omissão e morosidade na regularização das terras indígenas. Esta é a constatação do Relatório Violência Contra os Povos Indígenas no Brasil – dados de 2014, publicado pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi), que será debatido em Audiência Pública hoje (8/10), às 10h, na Câmara dos Deputados.

     

    A iniciativa da audiência, que contará com a participação de lideranças do povo Guarani-Kaiowá, é do presidente da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, deputado Átila Lira (PSB-PI) e o evento poderá ser acompanhado ao vivo no sítio eletrônico http://edemocracia.camara.gov.br/web/eventosinterativos/bate-papo/-/bate-papo/sala/41201

     

    O Relatório explicita que o estado mais violento do Brasil com os povos originários continua sendo o Mato Grosso do Sul. Nele, no último dia 29 de agosto, Semião Vilhalva, de apenas 24 anos, foi assassinado durante um ataque paramilitar organizado por fazendeiros ao tekoha Ñanderú Marangatú, no município de Antônio João, cuja homologação foi assinada pelo então presidente Lula em 2005.

     

    Após a morte de Semião, milícias armadas realizaram mais de doze ataques paramilitares contra diversas comunidades do povo Guarani-Kaiowá, no cone sul do estado. Como consequência, além da morte de Semião, três indígenas foram baleados por arma de fogo, vários foram feridos por balas de borracha, inclusive uma criança de colo, e dezenas de indígenas foram espancados. São fortes os indícios de que indígenas sofreram tortura e há denúncias da ocorrência de um estupro coletivo de uma Guarani-Kaiowá.

     

    Devido ao aumento da violência contra os povos indígenas, à situação de crise humanitária no Mato Grosso do Sul e à recente aprovação pela bancada ruralista da Assembleia Legislativa do estado de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) contra o Cimi, diversas instituições da sociedade civil, organizações religiosas do Brasil, América Latina e Holanda e parlamentares do Congresso Nacional têm reivindicado a criação de uma CPI do Genocídio para que sejam investigados os crimes e a violência cometidos contra os povos indígenas do estado. Hoje (8), uma missão ecumênica segue para o município de Dourados, onde fará uma visita às comunidades indígenas Apikay e Guyra Kambyí.

    Dados assustadores

    O Relatório é realizado a partir da sistematização de dados coletados e compilados com base nas denúncias e nos relatos dos povos, das lideranças e organizações indígenas, de informações das equipes missionárias do Cimi que atuam nas áreas e de notícias veiculadas pelos meios de comunicação de todo país. Também inclui informações de fontes oficiais. O aumento das violências e violações foi constatado em 17 das 19 categorias que compõem o Relatório.

     

    De acordo com informações da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), vinculada ao Ministério da Saúde, 135 indígenas cometeram suicídio em 2014. Este número configura-se como o maior em 29 anos, de acordo com os registros do Cimi. O Mato Grosso do Sul continua sendo o estado que apresenta a maior quantidade de ocorrências, com o registro de 48 suicídios, totalizando 707 casos registrados de suicídio no estado entre 2000 e 2014. Também é preocupante o alto número de casos registrados no Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei) Alto Rio Solimões, localizado no Amazonas, onde são atendidos os povos Tikuna, Kokama e Caixana. Somente neste Dsei foram registrados 37 casos de suicídio.

     

    Ainda segundo as informações da Sesai, 138 indígenas foram assassinados em 2014, sendo que no ano anterior 97 casos foram registrados. É possível afirmar que este estado figura mais uma vez como o mais violento do país, em relação ao assassinato de indígenas, com 41 ocorrências ou 29% dos casos.

     

    Serviço

     

    O quê: Audiência Pública sobre o Relatório Violência Contra os Povos Indígenas no Brasil –  dados 2014

     

    Quando: Hoje (8 de outubro), às 10h

     

    Onde: Câmara dos Deputados, Plenário 8, Anexo 2

     

    Mais informações, com assessoria de imprensa: Patrícia Bonilha (Conselho Indigenista Missionário – Cimi): 61 9979-7059

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  • 07/10/2015

    Requerimento pedindo a instalação da CPI do Genocídio é protocolado na mesa diretora da Assembleia Legislativa do MS

    A mesa diretora da Assembleia Legislativa do Mato Grosso do Sul recebeu no início da tarde desta quarta-feira, 7, requerimento pedindo a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar os assassinatos e os diversos tipos de violências cometidas contra os povos indígenas no estado. A chamada CPI do Genocídio tornou-se um clamor popular país afora, não apenas na sociedade sul-mato-grossense, mas sobretudo entre os povos indígenas, com destaque aos Guarani Kaiowá e Terena. Durante essa semana, mobilizações pela CPI do Genocídio acontecem em Brasília e no Mato Grosso do Sul.  

    Genocídio é quando violências e crimes são motivados por questões étnicas contra uma coletividade, no caso a indígena. É o extermínio deliberado, além da eliminação da existência física. Geno vem do grego e significa ‘raça’ ou ‘tribo’; Cídio vem do latim e significa ‘matar’.  "Um plano coordenado, com ações de vários tipos, que objetiva a destruição dos alicerces fundamentais da vida de grupos nacionais com o objetivo de aniquilá-los", assim definiu genocídio o advogado polonês Raphael Lemkin, em 1944. 

    Nos últimos 12 anos, 390 indígenas foram assassinados e outros 585 cometeram suicídio. Os dados constam no Relatório de Violências Contra os Povos Indígenas – Dados 2014 do Conselho Indigenista Missionário (Cimi). No estado, 229 inquéritos envolvendo homicídio doloso contra indígenas foram abetos nos últimos anos. Para o deputado Pedro Kemp (PT), líder de bancada e entusiasta da CPI, é preciso saber quem mata e assassina os indígenas, a formação de milícias ruralistas – já comprovada pela Justiça Federal no caso Nísio Gomes Guarani Kaiowá. Porém, para o deputado é preciso entender o genocídio como um processo mais amplo, envolvendo ainda a omissão do Estado diante da ausência de direitos humanos, sociais e da violência privada, organizada e premeditada, contra as comunidades. 

    “Sem os territórios tradicionais, as comunidades indígenas vivem confinadas, às margens das estradas. Então isso gera violência, falta de perspectivas, suicídios, miséria, problemas diversos. Permitir isso faz parte do genocídio em curso”, disse Kemp na manhã de hoje durante sessão na Assembleia Legislativa que teve a questão indígena como principal assunto abordado na tribuna. De acordo com o parlamentar, cerca de 120 indígenas estão detidos no estado. “Quantos assassinos de índios estão presos? No Mato Grosso do Sul, para quem mata um índio parece existir a garantia da impunidade. Precisamos apurar”, destacou. 

    Kemp destacou o assassinato de Oziel Terena, em 2013, durante reintegração de posse na Terra Indígena Buriti. “Existe a bala, sabe-se qual é o calibre, quem estava em confronto com os indígenas, mas não se sabe de quem partiu o tiro. Como não é possível determinar? Essa Casa não pode ser conivente com o genocídio em curso”, frisou o deputado. No início dessa semana, a Associação Brasileira de Antropologia (ABA) divulgou uma nota pública entendendo como genocídio a violência contra os indígenas no MS.

    Em setembro de 2011, o Ministério Público Federal (MPF) também se posicionou de forma enfática dizendo que o que estava acontecendo no Mato Grosso do Sul contra os povos indígenas era genocídio. A manifestação foi provocada por um ataque contra os Guarani Kaiowá de Pyelito Kue, no município de Iguatemi. Na época, os indígenas viviam às margens de uma rodovia: crianças e idosos foram atingidos por balas de borracha e o acampamento foi incendiado. A Anistia Internacional também considera caso de genocídio a conjuntura vivida pelos povos indígenas no estado. 

    “Até mesmo o registro de advogado na OAB/MS (Ordem dos Advogados do Brasil) estão tentando cassar do advogado Terena Luiz (Henrique) Eloy. O cúmulo do absurdo a gente ter que assistir isso acontecer dentro de uma entidade com a OAB, que sempre foi referência na defesa da democracia, dos direitos, da justiça. Além de atacar as entidades que apoiam os indígenas, não querem permitir que um índio seja advogado e defenda o seu povo”, ressalta Kemp.

    “Quem colheu meus milhos foram os índios”

    Para alguns parlamentares, caso do deputado ruralista Zé Teixeira (DEM), não é verdade que existe uma violência desse tipo, genocida, em curso contra os indígenas do estado, e ele não acredita que ‘produtores rurais’ tenham parte com algo do tipo. Pontuou que os indígenas são produtivos e capazes, faltando apenas mais incentivos do governo. “Quem colheu meus milhos esse ano foram os índios. Vai lá (na fazenda do deputado), trabalha e recebe certinho. Jamais que um índio bateu palmas na minha casa em Dourados e eu deixei de levantar da mesa para atender. Passavam e perguntavam: tem pão? Nunca neguei. (…) Os Kadiwéu têm muita terra e vivem na miséria porque falta incentivo a eles”, disse Teixeira reforçando um discurso recorrente entre os ruralistas de que a questão indígena não é de terra, mas de assistência social. O deputado é um dos integrantes da chamada CPI do Cimi.

    Já a presidente da CPI do Cimi, a deputada ruralista Mara Caseiro (PTdoB), defendeu uma “reforma agrária indígena” e falou sobre “países de fora para vir resolver uma questão que é nossa e que deveria ter sido resolvida pelo governo federal (sic)”, sem precisar exatamente de quais países estava a falar. A parlamentar ainda destacou: “São 13 anos que o PT está aí e o que ele fez para resolver nossa questão indígena? Inércia tem trazido interesses escusos, pregando o ódio e a guerra”, também sem destacar quais seriam os interesses escusos. O tom ameno e fraterno de Mara com relação aos indígenas não convenceu. Acabou vaiada pela população indígena presente no Plenário.

    A tática dos ruralistas concentrou-se em atacar o governo federal, criando proximidades com os indígenas e jogando para o Palácio do Planalto a responsabilidade por todos os problemas entre indígenas e fazendeiros no estado. “Indígenas e produtores: todos são vítimas desse governo que aí está”, ressaltou o deputado José Carlos Barbosa (PSB).

    O deputado Pedro Kemp, por sua vez, destacou que exatamente pelas ineficiências do governo na questão indígena é preciso seguir lutando pela demarcação das terras indígenas no estado e a indenização dos títulos de boa-fé aos ocupantes não-indígenas de territórios tradicionais reivindicados. “O governo federal precisa demarcar as terras indígenas. Só assim o genocídio em curso poderá ter um fim. É isso que falta”, encerrou.

  • 07/10/2015

    Em Brasília e no Mato Grosso do Sul, mobilizações pedem CPI para apurar genocídio dos povos indígenas

    A Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM), da Câmara dos Deputados, discute hoje (7/10), em audiência pública, a crescente violência praticada contra os povos indígenas no Mato Grosso do Sul, especialmente os Guarani-Kaiowá. A audiência será realizada às 14 horas, no Plenário 9, do Anexo 2.

    Foram convidados para representar o povo Guarani-Kaiowá, na audiência, Valdelice Veron e Natanael Vilharva Cáceres. Também estarão compondo a mesa a coordenadora da 6ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal (MPF), Debora Duprat, e um representante do Ministério da Justiça. Cerca de 200 lideranças de povos indígenas e representantes de quilombolas, pescadores, geraizeiros, apanhadores de flores sempre viva e outras comunidades tradicionais também participarão da audiência.

    Há mais de uma década os registros de violência indicam que o Mato Grosso do Sul é o estado mais violento contra os povos indígenas em todo o Brasil. Somente em 2014 foram registrados 48 casos de suicídio, totalizando 707 casos registrados entre 2000 e 2014 no estado. Outro dado assustador é que entre os anos de 2003 e 2014, 390 indígenas foram assassinados no Mato Grosso do Sul, um total que representa 52% dos casos registrados em todo o país.

    No último dia 29 de agosto, Semião Vilhalva, de apenas 24 anos, foi assassinado durante um ataque paramilitar organizado por fazendeiros ao tekoha Ñanderú Marangatú, no município de Antônio João (MS), cuja homologação foi assinada pelo então presidente Lula em 2005.

    Após a morte de Semião, milícias armadas realizaram mais de doze ataques paramilitares contra diversas comunidades do povo Guarani-Kaiowá, no cone sul do estado. Como consequência, além da morte de Semião, três indígenas foram baleados por arma de fogo, vários foram feridos por balas de borracha, inclusive uma criança de colo, e dezenas de indígenas foram espancados. São fortes os indícios de que indígenas sofreram tortura e há denúncias da ocorrência de um estupro coletivo de uma Guarani-Kaiowá.

    Com 45 mil pessoas, os Guarani-Kaiowá são a 2ª maior população indígena do Brasil e ocupam apenas 30 mil hectares de suas terras tradicionais. De acordo com dados do governo federal, se todas as áreas reivindicadas por eles como territórios indígenas forem demarcadas elas representam cerca de apenas 2% da área total do estado. Por outro lado, o Mato Grosso do Sul tem 23 milhões de bovinos, que ocupam 23 milhões de hectares de terra.

    Ato ecumênico no Mato Grosso do Sul

    Uma missão ecumênica, composta por quinze instituições religiosas do Brasil, América Latina e uma da Holanda, visitará o Mato Grosso do Sul hoje e amanhã em solidariedade aos povos Guarani-Kaiowá e em defesa da criação da CPI do Genocídio para que sejam investigados os crimes e violência cometidos contra os povos indígenas do estado. Hoje (7), às 15h, está previsto um ato ecumênico na Assembleia Legislativa. Amanhã (8), a missão segue para Dourados, onde fará uma visita às comunidades indígenas Apikay e Guyra Kambyí por volta das 8h30. As instituições demandam que as autoridades estaduais e federais adotem providências imediatas.

    Fazem parte da missão ecumênica as seguintes instituições: Coordenadoria Ecumênica de Serviço, Igreja Anglicana (Comissão Nacional de Incidência Pública da IEAB), Conselho Latino-Americano de Igrejas (Clai), Aliança Brasileira de Batistas, Comissão Pastoral da Terra (CPT), Igreja Presbiteriana Unida, Conselho Nacional de Igrejas Cristãs (Conic), Koinonia e Ogam no Camdomblé, Fundação Luterana de Diaconia (FLD), Rede Jubileu Sul, Cáritas Brasileira, Conselho de Missão entre Povos Indígenas (Comin), Rede Ecumênica de Juventudes (Reju), Centro de Estudos Bíblicos (Cebi) e Kerkinactie/Holanda.

    Serviço

    O quê: Audiência Pública sobre a violência contra indígenas no Mato Grosso do Sul

    Quando: Hoje (7 de outubro), às 14h

    Onde: Câmara dos Deputados, Plenário 9, Anexo 2

    Mais informações, com assessoria de imprensa:

    Patrícia Bonilha (Conselho Indigenista Missionário – Cimi): 61 9979-7059

     

     

     

  • 07/10/2015

    Ocupação da sede da Funai de Imperatriz é mantida depois de publicação de edital

    Os cerca de 80 indígenas e quilombolas que ocupam a sede da Coordenação Regional da Fundação Nacional do Índio (Funai) em Imperatriz (MA), desde a tarde de ontem, 6, decidiram, em assembleia na manhã desta quarta-feira, 7, manter e ampliar a mobilização. Os indígenas passaram a ocupar a parte interna do prédio da Funai. Servidores e a coordenadora regional do órgão Maria José Barros estão no local.

    Leia mais: Indígenas, quilombolas e quebradeiras de coco ocupam sede da Funai em Imperatriz, no Maranhão

    Enquanto um grupo bloqueia o portão de entrada, outro montou acampamento no gabinete de Maria José. Rituais e rezas são revezados entre os povos e comunidades presentes. Não há previsão de liberação da sede e as negociações com a Funai estão emperradas por decisão do próprio órgão, contam as lideranças indígenas.

    A publicação de um edital pela Funai na manhã de hoje explica. Contrariando decisão da Justiça Federal, a vontade do povo Krenyê e o que já vinha sendo negociado, a Funai comunica no edital que a terra a ser adquirida para o povo será por licitação, transformada em reserva, não condiciona a dotação orçamentária e o critério será o da terra mais barata. 

    Conforme as lideranças indígenas, a decisão da Justiça Federal da 1ª Vara de São Luís do Maranhão, com base em processo movido pelo Ministério Público Federal (MPF), a terra deve ser adquirida por desapropriação, com dotação orçamentária definida, dominial (quando a terra é dos indígenas, não da União) e o critério deve ser estabelecido pelo relatório circunstanciado da própria Funai, respeitando as taxas de crescimento populacional do povo.

    “Ontem (terça-feira, 6) ficou acordado com a Funai que as lideranças indígenas debateriam o edital antes da publicação. A resposta seria dada hoje. No entanto, todos foram surpreendidos pela publicação. Isso causou uma revolta muito grande. Existia uma negociação em curso, uma decisão judicial e a vontade do povo: tudo foi desconsiderado pela Funai”, explica a missionária Rosimeire Diniz, do Cimi Regional Maranhão.

    Na ocupação estão os povos indígenas Krenyê, Gamela, Kreepynm, Gavião, que contam com o apoio dos quilombolas do Movimento Quilombola do Maranhão (Moquibom) e quebradeiras de coco do Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu (Miqcb). A razão é que a ação direta na Funai de Imperatriz faz parte das mobilizações nacionais da Articulação dos Povos e Comunidades Tradicionais, que realiza encontro em Luziânia (GO), no Centro de Formação Vicente Cañas, e agenda com atos públicos em Brasília. 

    Além das reivindicações dos Krenyê, a Funai respondeu de forma negativa aos Gamela: o Grupo de Trabalho para a identificação territorial do povo não é prioridade e que no máximo a Funai enviará a Brasília três lideranças para negociar; no caso dos Gavião, o órgão não pretende fazer a demarcação territorial porque há desentendimentos entre o povo e os Guajajara sobre a ocupação, e que os Guajajara devem fazer uma assembleia para levar aos Gavião uma proposta; sobre as reivindicações do povo Kreepynm, a Funai disse que não irá se pronunciar: os indígenas devem procurar o MPF.

  • 07/10/2015

    ABA entende como genocídio violência contra indígenas no MS e pede ação imediata do Estado

    A Associação Brasileira de Antropologia (ABA) afirma, em nota pública divulgada no início dessa semana, que a omissão do Estado brasileiro diante da violência contra os povos indígenas no Mato Grosso do Sul “poderá ficar nos registros da história indígena e do indigenismo brasileiro, naquela região, como de clara conivência com algo que aparenta ser uma ação de extermínio planejado de um povo indígena, em pleno século XXI”.

    No texto da nota, a ABA enumera diversos casos de violência contra lideranças indígenas, envolvendo espancamentos e assassinatos lembrando que no âmbito da Comissão Nacional da Verdade (CNV) o Relatório Figueiredo trouxe à sociedade crimes de mesma espécie cometidos no decorrer do século XX, sobretudo durante a ditadura militar (1964-1985).

    Para a ABA, a paralisação das demarcações das terras indígenas é um dos vetores deste genocídio em curso: “Pode-se afirmar que as inadimplências administrativas que emperram a publicação dos relatórios de identificação e delimitação das terras indígenas, a insegurança devida à ineficiência dos órgãos policiais, a atuação corrente e muitas vezes impune, de empresas de segurança e de capangas, unidas à judicialização dos processos de demarcação de terras, têm contribuído para inflamar em Mato Grosso do Sul um clima de tensão, no qual se consuma de forma paulatina um genocídio claramente anunciado”.

    Leia na íntegra:

     

    Situação dos Guarani Kaiowa e Ñandéva no Mato Grosso do Sul: Ação imediata ou genocídio consentido pelo Estado Brasileiro

    Diante da sequência de ações de grupos armados contra comunidades Guarani Kaiowa e Guarani Ñandéva ao longo dos últimos trinta dias no Mato Grosso do Sul, que resultaram em mortes, ferimentos e traumas que serão carregados para o resto das vidas de quem as presenciou, ou o Estado brasileiro toma uma posição clara e implementa as medidas necessárias e urgentes que dele se espera, garantindo a efetivação dos direitos deste povo indígena na região, como assegurado na Constituição Federal de 1988 e na normativa internacional, ou sua omissão poderá ficar nos registros da história indígena e do indigenismo brasileiro, naquela região, como de clara conivência com algo que aparenta ser uma ação de extermínio planejado de um povo indígena, em pleno século XXI.

    Ao longo da última década não foram poucos os sinais e indícios de que se estava caminhando para um quadro crítico e assustador de violência sobre os Guarani no Mato Grosso do Sul. Isso não quer dizer que a violência não existisse antes disso. Ao contrário, seja velada ou explícita, seja cotidiana ou estrutural e sistêmica, ela foi constitutiva da sociedade plural e hierarquizada que ali se formou. Os fatos recentes só colocaram à vista do público mais amplo o verdadeiro fundamento da ordem colonial ali estabelecida: relações de dominação e exploração apoiadas na força bruta e pela segregação, e suas consequências aos indígenas. A configuração de uma situação de etnocídio e genocídio.

    O denominado Relatório Figueiredo, de 1968, que resultou de uma comissão instituída pelo Ministério do Interior para apurar irregularidades no antigo Serviço de Proteção aos Índios (SPI), e que foi localizado no contexto das investigações realizadas pela Comissão Nacional da Verdade, relata inúmeros casos de torturas e violências a que foram submetidos os Guarani durante todo o período de colonização do Mato Grosso do Sul e oeste do Paraná, isso entre as décadas de 1940 e 1960. A 7ª Inspetoria do órgão, com sede em Curitiba (PR), ficou conhecida à época como a mais corrupta e violenta, atuando explicitamente em favor dos interesses das madeireiras e das empresas de colonização. Em 1943, o governo Vargas criou a Colônia Agrícola Nacional de Dourados (CAND), sobrepondo-se às terras onde viviam e de onde os Kaiowá obtinham o seu sustento de maneira autônoma. Com o tempo, as colônias se transformaram em fazendas e as florestas em áreas de pasto, lavouras e monocultivos extensivos. Isso levou a que várias famílias e comunidades Guarani abandonassem seus locais de moradia, roçados etc e se deslocassem para outras regiões do país ou até mesmo para os países vizinhos. Aos que ficaram, restou adaptar-se dentro do possível a uma paisagem de contínua degradação ambiental e empobrecimento material, confinados em pequenas parcelas de terra.

    A ABA juntamente com outras instituições públicas e os próprios Guarani Kaiowa e Guarani Ñandéva, por meio das suas lideranças e associações, estiveram ao longo da última década periódica e sistematicamente chamando a atenção para o que vinha acontecendo no MS e às ações e omissões do Estado brasileiro. A seguir iremos pontuar alguns fatos que vimos apontando e denunciando ao longo da última década.

    Ao tomar conhecimento de que na madrugada do dia 08 de agosto de 2011 um grupo Kaiowá havia decidido retornar ao território Pyelito Kue-Mbarakay, área localizada no município de Iguatemi/MS, a ABA solicitou informações do MJ – Ministério da Justiça e da FUNAI – Fundação Nacional do Índio sobre as providências adotadas face aos graves acontecimentos no município de Iguatemi/MS. Em julho de 2003 um grupo tentou retornar e dois dias depois os pistoleiros das fazendas  invadiram o acampamento dos indígenas e os expulsaram com extrema violência, torturaram e fraturaram as pernas e os braços das mulheres, crianças e idosos.

    Da mesma maneira, em dezembro de 2009, foi atacado uma comunidade Guarani-Kaiowa recém-acampada nas margens de uma estrada de chão no município de Iguatemi para reivindicar Mbarakay, seu território de ocupação tradicional. As pessoas viram chegar em vários veículos mais de uma dezena de homens encapuzados, buscando por Adélio Rodrigues, o líder político da comunidade. Gritando pelo “o cabeludo”, os encapuzados batiam e maltratavam as pessoas, puxando-lhes os cabelos. O xamã Atanásio Teixeira, de 70 anos de idade, uma filha e um neto, entre várias outras pessoas, foram duramente espancados e feridos com balas de borracha. O líder político não foi encontrado apenas porque havia se afastado um pouco antes dos invasores chegarem. Já um filho seu, Arcelino Oliveira Teixeira, de 18 anos de idade, foi levado pelo agressores e dele não se teve mais notícias. Sobre este episódio, no site da PR em MS, consta que “o Ministério Público Federal (MPF) em Dourados pediu abertura de inquérito na Polícia Federal em Naviraí para investigar o crime. Foram encontrados dezenas de cartuchos de munição calibre 12 anti-tumulto (“balas de borracha”) e há indício de formação de milícia armada.(1)

    Em outubro de 2009, uma comunidade Guarani-Ñandéva recém-acampada para reivindicar Ypo’i, seu território de ocupação tradicional, no município de Paranhos, foi atacado por dezenas de homens armados. Sem qualquer tentativa de diálogo, os homens espancaram violentamente os indígenas (homens mulheres, idosos e crianças) e dispararam tiros em várias direções. Para escapar das agressões, os indígenas se dispersaram. Dois professores indígenas, Genivaldo Vera e Rolindo Vera, foram arrastados pelos cabelos e levados pelos agressores. Somente dias depois do ataque o corpo de um deles foi encontrado com marcas de violência, preso a um galho de árvore, num córrego (o Ypo’i), a uma distância de 30 quilômetros do lugar onde foram atacados. Do outro professor, até hoje não se tem notícias.(2)

    Em agosto de 2011, por ocasião de em nova tentativa de retornar ao território reivindicado, os grupos de Mbarakay e da comunidade vizinha de Pyelito sofreram diversos ataques semelhantes, com uso de balas de borracha, várias pessoas ficando feridas. Quatro meses depois, em 18 de novembro de 2011, foi vitimado o líder político e espiritual da comunidade de Guaiviry, que recentemente havia acampado no interior dos espaços por ele indicados como de ocupação tradicional. Segundo relatos de testemunhas, o senhor Nísio, de 59 anos de idade, morreu após ser atingido na cabeça, tórax e braços, seu corpo sendo levado em uma caminhonete, juntamente com dois adolescentes e uma criança de cinco anos de idade. Outras pessoas foram feridas com balas de borracha.

    De igual modo, em outubro de 2012, outro grupo Guarani Kaiowa, constituído pelas comunidades de Pyelito Kue e Mbarakay reocupou uma ínfima fração de seu território e ofereceu tenaz resistência a uma decisão de reintegração de posse. Tal fato gerou uma ampla e inaudita manifestação popular de apoio nas redes sociais. Disto resultou, naquele momento (mais especificamente em 25 de  outubro de 2012), uma manifestação da FUNAI, por meio de uma nota em sua página na internet, em que ressaltava “a gravidade da situação dos Guarani e Kaiowá” em Mato Grosso do Sul. Indicava que representantes da instituição participaram de uma grande assembleia desses dois povos (a Aty Guassu) e marcava uma posição: “A Funai, reafirma, assim, o compromisso de aprovar os Relatórios Circunstanciados de Identificação e Delimitação das terras indígenas Guarani e Kaiowá no Cone Sul/MS, dentro dos prazos pactuado na Aty Guassu”.

    Em fevereiro de 2013, a ABA solicitou às autoridades a rigorosa apuração do ataque sofrido por um grupo de indígenas Guarani Kaiowa e Guarani Ñandéva, promovido por pistoleiros de fazendas localizadas no município de Caarapó-MS. Na ocasião, um adolescente Guarani Kaiowá foi assassinado a tiro de bala nas proximidades da Reserva/Aldeia Tey’i kue/Caarapó. Solicitou também a colocação em práticas de medidas que garantam a segurança física dos cerca de 200 indígenas acampados no local, pois havia o risco de novo ataque dos pistoleiros, e, sobretudo, a aceleração dos procedimentos para a delimitação e regularização de suas terras.

    Dois meses após este ataque, em 18 de abril de 2013 nos manifestamos publicamente pela necessidade imperativa da observância de direitos dos Guarani Kaiowa e Guarani Ñandéva em Mato Grosso do Sul. São mais de 50 mil indivíduos (um dos maiores contingentes indígenas do país) constrangidos a ínfimos espaços devido a um processo de expropriação de seus territórios tradicionais, que por conta disso padecem de inchaço populacional, apresentando altas taxas de violência e suicídio, além de uma extremamente precária situação econômica. A nota foi endereçada à presidenta Dilma Rousseff e protocolada na Presidência da República no dia 30 de abril de 2013, sendo assinada, ainda, pela SBPC – Sociedade para o Progresso da Ciência, a CESA – Sociedade Científica de Estudos da Arte, ANPUR – Associação Nacional de Pós-Graduação em Planejamento Urbano e Regional e SBP – Sociedade Brasileira de Psicologia (Ofício nº 015/2013/ABA/PRES).

    Nela lembramos que por conta deste quadro e da tenaz reivindicação fundiária dos Guarani Kaiowa e os Guarani Ñandéva o Estado nacional colocou em campo seis GTs para identificação e delimitação territorial. Iniciados há cerca de cinco anos, estes estudos tiveram enormes dificuldades para serem realizados, devido a contínuas ingerências políticas e ações judiciais promovidas por segmentos ruralistas. Tais ações redundaram em inúmeras paralisações dos processos administrativos, bem como na instauração de um clima de violência local, que resultou no assassinato de diversos indígenas e na hostilidade aos antropólogos responsáveis pelos trabalhos.

    Não obstante tais dificuldades, a maioria dos relatórios circunstanciados foi concluída. Porém, apenas um havia sido publicado: o relatório da T.I. Iguatemipegua I (composta por Pyelito Kue e Mbarakay), publicado em janeiro de 2013. Isso gerou, de imediato, reações de parte dos ruralistas, os quais, em pressão junto à Casa Civil, solicitaram a suspensão dos demais processos, buscando impedir a publicação dos respectivos relatórios. Diante do fato, requeremos celeridade nos procedimentos de regularização fundiária em Mato Grosso do Sul, com a publicação imediata dos referidos relatórios e a busca de caminhos eficazes para a garantia da posse da terra, imprescindíveis para a reprodução física e cultural das famílias indígenas.

    Mas os fatos se precipitaram mais uma vez, mostrando a necessidade de ações concretas e urgentes. Poucos dias após aquele evento. Em maio de 2013 ocorre a trágica morte do professor Oziel Gabriel, do povo indígena Terena. Uma “mesa de negociação” é formada, mediada pelo Conselho Nacional de Justiça e com participação de integrantes do Governo Federal. A ação se mostrou paliativa, sem meios e vontade de decisão, as negociações na mesa emperrarem. Ou pior, o Executivo – principalmente, mas não unicamente, por obra do Ministro da Justiça – decidiu pela paralisação dos  processos administrativos de demarcação das terras indígenas realizados pela FUNAI, lesando assim o pleno direito territorial indígena, não apenas em Mato Groso do Sul, mas em todo o País.

    Em junho passado (2015), mais uma vez ocorreram atos de violência cometidos por produtores rurais no acampamento de indígenas Guarani Kaiowa da comunidade de Kurusu Amba, no município de Coronel Sapucaia, em Mato Grosso do Sul. Conforme informações da imprensa digital, tais atos de violência redundaram na destruição e no incêndio de barracas improvisadas pelos índios, na morte de uma criança de cerca de um ano de idade, carbonizada, e no desaparecimento de pelo menos outras duas pessoas indígenas. É a quarta vez que os Kaiowa de Kurusu Amba são repelidos nas tentativas de retorno a seu território, perante a inoperância do Estado em cumprir seu papel constitucional de garantir estes territórios. Em todas as tentativas, um violento revide foi a tônica, com diversas mortes e graves ferimentos no lado indígena.

    Tornando ao episódio de Kurusu Amba, pode-se afirmar que houve significativas mudanças no comportamento das forças policiais que operam em Mato Grosso do Sul, quando cotejado com o vigente na década de 1990 e no começo dos anos 2000. A Polícia Federal, que antes representava uma segurança para a incolumidade física dos indígenas, nos últimos tempos vem demonstrando formas de obstrucionismo em atuar tempestivamente para impedir ou limitar atos de violência. Em consequência, e com o intuito de preencher este vazio de atuação, tiveram que ser deslocados grupos da Força Nacional, contando, porém, com pouco efetivo e de forma sumamente intermitente. Completando esse quadro negativo, nos últimos anos os produtores rurais da região vêm contratando empresas especializadas em segurança, que passaram a agir organizadas como milícias paramilitares, amplificando tensões, avolumando atos de violência e insuflando um clima de insegurança e terror entre os indígenas. Entre estas, a empresa Gaspem Segurança, como denuncia o próprio MPF-MS, foi responsabilizada pelas mortes de várias lideranças indígenas, o que levou o seu proprietário a prisão domiciliar.(3)

    Resumindo, pode-se afirmar que as inadimplências administrativas que emperram a publicação dos relatórios de identificação e delimitação das terras indígenas, a insegurança devida à ineficiência dos órgãos policiais, a atuação corrente e muitas vezes impune, de empresas de segurança e de capangas, unidas à judicialização dos processos de demarcação de terras, têm contribuído para inflamar em Mato Grosso do Sul um clima de tensão, no qual se consuma de forma paulatina um genocídio claramente anunciado. Ao manifestar certas atitudes e promover certas práticas e políticas, o Estado brasileiro, do Executivo ao Judiciário, passando pelo Congresso Nacional, torna-se inevitavelmente coparticipante deste processo, responsabilidade esta que a ABA vem aqui a ressaltar e a denunciar.

    Associação Brasileira de Antropologia e sua Comissão de Assuntos Indígenas Brasília,

    4/10/2015.

    1. O MPF trata o caso como ação de genocídio, já que foi cometida violência motivada por questões étnicas contra uma coletividade indígena. Ainda no site consta que “nas fotos feitas é possível ver as marcas do ataque ao acampamento indígena, como barracos, pertences e alimentos queimados”. Para mais informações ver www.prms.mpf.gov.br/servicos/sala-de-imprensa/noticias/2011/09/

    2. Neste episódio, o Ministério Público Federal em Mato Grosso do Sul denunciou seis pessoas, entre os quais políticos e fazendeiros da região. Eles são acusados por homicídio qualificado, ocultação de cadáveres, disparo de arma de fogo e lesão corporal contra idoso. Mais informações em www.prms.mpf.gov.br/servicos/sala-deimprensa/noticias/2011/11

    3. A Gaspem (Grupo de Apoio, Segurança Privada e Empresarial) atua em Dourados e Região desde 1996. As investigações realizadas pelo o Ministério Público Federal levam-no a concluir que a GASPEM é “um grupo organizado o qual dissemina violência contra os guarani-kaiowá do cone sul do Estado de Mato Grosso do Sul através de pessoas brutais nominadas ‘vigilantes’, na maioria das vezes sem qualificação para o exercício da atividade, portando armamento pesado e munições, a fim de praticarem atos contrários ao ordenamento jurídico e à segurança pública”. Para mais informações ver http://www.prms.mpf.mp.br/servicos/sala-deimprensa/noticias/2015/06/decisao-livra-dono-da-gaspem-de-pagar-r-480-mil-a-vitimas-de-violencia-em-ms.

     

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  • 07/10/2015

    O apagão do presidente da Câmara dos Deputados

    “Eduardo Cunha quis apagar nossa resistência, vencer nossa paciência e dignidade, retirar nossos direitos constitucionais”. Mas a escuridão a que submeteu os quase 200 manifestantes, na noite deste último dia 5 de outubro, não os demoveu da decisão de passar a noite em vigília contra o genocídio das populações e comunidades tradicionais e dos povos indígenas.

    Dentro da normalidade de uma segunda-feira na Câmara dos Deputados, quando quase não existem atividades, uma silenciosa tempestade estava em curso. Percebendo uma ação um pouco fora dos padrões, um dos seguranças chegou a chamar atenção de seus superiores, sobre uma estranha movimentação. A audiência pública sobre as milícias armadas no campo, no entanto, foi transcorrendo dentro da normalidade. Denúncias contundentes sobre a ação, organização, articulação e ação violenta e genocida de milícias marcavam os depoimentos das lideranças e membros das comunidades e dos povos tradicionais.

    Quando as atividades da audiência já caminhavam para o seu encerramento, Agnaldo Pataxó Hã-Hãe-Hãe tomou a palavra anunciando que os povos indígenas e os representantes das comunidades tradicionais, como os quilombolas, pescadores artesanais, geraizeiros dentre outros, presentes no plenário 1 da Câmara, iriam permanecer em vigília, para denunciar, de forma mais contundente, as graves violências, mortes, impunidade e a criminalização das lideranças das lutas sociais no campo e pedir providências imediatas daquela Casa de leis. Em seguida, Luiz Couto, o parlamentar proponente da audiência, encerrou oficialmente as atividades.

    A partir daí, foram sendo revezados os depoimentos, os rituais e as canções de luta e alegria. Um grande dia para ser lembrado pela história. Uma noite memorável, de persistência, luta e resistência. “Estamos aqui, estamos vivos e estamos em luta”. Intensificou-se um processo de unificação de lutas no campo, a partir das lutas regionais e da articulação nacional. Os maracás, os tambores e as palavras de ordem foram mostrando que algo novo estava acontecendo.

     A Constituição e a escuridão

    Não dava para esconder a escuridão e menos ainda a Constituição cidadã que completava naquele mesmo dia 27 anos. Uma comemoração sendo feita sob as trevas e ameaças do presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Se vivo estivesse o deputado Ulisses Guimarães, que presidiu o processo Constituinte, certamente estaria indignado com o que estava acontecendo 27 anos depois da festa da promulgação da nova Carta Magna do país. Uma ignomínia, uma falácia, uma vergonha! Querer impedir de forma prepotente e autoritária a realização de uma vigília na decantada “Casa do povo”. Ele que, por diversas vezes, tem se reunido com deputados ruralistas para retirar da Constituição direitos sociais e étnicos conquistados com muita luta.

    Nos depoimentos, foram feitas várias menções sobre o desrespeito e as formas como a Constituição está sendo rasgada pelos poderosos que nunca se conformaram com os direitos conquistados pelos setores sociais. É revoltante constatar o que vem sendo feito com a Constituição nesses 27 anos.

    Diante da firme decisão de manter a noite de vigília, permanecendo no plenário, o presidente da Câmara mandou desligar a luz, o som e o ar condicionado. De nada adiantou. Uma mesa foi formada com representantes dos movimentos, e contou com a participação de Débora Duprat, subprocuradora da República e coordenadora da 6ª Câmara do Ministério Público Federal (MPF), que permaneceu na vigília durante toda a noite, e  coordenação do deputado Paulo Pimenta, presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM) da Câmara, que também permaneceu em vigília. No começo da madrugada alguns parlamentares compareceram para prestar apoio e solidariedade aos representantes dos povos indígenas e das comunidades tradicionais, na luta por seus direitos, especialmente seus territórios.

    CPI do Genocídio

     Uma das ações com as quais os parlamentares presentes se comprometeram foi o empenho em criar a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Genocídio que está acontecendo no campo hoje, contra os povos e as populações tradicionais. Foi lembrado em vários momentos a dramática situação de violência e genocídio a que estão submetidas as populações do Mato Grosso do Sul, em especial os povos Guarani-Kaiowá e Terena.

    Enquanto estávamos em vigília para denunciar as violências e dar visibilidade às lutas no campo, mais uma comunidade Guarani-Kaiowá era atacada no Mato Grosso do Sul. Desta vez foi a comunidade Mbarakaí que sofreu um violento ataque de jagunços e milícias armadas dos fazendeiros.

    Fotos: Laila Menezes

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