• 05/11/2015

    Organizações cristãs conclamam sociedade a apoiar os povos indígenas

    Um dia após a aprovação do Parecer da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215, pela Comissão Especial, na Câmara dos Deputados, no dia 27 de outubro, o Conselho Nacional de Igrejas Cristãs (Conic), o Conselho de Missão entre Povos Indígenas (Comin), o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e a Fundação Luterana de Diaconia (FLD) divulgaram um Manifesto Público em que se colocam “em favor da luta e das conquistas das comunidades e dos povos indígenas no Brasil”.

    No Manifesto, além de denunciar as manifestações preconceituosas e discriminatórias em relação às comunidades e aos povos indígenas no Brasil, a incitação ao desrespeito e à invisibilidade social destes povos e fazer críticas ao Legislativo, as organizações manifestam ampla solidariedade e apoio às lutas, mobilizações e manifestações que buscam garantir respeito e reconhecimento aos direitos indígenas e à sua plena participação social. O documento finaliza conclamando “todas pessoas ao engajamento, ao respeito dos direitos humanos e a garantir a paz junto às comunidades e povos indígenas”.

     

    Leia aqui o Manifesto Público na íntegra

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  • 05/11/2015

    Omissão governamental prolonga agonia e ataques se intensificam na TI Morro dos Cavalos

    O final de semana foi de perplexidade e apreensão para as famílias Guarani que vivem no Morro dos Cavalos, aldeia Itaty, próximo à Florianópolis, a capital de Santa Catarina. A tarde de sábado começava tranquila e seca, depois de dias e dias de chuva. O povo descansava, alguns sentados à porta de casa, outros dormindo, quando uma caminhão e vários carros entraram terra adentro. Ouviram-se tiros, rojões e gritaria. Vários homens desceram e entraram na casa que fica do outro lado da estrada, há pouco tempo entregue ao povo Guarani como parte das terras devidas na demarcação. Pois eles invadiram o lugar e lá ficaram, iniciando um churrasco.

    Perplexos, os Guarani iniciaram um trabalho de aviso a amigos e militantes sociais para que fossem até a aldeia em apoio às famílias. Já não é de hoje que a cacica Eunice Antunes vem recebendo ameaças de morte, e tampouco essa é a primeira vez que pessoas entram nas terras dos Guarani fazendo algazarra, tentando intimidar. Mas, aquele fato específico, na tarde de sábado, parecia fora de qualquer padrão. Mais tarde, soube-se, através de informações do CIMI/SC, que os invasores ali estavam capitaneados por um ex-morador do lugar, que teve seu pedido de reintegração negado no último dia 09 de outubro. Então, por conta própria decidiu retomar a casa, dizendo que de lá tinham de sair os Guarani.

    A Polícia Federal, que foi chamada pelos Guarani, só chegou ao local no início da noite, acompanhada de policiais militares e da polícia rodoviária. Depois de muita conversa, permitiram que quatro homens ficassem na casa para novas conversas no dia seguinte. Mais apreensão na aldeia, visto que haveriam de passar uma noite com os invasores dentro das terras. Somente na tarde de domingo eles finalmente saíram da casa, mas não há garantias de que fiquem longe e deixem a propriedade em paz. 

    A terra do Morro dos Cavalos tem sido alvo de frequentes ataques e os Guarani sabem muito bem de onde eles vêm. Desde que começou o processo de demarcação do território eles enfrentam a fúria de algumas pessoas que se dizem proprietárias das terras e que não aceitam entregá-las para os indígenas. Essas pessoas já tentaram jogar as famílias vizinhas contra os Guarani, buscaram desqualificar os profissionais que fizeram os laudos antropológicos e aliaram-se a mídia comercial para realizar uma campanha sistemática contra os indígenas. Nessa cruzada encontram no grupo RBS um forte companheiro. Não são poucas as reportagens que se repetem na TV e nos jornais do grupo, buscando gerar preconceito e ódio contra os Guarani.

    Durante as obras de duplicação da BR 101, por muito tempo esses veículos de imprensa inculcaram na opinião pública que eram os Guarani os que impediam a construção da estrada, mostrando-os como um atrapalho ao progresso do estado e responsabilizando-os pelas sucessivas mortes que aconteciam na estrada não duplicada. Não mostravam os argumentos nem a visão dos Guarani sobre o tema, e conseguiram gerar falsas informações, fomentadoras de discriminação. 

    Outro argumento bastante usado pelos veículos de imprensa é o de que esses Guarani não são de Santa Catarina, são do Paraguai, e que por isso, não teriam direito à terra. Ora, a história já registra a presença dos indígenas nessas terras muito tempo antes da chegada dos portugueses  e também é sabido que é da cultura Guarani caminhar pelo território, nunca ficando fixa em um mesmo lugar. Logo, está mais do que comprovado de que essas eram terras históricas dos Guarani. Se os brancos invadiram os territórios e expulsaram os nativos do lugar, não é culpa deles. Hoje, com a luta pela retomada do território original é mais do que direito dos Guarani ocupar o que é deles, ainda que seja apenas um pequeno pedaço.

    O trabalho de desintrusão das terras tem sido dificultoso e lento. A Funai garante apenas o pagamento das benfeitorias e as famílias que estão tendo de deixar suas casas querem também o pagamento pela terra, pois muitos deles a adquiriram de boa-fé. Essa é uma batalha que travam com o governo. Por outro lado, há outras famílias que ainda não receberam o dinheiro da indenização e isso leva a muita revolta. Essa demora em resolver a questão acaba também servindo de combustível para a explosão de preconceitos e violências na região.   
     
    Na última semana o jornal Diário Catarinense publicou nova reportagem, desta vez falando sobre a abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) na Assembleia Legislativa contra a Funai, que colocaria em questão a demarcação da terra Guarani.  Esse tipo de coisa aprofunda na opinião pública a ideia de que os indígenas é que são os vilões da história, colocando as reivindicações das poucas famílias que seguem não aceitando a retirada em primeiro plano. É importante lembrar que a maioria das famílias já aceitou a indenização.

    A cacica Eunice acredita que esse tipo de incitação promovida pelos jornais e pela televisão ajuda a criar esses conflitos. As pessoas se sentem respaldadas quando percebem o apoio da mídia comercial. Muitos interesses estão em jogo e o principal dele é especulação com a terra.  

    A Comissão Nhemonguetá, que reúne os caciques Guarani de Santa Catarina divulgou nota também responsabilizando a ação da mídia, apontando o Diário Catarinense como co-responsável pelo ataque. Igualmente solicitam à Presidenta Dilma Rousseff que assine de uma vez o Decreto de Homologação daquela terra indígena, o que permitirá o pagamento das indenizações aos posseiros, encerrando a questão.

    O fato é que Santa Catarina, justamente pela omissão governamental, que prolonga a agonia e não assina o decreto de homologação, está colocada no mapa da violência explícita contra os indígenas, assim como o Mato Grosso do Sul, a Bahia, o Pará. Ações de jagunços, que pareciam ser coisa do passado, estão acontecendo sistematicamente no Morro dos Cavalos e as famílias estão sem proteção. E, aliada a essas ações criminosas, está em curso uma cruzada sistemática, via meios de comunicação, de demonização, desqualificação e deslegitimação. Como num teatro do absurdo, os verdadeiros donos das terras são os que precisam provar, a cada dia, que são filhos desse território.

    Nesse fogo cruzado, os Guarani estão de prontidão e dispostos a defenderem o seu direito de viver em paz. O ataque desse final de semana terminou, mas todos sabem que não será o último. Até porque todas essas ações estão orquestradas com a investida que acontece em nível nacional de aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215, que pretende rever todas as demarcações de terras indígenas já feitas no país. O Brasil do século XXI parece disposto e seguir seu caminho eliminando os indígenas do território, invadindo suas terras para o bem do agronegócio.

    É a luta de classe nítida e clara, uma vez que os povos originários do Brasil estão em luta por outro projeto de país e de mundo.

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  • 05/11/2015

    Kayapó: “estamos de volta”

    “Por que não estão cumprindo a lei e nossos direitos, que conquistamos em 1988?

    Lutamos muito, viemos várias vezes a Brasília, juntamos com nossos parentes de todo o Brasil, nos encontrarmos na escola Santa Maria, visitamos os gabinetes dos deputados, fizemos nossos rituais de vida e de luta, entramos várias vezes no Congresso pela porta da frente, falamos com o Ulisses Guimarães, presidente da Constituinte.

    Com todo esse movimento, ganhamos muitos aliados da nossa causa. Parlamentares reconheceram nossa luta e nosso direito. E, assim, conquistamos nossos direitos há 27 anos passados.

    Estamos cientes que a maioria dos nossos direitos aprovados não foram colocados em prática. Principalmente em relação à demarcação das terras de todos os povos indígenas do Brasil, conforme foi determinado pela Constituição. Por isso estamos de volta para cobrar nossos direitos. A situação agora é muito grave. Os parlamentares não estão satisfeitos em rasgar a constituição. Agora querem tirar nossos direitos. Isso não vamos deixar. Se já lutamos muito, agora nossas lutas têm que ser mais intensas ainda

    Ontem (4) conseguimos falar com o presidente do Senado, Renan Calheiros. Ele disse pra nossa comissão de Kayapó que a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215 ainda não está preocupando muito os senadores, que estão discutindo outros temas importantes. Ele nos pediu que a gente fosse falar com os líderes dos partidos, para que quando esse projeto de emenda constitucional chegasse no Senado, fosse barrado, não fosse aprovado.

    Também fomos conversar com o presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha. Ele nos ouviu e depois falou que da parte dele ele não iria colocar a PEC 215 em votação”.

    Esse foi o teor das conversas com a delegação Kayapó, que com seus fortes rituais, empunhando suas bordunas, arcos e flechas, com seus corpos pintados e vistosos cocares, estiveram por horas e horas nas mediações do Congresso Nacional durante toda o dia de ontem.

    A mobilização e luta continuam

    Hoje (5) eles estão de volta a Brasília para conversar com as lideranças dos partidos e explicar a eles a grande preocupação que têm em relação à aprovação da PEC, que significa a retirada de seus direitos da Constituição, especialmente as ameaças às terras de todos os seus parentes indígenas de todo o Brasil. Com a chegada dos parentes Xikrim, estarão mostrando aos congressistas e à sociedade brasileira que continuarão lutando para que não haja a perda de seus direitos.

    Os povos indígenas de todo o país estão se mobilizando para mostrar ao Brasil e ao mundo que seus direitos estão correndo sérios riscos de serem suprimidos da Constituição. Os povos que lutaram para conquistá-los não permitirão que sejam violados, não cumpridos ou suprimidos, como é a proposta da PEC 215, dentre outras.

    Os Kayapó estão de volta a Brasília. E essa volta significa muito. Estão muito preocupados e revoltados com essas propostas de mudanças na Constituição que eles ajudaram a conquistar. Querem retornar às suas aldeias com a certeza de que o Congresso Nacional não vai lhes retirar o direito de viverem em paz e com dignidade em suas terras tradicionais.

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  • 04/11/2015

    Declaração dos Bispos do Tocantins em favor dos povos, das culturas e das comunidades tradicionais, contra a PEC 215

    REGIONAL NORTE 3 – CNBB
    Rua Dr. Francisco Aires, 135 – Centro
    CEP 77.650-000- Miracema do Tocantins – TO
    Fone: (63) 3366-2285

    “Eu vos digo, se eles se calarem, as pedras falarão” (Lc 19,40b).

    Nós, Bispos do Regional Norte 3, da CNBB, do Estado do Tocantins, em meio a raros momentos de alegria, encontro, celebração e confraternização, decorrentes dos Primeiros Jogos Mundiais dos Povos Indígenas, em Palmas – TO, recebemos com surpresa, tristeza e indignação a notícia da aprovação, na Comissão Especial da PEC 215 da Demarcação de Terras Indígenas, que retira do poder Executivo e transfere ao poder Legislativo a exclusividade de demarcar terras indígenas. Lamentamos dizer que esta decisão não faz outro que lançar mais lenha na fogueira, acirrar os ânimos, criar melindres e insegurança jurídica e agravar ainda mais os conflitos entre as comunidades indígenas e os produtores rurais.

    Somos conscientes que Jogos Indígenas talvez não sejam a única e nem a mais urgente pauta para os povos indígenas. Mas também somos sabedores que festa, cultura, diversão, divertimento e confraternização fazem bem a qualquer povo, especialmente aos povos indígenas. Estes Jogos são para os povos indígenas o que a copa do mundo de futebol e as olimpíadas são para os outros povos.

    Em meio a uma crise generalizada – política, econômica, social, moral e de credibilidade – pela qual passa o Brasil, os nossos Deputados, ao invés de aprovarem leis que ajudem o país a reencontrar o caminho do desenvolvimento, ocupam preciosos tempos para tirar direitos adquiridos, com muita luta, de quem pouco tem seus direitos respeitados.

    A aprovação desta PEC 215 se constitui uma grave ameaça contra os povos indígenas, seus direitos, suas terras, suas culturas e suas vidas. Trata-se de “um decreto de morte”, como já denunciavam bispos e missionários no documento “Y Juca Pirama, em 1973”.

    Lamentamos que ainda hoje, em pleno século vinte e um, sejam defendidas ações de genocídio e de extermínio de comunidades indígenas por serem considerados empecilhos à implantação de projetos faraônicos, tais como hidrelétricas, agronegócios e tantos outros que como o MATOPIBA que, com certeza trarão graves consequências para o meio-ambiente e para a vida de centenas de comunidades, diretamente atingidas.

    Temos aqui em nossa Região a situação de grave ameaça à sobrevivência do povo Avá-Canoeiro, reduzido a 24 pessoas, que sobrevive sem seu território demarcado, como estrangeiro na sua própria terra. E em nível Nacional, a situação do povo Guarani Kaiowá, no Estado do Mato Grosso do Sul. São apenas dois exemplos de situações de extrema violência e de sistemática violação dos direitos humanos fundamentais contra os povos nativos, tradicionais, originários do Brasil.

    Como pastores de nossas Igrejas Particulares, nos sentimos comprometidos com o meio-ambiente e a vida dos povos indígenas ameaçados. E como o papa Francisco, diante dos trabalhadores precários e da economia informal, dos migrantes, dos indígenas, dos sem-terra e das pessoas que perderam a sua habitação, “digamos juntos e de coração: nenhuma família sem casa, nenhum camponês sem terra, nenhum trabalhador sem direitos, nenhuma pessoa sem a dignidade que o trabalho dá”.

    E, por fim, nos propondo ser amplificadores das vozes silenciadas, do sofrimento reprimido e da vida digna destes povos negada. Como profetas da esperança, proclamamos com Jesus: “eu vim para que todos tenham vida e vida em abundância” (Jo 10,10b).

    Em nome da nossa fé e da nossa missão, não podemos ficar calados diante de um dos piores sinais de ofensiva do Estado brasileiro, do poder econômico e político contra os povos indígenas. Não à PEC 215.

    Em nome dos 5 bispos do regional da CNBB – Norte 3; Dom Pedro Brito Guimarães-  Arcebispo de Palmas; Dom Romualdo Matias Kujawski-  Bispo de Porto Nacional; Dom Giovane Pereira de Melo- Bispo de Tocantinópolis; Dom Rodolfo Luís Weber- Bispo da Prelazia de Cristalândia.

    Dom Philip Dickmans,

    Bispo de Miracema do Tocantins e Presidente do Regional Norte 3 da CNBB.

    Palmas, 31 de outubro, mês missionário, de 2015.

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  • 04/11/2015

    “A CPI do Genocídio deve ser uma resposta contra a impunidade que impera no Mato Grosso do Sul”, diz Pedro Kemp

    Enquanto a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Assembleia Legislativa do Mato Grosso do Sul que investiga o trabalho do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) no estado se debate em oitivas subjetivas ou inquisitórias, produzindo acusações baseadas em “ouvi dizer”, “me falaram, mas não é possível provar”, uma outra CPI, já aprovada pela Mesa Diretora da Casa Legislativa, aguarda sua definitiva instalação. A CPI do Genocídio, reivindicada pela sociedade civil e movimentos sociais, tornou-se a esperança de alguns parlamentares para que crimes impunes e notoriamente comprovados contra os povos indígenas do estado sejam apurados.  

    Esta CPI deverá apurar uma longa lista de arbítrios. Nos últimos 12 anos, 390 indígenas foram assassinados no estado e outros 560 cometeram suicídio. Além disso, desde o assassinato do rezador Nísio Gomes Guarani e Kaiowá, em 2011, no tekoha – lugar onde se é – Guaivyry, investigações do Ministério Público Federal (MPF) chegaram à formação de milícias e consórcios de morte, envolvendo empresas de segurança, caso da Gaspem, advogados, sindicatos rurais, políticos e fazendeiros para expulsar comunidades de terras indígenas retomadas e matar lideranças. No Caso Nísio, a Justiça Federal pediu a prisão de mais de 20 indivíduos, entre eles o dono da Gaspem, fazendeiros, advogados, pistoleiros e o presidente à época do Sindicato Rural de Aral Moreira.  

    Se a CPI do Cimi nasce sem fatos determinados, um apanhado de assassinatos, suicídios e violências sortidas alçam o Mato Grosso do Sul ao cenário internacional de genocídios em curso contra populações e grupos indígenas ao redor do mundo – a partir de relatórios e pronunciamentos tanto do MPF quanto de comissões da Organização dos estados Americanos (OEA) e da Organização das Nações Unidas (ONU). A isso a CPI do Genocídio pretende se debruçar e, nas palavras do deputado Pedro Kemp (PT), oferecer “uma resposta contra a impunidade que impera no Mato Grosso do Sul”.   

    Kemp, em entrevista concedida durante as sessões da CPI do Cimi, entende que a estratégia ruralista é de atacar a principal organização de apoio aos povos indígenas do estado, o Cimi, e, como consequência, enfraquecer as comunidades que sem respostas do Estado decidiram retomar os territórios tradicionais de onde foram expulsos à força no decorrer do século XX. Por trás dessa estratégia, está o agronegócio e sua cadeia privada bilionária. Para o deputado, “não há interesse em fazer avançar o processo de demarcação das terras indígenas no Mato Grosso do Sul por se tratar de um estado que tem a base principal da sua economia na produção de grãos e carne bovina, grande parte para exportação”.   

    O que o senhor entende como prioridade para o parlamento sul-mato-grossense responder ao estado e ao país com a CPI do Genocídio?

    A instalação da CPI do Genocídio na Assembleia Legislativa deve ser uma resposta contra a impunidade que impera no Mato Grosso do Sul quanto aos assassinatos de lideranças indígenas e aos ataques violentos sofridos pelas comunidades que lutam pela demarcação de seus territórios tradicionais. Desde a execução do líder Marçal de Souza Tupã-I, em 25 de novembro de 1983, até o mais recente assassinato ocorrido em 29 de agosto passado, quando o índio Guarani e Kaiowá Semião Fernandes Vilhalva, 24 anos, foi morto por tiro disparado à longa distância com arma de calibre 22 e de autoria ainda desconhecida, muitas mortes foram contabilizadas sem que ninguém fosse punido, sejam mandantes ou executores. Parece imperar no estado a conivência dos órgãos de segurança estadual e federal com a existência de milícias e pistoleiros contratados para defender as propriedades rurais e atacar as comunidades indígenas em processo de retomada de suas terras. Esta situação não pode prosseguir e o parlamento estadual precisa investigar esses casos de violência contra os indígenas e cobrar o fim da impunidade.

    Na atual conjuntura indigenista do MS, qual a relação entre as duas CPI’s: a do Cimi e a do Genocídio?

    Entendo que a CPI do CIMI foi instalada por pressão dos ruralistas na tentativa de criminalizar a principal entidade de apoio à luta dos povos indígenas no estado e, por tabela, enfraquecer o próprio movimento indígena que, cansado de esperar providências do governo federal quanto às demarcações, decidiu por retomar suas terras tradicionais. Já a CPI do Genocídio é uma iniciativa dos movimentos sociais ligados à defesa dos direitos humanos, sindicatos de trabalhadores e igrejas cristãs, que cobram o fim da omissão do Estado quanto à violência perpetrada sistematicamente contra as comunidades indígenas que lutam por seus direitos.

    Alguns deputados ruralistas assinaram a CPI do Genocídio. Na sessão do dia 7 de outubro, porém, declararam na tribuna, caso do deputado Zé Teixeira, que não há genocídio no estado. Por que o senhor acha que assinaram pela CPI, então? 

    Há muita contradição nos discursos. Se muitos não acreditam que haja um genocídio contra os povos indígenas no Mato Grosso do Sul, principalmente contra os Guarani e Kaiowá, não deveriam apoiar a investigação de algo que para eles não existe.

    Como o senhor acredita que se dará a composição parlamentar dessa CPI? No caso da CPI do Cimi, a presidência, a vice e a relatoria ficaram nas mãos de deputados diretamente atrelados aos setores que ambicionam as terras indígenas.

    A CPI é constituída por cinco membros indicados pelas bancadas partidárias. Há na Assembleia uma maioria esmagadora de parlamentares que são ligados ao agronegócio. Não tenho esperanças de que na CPI do Genocídio tenhamos uma composição de deputados ligados às causas indígenas. Nossa bancada tem vaga garantida e vamos lutar pela presidência ou relatoria. Penso que vai ser importante a vigilância da sociedade, através dos movimentos sociais que apoiam os índios, para que esta CPI cumpra com os seus objetivos. 

    O MPF, a Associação Brasileira de Antropologia (ABA), a Anistia Internacional, ONU, OEA, o seu mandato… não são poucas as instituições e figuras públicas que entendem como genocídio o que acontece no MS contra os povos indígenas. Na sua opinião, o que motiva esse genocídio?

    O genocídio contra os povos indígenas no Mato Grosso do Sul ocorre na forma de perseguições, ataques violentos e assassinatos de índios, mas também na forma do total abandono das comunidades que estão fora de suas terras, em acampamentos improvisados ou confinadas em pequenas áreas, sem o atendimento nas políticas públicas de saúde, educação, produção e segurança. Ali reina a miséria e a fome e, como consequência, o alcoolismo, a violência, os conflitos internos e o suicídio. Talvez esta última seja a pior forma de genocídio, pois é invisível e silenciosa.

    Sabemos que existe um passivo com relação à demarcação das terras indígenas no estado. Os governos pós-Constituição de 1988 não o resolveram. Mesmo este sendo um problema estruturante não só no estado, mas em âmbito nacional, por que, na opinião do senhor, o Mato Grosso do Sul se destaca nesse aspecto de violência, genocídio, contra os povos indígenas? 

    Na minha avaliação, não há interesse em fazer avançar o processo de demarcação das terras indígenas no Mato Grosso do Sul por se tratar de um estado que tem a base principal da sua economia na produção de grãos e carne bovina, grande parte para exportação. Na visão do agronegócio, os índios querem ocupar essas que são as terras mais férteis do país para não produzir nos moldes capitalistas. Seria um desperdício e um prejuízo para a economia do Estado. Só que aqueles que pensam dessa forma se esquecem que o estado vizinho, Mato Grosso, tem uma economia mais forte do que a nossa e tem 12% do seu território de terras indígenas, enquanto que em Mato Grosso do Sul não chega a 0,5% do território de áreas demarcadas e garantidas aos índios. E olha que aqui temos a segunda maior população indígena do país. Portanto, demarcar as terras indígenas acabaria com a insegurança jurídica no Estado, esta sim capaz de prejudicar a produção, e que poria fim aos conflitos agrários entre produtores e índios.

    A bancada ruralista critica muito o governo federal pela situação no MS e busca se aproximar dos indígenas se declarando tão vítima quanto eles. Como o senhor entende essa estratégia?

    Uma coisa temos que reconhecer, a demarcação das terras indígenas no Mato Grosso do Sul não tem sido prioridade para o governo federal. As vezes que tivemos a presença de representantes de Brasília aqui para discutir a questão se deram após conflitos acontecerem e por pressão do movimento indígena com as retomadas de seus territórios. Em algumas situações, comissões são formadas, propostas são apresentadas, mas depois nada acontece. Além disso, é importante dizer que muitos processos demarcatórios foram judicializados e ficam parados por anos sem solução. A questão central é que, o grande responsável pela situação que estamos vivendo hoje é o Estado, uma vez que no passado confinou as comunidades indígenas em algumas reservas e alienou suas terras tradicionalmente ocupadas a estes proprietários que hoje também reclamam por direitos. Penso que hoje não é possível resolver o problema sem levar em conta esse processo histórico. Cabe, portanto, ao Estado brasileiro encaminhar a solução resguardando direitos das partes envolvidas. O que não dá mais é ver os índios, primeiros habitantes dessa terra, ficarem aguardando por providências que nunca acontecem. 

    Por que essa violência, aparentemente passional, envolvendo alcoolismo e mortes violentas entre os indígenas, faz parte desse processo de genocídio e tem relação com a demarcação de terras?

    Ninguém precisa ser um grande estudioso para concluir que os problemas de alcoolismo, violência interna nas comunidades, drogas, suicídios entre os índios têm a ver com a questão da demarcação de suas terras. Populações numerosas estão confinadas em pequenas áreas ou à beira de estradas, em acampamentos, onde não conseguem reproduzir suas formas de subsistência material e espiritual, a partir de suas culturas. Necessitam de seu espaço, onde possam se reconhecer enquanto povo, com identidade própria, com uma história de resistência, com seus saberes tradicionais e sua espiritualidade. Nossa sociedade tem dificuldade de reconhecer isso e muitos costumam dizer: ‘para que os índios querem tanta terra se não produzem?’. Querem avaliar o modo de viver dos índios a partir dos parâmetros do capitalismo. Os índios no Mato Grosso do Sul estão submetidos ao completo abandono e são duramente atacados quando resolvem lutar por seus direitos. No passado recente eram considerados amigos e pacíficos, na medida em que serviam à expansão do agronegócio. Agora que se organizam e reivindicam seus direitos são vistos como invasores de terras e manipulados e financiados por ong’s. Somando-se a omissão do Estado, segue o genocídio.

     

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  • 04/11/2015

    A Marcha das mulheres Guarani e Kaiowá pelo Bem Viver

    Mato Grosso do Sul é o segundo estado brasileiro em população indígena e, é também o que mais viola os direitos das populações tradicionais. O estado brasileiro contribuiu nesse processo de violação desde os primórdios da ocupação e expansão para o Oeste, com objetivo desenvolvimentista e exploratório. Isso se deu com a exploração massiva da mão de obra indígena na exploração da erva mate pela Companhia Mate Laranjeira, financiada pelo Estado, pela criação dos territórios federais, como por exemplo, Ponta Porã e ainda a "colonização" protagonizada pelo governo Getúlio Vargas, que titulou os territórios indígenas para o latifúndio na região da grande Dourados.

    A espoliação, a violência e as violações são uma constante há muitos séculos e continua a acontecer nos dias de hoje, especialmente entre os povos Guarani Kaiowá, que habitam o sul do estado e os municípios de fronteira. Nesse contexto, as mulheres são as que mais sofrem privações, perseguições e violências. Elas são arrancadas de seus barracos no meio da noite, por tiros e pelo fogo ateado em suas humildes moradias. Todavia, continuam a sua peregrinação e luta nas áreas de retomada. 

    O modelo de desenvolvimento obrigatório no sistema capitalista, e em nosso país, exploratório, predador, tanto do meio ambiente, como do ser humano, não corresponde ao modo de vida Guarani e Kaiowá. O significado que tem a terra para o capitalismo, não corresponde ao que o Povo Indígena compreende da Terra. Ela não possui valor venal, mas sagrado, a Terra é Mãe, aquela que gera e fortalece a vida e a vida de seus filhos. A terra deve ser o lugar onde se pode reproduzir o "Bem Viver".

    A retomada dos Tekohas (territórios tradicionais, sagrados para o povo indígena), significou e significa para os Guarani e Kaiowá a possibilidade de reproduzir sua cultura, sua religiosidade, sua dança, seu canto, plantar a sua roça, de conviver harmonicamente com a natureza e seus filhos. Significa a retomada do Bem Viver. Entretanto, o que deveria ser o restabelecimento da dignidade, da liberdade, do direito à terra sagrada, se tornou um grande pesadelo.

    A omissão do estado brasileiro em demarcar os territórios tradicionais, vem acarretando todo tipo de mazela. Nos últimos 20 anos mais de trezentas lideranças indígenas foram assassinadas no Mato Grosso do Sul, entre homens e mulheres, e ainda sofrem todo tipo de violação e violências, as mulheres são estupradas (jovens e adultas) por pistoleiros, jagunços, e obrigadas a permanecer no silêncio. Um silêncio que leva à morte, ao suicídio, tamanho o dano causado por esse tipo de violência às mulheres indígenas.

    As Mulheres indígenas do Mato Grosso do Sul, as mulheres Guarani e Kaiowá, clamam por justiça, por respeito, por dignidade. As jovens Guarani e Kaiowá clamam por direitos, por respeito, por segurança. Clamam pelo direito à vida conforme a cultura de seu povo. As crianças Guarani e Kaiowá pedem socorro, socorro para que cessem com a maldade praticada contra elas. Socorro para que cesse o Genocídio cometido em uma guerra que elas não começaram. As crianças Guarani e Kaiowá querem simplesmente Bem Viver.

    Seguiremos em Marcha até que todas as Guarani e Kaiowá possam Bem Viver.

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  • 04/11/2015

    Nota CIR – PEC 215: retrocesso aos direitos conquistados na Constituição Federal de 1988

    “Makunaima – Vivo até o último índio”.

    Os povos indígenas de Roraima comparam a PEC 215 a um anúncio de genocídio dos povos indígenas no Brasil. Não aceitamos a PEC 215, pois temos a clareza de que o Estado Brasileiro deve respeitar os direitos constitucionais estabelecidos como invioláveis, a diversidade cultural existente, e principalmente a vida dos povos indígenas que dependem de suas terras tradicionais, essa é a mensagem que resume o repúdio e ao mesmo tempo, as razões pelas quais os povos de Roraima, assim como os diversos povos do Brasil são contra a proposta genocida.

    A conquista pelos direitos constitucionais há mais de 25 anos foi um marco na vida dos povos originários desse país, conquistando não apenas o direito administrativo sobre o processo de demarcação dos territórios tradicionais, mas conquistando o direito à participação e construção social, cultural, política e econômica do Brasil, tendo como berço desse histórico os solos sagrados e tradicionais indígenas.

    A diversidade cultural se aflora nas mais de 180 línguas distintas do idioma oficial, com usos, costumes e tradições diferenciadas, sem contar com a riqueza do patrimônio ambiental abrigada no interior das terras indígenas dando possibilidade de desenvolvimento sustentável em todo território nacional.

    Desde o princípio, a luta pelos direitos indígenas nunca foi fácil, sempre injusta e conflituosa, porém, aos poucos se conquistou o direito de, pelo menos, os povos indígenas serem ouvidos pelo Estado Brasileiro. Cenário que, amplamente, ganhou espaço com o protagonismo e autonomia dos povos e suas organizações, aliado aos parceiros e amigos da causa indígena que juntos lutaram não somente pelo direito constitucional, mas pelo direito a vida e bem estar coletivo dos povos e toda sua riqueza cultural e tradicional. Uma soma de conquistas que perpassou as formalidades e normas da Constitucional, como deve ser, avançando para o processo próprio de implementação de seus direitos originários.   

    Nesse caso, pós conquista constitucional, a PEC 215/2000 de autoria do ex-deputado federal Almir Sá (RR) surgiu como uma manobra política de evitar a demarcação em área continua da Terra Indígena Raposa Serra do Sol. Claramente políticos do agronegócio que disputavam terras com povos indígenas viram seus interesses individuais e econômicos ali apresentados.

    De início o texto da PEC 215 previa alterar o Artigo 231 da CF/88 para transferir a responsabilidade sobre a demarcação de terras indígenas, exercida pelo Poder Executivo, para ser de competência do Poder Legislativo, os parlamentares. Por si só, viu-se a inconstitucionalidade da matéria quanto à usurpação dos poderes estabelecidos na nossa Constituição Federal. 

    Após anos o texto foi sendo desenvolvido, ampliando assim seus efeitos, por sinal efeitos drásticos para a vida dos povos indígenas e quilombolas, povos que dispõem de forma legítima de seus territórios.  O texto atual, além da proposição inicial incorporou novas restrições ao uso dos direitos indígenas, sendo o mais grave da matéria geral, a alteração do artigo 231 da CF/88.   

    A PEC 215 dispõe dentre as competências exclusivas do Congresso Nacional a aprovação da demarcação das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios e a ratificação das demarcações já homologadas; estabelecendo que os critérios e procedimentos de demarcação serão regulamentados por lei. Agrava-se ainda pelo fato de incorporar perversamente ao texto as condicionantes incluídas pelo STF exclusivamente no caso Raposa Serra do Sol. Entre elas o absurdo de criar um marco temporal para ter início aos direitos indígenas. Veja aqui.

    Enquanto isso, os povos indígenas reafirmam – “somos contra a PEC 215 porque é inconstitucional”, e apresentam três pontos relevantes e que devem ser considerados pelo Estado Brasileiro, antes de qualquer ato inconstitucional. Primeiro, a proposta não poderia sequer ter iniciado porque é inadmissível que o Legislativo usurpe o poder do Executivo. Demarcação de Terras Indígenas é ato administrativo. Segundo, a CF/88 assegura os direitos indígenas como cláusulas pétreas, pelo fato de que são direitos humanos e que não devem ser moedas de interesses políticos e de negociações econômicas. Terceiro, a própria Constituição garante os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam.

    Esses direitos não nasceram a partir da CF/ 88, foram estabelecidos, mas o reconhecimento é anterior à criação do próprio Estado Brasileiro. E por último, a PEC 215 tem a intenção de sobrepor o interesse do agronegócio que disputa com os indígenas o direito à terra. É visível que a maior intenção dos aliados do governo e do agronegócio é querer regulamentar a invasão, o esbulho e a turbação sobre as terras indígenas.

    Para combater esse ato, ato genocida, é preciso juntar forças, união do povo brasileiro contra a injustiça, a discriminação racial, e a violência não só física, mas social e cultural desse país. Caso contrário, mais uma vez o Estado Brasileiro estará cometendo um genocídio iniciado há quinhentos anos atrás, quando em prol do “desenvolvimento” do Brasil exterminou milhares de índios, cerceando o direito de sobrevivência nesse país.   

    Povos de todas as nações se unem, em Roraima o lema é: “Makunaima – Vivo até o último Índio”.

    Conselho Indígena de Roraima, 4 de Novembro de 2015.

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  • 03/11/2015

    Movimento de Comunidades Populares divulga nota contra a PEC 215 e em apoio aos povos indígenas

    Durante o 1º Seminário Interestadual do Movimento das Comunidades Populares, ocorrido em São Lourenço da Mata, Pernambuco, durante o feriado de Finados, organizações sociais e coletivos autônomos do Nordeste divulgaram uma nota pública rechaçando a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215 e declarando apoio às lutas dos povos indígenas no Brasil.

    “Vinte e sete anos já se passaram e apenas pequena parte dessas terras foi demarcada devido às pressões de pessoas que olham a terra como mera fonte de enriquecimento, e não como fonte de vida – como corretamente a tratam os povos indígenas. Agora, a PEC 215 vem com intuito de dificultar ainda mais e até mesmo bloquear qualquer demarcação, além de permitir a exploração das riquezas existentes nos territórios indígenas”, diz trecho da nota.

    Leia na íntegra:

     

    MOÇÃO DE APOIO AOS INDÍGENAS DO BRASIL

    O 1º Seminário Interestadual do Movimento das Comunidades Populares – MCP, que tem como tema ‘Os Povos Indígenas’, vem manifestar todo o seu apoio à luta dos povos originais contra a aprovação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC 215/2000) pelo Congresso Nacional. A Constituição Federal de 1988 reconheceu, justamente, os direitos originários dos índios sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarca-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens (artigo 231). Já o Art. 67 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias estabeleceu o prazo de cinco anos a partir da promulgação da constituição (5 de outubro de 1988) para que essa demarcação fosse concluída.

    Vinte e sete anos já se passaram e apenas pequena parte dessas terras foi demarcada devido às pressões de pessoas que olham a terra como mera fonte de enriquecimento, e não como fonte de vida – como corretamente a tratam os povos indígenas. Agora, a PEC 215 vem com intuito de dificultar ainda mais e até mesmo bloquear qualquer demarcação, além de permitir a exploração das riquezas existentes nos territórios indígenas, anulando a disposição constitucional de 1988 e ferindo normas internacionais como a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que integra o ordenamento jurídico brasileiro.

    O papel constitucional do Congresso é legislar e fiscalizar as ações do Executivo. A PEC 215 quer trazer para a instituição legislativa uma função administrativa de homologar o processo de demarcação das terras, que já passa por análise da FUNAI e do Ministério da Justiça, com previsão de contestações e critérios de verificação objetivos e rígidos. Por que esse interesse?

    A previsão constitucional de 1988 de assegurar os territórios indígenas e preservar seus bens materiais e culturais representa o mínimo que a sociedade brasileira pode fazer em favor dos povos originais que tiveram seus espaços ocupados, foram escorraçados, escravizados e exterminados no processo de colonização.

    Pela rejeição da PEC 215 e seu imediato arquivamento, se manifestam as organizações participantes deste Seminário, colocando-nos à disposição do Movimento Indígena, no que estiver ao nosso alcance, no sentido de ver atendidas suas justas reivindicações a fim de que possam em paz reconstruir o Bem Viver, que é de interesse de todo o povo brasileiro.

     São Lourenço da Mata – PE, 1º de novembro de 2015.

    Movimento das Comunidades Populares – MCP

    União da Juventude Popular – UJP

    Jornal Voz das Comunidades – JVC

    Associação Nacional de Apoio as Comunidades Populares – ANACOP

    Acampamento Jeremias (Engenho Gongo, Itambé, Pernambuco)

    Escola Jardim da Comunidade (Santa Rita, Paraíba)

    Grupo de Mulheres Liberdade Vamos Simbora (Monte Verde, Recife, Pernambuco)

    Poyá Limolaygo (Juventude Xukuru do Ororubá)

    Grupo de Produção Coletiva (Maceió, Alagoas)

    Grupo de Trabalho Coletivo da Construção Civil (Região Metropolitana de Recife)

     

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  • 03/11/2015

    Indígenas trancam rodovia contra a PEC 215 e organizações lançam manifesto em defesa da luta por direitos

    Indígenas Kaingang e Guarani Mbyá bloquearam na manhã desta terça-feira, 3, trecho da BR-277, na altura de São José dos Pinhais, região de Curitiba, em protesto contra a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215, que teve o relatório aprovado na semana passada – por parlamentares ruralistas – numa Comissão Especial da Câmara Federal. Os indígenas pediram também demarcações de terras tradicionais na região Sul do país, que estão paralisadas.

    A PEC 215 pretende transferir do Poder Executivo para o Poder Legislativo, onde os ruralistas e patrões do agronegócio concentram maior poder, a demarcação de terras indígenas, quilombolas e a criação de áreas de preservação ambiental. O último texto apresentado pelo relator e deputado ruralista Osmar Serraglio (PMDB/SC), e aprovado pela Comissão, acrescentou ainda a tese do marco temporal – uma terra só poderá ser indígena, conforme os defensores da tese, se na data da promulgação da Constituição de 1988 a comunidade comprovar que estava nela.   

    O Conselho de Missão entre Povos Indígenas (Comin), o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), o Conselho Nacional de Igrejas Cristãs (Conic) e a Fundação Luterana de Diaconia (FLD) divulgaram também na manhã de hoje um manifesto público defendendo a legitimidade das lutas dos povos indígenas pelos territórios tradicionais e direitos sociais e humanos garantidos pela Constituição Federal e por legislações internacionais.

    Para as organizações, as mobilizações indígenas têm sido a saída encontrada pelos povos para que tais direitos sejam garantidos, mas mesmo assim a inoperância do Estado e os ataques de setores anti-indígenas persistem. “Apesar das constantes mobilizações e manifestações que as próprias comunidades indígenas organizaram e divulgaram, o discurso de incitação preconceituosa e discriminatória persiste”, diz trecho do manifesto.

    Leia na íntegra:

     

    MANIFESTO PÚBLICO

    Em favor da luta e conquista das comunidades e povos indígenas no Brasil

    São constantes e recorrentes as denúncias de manifestações preconceituosas e discriminatórias às comunidades e povos indígenas no Brasil. Tais manifestações fomentam uma postura de segregação e desrespeito à diversidade étnica e cultural dos povos originários deste território, no qual se forjou o Brasil. A manifestação preconceituosa e discriminatória contraria a proposição conquistada pelas comunidades e povos indígenas na elaboração da atual Constituição Federal e no direito internacional aos quais o Brasil é signatário e cooperou na elaboração e solidificação dos direitos humanos e de respeito a diversidade étnica. O repúdio e as denúncias das comunidades e povos indígenas tornam-se mais relevantes quando estas manifestações preconceituosas e discriminatórias são proferidas por servidores públicos, como deputados federais e estaduais, que são eleitos e assumem mandatos que preconizam a defesa e amplitude da democracia e representatividade da diversidade social, étnica, cultural, econômica, política, sexual e outras, que constituem a sociodiversidade da República Federativa do Brasil.

    A incitação ao desrespeito e a invisibilidade social às comunidade e povos indígenas no Brasil, visam desconstituir a plena cidadania e protagonismo indígena, desqualificando ou desprezando a identidade e situação sociocultural, que garante o tratamento específico e diferenciado por políticas públicas e o tratamento do Estado Democrático e de Direito, que constituímos como sociedade brasileira. Apesar das constantes mobilizações e manifestações que as próprias comunidades indígenas organizaram e divulgaram, o discurso de incitação preconceituosa e discriminatória persiste. De forma especial as proferidas por parlamentares afetam diretamente as comunidades indígenas da região sul do Brasil, ao desqualificarem pejorativamente e com conceitos arcaicos e descontextualizados – que aflige a dignidade individual e coletiva dos povos, o trato dos direitos humanos e do reconhecimento sociocultural dinâmico e dialogal entre sociedades étnicas ou grupos sociais.

    Como entidades da sociedade civil brasileira manifestamos nossa solidariedade e apoio às lutas, mobilizações e manifestações das comunidades e povos indígenas pelo respeito e reconhecimento de direitos e plena participação social. Repudiamos todas as manifestações preconceituosas, difamatórias, caluniosas e discriminatórias, sobretudo as expressas por agentes públicos, que deveriam prezar pelo respeito e promoção da sociodiversidade étnica no Brasil. Manifestamos nossa contrariedade aos projetos legislativos e sentenças jurídicas que ultrajam e retrocedem no zelo pela sociodiversidade dos povos indígenas brasileiros, diversidade essa que assegura a demarcação e proteção das terras indígenas, conforme os preceitos e entendimentos culturais de cada povo, também firmados pelo Brasil em acordos internacionais.

    Conclamamos a sociedade brasileira à solidariedade e vinculação às mobilizações e manifestações das comunidades e povos indígenas no Brasil, como as ocorridas, de forma expressiva e com ampla participação (no norte do Rio Grande do Sul, foram seis locais de mobilização e participação de superior a 1000 indígenas e diversos manifestos divulgados nas mídias), na data de 27 de outubro de 2015, em que se manifestou a contrariedade e repúdio da aprovação da PEC 215/2000, que inviabiliza o direito humano básico de acesso e usufruto exclusivo das terras e territórios de ocupação tradicional indígena, entre outras arbitrariedades e ultrajes. Da mesma forma, conclamamos o repúdio às práticas do atual Poder Legislativo em impedir a participação civil e cidadã, sobretudo das comunidades indígenas, em votações, debates e definições legislativas sobre o direito indígena (fato ocorrido, outra vez, na votação final do PEC 215/2000, pela Comissão Especial da Câmara de Deputados – Brasília/DF, na noite de 27 de outubro de 2015). Enfim, conclamamos a todos e todas ao engajamento e ao respeito dos direitos humanos para a garantia da paz às comunidades e povos indígenas.

    28 de outubro de 2015

    Assinam:

    Conselho de Missão entre Povos Indígenas – COMIN

    Conselho Indigenista Missionário – CIMI

    Conselho Nacional de Igrejas Cristãs – CONIC

    Fundação Luterana de Diaconia – FLD

     

     

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  • 02/11/2015

    Terra Indígena Morro dos Cavalos: Invasão anunciada e incentivada

    No dia 31 de outubro a Terra Indígena Morro dos Cavalos, localizada no município de Palhoça (SC) foi alvo de nova invasão. Desta vez, um grupo de pessoas ocupou a terra, expulsou as famílias Guarani e se apossou de suas casas. Um ato criminoso e extremamente ousado que tem sua origem no estímulo a atos criminosos praticados por parlamentares e difundidos pelos meios de comunicação empresariais.

    A invasão, que em princípio poderia ser interpretada como um ato de protesto de um ocupante de má-fé da terra indígena, converteu-se em ato estratégico do agronegócio brasileiro e de setores empresarias que estão agindo articuladamente para reduzir os direitos indígenas, via Congresso Nacional, através da PEC 215 aprovada na Comissão Especial no dia 27/10 e, pela criação da CPI da Funai aprovada no dia 29 de outubro.

    O líder da invasão da terra indígena diz ter comprado a casa de outro morador não-indígena. Ocorre que o ato foi consumado depois da terra indígena ter sido declarada em abril de 2008, configurando como má-fé e não tendo direito a indenização alguma (§ 6º, Art.231 da CF/88), mesmo assim a Funai decidiu indenizar, mas o valor ofertado não foi aceito pelo “proprietário”. Após ter sido indeferido seu pedido de reintegração de posse na Justiça Federal, decidiu juntar seus comparsas para invadir a terra indígena.

    O empoderamento para praticar o ato violento está associado às informações difundidas pelos meios de comunicação e com a total omissão do governo em equacionar os conflitos que geram violência contra os povos indígenas. Na semana que antecedeu a invasão, a mais poderosa mídia digital e impressa no estado, afiliada a Globo, publicou diversas matérias com conteúdo anti-indígena, destacando a aprovação da PEC 215 na Comissão Especial (29/10) e a criação da CPI da Funai (30/10), com o argumento da “ilegalidade” na demarcação da referida terra indígena. O único interlocutor do jornal é o deputado Valdir Colatto (PMDB), representante do agronegócio catarinense e declaradamente contrário a todo direito indígena, conforme notas divulgadas pelos povos indígenas em Santa Catarina nesse mês de outubro. A referida mídia não ouve os indígenas ou qualquer instituição que não esteja em sintonia com o empresariado do turismo e do agronegócio.

    Entre maio e junho desse ano, depois da cacique Eunice sofrer cinco ameaças, o Cimi já havia demonstrado a estreita relação entre as notícias na referida mídia e a violência, levando a crer que há sintonia entre os veículos de comunicação com os setores anti-indígenas.

    A terra indígena Morro dos Cavalos foi reconhecida como de ocupação tradicional em 1993. Por conta da publicação do Decreto 1775/96 passou por revisões e a comunidade conseguiu que o estudo fosse refeito, levando a publicação novo relatório em 2002 e o da Portaria Declaratória em 2008. A terra sofreu três processos judiciais, todos decididos favoráveis à comunidade indígena. Apesar de não haver entraves judiciais a presidente Dilma se recusa a homologar devido ao acordo estabelecido com o agronegócio catarinense. O argumento do ministro da Justiça é de que os “astros estão confluindo contra”, proferido para a cacique Eunice durante audiência em maio de 2013.

    Em 2012 houve uma invasão patrocinada pelo setor empresarial. Depois de esperar a decisão judicial a comunidade se mobilizou e expulsou os invasores. Nessa atual invasão a Polícia Federal esteve no local no dia 31 e permitiu que quatro invasores permanecessem. Nesse dia 01 de novembro uma nova decisão judicial levou a Polícia Federal a retirar todos os invasores.

    Apesar de serem apenas 1988 hectares, são diversos interesses do setor empresarial catarinense sobre aquela terra, especialmente do turismo e da água.

    Chapecó, SC, 01 de novembro de 2015.

    Cimi Regional Sul

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