• 13/06/2016

    Fazendeiros expulsam Avá Guarani de terra reivindicada como indígena no Paraná

    Nem reintegração de posse, nem polícia: cerca de 150 fazendeiros expulsaram um grupo de sete famílias Ava Guarani, em Guaíra (PR), fronteira com o Paraguai, na última quarta, 8. Na madrugada de segunda, 6, os indígenas haviam ocupado uma área de mata, cuja propriedade é reivindicada por um fazendeiro local. Segundo os indígenas, a área pertence à Usina de Itaipu. A terra está em processo de identificação pela Fundação Nacional do Índio (Funai), e é reivindicada como território tradicional pelos Guarani.


    Na manhã de quarta-feira, 8, fazendeiros, através da página de Facebook da Organização Nacional de Garantia ao Direito de Propriedade (Ongdip), publicaram um alerta aos proprietários da região para que todos se reunissem às duas da tarde do mesmo dia, para impedir a “invasão na propriedade”, conforme o chamado (veja na imagem abaixo).


    O resultado: o grupo de pessoas arregimentadas pelos ruralistas – algumas delas empunhando facões – foi ao exato local em que estavam acampadas as famílias. Segundo um indígena, foram disparados três tiros para o ar, além de rojões e gritos para intimidá-los. Considerando a hipótese de conflito, a Polícia Federal foi ao local, mas teria afirmado aos indígenas que não poderia garantir sua segurança. Sob pressão, as famílias juntaram seus pertences e retiraram-se da área (abaixo e no topo, foto da ação tirada por uma indígena).


    Depois de atearem fogo aos barracos de lona nos quais as famílias indígenas haviam se instalado, os ruralistas comemoraram a expulsão dos indígenas. Há relatos de que, durante a ação, animais de estimação dos Guarani teriam sido afugentados e galinhas, mortas.

    Em nota, o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) – Regional Sul afirma que a ação dos fazendeiros “denota um extremo ódio contra aquela pequena comunidade” e alerta para o “clima de perseguição e criminalização contra os grupos mais vulneráveis – em especial os indígenas e quilombolas”.

    “O acampamento foi invadido sem haver determinação judicial para que se procedesse à desocupação da área – e, ainda que houvesse uma ordem judicial, os indivíduos que lá estavam não são autorizados a executá-la”, afirma o Cimi – Regional Sul sobre o caso.

    Clique aqui para ler a nota na íntegra.

    Histórico

    Em meados dos anos 2000, um grupo de famílias já havia ocupado a área. Contudo, foram retirados pela prefeitura e enviados para a Terra Indígena Marrecas, do povo Kaingang, localizada no centro do Paraná, a mais de 400km de Guaíra. Pela distinção interétnica, as famílias foram deixando a reserva e migrando para outros territórios, como o sul do Mato Grosso do Sul, onde têm parentes Guarani Ñandeva.

    As retomadas na região de Guaíra e Terra Roxa têm permitido o retorno de algumas famílias à região. Parte delas decide reocupar antigos territórios que consideram seus, como é o caso da mata localizada na APP, às margens do rio Paraná.

    Os indígenas explicam que a falta de terra é agradava pelo cumprimento parcial de um acordo realizado entre os Avá Guarani e a Usina de Itaipu. A usina teria se comprometido a comprar sete hectares de terra para que as famílias do tekoha Mirim pudessem viver em mínimas condições de moradia, até que os estudos para a demarcação de seus territórios tradicionais na região sejam concluídos.

    A empresa, no entanto, cedeu aos indígenas uma área de apenas dois hectares, onde construiu um conjunto habitacional de alvenaria. Neste espaço extremamente reduzido, onde é impossível plantar, vivem atualmente cerca de 25 famílias.

    Em função da situação de confinamento e do descumprimento do acordo pela Usina, algumas das famílias seguiram na madrugada de domingo para segunda, 6, para viver em sua mata tradicional, acompanhadas por parentes vindos de outro tekoha próximo e também ligados tradicionalmente à área. Começaram a erguer suas casas, o que acabou chamando a atenção dos ruralistas da região. Ao redor da área ocupada, há uma série de terras arrendadas para a monocultura do milho e da soja.


    Após a expulsão, a página ruralista postou fotos da ação, agradecendo aos indivíduos que participaram da ação contra os indígenas e afirmando que se houver "qualquer nova invasão, vamos precisar de uma participação maior no local, para a pressão dos agricultores ser maior e assim ter mais força".

    Ainda nesta semana, os indígenas aguardam uma reunião com representantes da Usina de Itaipu, para tratar sobre o acordo que foi descumprido pelo empreendimento.

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  • 13/06/2016

    Nota do Cimi – Regional Sul em repúdio ao ataque contra comunidade Guarani em Guaíra, Paraná

    O Conselho Indigenista Missionário vem a público denunciar e repudiar as violências contra um grupo de famílias Guarani, do Tekoha Mirim, no município de Guaíra, estado do Paraná. Os indígenas ocuparam há alguns dias uma pequena porção de terra dentro de uma área de reserva legal, localizada nos fundos de uma fazenda onde se produz milho e soja transgênicos. Os indígenas reivindicam há décadas, junto à Fundação Nacional do Índio, a demarcação da terra ocupada.


    Os relatos de lideranças Guarani dão conta de que na tarde de quarta-feira, 8 de junho, fazendeiros, acompanhados de centenas de homens e mulheres, invadiram o acampamento, entraram nos barracos de lona e capim, agrediram, ameaçaram, intimidaram os indígenas e os expulsaram do local. Depois atearam fogo no acampamento, fazendo queimar inclusive pertences das famílias – roupas, calçados, alimentos e utensílios de cozinha. Não bastasse toda essa violência, os indígenas relatam que os invasores ainda mataram galinhas e afugentaram animais de estimação. Além de a ação ser descabida, pois não havia nenhuma determinação legal para a desocupação da área, denota um extremo ódio contra aquela pequena comunidade.

    Segundo informações das lideranças que estavam no local, que são corroboradas pelas imagens registradas por aparelhos celulares e disponibilizadas nas redes sociais, as ações são ainda mais graves pelo fato terem sido praticadas à revelia da justiça e da legalidade: o acampamento foi invadido sem haver determinação judicial para que se procedesse à desocupação da área – e, ainda que houvesse uma ordem judicial, os indivíduos que lá estavam não são autorizados a executá-la; não apenas violaram domicílios e agrediram uma comunidade indefesa, na qual havia mulheres e crianças, mas também destruíram patrimônio, atearam fogo em pertences dos indígenas, afugentaram animais de estimação. Trata-se de ações graves, passíveis de severas penalidades. Espera-se, portanto, uma ágil intervenção do Poder Público, para investigar e punir aqueles que participaram – agredindo diretamente pessoas e animais ou assistindo a estes atos e, desse modo, também deles participando. Evidências dessas ações não serão um problema, posto que existem registros nos quais os agressores podem ser reconhecidos.

    Infelizmente este não é um ato isolado, não diz respeito à ação de um único grupo que ignora o ordenamento jurídico e pensa ser legítimo para fazer justiça com as próprias mãos. O Cimi alerta o Poder Público acerca do clima de perseguição e criminalização contra os grupos mais vulneráveis – em especial os indígenas e quilombolas – que lutam pela garantia de direitos humanos fundamentais, como a demarcação das terras, o emprego e a moradia. Alerta, ainda, para a insegurança jurídica que esse tipo de ação gera e faz proliferar, e que decorre da omissão e negligência das autoridades públicas. Têm ocorrido, com grande regularidade, casos de agressão contra indígenas e comunidades, em nome de uma suposta ordem, que esconde a tentativa de manutenção de privilégios por parte de segmentos historicamente favorecidos.

    Esse fato grave deve ser visto e analisado dentro de um contexto político de tentativa de desqualificação dos direitos constitucionalmente assegurados aos indígenas e quilombolas. E, portanto, pode também ser analisado como consequência dos discursos feitos por parlamentares ruralistas no âmbito da Comissão Parlamentar de Inquérito/CPI da Funai e Incra. Uma CPI que parece ter sido instituída para investigar, perseguir e criminalizar os agentes públicos e outros atores e lideranças sociais que se dedicam à luta pela garantia dos direitos indígenas e quilombolas. Comprova-se a intencionalidade de alguns integrantes desta comissão, a partir do modo como eles conduzem suas reuniões, audiências e diligências externas. Nota-se, pelas manifestações de parlamentares, que há prejulgamento contra os que defendem as demarcações de terras e uma pré-disposição de instigar a animosidade e os conflitos nas regiões onde terras estão sendo reivindicadas ou demarcadas. Na CPI, quando autoriza-se e convoca-se as audiências públicas para tratar do objeto da investigação, a ação do Incra e da Funai, os parlamentares ruralistas excluem os principais interessados, os indígenas e quilombolas. Transformam, com isso, as audiências – que deveriam ser públicas – em palanque eleitoral junto aos segmentos sociais, sindicais e políticos que defendem exclusivamente os ocupantes e invasores de terras indígenas e quilombolas.

    É inegável que a atuação parlamentar da bancada ruralista contribui para o aumento dos conflitos. Infelizmente, temos presenciado com maior frequência ações anti-indígenas em Mato Grosso do Sul, no Maranhão, na Bahia, Tocantins, Pará, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, exatamente nos estados por onde as comitivas de deputados e assessores da CPI têm atuado ao longo dos últimos meses.

    Os Guarani, assim como os demais povos indígenas, esperam que a justiça seja feita – não para ver recair sobre seus agressores o mesmo sofrimento que lhes foi imposto, mas para poder continuar confiando na justiça “dos brancos”  e nas instituições democráticas. É preciso que se entenda que os povos indígenas não desistirão de suas terras. Eles prosseguirão em sua mobilização e luta pela regularização de suas áreas, pois confiam que aquilo que se registrou no texto constitucional não é mera retórica, nem letra morta.

    O Cimi presta solidariedade aos Guarani, privados de viver em suas terras tradicionais e, ainda mais, golpeados, desrespeitados e agredidos física e verbalmente por quem, do alto de sua arrogância, imagina que pode ignorar instituições, passar por cima dos direitos constitucionais e humanos dos povos indígenas, expulsá-los e roubar-lhes a disposição de lutar por seus direitos.

    Mas, por mais que a arrogância de  fazendeiros os impeça de ver as violências praticadas, o fato de agredir e ameaçar seres humanos, matar os seus animais e destruir seus pertences constitui-se em crimes graves. Lembramos aqui de um importante líder religioso do Povo Guarani, Karaí Adolfo, que costumava dizer, em seus conselhos dirigidos aos mais jovens e para os que lhe visitavam em sua aldeia, na área de Varzinha/RS, que se os juruá – os brancos – matarem os Mbya, estarão promovendo não tão somente crime, mas a destruição de toda a terra.

    O ataque contra famílias Guarani indefesas, vivendo em situação de vulnerabilidade, numa pequena porção de terra, situada dentro de uma área de reserva legal, é sinal de desrespeito à dignidade humana e de injustiça extrema. E sobre estes que agiram criminosamente recairá, certamente, alguma forma de punição. O Cimi une-se aos Guarani na certeza de que a Justiça prevalecerá. Une-se às suas lutas pela demarcação e garantia das terras.

    Chapecó, 11 de junho de 2016.
    Conselho Indigenista Missionário-Regional Sul

    Foto: Pe. Diego Pellizari

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  • 13/06/2016

    Vaticano reafirma apoio aos movimentos sociais do Brasil por ‘Terra, Teto e Trabalho’

    O cardeal Peter Turkson (na foto), presidente do Conselho Pontífice de Justiça e Paz do Vaticano, se pronunciou em carta aos movimentos sociais brasileiros, que se reuniram em Mariana (MG) no início deste mês, reafirmando o comprometimento do Vaticano com as lutas populares por Terra, Teto e Trabalho. Conforme lembra o cardeal, o papado de Francisco entende o chamado três ‘Ts’ como direitos sagrados.

    Turkson se referiu às palavras do Papa Francisco ainda para ressaltar que os principais problemas mundiais só serão resolvidos pelas mãos dos humildes, ou seja, pela luta incessante de povos, comunidades e grupos sociais, em união, por uma nova conformação política e social, onde a economia esteja a serviço dos povos e a Mãe Terra seja respeitada.

    Leia a carta na íntegra:

    Irmãos e irmãs dos movimentos populares do Brasil:

    Em nome do Conselho Pontífice de Justiça e Paz, saúdo a todos e todas. Lamento não ter acompanhado seu encontro onde retomam os debates e propostas de objetivos fixados em comum: que os três ‘Ts’ – Terra, Teto e Trabalho – sejam respeitados em toda Criação porque são, como assinala o Papa Francisco, direitos sagrados.

    Que bonito gesto de realizar a reunião do Brasil em Mariana (MG), em solidariedade com as vítimas do paradigma tecnocrático que coloca a natureza a serviço da ganância. Sabemos que a contaminação da bacia do rio Doce e das comunidades que vivem em suas margens é grave. Os acompanhamos na busca de que crimes ambientais como esse não se repitam.

    Sei que estão vivendo um momento crítico em seu país. Me vem à mente uma palavra fundamental: democracia. Vale a pena lutar, de forma pacífica e tenaz, por uma democracia plena e participativa.

    Recordo as três tarefas que o Papa Francisco propôs a vós durantea reunião celebrada na Bolívia, em 2015: 1. Colocar a economia a serviço dos povos; 2 Unir os povos em busca da paz e da justiça; 3. Cuidar da Mãe Terra.

    O Papa nos recordou que as soluções aos grandes problemas do mundonascem da criatividade das mãos dos humildes, de vossas mãos. Orem por ele e contem com as orações e o apoio deste Conselho Pontífice.

    Graças a todos e todas que agem e que Deus os abençoe. Que o exemplo de Maria, sempre firme diante das adversidades, os inspirem a caminhar e cantar!

    Roma, 3 de junho de 2016

    Cardeal Peter K.A Turkson

    Presidente do Conselho Pontífice de Justiça e Paz

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  • 13/06/2016

    Em Assembleia, Cimi Regional Maranhão reafirma luta contra o Matopiba e denuncia assassinatos


    O Regional Maranhão do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) esteve reunido em assembleia entre os últimos dias 7 e 10 de junho, em São Luís (MA). Os missionários e missionárias trataram de assuntos inerentes ao escritório regional e debateram a conjuntura indigenista no estado e no país. Dois pontos têm despertado grande preocupação para o Cimi/MA: o Matopiba e os assassinatos de indígenas – de janeiro até este mês de junho foram cinco mortes “mandadas”.

    Projeto tocado pelo governo federal, o Matopiba visa exaurir o que o agronegócio afirma ser uma fronteira agropecuária ainda não explorada, o Cerrado, e envolve um cinturão de terras que perpassa os estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia – as siglas formam o nome deste projeto danoso ao meio ambiente e às populações que nele vivem.

    "Repudiamos a continuidade da relação colonizadora e preconceituosa do Estado brasileiro para com os povos originários em suas formas de vida, em seus territórios e em sua organização social, com a implantação do Programa MATOPIBA, – a Besta Fera do Cerrado –, que causará a devastação, a poluição e a expulsão de povos e comunidades desse Bioma considerado o berço das águas", diz trecho da nota do encontro.

    Leia a nota na íntegra:

    Nota da 37ª Assembleia do Cimi Regional Maranhão

    "Vós sois sal da terra e a luz do mundo"(Mt,13-16)

    Nós, missionárias e missionários do Cimi Maranhão, o Secretário Executivo do Cimi, o bispo da Diocese de Viana, representantes indígenas dos povos Krenyê, Gamela, Krepumkatejê, Awa, Krikati, Pyhcop (Gavião) e Tentehar/Guajajara da Terra Indígena Pindaré, da Comissão Pastoral da Terra, da Rede Justiça nos Trilhos, do Conselho Missionário Regional, da CNBB e da Pastoral Indigenista da diocese de Grajaú, reunidos nos dias 07 a 10 de junho de 2016, na XXXVII Assembleia Cimi Regional, em São Luis-MA, à luz do tema Povos Indígenas: sementes de solução e fontes de esperança, refletimos sobre a importância dos povos originários para o cuidado com a nossa Casa Comum, a Conjuntura Política e Indigenista no Brasil, como esta afeta povos e comunidades, e celebramos as lutas de resistências e insurgências em nossa região.


    Com os povos, reafirmamos o compromisso com seus projetos de vida, que se mostram em equilíbrio com a natureza e seres humanos. Neste sentido, salientamos a necessidade imediata do reconhecimento das terras tradicionais desses povos, para que possam dar continuidade à sua existência e dignidade de pessoas humanas.

    Repudiamos a continuidade da relação colonizadora e preconceituosa do Estado brasileiro para com os povos originários em suas formas de vida, em seus territórios e em sua organização social, com a implantação do Programa MATOPIBA, – a Besta Fera do Cerrado –, que causará a devastação, a poluição e a expulsão de povos e comunidades desse Bioma considerado o berço das águas. Repudiamos também os projetos de mineração com concessões de lotes (previsto) em terras indígenas, que mais uma vez beneficiarão os já mais ricos deste País.

    Denunciamos os assassinatos de cinco indígenas – 04 Guajajara e 01 Gamela –, ocorridos de janeiro até agora; as ameaças de extermínio desses povos, a invasão e exploração ilegal em seus territórios. Da mesma forma, denunciamos que essa crise econômica e política é uma farsa, sendo para nós a tomada de Estado por um golpe movido pelo interesse em retroceder com os direitos territoriais e sociais já adquiridos e, a continuidade da venda de nossas riquezas e patrimônio. Não nos sentimos representados por esse governo interino, pelo Congresso Nacional e pelo Poder Judiciário, em contínuas decisões contra os direitos territoriais e a completa ausência dos povos/comunidades nas ações que lhes dizem respeito.

    Reafirmamos nosso compromisso com a causa indígena, em todos os espaços e momentos, até o ultimo território de Bem Viver dos povos seja reconhecido e a eles devolvidos. Na luta diária com nossas comunidades pela descolonização de nosso pensar, sentir e agir. Nossas armas, mais que a resistência, serão a insurgência contra esses projetos de morte e da separação forçada e violenta do homem com a natureza, chamada pelos governos, em aliança com o capital, de desenvolvimento. Na calada das noites e manhãs, ‘faremos as nossas flechas, e sairemos de debaixo das folhas para pisar na cabeça daqueles que nos querem soterrar’ pelos nossos direitos conquistados e pelo nosso direito sagrado de viver como filhos e filhas da Mãe da Terra.

    São Luís, 10 de junho de 2016.

    Território Livre para o Bem Viver dos Povos!!

    Fora Temer!

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  • 13/06/2016

    Despejo é genocídio: em defesa dos Guarani e Kaiowá do Apyka’i


    No Mato Grosso do Sul, no meio de uma plantação de cana, vive um grupo de famílias Guarani e Kaiowá. Para eles, aquela terra se chama Apyka’i, e é onde estão enterrados os seus antepassados. E eles estão ameaçados de despejo.

    É ao lado dessas pessoas que nos posicionamos nesta carta, contra a recente decisão de reintegração de posse da área em favor de uma vasta plantação de cana, arrendada pela Usina São Fernando. A usina, localizada no município de Dourados (MS) – pertence a José Carlos Bumlai, empresário e pecuarista preso pela Operação Lava Jato -, incide sobre o território indígena.

    Apyka’i é um exemplo grave do genocídio praticado contra os indígenas no estado. Lá, eles bebem água em um córrego envenenado pelas plantações de cana – uma senhora morreu de envenenamento ali. Outras oito pessoas foram atropeladas às margens da rodovia, por onde os indígenas acessam a cidade. Outras três se suicidaram, no contexto da falta absoluta de terra. A morte é muito presente no Apyka’i – logo que se entra no acampamento, é possível avistar dois cemitérios.

    Desfavorecidos pela paralisação das demarcações das terras indígenas, sofrendo regularmente tentativas de reintegração de posse, ameaças de morte, ataques, incêndios criminosos, suicídios, ausência total de acesso a saúde e educação, ataques químicos com agrotóxico por aviões, atropelamentos e racismo. Por anos, viveram em uma faixa minúscula de terra na beira da estrada, em barracos, antes de reocuparem sua terra ancestral.

    A comunidade afirma que não irá sair – mesmo que o efetivo da polícia militar seja utilizado para removê-los a força, conforme solicitação do juiz Fábio Kaiut Nunes, da 1a. Vara Federal de Dourados. Afora os moradores dali, há milhares de guerreiros e guerreiras, entre os mais de 50 mil Guarani e Kaiowá que habitam o estado, prontos para resistir ao lado deles.

    E quem seríamos nós, se não nos rendêssemos a esse grito desesperado de resistência? Num dos momentos mais antidemocráticos que já vivemos em nossa história, e num contexto de forte criminalização contra nós movimentos sociais e apoiadores da causa indígena, afirmamos que faremos o que for possível para ajudar a defender o pequeno acampamento do Apyka’i, tomando nosso lado nesta luta: de mãos dadas com os Guarani e Kaiowá, contra os gigantes com dinheiro.


    Deixe o Apyka’i viver!


    13 de junho de 2016

    ASSINAM ESTA CARTA:

    Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib)

    Articulação dos Povos Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (Apoinme)

    Articulação dos Povos Indígenas do Sudeste (Arpinsudeste)

    Articulação dos Povos Undígenas do Sul (Arpinsul)

    Associação Floresta Protegida (Mebengokre/Kayapó)

    Aty Guasu Guarani e Kaiowá

    Comissão Guarani Yvyrupa (CGY)

    Conselho de Articulação do Povo Guarani (RS)

    Conselho Terena

    Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab)

    Amigos da Terra

    Associação Brasileira de Antropologia (ABA)

    Associação de Defesa do Meio Ambiente de Araucária/PR (Amar)

    Associação de Proteção ao Meio Ambiente de Cianorte/PR (Apromac)

    Associação Nacional de Ação Indigenista (Anaí)

    Associação de Proteção ao Meio Ambiente (Apromac)

    Art. Rosalino de Povos e Com. Tradicionais do Norte de Minas e Alto Jequitinhonha

    Bicuda Ecológica (RJ)

    Canudos/SP

    Cáritas Brasileira

    Centro Acadêmico Celso Amorim (Rel. Int./UFGD)

    Centro Acadêmico de Ciências Sociais (UFMS)

    Centro Acadêmico Florestan Fernandes (Ciências Sociais/UFGD)

    Centro de Agricultura Alternativa do Norte de Minas (CAA)

    Centro de Defesa da Cidadania e dos Direitos Humanos (CDDH-MS)

    Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva (Cedefes)

    Centro de Estudos Bíblicos (CEBI)

    Centro de Estudos e Pesquisas para o Desnvolvimento do Extremo Sul/Ba (Cepedes)

    Centro de Trabalho Indigenista (CTI)

    Coletivo A Causa

    Coletivo de Entidades Ambientalistas do Estado de São Paulo

    Coletivo de Mulheres da UFGD

    Coletivo de Profissionais em Antropologia (aPROA)

    Coletivo Terra Vermelha (CTV)

    Comissão da Verdade e Memória do Grande Sertão

    Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos

    Comissão Pró-Índio de São Paulo (CPI-SP)

    Comissão Pastoral da Terra (CPT)

    Comitê de Defesa Popular de Dourados

    Comitê de Solidariedade aos Povos Undígenas De Araraquara/SP

    Comitê de Solidariedade aos Povos Undígenas De Dourados/MS

    Comunidades Eclesias de Base do Mato Grosso do Sul (CEBs/MS)

    Conselho Indigenista Missionário (Cimi)

    Conselho Pastoral de Pescadores (CPP)

    Conselho Nacional do Laicato do Brasil (CNLB)

    Contra o Trafico de Mulheres (UFGD)

    Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq)

    Eterno Arte Crew

    Fábrica Arístico-cultural Latinoamericana de Corumbá e Ladário (Fala)

    Fase

    Federação Anarquista Gaúcha (FAG)

    Fian Brasil

    Frente Nacional de Defesa dos Territórios Quilombolas

    Fórum da Amazônia Oriental (Faor)

    Fórum de Igrejas e Organismos Ecumênicos do Brasil (FE ACT/Br)

    Fórum Mudanças Climáticas e Justiça Social

    Greenpeace Brasil

    Grupo Argos de Teatro (Corumbá/MS)

    Grupo de Estudos Desenvolvimento, Modernidade e Meio Ambiente (UFMA)

    Grupo de Estudos Subalternidade e colonialidade na America Latina (UFGD)

    Índio é Nós

    Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental (PROAM)

    Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB)

    Instituto da Mulher Negra do Pantanal (Imnegra)

    Instituto de Pesquisa e Formação Indígena (Iepé)

    Instituto Madeira Vivo

    Instituto Socioambiental (ISA)

    Instituto Terramar

    Instituto Transformance: Cultura & Educação

    International Rivers – Brasil

    Justiça Global

    Marcha Mundial das Mulheres

    Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB)

    Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST)

    Movimento Tapajós Vivo

    Plataforma de Articulação e Diálogo (PAD)

    Plataforma de Direitos Humanos Dhesca Brasil

    Rede Brasileira de Arteducadores (Abra)

    Rede Nacional de Advogados Populares (Renap)

    Toxisphera Associação de Saúde Ambiental

    Uma Gota No Oceano

    União de Mulheres de São Paulo

    Universidade Communitária dos Rios (UNIcomRIOS/Marabá)

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  • 13/06/2016

    Três CPIs com intenções e resultados parecidos

    Na quinta-feira (09), foi aprovado o relatório da CPI do Genocídio, eufemisticamente apelidada de CPI da Ação/Omissão, originalmente proposta pelos movimentos sociais como um contraponto à CPI do Cimi, mas que de forma oportunista foi ocupada por um conjunto de forças anti-indígenas no Mato Grosso do Sul. O documento contém 286 páginas distribuídas em 17 capítulos. Os trabalhos de quatro meses chegaram à brilhante conclusão de “que o poder público não é omisso e nem age contra as comunidades indígenas de Mato Grosso do Sul”. Segundo e seguindo essa lógica, quando o ex-governador Pucinelli afirmou que era um crime dar um palmo de terra produtiva aos índios, certamente estava ostensivamente apoiando os índios e a Constituição brasileira!

    A conclusão da relatoria é de que “inexistem provas materiais e liame jurídico necessário à responsabilização do Estado de Mato Grosso do Sul nos casos de violência contra os povos indígenas”.

    O que são então os 30 acampamentos Kaiowá Guarani, no cone sul do Mato Grosso do Sul? São frutos do reconhecimento do direito dos povos indígenas às suas terras, de uma relação sem preconceitos e dignidade? Se existe tanto interesse em afirmar que o Estado não tem responsabilidade quanto às violências, por que este não busca, junto ao governo federal, ações no sentido de demarcar as terras reivindicadas pelas comunidades indígenas?

    A CPI da Funai e do Incra segue o mesmo caminho, ou seja, são espaços quase que totalmente ocupados por parlamentares ruralistas.

    As duas CPIs na Assembleia Legislativa do Mato Grosso do Sul tiveram praticamente a mesma composição: quatro parlamentares defendendo interesses ruralistas e apenas um favorável à causa indígena. E na CPI que encerrou suas atividades nesta semana com aprovação do relatório, quatro parlamentares se posicionaram sistematicamente a favor do Estado, e um buscando fazer um contraponto, procurando elucidar as responsabilidades do Estado com relação às violências e genocídio em curso.

    O resultado não poderia ser outro. Os relatórios aprovados não tiveram unanimidade, tanto que relatórios paralelos foram apresentados.

    Os ditos resultados das CPIs de Mato Grosso do Sul foram enviados à CPI da Funai e do Incra. Não tem quem, de boa fé, possa esperar algo diferente. Atacar funcionários públicos, profissionais competentes, demonizar a causa indígena e seus aliados, retardar o cumprimento da Constituição, fazer avançar a aprovação de Propostas de Emenda Constitucional (PECs) e Projetos de Lei (PLs), como a 215 e o 1610, dentre dezenas de outros, eis alguns dos ventos no horizonte.


    Para quem acompanhou, neste último meio século, as dificuldades enfrentadas pelos indígenas com milhares de mortes, massacres, extermínios, genocídio, etnocídio, não restam dúvidas de que esta é uma página conspurcada de nossa história, da qual não apenas nos envergonhamos, mas precisamos reagir energicamente para começar a fazer justiça a esses 305 povos originários que sobrevivem em nosso país. Foram constituídas regionalmente e em nível nacional inúmeras Comissões Parlamentares de Inquérito para identificar e punir severamente os culpados por essa barbárie. Infelizmente, os mandantes e executores não apenas continuaram impunes, mas sentiram-se estimulados a continuar com suas práticas criminosas contra os povos indígenas.

    Vejam o “Relatório Figueiredo” (de 1968) e o relatório da Comissão Nacional da Verdade (2014) e outros tantos relatórios, que foram e continuam sendo levados a instâncias nacionais e internacionais, no anseio de acabar com esse quadro de violência e mortes que continua em praticamente todas as regiões do país. Infelizmente essa triste realidade se verifica também em grande parte de nossa América Ameríndia, ainda na paixão, conforme palavras de Dom Pedro Casaldáliga.

    Egon Heck
    Cimi Secretariado Nacional

    Brasília, 10 de junho de 2016.

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  • 10/06/2016

    Juiz pede que governo Temer mande Força Nacional para despejar Guarani Kaiowa de área explorada por Bumlai no MS

    Ruy Sposati,

    de Dourados (MS)

    Após o governo do estado ter se recusado a usar a Polícia Militar para realizar o despejo das nove famílias Kaiowa e Guarani do tekoha Apyka’i, em Dourados (MS), o juiz federal Fábio Kaiut Nunes requisitou ao Ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, o envio de tropas da Força Nacional de Segurança Pública para retirar os indígenas da área. Mesmo sem polícia para efetuar a ação, a Justiça notificou a liderança da comunidade, Damiana Cavanha. A indígena afirmou que a comunidade não deixará a área, arrendada pela a Usina São Fernando, propriedade de José Carlos Bumlai. A Fundação Nacional do Índio (Funai) entrou com pedido de Suspensão de Liminar no Supremo Tribunal Federal (STF), para evitar o confronto.

    Na última quarta, 8, Damiana foi levada até a sede da Funai para receber a notificação da oficial de Justiça. A liderança, no entanto, recusou-se a assinar o documento. "Não vou assinar nada. Pode cavar o buraco para enterrar todos, porque não vamos sair do nosso tekoha", afirmou, respondendo ao pedido da oficial. Mesmo sem a assinatura, o prazo de cinco dias estabelecido na decisão judicial para cumprimento da ordem passa a valer. O despejo deverá acontecer entre os dias 13 e 15 de junho, a pedido do proprietário da fazenda Serrana (arrendada para a usina), Cassio Guilherme Bonilha Tecchio.

    Sem Polícia

    Esta não é a primeira vez que o juiz substituto da 1a. Vara da Justiça Federal de Dourados  decide pela reintegração de posse contra os Kaiowa de Apyka’i, apesar da forte oposição de organizações de direitos humanos do mundo todo contra o despejo.

    Na última decisão, em maio, Kaiut requisitou ao governo do Mato Grosso do Sul o uso da PM para o cumprir a reintegração, mas o pedido foi negado. Em sua decisão, Kaiut exige que a Procuradoria Geral da República "adote as medidas cabíveis" contra o governo do estado pelo não-cumprimento, e solicitou ao Ministro da Justiça o uso da Força Nacional, que ainda não respondeu ao pedido.

    Dias depois de assumir o Ministério da Justiça no governo provisório de Michel Temer (PMDB), o ex-secretário de Segurança do estado de São Paulo Alexandre de Moraes afirmou à imprensa que irá combater "movimentos de esquerda", e que ações de grupos que ocupem terras – em referência ao Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), citado pelo ministro – "vão ser combatidas assim como os crimes".

    Antes dos cargos públicos, Alexandre atuava como advogado e trabalhou também para o deputado federal afastado Eduardo Cunha (PMDB/RJ). Em 2014, Cunha foi defendido por Alexandre numa ação em que era acusado de usar documento falso. Alexandre conseguiu a absolvição de Cunha no STF.

    Apyka’i, "comunidade modelo" do genocídio

    Mais de uma década vivendo na beira da estrada, sofrendo ataques de seguranças privados, barracos criminosamente incendiados a mando de produtores rurais, bebendo da água mais podre dos córregos envenenados pela monocultura – o Apyka’i figura como uma espécie de "comunidade modelo" do genocídio que sofrem os povos indígenas no Brasil.

    Nove pessoas faleceram no local – oito, vítimas de atropelamentos, e uma envenenada por agrotóxicos utilizados nas plantações que circundam a retomada. Os moradores do tekoha sobrevivem essencialmente de doações e de cestas básicas oferecidas por apoiadores e pela Funai. Não tem acesso à água, à floresta, è educação, saúde, à segurança ou a dignidade mínima.

    A usina

    Instalada em Dourados em 2009, a Usina São Fernando é um empreendimento do Grupo Bertin, um dos maiores frigoríficos produtores e exportadores de itens de origem animal das Américas, e da Agropecuária JB, ligada ao Grupo Bumlai (propriedade do pecuarista José Carlos Bumlai), especializado em melhoramento genético de gado de corte. Um dos territórios utilizados pela usina para produzir cana é reivindicado pelos Kaiowá de Apyka’i.

    Em 2010, sob perigo de perder sua licença de operação em função de diversos descumprimentos legais em questões trabalhalistas, ambientais e indígenas, a usina teve de assinar um termo de cooperação e compromisso de responsabilidades na Justiça.

    Entre as condicionantes estabelecidas pelo Ministério Público Estadual, Ministério Público do Trabalho e MPF, a usina era obrigada a não renovar o contrato de arrendamento da fazenda Serrana, de Cássio Guilherme Bonilha Tecchio, propriedade que incide sobre o território reivindicado como Apyka’i pela família de Damiana, quando o atual findasse.

    Em 2015, José Carlos Bumlai foi preso no decurso da Operação Lava Jato, acusado de fazer parte de um esquema de corrupção e fraude no pagamento de dívidas de campanha eleitoral do Partido dos Trabalhadores.

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  • 09/06/2016

    Nota pública: o povo não cabe no orçamento do governo provisório

    A Articulação das Pastorais do Campo, composta pelo Conselho Indigenista Missionário – CIMI, Comissão Pastoral da Terra – CPT, Conselho Pastoral dos Pescadores – CPP, Serviço Pastoral dos Migrantes – SPM, divide com os grupos e comunidades com as quais convivem suas angústias e apreensões, diante da violência institucional e do desmonte dos direitos conquistados em longo processo de lutas.


    Clique aqui para acessar a nota em pdf.

    Após o Senado Federal ter afastado temporariamente, numa manobra claramente golpista, a presidenta Dilma Rousseff e empossado provisoriamente Michel Temer, estão sendo impostas, irresponsavelmente, medidas com caráter de mandato definitivo.  Medidas que afetam diretamente os mais fracos e vulneráveis de nosso país, sobretudo os povos e comunidades do campo, das florestas e das águas.

    Formou um novo ministério só de homens, e todos brancos. Nenhuma mulher, nenhum negro, ninguém alinhado às classes sociais desprotegidas. Nada menos que sete deles citados e denunciados na Operação Lava-Jato e em outros processos de corrupção. Dois, por conta de gravações divulgadas e que os incriminam, já tiveram que ser afastados.

    Promoveu a extinção de ministérios, a fusão de outros, sobretudo os voltados para o campo social, como o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) e a Secretaria dos Direitos Humanos, da Igualdade Racial e da Mulher, num processo em que está implícito o desmanche de direitos. Sucedem-se medidas anunciadas e revogadas num curto espaço de tempo. Caso exemplar é o da competência pela delimitação das terras quilombolas, que foi transferida do Incra para o Ministério da Educação, deste para o Ministério da Cultura e por fim acabou ficando, junto com o próprio Incra e outros órgãos voltados para o povo do campo, para a Casa Civil.

    Seus ministros acenam que as medidas de reconhecimento de terras indígenas e territórios quilombolas tomadas pelo governo Dilma, nos meses anteriores a seu afastamento, poderão ser revogadas.

    Há articulações para revogação do Decreto nº 8.750/2016, que instituiu o Conselho Nacional dos Povos e Comunidades Tradicionais, num claro desrespeito à identidade e direitos desses povos.

    Na verdade, as questões que envolvem indígenas, camponeses, sem terra e comunidades tradicionais são uma batata quente nas mãos do governo interino com as quais não sabe tratar. A sensação que transparece é que procura um jeito de se ver livre delas.

    O golpe contra o direito dos mais vulneráveis atinge em cheio também as comunidades urbanas. A primeira grande vítima do governo provisório foi o Direito à Moradia. O cancelamento dos contratos se voltou principalmente contra a modalidade ‘Entidades do Programa’, na qual os futuros moradores gerenciam o projeto e a obra, construindo casas maiores e melhores, com os mesmos custos das construções feitas por empreiteiras. Medida revogada nos últimos dias.

    E se anunciam reformas na previdência, com aumento da idade mínima para aposentadoria, desvinculação do salário mínimo, atingindo mais de 30 milhões de pessoas. Também já está clara a revisão do programa Bolsa Família. O ministro da Saúde acenou para o fim da universalidade do SUS.

    Quem está atrapalhando o novo governo é o povo. Este não cabe no orçamento, como se pode ver pelo plano econômico anunciado que propõe colocar um limite para despesas em saúde, educação e outras em setores essenciais à vida do povo.

    Tudo isso deixa claro o que esteve por trás de todo o processo que levou ao afastamento provisório da presidenta Dilma Rousseff.  Foi um escárnio à história e à inteligência do povo brasileiro. E um claro e transparente atentado contra a democracia. Na realidade o processo de Impedimento de Dilma não visava acabar com a corrupção ou punir os corruptos, mas justamente o oposto: proteger corruptos dando-lhes poder para garantirem seus privilégios e para bloquear investigações em curso. E limitar os ganhos sociais dos mais pobres.

    De nada valeram, até agora, as mais variadas manifestações das igrejas, de pastorais sociais, de movimentos populares, de juristas, artistas e intelectuais que alertavam sobre a iminência da quebra da ordem democrática. De nada valeram também os argumentos de defesa da presidenta. O que se inferia de todo o procedimento adotado ficou claramente explícito na gravação, tornada pública no dia 23 de maio, do diálogo do senador Romero Jucá com o ex-presidente da Transpetro, Sérgio Machado. Dilma tinha que ser afastada para se colocar um limite às investigações da Lava-Jato.

    A cada dia de atuação desse novo governo interino se confirma a subserviência do presidente Temer aos interesses financeiros dos conglomerados empresariais, de capital nacional e internacional, representados, sobretudo, pela bancada ruralista e por setores ligados a interesses minerários.

    As Pastorais do Campo denunciam a violência em curso e somam suas vozes à de muitas igrejas cristãs e não cristãs, à dos movimentos sociais, à dos jovens que ocupam escolas na defesa dos direitos a condições melhores de educação, a milhares de famílias silenciosas que vêem suas parcas conquistas escorrerem de suas mãos, para que um estrondoso grito de justiça ecoe em todos os cantos deste imenso Brasil. É necessária e urgente uma profunda reforma política que garanta mecanismos de participação popular nos destinos da nação. É patente que o Executivo e o Legislativo não respondem à sociedade, não olham os interesses do povo. Obedecem unicamente aos ditames dos doadores de suas campanhas.

    Brasília, 07 de junho de 2016.

    Comissão Pastoral da Terra – CPT
    Conselho Indigenista Missionário – CIMI
    Conselho Pastoral dos Pescadores – CPP
    Serviço Pastoral dos Migrantes – SPM

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  • 09/06/2016

    Presidente da CPI do Genocídio discorda de relatório oficial e apresenta voto paralelo

    O presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Assembleia Legislativa do Mato Grosso do Sul que investiga crime de genocídio contra as populações indígenas, deputado João Grandão (PT), apresenta nesta quinta, 9, um voto paralelo, defendendo ter havido ação e omissão do estado nas violações cometidas contra povos indígenas no Mato Grosso do Sul.

    Cerca de oitenta lideranças indígenas Guarani, Kaiowa e Terena acompanham a votação, em protesto contra relatório oficial. Lido na semana passada pelo deputado Paulo Corrêa (PR) – substituindo provisoriamente a relatora da CPI, Antonieta Amorim (PSB) -, o documento isenta o governo do estado de toda a responsabilidade por crimes cometidos contra indígenas na região.

    Leia a nota pública do Cimi sobre a CPI do Genocídio

    Com pouco menos de 300 páginas, o relatório oficial foi lido em 2 de junho, e deverá ser aprovado pelos parlamentares ruralistas que compõem a CPI: além de Paulo e Antonieta, a vice-presidente, Mara Caseiro (PSDB) e o membro da comissão Professor Rinaldo (PSDB) devem acompanhar o voto favorável ao documento.

    O deputado João Grandão, que vota isoladamente, aponta que a morte sistêmica de lideranças indígenas, a formação de milícias armadas, as tentativas de assimilação, a ausência de terra, falta de acesso à educação e saúde, insegurança alimentar, o papel da polícia nas aldeias, e outras violações são indissociáveis das ações e omissões do estado.

    No voto, Grandão propõe trinta recomendações aos poderes públicos – entre elas, de que o estado faça um "pedido público de desculpas aos povos indígenas pelo esbulho das terras (…) e pelas (…) violações de direitos humanos e sociais ocorridos sob sua responsabilidade direta ou indireta".

    Genocídio

    A conclusão de que o poder público não foi omisso e, por isso, não deve ser penalizado pelos conflitos na região foi criticada pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi). Em nota, a entidade afirma que aprovar o relatório ignorando o papel do estado configura-se como "um crime em cima de um crime", e que os povos indígenas estão "sofrendo a tentativa de serem silenciados pelo poder econômico".

    Ainda, a carta atrela a CPI do Cimi à CPI do Genocídio (ambas compartilham basicamente os mesmos deputados), e também à CPI da Funai/Incra, hegemonizadas por parlamentares ligados ao agronegócio, cujo horizonte é "liberar territórios tradicionais para a eterna empreitada do capital na expansão de suas fronteiras".

    O voto de Grandão aponta que as provas colhidas nas oitivas da CPI garantem que "estamos diante do genocídio dos povos originários, habitantes deste território", contrapondo a conclusão do relatório oficial de que não existe genocídio no estado.


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  • 09/06/2016

    CPI do Genocídio: matam os índios e querem esconder o pau

    Aos povos indígenas no Brasil, o Estado e suas esferas de poder parecem um monstrengo abominável.

    Menos de um mês após a entrega do relatório que tenta criminalizar o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) no estado, a Assembleia Legislativa do Mato Grosso do Sul apresentou o relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Genocídio, isentando o estado de qualquer responsabilidade sobre as violências sofridas por indígenas no contexto do conflito fundiário na região.

    A tese central da CPI do Cimi foi acusar a entidade de manipular indígenas para ocuparem terras – ao mesmo tempo em que atribuía uma absoluta ausência da autonomia dos povos indígenas em suas movimentações na luta pela terra. O argumento não é uma novidade: na carta de 1500 ao rei português, Pero Vaz de Caminha descrevia os indígenas no Brasil como gente a ser domesticada, "argila moldável, uma tábula rasa, uma página em branco".

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    A afirmativa da CPI do Genocídio é ainda mais trágica: os indígenas não só são mentecaptos, segundo os deputados, mas também são os próprios responsáveis pela aniquilação de suas gerações, presentes e futuras.

    Para eliminar qualquer dúvida, de antemão, proibiu-se o uso da expressão "genocídio" durante as oitivas. O próprio título da CPI foi alterado, num acordo bizarro exigido pelos parlamentares ruralistas – em essência, os mesmos da CPI do Cimi, representando os interesses do agronegócio da região – ao presidente da Comissão, João Grandão (PT), sob ameaça de inviabilizar a investigação, prenunciando as manobras que viriam, para tornar o mais asséptico possível a sistematização dos dados coletados nos depoimentos.

    Os deputados sequer se envergonharam de proibir os indígenas de falarem em seus idiomas maternos. O trato com os indígenas remontava interrogatórios toscos de policiais de cinema. Oitivas importantes, como a dos procuradores do Ministério Público Federal (MPF) foram implodidas: os deputados desinteressados em ouvi-los (posto os procuradores desconstruiriam as principais teses anti-indígenas da CPI) simplesmente não se fizeram presentes, e a sessão foi cancelada. Estes depoimentos materializariam as ações e omissões do Estado de Mato Grosso do Sul, tipificando assim a situação dos povos indígenas como genocídio.

    Ignorar o MPF é um movimento importante, quando se trata de invisibilizar o que os indígenas têm a dizer. Quando era vice-procuradora geral da Republica, Déborah Duprat visitou a região de Dourados afirmou que a questão Guarani e Kaiowa, ali, apresentava-se como “talvez a maior tragédia conhecida na questão indígena em todo o mundo”.

    Ainda, as últimas empreitadas das lideranças do Conselho Aty Guasu em fóruns da Organização das Nações Unidas (ONU) tem aproximado cada vez mais o entendimento de que a crise humanitária vivida pelos Guarani e Kaiowa se associa ao conceito de genocídio estabelecido pela Convenção de Prevenção e Repressão do Crime de Genocídio da ONU, de 1951 (sancionada no Brasil pela Lei 2889/56). Não é à toa que o Brasil tem recebido visitas sistemáticas de relatores deste organismo internacional sobre a questão indígena no Mato Grosso do Sul.

    Mas, afinal, o que dizer de tantos relatos apresentados pelos indígenas na CPI? Dorvalino Rocha, Marcos Veron, Oziel Gabriel, Rolindo Vera, Genivaldo Vera, Dorival Benites, Denilson Barbosa, Simeão, Nízio Gomes, Xurite e Oritz Lopes, entre tantos outros -, estes morreram de quê? As dezenas de famílias que denunciaram os ataques de jagunços contratados por fazendeiros estão simplesmente mentindo?

    A falta de comida, para os deputados, parece uma abstração. A falta de terra para o plantio – afinal, faltam-lhes as mesmas terras originárias que foram tituladas pelo próprio estado em algum momento da história -, soa o oposto a eles. A água podre impregnada de agrotóxicos que eles bebem, ora, não instalam filtros porque não querem! As escolas onde só se fala português, o racismo institucional é cotidiano, estes, estão na cabeça complexada do indígena com baixa auto-estima. Um ônibus escolar incendiado criminosamente: talvez não tenha acontecido.

    E, no entanto, tudo isso aconteceu e acontece. E acontece também que os poucos que denunciam estas atrocidades, que sugerem a existência de um genocídio permamente e prolongado contra as populações indígenas, estes estão brutalmente sofrendo a tentativa de serem silenciados pelo poder econômico cuja personalidade, no universo rural, é das mais brutas. Não tolera o outro.

    Falamos da lei de genocídio, aprovada no Brasil na década de 50 – lei, diga-se, que a CPI sequer considerou utilizar para a apuração técnica de fatos.. Esta lei tipifica genocídio da seguinte forma: a) matar membros do grupo; b) causar lesão grave à integridade física ou mental de membros do grupo; c) submeter intencionalmente o grupo a condições de existência capazes de ocasionar-lhe a destruição física total ou parcial; d) adotar medidas destinadas a impedir os nascimentos no seio do grupo; e) efetuar a transferência forçada de crianças do grupo para outro grupo.

    Não é muito afirmar que, através deste relatório, os gerentes do capitalismo na região tentam formalizar sua própria inocência, forjada na condução autoritária e racista das oitivas e na anti-sistematização dos dados exaustivamente apresentados ao longo da investigação por lideranças indígenas, pesquisadores, técnicos, indigenistas e servidores públicos.

    CPI do Cimi, CPI do Genocídio e CPI da Funai/Incra – todas atulhadas de legisladores ruralistas –  têm figurado como uma arena espetacular de aniquilação de direitos e de de uma investida pelo desmonte do movimento indígena em luta, projetando liberar territórios tradicionais para a eterna empreitada do capital na expansão de suas fronteiras. Tudo porque, nestes territórios, justamente, vive-se um anticapitalismo inato, uma vontade e prática outras de produzir e reproduzir a vida. Outra ousadia não tolerada por muitos dos brutos donos do campo.

    A aprovação deste relatório, nestes termos, é um crime em cima de um crime. Mata-se os índios, e esconde-se o pau: estes, que os cachorros cacem, tentando descobrir onde está enterrado. Enquanto isso, a farsa, a nojenta farsa, essa continua.

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